E pensar que eu tinha preparado para esta semana, que seria a do GP do Brasil, um post com 10 coisas (acho que deu mais, inclusive) que os gringos não entendem sobre o nosso país, incluindo perguntas pertinentes sobre restaurantes por quilo e onde o papel higiênico vai parar. Mas fica para outra oportunidade!
Ao invés de São Paulo, a F1 vai para Istambul, uma cidade com uma história e cultura completamente diferentes, mas cujo povo guarda muitas semelhanças com os brasileiros. Ou pelo menos foi minha impressão na única vez por que passei por lá, já há 7 anos. Uma conexão é até óbvia: o futebol, uma grande paixão dos turcos. Brasil é sinônimo de Alex por lá.
Mas também há muita coisa diferente:
Istambul é uma das maiores cidades do mundo, e é bem provável que vocês vejam alguém da F1 citando o trânsito neste fim de semana, já que não há muitas opções de hotéis perto do circuito e é preciso encarar a movimentação da cidade com o 15º pior trânsito do mundo. E esse movimento todo não é de hoje: Istambul era a cidade mais populosa do mundo quando os portugueses chegaram no Brasil, título que só lhe foi tirado, por Londres, em 1840.
A Hagia Sophia foi a maior igreja do mundo por cerca de 900 anos, até a construção da Catedral de Sevilha em 1520. Nesta época, inclusive, logo depois da queda de Constantinopla, o local já tinha sido transformado em uma mesquita (e hoje é um museu). São edificações como esta que mostram como Istambul foi uma cidade extremamente importante na história da humanidade, sendo capital de três grandes impérios (a capital leste do Império Romano, quando se chamava Constantinopla, do Império Bizantino e do Otomano). Área importante de comércio devido ao Bósforo, é habitada há 8 mil anos.
Aliás, falando em Império Otomano, os séculos de presença dos turcos em boa parte do leste europeu ainda são claramente visíveis quando se viaja principalmente nos países da ex-Iugoslávia. Essa foto aí é de Sarajevo, na Bósnia. Lembro de dar risada sozinha quando o ônibus em que eu estava, vindo de Belgrado, passou pelo centro de Sarajevo e eu pensei, de brincadeira, “devo ter dormido bastante para ter chegado em Istambul”. A presença otomana é garantia de bom café, se você é dos fortes.
Mas nem sempre beber café foi uma boa ideia na época do Império Otomano. No século XVII, o sultão Murad IV, considerava que o café era uma droga estimulante e provocava comportamentos indecentes, e portanto seu consumo deveria ser punido com pena de morte. Ele, inclusive, se disfarçava e andava pelas ruas procurando pessoas que estivessem tomando café para cortar suas cabeças. Isso acabou no final do mesmo século.
Antes disso, durante a Idade Média, enquanto a Europa era sinônimo de atraso, o Império Otomano avançava em diversas áreas. Muitos dos cálculos que levaram Copérnico à teoria do heliocentrismo na verdade vieram dos cientistas otomanos. Outro dado interessante é que, na Istambul da Idade Média, havia mais de 1400 banheiros públicos, algo inexistente na Europa na época.
A Turquia é um destino turístico para quem gosta de praia. A chamada Riviera Turca fica perto de Antalya e tem longas praias de areia (o que não é tão comum como os brasileiros esperariam na Europa). E a água vai ficando num tom mais turquesa mais para o leste, para Kaş e mais ainda para Bodrum. Até porque, chegando lá, as primeiras ilhas da Grécia estão logo ali.
E quem estava na praia perto das ilhas gregas especialmente em 2016 muito provavelmente se surpreendeu com os botes e cheios de refugiados que vinham principalmente da Síria e buscavam cruzar o mar para chegar na Grécia e, dali, procurar recomeçar a vida em algum país da Europa. A guerra da Síria já tinha começado fazia tempo, mas foi em 2016 que a situação se complicou a ponto de quase 5 milhões de pessoas terem decidido sair do país. Muito se falou do fluxo migratório para a Europa, mas foi a vizinha Turquia que absorveu, e ainda absorve, a grande maioria dos refugiados (não apenas da Síria, mas de outras regiões de conflito na Ásia). Hoje, calcula-se que a Turquia tenha mais de 3.5 milhões de refugiados. O país tem 85 milhões de pessoas.
A Turquia também é um dos maiores destinos do mundo para turismo médico. Isso mesmo. O sistema médico em alguns países, especialmente nos Estados Unidos, é tão caro que vale a pena ir para a Turquia fazer determinados tratamentos. Mas não são só americanos: quase 1 milhão de pessoas de mais de 100 países diferentes procuraram os médicos turcos ano passado, e o número tem crescido junto com o investimento nesta área.
Atire a primeira pedra que não chamou árabe de turco e turco de árabe. São povos diferentes, ainda que hoje dividam, em sua maioria, a mesma religião, o islã. Os turcos são originários da região das montanhas Altai, onde Mongólia, Cazaquistão, China e Rússia se encontram. O povo que acabou sendo forçado para o oeste pelo reino mongol, que foi um dos maiores do mundo, e acabou ficando na região onde hoje é a Turquia (e também tendo um dos maiores impérios do mundo).
Até por isso, o turco é uma língua que guarda similaridades com o mongol, embora a escrita árabe tenha sido adotada por séculos. O Alcorão perde muito de seu sentido quando traduzido, então o melhor para estudar o livro sagrado do Islã é aprender a caligrafia árabe. Mas, depois do fim do Império Otomano com a Primeira Guerra Mundial, foi iniciada uma reforma com a latinização do alfabeto turco, para conectar o país com a Europa. Mas ainda assim as diferenças chamam a atenção, como as letras Ğ, Ü, Ö, Ş, I (existe um i com ponto e outro sem).
1 Comment
Mais uma lição de história. Excelente.
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