Final da volta 18 do GP de Singapura: Kevin Magnussen vai aos boxes e finalmente abre o espaço na pista para que os ponteiros parassem, algo que vinha sendo evitado ao máximo por Charles Leclerc, que usada o fato do circuito de rua só permitir ultrapassagens com grande diferença entre os carros para ditar um ritmo de tartaruga na primeira parte da prova.
Essa estratégia da Ferrari tem dois motivos: primeiro, eles sabem que parte de sua vantagem na classificação nas retas desaparece aos domingos, e têm lá suas dúvidas se têm ritmo para ganhar a corrida. Isso porque foi só no sábado que o time conseguiu tirar o melhor rendimento das peças que levou a Singapura, e não fez uma simulação de corrida significativa (o terceiro treino livre é quente demais para isso por lá, por ser realizado no fim da tarde) para entender qual é seu ritmo real. E eles também queriam levar o primeiro stint com os macios até o máximo que pudessem, temendo sofrer com desgaste no final.
Retornando à volta 18: a Ferrari sabe a parada de Magnussen dá espaço para os ponteiros fazerem sua troca de pneus e não voltarem no trânsito, e sabe que seus rivais vão reagir a isso. Decide chamar, na antepenúltima curva da 19ª volta, o seu segundo carro, de Vettel, o mais exposto a um possível undercut.
A Mercedes não vê a oportunidade – ou melhor, acredita que terá ritmo suficiente para o overcut, ou seja, ficar na pista por mais tempo que os rivais, e ignora a jogada. A Red Bull chama Verstappen na mesma volta de Vettel e, com essa manobra, tira a Mercedes do pódio pela primeira vez no ano.
Já a Ferrari chama Leclerc na volta seguinte e se surpreende quando vê o antes líder saindo atrás de Vettel. O que foi uma jogada de defesa acabou virando algo tão ofensivo que virou fogo amigo.
Surpreendi-me quando ouvi de Leclerc que ele não sabia da parada de Vettel ou que estaria disputando com ele na saída dos boxes. Fui perguntar a Binotto, que se surpreendeu pelo mesmo motivo (na verdade, disse que eles tinham avisado, e foi desmentido por Charles, que estava a seu lado). Não, a Ferrari não tentou inverter seus pilotos de propósito. Eles estavam tentando defender as posições dos dois, talvez duvidando do próprio ritmo, e não perceberam que algo muito diferente estava acontecendo em Singapura: Vettel estava a 3s5 de Leclerc quando parou e voltou 0s4 à frente. O undercut era muito mais poderoso do que se previa.
E não digo só da Ferrari. Se a Mercedes tivesse a mínima ideia disso, teria chamado Hamilton na volta 19. Mas a mensagem “faça o contrário do que o Leclerc fizer” veio no giro seguinte, ele seguiu na pista, e descobriu que não tinha mais o que tirar de seu jogo de pneus. Isso foi a diferença entre uma vitória (se ele parasse junto com Vettel, voltaria à frente das duas Ferrari) para um quarto lugar, então não é de se estranhar que o estrategista James Vowles estivesse se martirizando depois da corrida.
O erro tático da Mercedes acabou obrigando Bottas – que fora chamado aos boxes para cobrir Albon – a diminuir o ritmo para não superar o companheiro, algo que tem a ver com a regra interna da Mercedes de um piloto não poder fazer o undercut no outro. Mas também é justo dizer que, nesse ponto, eles já sabiam exatamente onde Hamilton voltaria, algo que, para a Ferrari, foi uma surpresa.
Mas por que parar uma volta antes do rival foi tão importante? Os pneus macios de Singapura eram o C5, os ultras do ano passado. E ano passado foi Hamilton quem segurou o ritmo no começo para evitar que se abrissem espaços para o undercut e foi ele mesmo quem parou primeiro. Mas isso foi na volta 12. O que Hamilton descobriu a ficar na pista em 2019 foi que, mesmo dosando o ritmo por 19 voltas, não sobrou nada do C5 para fazer o overcut funcionar.
Mas e Leclerc? A informação que faltou no domingo foi quando o monegasco foi avisado de que pararia no final da volta 20. Porque nada no ritmo dele indica que ele foi avisado até o fim da volta que o pitstop estava próximo, a não ser que os pneus deles também tivessem acabados.
Mas de onde veio esse ritmo da Ferrari e onde foi parar o da Red Bull que, em teoria, deveria ser quem desafiaria as Mercedes, sempre tão sensíveis às ondulações de Singapura? Começando pela segunda, foram as mesmas ondulações que pegaram eles desprevenidos. Aparentemente, o carro foi preparado baseado em um simulador que tinha dados imprecisos. E a Ferrari precisou de tempo para mudar totalmente o conceito da sua parte dianteira. As peças foram chegando aos poucos, desde o GP da França, e foi como se tudo tivesse se ajeitado da sexta para o sábado em Cingapura.
Isso, então, significa que Leclerc e Vettel estarão entre os protagonistas até o fim? As curvas de Singapura são de raio curto e mais lentas. Claro que é uma boa notícia para os italianos – e especialmente para Vettel – que o carro esteja mais estável e previsível, mas isso não quer dizer necessariamente que ele esteja mais rápido em uma pista como Suzuka, por exemplo. Este, sim, será um teste de fogo para a Ferrari.
11 Comments
Esta foi uma vitória da equipe, que conseguiu maximizar o resultado.
Mas se tivesse uma ordem para Vettel devolver a posição, será que ele acataria?
E porque deveria? Ele fez algo errado? Roubou a posição do monegasco?
Qual a diferença entre mandar quem está na frente ceder a posição na pista e impedir que este se defenda por meio da omissão de informações de pit stop que foi praticada ?
A Ferrari fez tudo certo, mas ao deixar Leclerc alheio a situação que o rodeava, possibilitou um cenário em que a inversão dos carros fosse mais provável.
Ju, é verdade que, nos treinos, o ritmo de corrida da Ferrari era um pouco mais lento do que o ritmo da Mercedes. Mas como podemos ter certeza de que não estavam rodando com uma carga de combustível maior ou um modo mais conservador do motor?
Jú, ao meu ver, a informação mais importante de toda a sua maravilhosa reportagem, está entre parênteses. Leclerc desmentir Biruto, na presença dele, que estava ao lado. A Ferrari virou casa da mãe Joana se um piloto que acaba de estrear pela equipe, se acha no direito de desmentir o chefe da equipe na cara dele e se o o chefe de equipe não souber gerenciar o ego de um piloto, tem tudo pra virar um grande desastre. O guri é bom piloto e ter alguma personalidade é muito importante nesse mundo da F1, até pra não virar um Massa/Berger/Rabiquello da vida. Mas acredito que o moleque está indo com muita cede ao pote, ter personalidade a ser um pedante é muito diferente.
A Ferrari tinha duas opções. Fazer 1-3 com Leclerc na frente. Ou arriscar e ter 1-2. Com Vettel à frente (mesmo não imaginando que ele superaria o Leclerc, mas sim Hamilton). A equipe alcançou o objetivo. Dobradinha. A Vitória de Vettel foi um acidente amigo se assim posso dizer.
O 1-2 era possível. Bastava Leclerc ser 1 segundo mais veloz na in-lap, o que não foi porque a equipe aparentemente não o solicitou a ser.
Mas se Leclerc aperta o ritmo e o Lewis para junto dele provavelmente Vettel ficaria em 3º
Ju , a ultrapassagem de Vettel em Gasly foi uma das mais estabanadas que já vi nesse esporte , assisto todas corridas desde 1986
Ju, com todo o respeito, mas o C5 é o antigo Hypersoft.
Ju, é verdade que, nos treinos, o ritmo de corrida da Ferrari era um pouco mais lento do que o ritmo da Mercedes. Mas como podemos ter certeza de que não estavam rodando com uma carga de combustível maior ou um modo mais conservador do motor?