A maneira como a F-1 é organizada é cheia de contrapontos. Vivemos um momento em que não se sabe muito bem o limite entre talento e dinheiro – e mesmo se há um limite. Existe, ainda, aquela velha confusão entre os interesses de uma equipe no Mundial de Construtores e os de cada um de seus pilotos, que lutam juntos, ainda que um contra o outro, por seu próprio campeonato – e as intrigas geradas por esse conflito resultaram em algumas das passagens mais memoráveis da história da categoria.
E há também outro fator que deixa os mais pragmáticos com a pulga atrás da orelha: o que diferencia a F-1 das demais categorias do automobilismo é a necessidade de cada equipe ser também um construtor. Então por que esses projetos são tão cerceados?
Há quem diga que, se todos os carros fossem pintados de branco, ninguém saberia identificá-los. É claro que os fanáticos percebem diferenças marcantes, mas é fato que elas não são visíveis a espectadores de ocasião, resultado direto de um regulamento técnico altamente restritivo.
Certamente, se a F-1 fosse respeitar seus princípios adotaria limitações básicas de altura, largura e comprimento e liberaria os engenheiros, mas isso não acontece devido a dois problemas básicos: segurança e dinheiro. Para assegurar sua sobrevivência, a categoria tem de deixar seus princípios em segundo plano: só vai usar tecnologia de ponta se ela não deixar os carros rápidos demais e se ela não for cara demais.
É assim, também, que a F-1 garante sua competitividade. Como os mecanismos de controle de gastos têm falhado, até porque em um mundo capitalista os que ganham sempre irão atrair mais patrocinadores, terão mais gasto com profissionais gabaritados, poderão desenvolver infraestrutura melhor e ganharão mais ainda, restringir o regulamento tornou-se uma maneira mais fácil para assegurar-se de que equipes como Ferrari e Red Bull, com orçamentos quase infinitos, que oficialmente chegam nos 550 milhões de reais – extra oficialmente, talvez mais – estejam na mesma categoria de uma HRT da vida e suas mágicas por menos de 100 milhões.
Tendo isso em vista, apenas um regulamento restritivo pode garantir com que essa mesma HRT se classifique em um circuito longo, como o de Cingapura, por exemplo, a apenas 6s da Red Bull. Se a natureza capitalista prevalecesse sem limites, certamente a categoria não duraria por muito tempo. Pode-se falar em criatividade dos engenheiros, mas os melhores estão nas grandes, assim como as ferramentas mais adequadas para simulação e fabricação das peças. Ou seja, quanto mais livre o regulamento, maior a tendência deles se sobressaírem.
É por isso também que os regulamentos são constantemente ajustados quando algum time consegue uma supremacia que coloca em xeque a competição. Ainda que a F-1 se venda como grande precursora de tecnologia de ponta, isso é sempre colocado em segundo plano em favor do show.
E, por que não, dá para pensar que toda essa censura aos engenheiros existe também para provocar aquela polêmica técnica que é a cara da F-1. Afinal, uma temporada sem uma briguinha política, uma inovação que desafia o regulamento e uma desavença entre companheiros de equipe não é uma temporada que se preze.
16 Comments
Aquele Brabham-Ventilador – em sua vida efêmera – era um terror para quem vinha atrás: muitos diziam que ele extraía não apenas o ar sob o assoalho, mas também os detritos da pista, arremessando-os nos outros carros.
E o Ecclestone jurava na época que aquilo só servia para refrigeração, assim como a tal letterbox do RB8. Sei…
Há uma química complicada que dá certo por traz disso tudo. Ela evita vermos Ferraris no Lugar de HRT’s e consegue equilibrar muita coisa que outras categorias não conseguem. Dizem que se não fosse a grande mudança no regulamento em 2009, o carros pareceriam carros alegorias de carnaval exaltando apêndices no mínimo esdrúxulos, como as “orelhas de dumbo” do Honda 2008, e lançando outras “modas” assim como as “barbatanas de tubarão”.
Enfim, concordo com o que Montezemulo (em clara desvantagem em relação às rivais) reclamando de que a F1 hoje esta muito mais aerodinâmica do que mecânica. Esqueci o que de fato ele disse, mas ele fez até uma comparação.
Apesar disso, vem aí os motores V6, (gostaria que vc pudesse falar , algum dia, Ju). E muita coisa vai mudar – pelo menos o som do pobre motor deverá ser pior do que já é. A resposta está com a FIA. E olha que já tem muita coisa rolando nos bastidores.
Ab e saudade do V10.
É curioso que limitar a aerodinâmica está se mostrando mais trabalhoso do que todas as demais áreas do carro, ainda que se livrar daquelas aletas todas não tenha sido nada mal. Aliás, essas mudanças de regras também são uma maneira de nivelar, pois dão a chance de quem não está no topo dar o pulo do gato.
Falarei sobre o regulamento de 2014 quando for mais claro tudo o que a mudança dos motores vai representar, está prometido. Também não esqueci de quem me pediu para falar dos novos Pirelli: farei isso quando tiver mais dados sobre as simulações de corrida das equipes, que ainda estão engatinhando.
Acho que as maiores “bestas” são os carros até a primeira grande mudança para domá-los, em 2005. Era uma loucura vê-los em Mônaco, por exemplo. Mas era uma realidade totalmente diferente do ponto de vista econômico, com Ferrari, Mercedes, BMW, Renault, Jaguar, Toyota e Honda envolvidos (7 das 10 equipes tinham parcerias ou eram propriedade de montadoras). Mas fica a lembrança: http://www.youtube.com/watch?v=EC8sz-eNmrY
É, caríssima. O carro era ultra-nervoso mesmo e o som do BMW V10 era a música da F1.
Até o Cosworth era legal – A1 RING: http://www.youtube.com/watch?v=Vy-WBZTXDDE
Mas um exemplo do que vc disse, Julianne, dá pra entender o que os engenheiros da F1 são capazes. Jarno Trulli com a “besta” e tudo o mais, fez a pole em 2004 com 1.13.985. Sebastien Vettel fez a pole de 2011 no mesmo traçado monegasco com incríveis 1.13.556!
Pois é … Obrigado pela atenção e esperando pelos posts. Colecionando horrores de uns anos pra cá, tenho até medo como serão os carros de 2014!
Se vermos todos os recordes, os de 2004 permanecem em 10 circuitos de hoje – e olha que tivemos algumas novidades, como Valência, Abu Dhabi, novo Silverstone, Índia, Coreia, Cingapura, etc. É uma era da qual essa futura geração de V6 se distancia cada vez mais.
Perfeito a sua opinião Julianne, é por ai, muito difícil equilibrar as coisas no mundo automotivo, no mundo esportivo é igual, exceto, talvez, nos esportes individuais e olha lá.
No mais, você é linda, uma das mulheres mais lindas que já vi, parabéns.
julianne, que dizer do “w duto”? um posto para isso?
abraço.
Thiago, recomendo assistir a esse vídeo sensacional (apesar das musiquinhas!) que explica muito bem esse complexo sistema. Se ficar alguma dúvida, me diga. A questão desse tudo é que a complexidade dele acaba não valendo muito a pena, pois calcula-se que o ganho seja de 0s1.
http://www.youtube.com/watch?feature=player_embedded&v=GJ9cFis55xM
Sensacional o vídeo!!!!!!!!
Julianne:
Vejo muita gente dizendo que equipes que dispõem apenas de pilotos novatos tem ou terão mais dificuldade em desenvolver seus carros – casos de Williams, Force India, como exemplos. Na minha opinião, considerando que a F 1 de hoje tem tanta telemetria, eletrônica e informática, essa premissa não se sustenta. Acho que os engenheiros e projetistas hoje são mais preponderantes que os pilotos na questão do desenvolvimento, haja vista que o grandíssimo Alonso não fez grandes coisas na Ferrari até agora – ressalvando, é claro, suas brilhantes atuações ao volante nas corridas – e muito menos na Renault, quando retornou da McLaren. Hoje mesmo Maldonado – apedrejado injustamente por muitos – fez valer seu talento, logrando o melhor tempo dos testes em Barcelona até agora, e o carro que a Williams está apresentando para 2012 não parece ser bom. Ontem, Hulkenberg mandou ver. Acho que atualmente os pilotos são mais importantes para obterem resultados nos treinos classificatórios e nas corridas. Só para respaldar minha opinião, cito que o Diretor Técnico da Lotus disse que eles já haviam mandado os dados de TELEMETRIA para a fábrica e que JÁ SABIAM quais as áreas que necessitam de trabalho adicional para corrigir os defeitos que retiraram prematuramente a equipe dos testes em Barcelona. Acho que os pilotos eram importantíssimos no acerto dos carros nos primórdios da F 1 até mais ou menos a era de Piquet e Prost.
Você que acompanha de perto a categoria, o que acha disso? Gostaria de ver a sua competente opinião sobre este assunto num post, quando puder. Muito grato, desde já.
Em nossas matérias prévias da temporada, vamos publicar uma entrevista muito bacana que o Ico fez com Ricardo Penteado, engenheiro brasileiro que trabalha na parte de motores da Renault. Ele vai falar sobre a questão da simulação e passa informações impressionantes – posso adiantar que a realidade é bem próxima dessa sua opinião!
Ju, sobre as limitações regulamentares necessárias, vc não acha que as limitações excessivas em relação ao design dos carros, crie cópias quase que idênticas, tornando as idéias das grandes equipes predominantes, e assim, contribuindo ainda mais para o aumento das diferenças entre pequenas e grandes? Não digo em gastos livres, mas a liberdade de construção respeitando critérios mínimos de segurança, evitando muitas entrelinhas, não poderia ser mais benéfico para as pequenas e a disputa em si? O que vc acha?
Acredito que uma grande ideia venha de grandes cabeças + grande estrutura para colocá-la em prática, e quem tem isso? Não acho que as ideias das grandes equipes sejam mais copiadas pelo limite do regulamento, mas mais por uma espécie de seleção natural.
Pra mim as maiores invenções da f1 são as feitas com pouco dinheiro e muita criatividade, como o efeito solo da antiga lotus, os difusores duplos da brawn, (esses proibidos nos dias de hoje) ou voltando muito no tempo quando começaram a usar as chamadas asas invertidas, coisas que não precisaram rios de dinheiro mas sim muita visão e ousadia.
E e dinheiro ainda é o principal ingrediente para fazer uma equipe vencedora, um exemplo é a formula indy, onde até os carros são feitos na mesma fabrica, mas quem tem mais dinheiro tem sempre os melhores profissionais e sempre terão uma certa vantagem…
Mas meu sonho é um dia ser engenheiro de uma equipe de formula 1, ter muita tecnologia a disposição como os tuneis de vento e quebrar a cabeça para desenvolver um carro seria incrivel… se mexendo em um kart eu ja me empolgo hahhahaaha…
A memória geralmente nos trai quando falamos daquela Brawn, que foi desenvolvida sob um altíssimo custo, com dois túneis de vento trabalhando simultaneamente e um ano inteiro de esforço concentrado por parte da Honda. E o efeito do dinheiro se viu claramente durante a temporada, já sem o apoio da montadora: mesmo um carro extremamente dominante, por não manter a velocidade de desenvolvimento das equipes com mais orçamento, foi superado após a metade do do ano.