F1 Regra de desenvolvimento aerodinâmico - Julianne Cerasoli Skip to content

Limite de desenvolvimento aerodinâmico na F1

A regra que limita o desenvolvimento aerodinâmico dependendo da posição da equipe no campeonato é uma das mais inovadoras da F1. É como se a categoria passasse a adotar um sistema de draft de jogadores, mas adaptada a seu tipo de competição. E o melhor de tudo isso é que o sistema que controla esses limites já existia. Então não tem segredo ou gasto adicional envolvido.

A ideia da regra que estreou em 2021 é simples. Buscar uma forma o menos artificial possível para aumentar a competitividade do campeonato. Ela faz isso ao dar mais tempo de túnel de vento e de CFD para quem está atrás recuperar o terreno de maneira progressiva. Assim como um time do fundo da tabela da NBA tem a chance de escolher jogadores primeiro a cada temporada. E, da mesma forma como o Chicago Bulls, quando selecionou Michael Jordan em 1984, não saiu ganhando tudo de cara, é esperado que essa limitação vá fazendo diferença progressivamente.

Os carros de 2022 foram os primeiros projetados já com estes limites impostos. Em 2021, a diferença entre a primeira colocada no mundial e a última era de 22,5% e, entre um e outro time, de 2,5%. A partir de 2022, estes números dobraram: a primeira tem 45% menos tempo de desenvolvimento aerodinâmico que a última. E será assim até pelo menos 2025.

Os percentuais são revistos duas vezes por ano. A posição da equipe no final do campeonato anterior determina seu percentual de desenvolvimento aerodinâmico nos seis primeiros meses do ano seguinte. E as quantidades são revistas para o segundo semestre com base na classificação do campeonato em 30 de junho.

Como funciona a regra de desenvolvimento aerodinâmico da F1

Como calcular os limites?

Os testes em túnel de vento e o trabalho em CFD, que é um sistema de computador que simula fluídos (no caso, fluxos de ar, como se fosse um túnel de vento virtual), já eram limitados há anos. Isso porque são ferramentas muito caras que algumas equipes usavam 24 horas por dia. Aquele carro da Brawn de 2009, por exemplo, foi feito com dois túneis de vento rodando sem limites.

Então os limites existem e são policiados pela FIA há anos. E isso dá credibilidade a este novo sistema de draft. Afinal, é algo que funciona e cujas possíveis formas de burlar já foram descobertas e banidas. 

Como a maioria das coisas que o regulamento técnico da F1 cobre, estes limites não são simples. Para a definição dos limites, divide-se o ano em seis períodos de testes aerodinâmicos, chamados ATPs. Sua duração varia entre oito e dez semanas. E as mais longas são aquelas na pós e pré-temporadas e nas férias de agosto. Então fica assim:

ATP1 – nove semanas

ATP2 – oito semanas

ATP3 – oito semanas

ATP4 – dez semanas

ATP5 – oito semanas

ATP6 – nove semanas

Modelo de carro de 2022 no túnel de vento @F1

O que significa 100% de tempo de desenvolvimento aerodinâmico?

São três parâmetros para aferir os limites. A base do cálculo é de 320 ‘tentativas’ (runs), 80 horas de túnel de vento sendo usado (chamado de tempo de wind on) e 400 horas de ocupação no total. Esse era o limite de um ATP em 2020, então é considerado 100%.

No CDF os parâmetros são outros, mas o princípio de um limite dentro deste ATP é o mesmo. Existe uma métrica para cálculos que resolvam parcialmente ou totalmente uma questão de fluxo de gases (2000 por ATP). E uma métrica de tempo que também leva em consideração o que pode ser processado pelo computador. Só para se ter uma ideia do quão complicado é esse papo, esse tempo é obtido por essa fórmula: AUh = (NCU * NSS * CCF) / 3600.

Como funciona o limite de desenvolvimento aerodinâmico a partir de 2022?

O tal sistema de draft define que os limites em cada ATP serão diferentes de acordo com a posição da equipe no campeonato. Então, para calcular as horas de túnel funcionando (wind on), você usa aquelas 80h como padrão e adiciona ou subtrai as porcentagens referentes à posição. A variação é de 5% entre as equipes. 

Ou seja, a última colocada pode fazer 115% dessas 80h de wind on dentro de um ATP, ou seja, 92h. Na outra ponta, o limite da primeira colocada é de 56h.

Mas e se um time se recuperar ao longo da temporada? O sistema de certa forma prevê isso, sendo resetado a cada seis meses. A data para essa reorganização é 30 de junho. Ou seja, o resultado do campeonato anterior vale de janeiro a junho. E a classificação em 30 de junho define os limites entre julho e dezembro.

Quanta diferença isso faz no desenvolvimento aerodinâmico na prática?

Dá para entender por que os engenheiros diziam que não estavam preocupados no primeiro ano de implementação, em 2021. A diferença era de 2,5% entre os times. Mas eles já sabiam do potencial enorme que a regra tem para mexer seus pauzinhos no grid ao longo do tempo.

Isso porque, à medida que o tempo vai passando, a bagagem que você ganha só cresce. E as equipes têm de trabalhar de maneira muito mais eficiente, o que significa uma revisão de seus sistemas.

Mas o que é “muito mais tempo” de desenvolvimento? Temos um exemplo interessante porque coloca frente a frente equipes com o mesmo tipo de orçamento e qualidade de ferramentas de simulação. Mercedes e Ferrari.

Primeiro, vamos lembrar que o desenvolvimento aerodinâmico do carro de 2022 só começou em janeiro de 2021.

Nesta escala que define a alocação de desenvolvimento aerodinâmico, a Mercedes era primeira entre janeiro e junho de 2021, segunda de julho a dezembro, e voltou a ser primeira agora, pelo menos até junho de 2022. Então, a Mercedes teve 6 meses de 90%, 6 meses de 92.5% e agora 6 meses de 70%.

Por outro lado, a Ferrari era sexta de janeiro a junho de 2021, quarta de julho a dezembro de 2021 e foi terceira até junho de 2022. Então a Scuderia teve 6 meses de 102.5%, 6 meses de 97.5% e depois 6 meses de 80%.

Ou seja, por todos os 18 meses do desenvolvimento aerodinâmico do carro de 2022, a Ferrari teve cerca de 10% a mais de tempo que a Mercedes.

O que isso significa na prática?

De janeiro a junho de 2021 (Mercedes 1ª e Ferrari 6ª colocada)
MercedesFerrari
Tentativas (runs) no túnel de vento864984
Tempo de ‘wind on’216246
Tempo total de túnel de vento10801230
Cálculos de CFD54006150
De julho a dezembro de 2021 (Mercedes 2ª e Ferrari 4ª colocada)
MercedesFerrari
Tentativas (runs) no túnel de vento888936
Tempo de ‘wind on’222234
Tempo total de túnel de vento11101170
Cálculos de CFD55505850
De janeiro a junho de 2022 (Mercedes 1ª e Ferrari 3ª colocada)
MercedesFerrari
Tentativas (runs) no túnel de vento672768
Tempo de ‘wind on’168192
Tempo total de túnel de vento840960
Cálculos de CFD42004800

Não dá para cravar que a Mercedes caiu de produção porque teve muito menos capacidade de desenvolvimento aerodinâmico em função desta regra. Mas também não dá para ignorar o crescimento da Ferrari entre 2021 e 2022 ou como outras equipes que estavam na parte de baixo da tabela começaram 2022 em uma situação bem melhor (leia-se Haas ou Alfa Romeo).

No início de 2023, vimos outro grande exemplo na Aston Martin, que passou todos os primeiros dois anos e meio de uso dessa regra com 100% ou muito perto disso. Ou seja, eles tiveram muito mais tempo de desenvolvimento que os ponteiros por se manterem entre o sexto e sétimo lugares do mundial. Com o sucesso da primeira metade do campeonato, eles acabaram perdendo tempo de desenvolvimento aerodinâmico. Esse não foi o motivo para eles terem caído de produção, uma vez que as equipes trabalham com muita antecedência, mas é um fator para observarmos no futuro.

A McLaren foi outro caso de equipe que usou bem o tempo a mais que teve de desenvolvimento em relação aos ponteiros. E olha que estamos falando de duas equipes que, até meados de 2023, alugavam túneis de vento. Agora, tanto Aston Martin, quanto McLaren, usam seus próprios equipamentos, que são os mais atualizados de todo o grid.

Como funciona a punição de desenvolvimento aerodinâmico da Red Bull?

A parte mais importante da punição que a Red Bull levou por ultrapassar o teto orçamentário de 2021 não foi a multa de 7 milhões de dólares. Mas sim a diminuição de 10% de sua cota de desenvolvimento aerodinâmico, valendo por 12 meses, entre novembro de 2022 até o final de outubro de 2023.

Esse percentual é calculado em cima dos 70% que a equipe tem de respeitar por ser a primeira colocada em 31 de dezembro de 2022. Como eles seguiram em primeiro quando os números foram atualizados, passaram a temporada toda com o percentual é de 63% da base de cálculo de 320 ‘tentativas’ (runs), 80 horas wind on e 400 horas de ocupação no total no túnel de vento. E dos 2000 cálculos de CFD.

Como a Ferrari foi a segunda no campeonato de 2022 e a Mercedes foi a terceira, estes são os limites pelo menos até 30 de junho de 2023. Entre aspas, qual seria a alocação da Red Bull sem a punição pela quebra do teto a cada ATP:

Desenvolvimento aerodinâmico da Red Bull x rivais

Red BullFerrariMercedes
Tentativas (runs) no túnel de vento201 (224)240256
Tempo de ‘wind on’50 (56)6064
Tempo total de túnel de vento252 (280)300320
Cálculos de CFD1260 (1400)15001600

(Entre aspas, os números da alocação da Red Bull caso eles não tivessem sido punidos(

Por um lado, os rivais dizem que a punição foi branda. Dizem que se havia um ano em que faria muita diferença quebrar o teto, seria 2021. Isso porque era justamente quando se fazia toda a pesquisa e desenvolvimento de um carro totalmente novo para 2022. Por outro lado, a Red Bull reclama. Argumentando que a pena é dura a demais para quem passou do teto por menos de 2%.

Quando veremos o resultado dessa punição? Certamente isso não aconteceu em 2023, a julgar pela maneira como o carro é bem nascido. Mas ficou claro que eles tiveram que fazer escolhas, então a pena só não ajudou os rivais porque eles puderam dar-se o luxo de desenvolver muito pouco o RB19. Tanto pela vantagem que já tinham, como pela dificuldade dos rivais de progredir de forma consistente.

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