Com os conflitos entre protestantes e forças militares no Bahrein se intensificando, há uma grande possibilidade de que o último teste de pré-temporada, que seria realizado no país entre os dias 3 e 6 de março, e a prova de abertura do mundial, na semana seguinte, sejam cancelados. A GP2 Asia, marcada para este final de semana, já foi, por falta de médicos.
Um boa medida do quanto a situação é séria é a declaração de hoje de Bernie Ecclestone, que prometeu anunciar uma decisão entre terça e quarta da semana que vem. Logo ele, sempre o último a afastar qualquer chance de prejuízo, não se arrisca a dizer se a corrida será realizada ou não – claro que não consegue evitar as brincadeiras de sempre e abriu a possibilidade de fazer a corrida após o GP do Brasil, em dezembro, “uma corrida natalina”. Essa demora para um posicionamento da FIA e da FOM é praticamente uma carta branca para que o governo do Bahrein faça ‘o que for necessário’ para calar a população e evitar que o reino perca dinheiro com o cancelamento da prova – estamos falando de algo em torno de 60 milhões de euros. E isso não cheira nada bem.
Seria possível desviar os testes para a vizinha Abu Dhabi, mas dificilmente um outro GP ocuparia o lugar do Bahrein, já que parte dos equipamentos das equipes já foi enviado ao país. Seria o caso, portanto, de iniciar a temporada em Melbourne e, provavelmente, guardar o projeto do campeonato mais longo da história para depois.
Não seria a primeira vez que um GP é cancelado por problemas políticos. Isso já aconteceu durante a ditadura argentina, nos anos 1970. O passado ainda guarda algumas histórias inacreditáveis de momentos em que a política invadiu o automobilismo, como o sequestro de Juan Manuel Fangio quando este foi a Cuba para o GP de Havana. Mas nada pode ser comparado às proporções que o esporte tomou nas últimas décadas.
Correr em países de regimes autoritários também não é novidade para uma categoria que esteve na África do Sul do Apartheid (dos anos 60 aos 80), no Brasil da Ditadura Militar (anos 70 e 80), na Argentina da Guerra Suja (de 1976 até 1981), na Espanha de Franco (começo dos anos 50, e depois entre fins dos 60 até os 70), em Portugal do Salazar (fim dos anos 50), e na Hungria socialista (final dos anos 80). Hoje, além do Bahrein, Emirados Árabes Unidos, China, Malásia e Cingapura também podem entrar na lista, ao menos, das semi-democracias que gastam montanhas de dinheiro com a F1.
Curiosamente, é a segunda vez que se fala em cancelamento em bem pouco tempo. Em outubro de 2010, era a Coreia que perigava não aprontar a pista a tempo de fazer sua estreia na categoria. A lentidão das licitações governamentais e as chuvas foram as vilãs dos coreanos, que chamaram até o exércio para aprontar o básico e realizar a prova. Em 2009, foi o GP da Espanha que esteve ameaçado, contudo mais por histeria devido à gripe H1N1 que qualquer fato mais concreto.
A questão é que a expansão comercial promovida por Ecclestone não enxerga muito mais que dinheiro. Não importa de onde ele vem, se o negócio se sustenta. O que interessa é explorar mercados e cobrar uma taxa inacreditavelmente alta por isso – acredita-se que cada GP seja negociado por um preço, enquanto o Canadá pagaria RS 25 milhões por prova, a conta da Turquia chegaria a R$ 58 milhões. Não coincidentemente, os eventos de Valência e da Austrália enfrentam oposição popular, de gente que vê muito dinheiro sendo investido em algo cujo retorno não é tão claro. Se a família real sair enfraquecida dos confrontos no Bahrein, é outra mina de ouro que tende a esvaziar.
2 Comments
Semi-democracias é um eufemismo interessante… Pegou leve com esses países, hein Julianne. Bom, brincadeiras à parte, parece que a coisa lá está bem séria mesmo:
http://blog-do-ico.blogspot.com/2011/02/sem-condicoes.html
Não li ainda a entrevista do Razi lá no blog do Ico, mas o que ele postou indica que o risco de não haver o GP de F1 é real.
Abraços a todos.
A sua foto resume mt bem o sentimento! Interessante o final do seu post, sobre a oposição quanto ao custo/benefício das corridas. Tanto se tem falado em corte de custos, mas ao que parece, fora das pistas a grana tá rolando solta, e alguém (s) deve estar nadando de braçada. O Exercício de adivinhação fica forte, no momento em que se imagina o quanto poderia ser salutar para a categoria, a instituição do teto orçamentário, para as contas, tanto dentro, quanto fora das pistas, criando uma deflação em castata, que diga-se de passagem, seria bom para todo mundo.