F1 Por dentro da F-1 e da logística maluca das corridas - Julianne Cerasoli Skip to content

Por dentro da F-1 e da logística maluca das corridas

É sempre assim: saio dos circuitos cerca de 5h depois do final da corrida e fico impressionada com o que vejo pelo caminho: as garagens já estão praticamente desmontadas e colocadas em grandes caixas nas quais tudo se encaixa milimetricamente. E todo mundo coloca a mão na massa, incluindo quem trabalha servindo café e coisas do tipo. Claro que os engenheiros e chefes ficam de fora – provavelmente, a esta altura, eles e os pilotos já estão pegando seus voos. Costuma-se levar de 6 a 8h para desmontar tudo, dependendo do espaço disponível no paddock e da facilidade de acesso dos caminhões à pista. E o paddock da China, bastante amplo, é tido como o melhor.

Mas isso é só a ponta do iceberg da loucura que é a logística da Fórmula 1, que permite façanhas como desmontar o circo em Melbourne e montá-lo novamente em Manama, a mais de 12.000km de distância, em três dias.

Dependendo da corrida, os equipamentos são mandados por meio de caminhões ou por uma combinação de avião mais navios. Começando pela parte mais simples, são cerca de 300 caminhões que viajam para as etapas europeias (menos Baku, que fica geograficamente na Europa mas é considerada uma corrida “flyaway”, na linguagem da F-1, ou seja, para onde o equipamento voa ao invés de ir por terra).

Por via aérea, os equipamentos das diferentes equipes se “encontram” em dois pontos: no aeroporto de East Midlands, no centro da Inglaterra, e em Munique (para onde são enviadas as caixas de Ferrari, Toro Rosso e Alfa). A DHL é quem fica encarregada de fazer esse transporte para as corridas, mas isso sai caro: a estimativa é de que cada time transporte 50 toneladas de equipamentos por ano, ao custo de 8 milhões de dólares. 

Mas acho que a parte mais interessante é o transporte marítimo. Basicamente, as equipes compram cinco equipamentos iguais e enviam quatro para as primeiras quatro etapas com antecedência e a quinta para o Canandá. Depois, o que estava em Melbourne vai para Singapura, a carga de Xangai vai a Suzuka, de Manama vai para Sochi, de Baku, para Austin e do Canadá, para o México. Depois, de Singapura, a carga vai para o Brasil e, de Sochi, para Abu Dhabi.

Ou seja, é por conta desse transporte marítimo que é possível fazer dobradinhas como Austrália e Bahrein, Singapura e Rússia (ou Japão) e Azerbaijão e Canadá, ainda que essa última não seja muito bem vista pelas equipes. Porém, foi feita uma inversão importante para o ano que vem em relação a quando isso aconteceu, em 2016: fazendo Baku primeiro, ganha-se 8h para o transporte devido à diferença de fuso entre o Azerbaijão e Montreal.

Isso só faz sentido porque é um meio de transporte mais barato para encomendas ao mesmo tempo pesadas e não muito caras – ou seja, quando compensa comprar cinco peças diferentes do que voar com a mesma o ano todo.

Já nas caixas que são transportadas por via aérea e terrestre estarão todo o equipamento de montagem dos boxes, computadores, peças, cabos, e o carro é desmontado ao máximo e colocado no contêiner acolchoado para evitar danos. O transporte de motores, combustível e lubrificantes, além dos pneus, fica a cargo dos fornecedores. Aliás, o fato da Pirelli transportar seus pneus, que vêm da Turquia, em caminhões não climatizados é tido como um dos motivos para a falta de consistência de seu pneu, mas isso é outra história…

Caso as corridas não sejam em dois finais de semana seguidos, o equipamento volta para a fábrica, onde tudo é checado para a corrida seguinte. Mas pode acontecer de uma peça ficar pronta de última hora e as equipes terem de mandar alguém para o outro lado do mundo só para carregar a tal peça na sua bagagem. Isso é mais comum do que se imagina e, no voo de volta do Japão, cruzei com um cara de 20 anos que tinha feito isso: ele trabalha no estoque da Red Bull e entrou numa lista de espera para ser um desses “entregadores de luxo”. A equipe pagou a viagem e hotel do outro lado do mundo só para ele levar a peça.

Outra coisa que também acontece é, quando um motor quebra, ele é imediatamente levado para a fábrica para ser analisado. No caso da Honda, por exemplo, isso significa mandá-lo para Sakura, no Japão.

Tudo isso porque as equipes avaliam que o custo do transporte é compensado pelos benefícios de uma análise rápida – ou pelos 0s00001 que a tal peça nova vai dar.

Por outro lado, os times estão constantemente tentando levar menos coisas para as corridas para economizar. E por conta disso às vezes ouvimos algumas histórias até meio bizarras no paddock. O time de comunicação da Mercedes foi questionado por conta de sua impressora. Pediram que eles não levassem mais e que comprassem uma a cada GP! Não é por acaso que muita gente anda questionando se a categoria não poderia pelo menos tomar passos mínimos em relação à sustentabilidade.

Já questionei, inclusive, a chefia da FOM sobre isso, mas claramente não há muito entusiasmo em pensar no tema. O que eles gostam mesmo é de mostrar os números: ao longo de uma temporada, cada equipe transporta 600 toneladas de equipamentos por via aérea e 500 toneladas pelo mar. E os seis 747 viajam por 132 mil quilômetros, ou seja, dão a volta ao redor do mundo mais de três vezes.

7 Comments

  1. tão incrível quanto as próprias corridas. Ou até mais….

  2. Ju, vendo totalmente de fora o que mais me impressiona é que eu nunca ouvi alguma notícia de algo que tivesse dado errado; algum equipamento quebrado, retido em algum aeroporto por greve, mal tempo ou qualquer outro imprevisto…

    Nunca deu nada errado?

    • também tenho essa curiosidade

    • UAU. Que reportagem fantástica. Parabéns pelo trabalho..

  3. Outra pergunta, se me permite: a FIA ainda paga todo o transporte? Lembro que até meados dos anos 90 ela pagava o transporte das 10 primeiras colocadas do Mundial de Construtores do ano anterior e segundo a imprensa isso representava cerca de 2,2 milhões de dólares.

  4. Muito legal, Julianne.
    Essa visão dos bastidores devia ser mais comentada pelos jornalistas que acompanham os GPs.
    Gostei também da sugestão do Rodrigo Rocha sobre os possíveis problemas nesses transportes.
    Abração e obrigado pelas matérias maravilhosas.

  5. É, sem dúvida nenhuma, um grande desperdício de oportunidades. A Temporada de 1989 foi disputada por 20 equipes com um total de 39 carros titulares (a equipe EuroBrun só tinha um carro inscrito) e mais os 20 carros reservas, em um total de insanos 59 carros, mais peças de todo tipo pra eles, levando de avião pra 6 provas fora da Europa, e tenho certeza que era menos peso transportado do que o monte de “tralha” sem sentido que se leva hoje, só pra fazer número. A F-1 já a muito tempo se tornou uma máquina de jogar dinheiro fora, infelizmente.


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