As Regras da Classificação na F1
A classificação é dividida em três partes, nas quais os tempos sempre começam zerados. No Q1, que dura 18 minutos, os cinco carros mais lentos são eliminados. No Q2, que dura 15 minutos, outros cinco ficam pelo caminho e o Q3 define as 10 primeiras posições, em sessão de 12 minutos.
A escolha de pneus durante a sessão é livre. E todos os pilotos que chegam no Q3 ganham um jogo de pneus extra só para fazer essa última sessão. Depois, têm que devolver esse jogo. Essa foi uma iniciativa para impedir que aqueles carros que já sabem que não vão conseguir nada além da nona ou décima posições deixem de ir à pista.
A partir do momento em que o carro sai do box para sua primeira volta na classificação, ele automaticamente entra em regime de parque fechado, e muito pouco pode ser feito para melhorar seu desempenho – são permitidas mudanças de pressão de pneu e ajustes de asa e há configurações de motor que o piloto pode alterar no próprio volante. E, em caso de quebra, pode-se fazer reparos. Isso é checado por um fiscal da FIA, que permanece o tempo todo dentro da garagem. No entanto, qualquer peça que seja trocada tem que ser da mesma especificação. Caso contrário, o piloto tem que largar dos boxes.
Existe um limite de 107%, ou seja, um piloto não é classificado se seu tempo for 7% pior que a melhor marca da sessão (Q1, no caso). Mas se a equipe comprovar com os tempos dos treinos livres, por exemplo, que ele poderia ter feito melhor, isso não é aplicado.
Os carros podem ser reabastecidos durante a classificação?
Sim, desde que o carro esteja dentro dos boxes. Não é permitido reabastecer o carro quando ele está no pitlane. É por isso que as equipes recolhem os carros entre uma tentativa e outra, e esse meio tempo em que há o reabastecimento e a troca de pneus dentro dos boxes é chamado de turnover.
Mas há um tipo de situação em que vale a pena sair com o carro mais pesado, com combustível para mais do que uma ou duas voltas rápidas: quando está chovendo ou muito perto de chover. Nesse contexto, o segredo é estar na pista no momento em que a condição estiver a melhor possível, e isso significa ficar na pista o maior tempo possível, então os pilotos dão uma sequência maior de voltas e precisam de combustível para isso.
Entenda a estratégia de pneus na classificação
Cada piloto recebe 13 jogos de pneus (dois duros, três médios e oito macios), mas tem de devolver dois jogos após cada sessão de treino livre e chega à classificação com sete jogos, sendo que todos os que forem ao Q3 recebem o jogo extra. Um jogo de pneus macios será devolvido após a definição do grid (no caso dos pilotos do top 10, dois jogos) e então os pilotos terão 6 jogos (usados ou novos) para a corrida.
O legal da classificação é que não há uma tática correta. Cada equipe define o que vai fazer sabendo qual seu objetivo: a equipe que sonha em passar do Q1 vai fazer o maior número de tentativas que puder e nem vai pensar em economizar pneu. E talvez a posição mais difícil seja daquele time que disputa as últimas posições no top 10. A diferença entre o quinto e o 15º muitas vezes é bem pequena, e se você tiver que fazer duas tentativas no Q1 e duas no Q2 para passar para o Q3, fatalmente não vai ter pneus macios novos para a corrida.
Um fator importante é o desgaste esperado para o pneu macio na corrida. Se for alto, os carros que disputam as primeiras colocações vão tentar evitá-lo, já que terão de largar com este composto. A não ser que eles passem ao Q3 com os médios, algo que só vai ser possível se a vantagem do carro for grande o suficiente para compensar a diferença do pneu, que pode chegar a 1s dependendo da pista. No entanto, o grid da F1 anda tão apertado que isso é extremamente raro ultimamente.
Mesmo nesse tipo de situação, em que equipes grandes passam para o Q3 fazendo seu melhor tempo no Q2 com o pneu médio ou macio usado, vemos os pilotos voltando à pista com os macios e chegando a abrir uma volta rápida, que é abortada e eles voltam aos boxes. Eles fazem isso para sentir se o carro está respondendo bem à pista mais emborrachada e para o piloto fazer os últimos ajustes de asa, pressão e das regulagens que ele pode fazer no volante (diferencial, equilíbrio de freio, etc). E há outra vantagem em fazer isso: o pneu passa por um ciclo de calor e, se for usado depois na corrida, isso ajuda a evitar superaquecimento.
Porém, em várias pistas, os pneus usados na corrida são os médios e duros. Com isso, os pilotos ficam mais liberados para gastar os macios na classificação. Só precisam cuidar para ter jogos novos no final.
Escolhendo o momento de ir para a pista
As equipes sempre vão preferir estar na pista nos últimos instantes, para pegá-la mais emborrachada. E, sim, vale a pena o risco de pegar trânsito – há toda uma equipe muito bem paga e preparada para evitar isso, que se afunila no engenheiro de pista, que vai guiar o piloto para que ele consiga evitar atrapalhar os demais e preparar bem sua volta rápida.
Não é incomum vermos os pilotos não conseguirem melhorar o tempo na sua última tentativa. Isso geralmente acontece quando o vento muda de direção ou aumenta em intensidade, ou até quando uma nuvem grande altera a temperatura da pista. São sempre detalhes impossíveis de prever.
Às vezes vemos pilotos que saem sozinhos, fora de sincronia com os demais, mas eles provavelmente estão em uma estratégia diferente (só têm um jogo de pneus para fazer uma tentativa no Q3, por exemplo).
Seguindo no exemplo do Q3, você fatalmente vai encontrar os rivais na pista porque são 12 minutos de sessão e você tem geralmente dois jogos de pneus, então fará duas voltas rápidas (é preciso dar uma volta de intervalo para recarregar as baterias e, se o piloto fizer uma rápida, uma lenta, uma rápida, vai precisar colocar mais combustível: na primeira volta, estará mais pesado, e na segunda, seus pneus estarão mais desgastados, então não vale a pena normalmente, a não ser num caso de baixíssima aderência). E também não há tempo para ‘’inventar moda’’: entre outlap, volta rápida, inlap, lá vão uns 5min30, e entre uma tentativa e outra você terá de entrar no box para reabastecer.
Na chuva, a situação muda de figura: os pneus duram por mais voltas, então os carros vão para a pista mais pesados e ficam rodando até o pneu perder rendimento, porque a chave é estar na pista no momento em que chove menos.
Outro fator que deve entrar nessa conta é a pesagem. Os carros são selecionados de forma aleatória, durante a sessão, para passarem pela balança da FIA, o que pode durar alguns minutos. Eles recebem a sinalização quando entram nos pits.
Como que cada equipe define a ordem de saída dos pilotos?
Cada time tem seu acordo quanto a isso. Na Mercedes, sabemos qual é: a cada GP um deles tem o direito de escolher sair antes ou depois. Sair antes dá mais chances de ter a pista limpa, ao sair depois você pode tentar pegar o vácuo e talvez pegar a pista melhor. É um sistema muito justo porque às vezes é mais vantagem ir depois, às vezes antes.
Falando em vácuo, são raras as vezes em que compensa o risco de ensaiar algo entre os pilotos. Isso porque o carro perde muita estabilidade nas curvas se estiver muito perto do outro, então é preciso que o que se ganha com o vácuo compense essa perda. Por isso é algo mais comum em Monza, onde há poucas curvas (principalmente de média/alta velocidade) e o carro anda com menos carga aerodinâmica.
Preparando bem a volta rápida
Isso é fundamental para uma boa classificação. O piloto tem de se certificar que suas baterias estão totalmente carregadas, a configuração certa de uso do ERS está sendo usada, os freios estão aquecidos e, principalmente, os pneus. Eles são o grande fator complicador porque cada carro trabalha os pneus de uma maneira diferente, e cada pista, também. Então às vezes é bom que os pneus não estejam tão quentes assim no começo da volta para que eles tenham a aderência perfeita no final – Abu Dhabi, que tem as curvas mais travadas no terceiro setor, é um caso clássico. Mas, em outras situações, vemos aquela travada logo na primeira curva porque os freios e pneus não estavam bem preparados (o que muitas vezes acontece porque o piloto pegou trânsito na outlap).
Classificação boa X ruim
Somando todas essas informações, dá para entender por que muitas vezes vemos o final de semana de companheiros de equipe começar a se desequilibrar ainda na classificação. Como é possível, se eles têm o mesmo carro?
Há muitas variáveis que podem interferir em tirar o máximo do que se tem em mãos. Se você pega trânsito na preparação ou uma bandeira amarela na primeira tentativa, vai ter que gastar dois jogos de pneus para passar para o Q2 (claro que pode tentar passar com o mesmo, mas isso só vai adicionar uma camada de pressão). Um bom exemplo é o de Sergio Perez em seus anos de Red Bull: ele raramente chegou ao Q3 tendo feito exatamente o mesmo número de voltas e adotando a mesma estratégia de Verstappen. Aí a diferença será inevitavelmente enorme e é algo que é carregada para a corrida, já que serão os mesmos jogos de pneus à disposição.
10 Comments
Se eu achava interessante até hoje sem saber metade destes detalhes, agora vale mais ver os treinos livres e a classificação que a prova em si … 🤦♂️… hahaha. Valeu… Grato… .
Luis Ventura +55 51 993.322.165 enviado por Samsung Galaxy NOTE9
Julianne,
Suas postagens são sensacionais.
A gente aprende muito com você, e fica muito mais interessante acompanhar as seções, seja treinos ou corrida.
Obrigado por mais essa aula.
Muito legal! Obrigado por explicar tão bem!
Minha dúvida é a seguinte: se os pilotos dão diversas voltas com qualquer jogo de pneus numa corrida, por que é que esses mesmos pneus, na classificação, só “funcionam” por uma volta?
Não é que eles funcionam só por uma volta. A cada volta que vc dá, ele vai se desgastando um pouco. Então para você tirar o máximo de rendimento possível, você precisa de pneu novo + pouco combustível + baterias regarregadas
Julianne, bom dia.
Tenho uma duvida sobre os treinos.
Eu sei que o último treino (classificatório), tem a finalidade de decidir as posições para a largada no domingo.
Desta forma, qual seria a finalidade dos treinos anteriores?
A posição interfere em algo?
Oi Talyson,
Os treinos livres servem para as equipes acertarem os carros para a classificação e a corrida, além de entender o comportamento dos pneus. Eles só acabam servindo para efeito de classificação se chove no classificatório e não é possível fazer esta sessão nem no sábado, nem no domingo antes da corrida. Mas isso é super raro de acontecer. Então o resultado dos treinos livres não conta muito, mas sim o que as equipes aprendem neles.
Obrigado pela explicação Julianne!
O que acontece com os pilotos que são eliminados do q1 e q2?
Olá,
Seu conteúdo é muito bom. Uma coisa que não fica muito clara para mim é onde a volta começa, porque por vezes fico muito atrapalhado, por parecer estar saindo da linha de largada, mas as vezes parece que eles escolhem uma curva