F1 Estratégia do GP de Mônaco: corrida de xadrez - Julianne Cerasoli Skip to content

Estratégia do GP de Mônaco: corrida de xadrez

Mônaco é Mônaco, para o bem e para o mal. E ficou provado no domingo que nem mesmo o que alguns chamam de roleta russa pode mudar isso. A necessidade de poupar pneus para parar apenas uma vez fez com que tivéssemos um ritmo ‘com o freio de mão puxado’. Nesse cenário de marasmo nas disputas de pista, a estratégia teve um papel importante na corrida de Sebastian Vettel e poderia ter levado Fernando Alonso à vitória.

Com a pouca experiência com tanques cheios devido ao mau tempo da quinta-feira, a maioria foi para a prova pensando em duas paradas, mas dois fatores desencorajaram todos e mudaram a cara da corrida: primeiro, como o pelotão ficou muito junto o tempo todo, era difícil encontrar o espaço necessário para voltar com pista livre após a parada e se beneficiar do pneu novo; segundo, a ameaça de chuva obrigou todos a esperar.

Em um dia de surpresas com os pneus, a durabilidade foi maior que o esperado e a dificuldade em aquecer os macios logo de cara fez com que parar antes se tornasse uma desvantagem, ao contrário do padrão dos Pirelli. Foi assim que a Red Bull lucrou com Vettel e a Ferrari, sendo conservadora e adotando a cartilha padrão destes pneus, perdeu a chance de vencer.

Outra lição importante foi decorrente de alguns dos stints mais longos do ano, que mostraram tendências relacionadas à temperatura. Olhando o primeiro stint, a pista começou a esfriar – algo em torno de 3 ou 4ºC – entre as voltas 15 e 20. O primeiro efeito perceptível é a queda dramática da Lotus de Raikkonen, que até então seguia Vettel de perto – em seis voltas, a diferença pulou de 1s3 para 5s. Quase paralelamente, as Ferrari se tornaram os carros mais rápidos da pista e Alonso, que estava a 4s4 de Hamilton, chegou a ficar a 0s1 do inglês.

É justamente essa variação de performances em função da temperatura ambiente a razão da imprevisibilidade do campeonato. O melhor carro nesse ano é aquele que funciona bem na maior gama de cenários, e não necessariamente o mais rápido em uma ou outra condição.

A estratégia de Vettel não era a melhor logo de cara, mas a corrida acabou se moldando para isso. Primeiro, as três posições ganhas na largada – e, antes que alguém aponte o atalho utilizado pelo alemão como motivo, ele estava à frente de Raikkonen mesmo antes da Sainte Dévote. Não ficar preso pelo finlandês marcou o início da virada para quem havia sofrido com os supermacios na classificação.

Em segundo lugar, o ritmo lento dos primeiros colocados, poupando seus pneus para economizar no número de paradas fez com que se mantivesse próximo mesmo com o composto teoricamente mais lento. Além disso, há dúvidas se Webber não teria segurado o pelotão para que o bicampeão voltasse de sua única parada o mais adiante possível. Verdade ou não, o fato é que as cerca de 15 voltas que deu a mais no primeiro stint lhe fizeram ganhar duas posições.

Tática semelhante poderia ter dado a vitória a Alonso. O espanhol foi o que mais poupou pneu na primeira fase da prova, evitando o ar turbulento de Hamilton. No final do stint, se aproximou e, quando o inglês fez sua parada, marcou os dois primeiros melhores setores da corrida, e por boa margem. Para se ter uma ideia, a inlap do bicampeão foi mais de 3s melhor que a de Hamilton. Naquele momento, Rosberg e Webber já tinham parado e voltado marcando tempos altos, indicando a dificuldade de aquecimento que acabou sendo sentida para todos. Era aí que a Ferrari poderia ter reagido e mantido o asturiano por duas ou três voltas a mais na pista, que seriam suficientes para que voltasse à frente de Webber. Certamente, porém, esse cenário ficou mais claro após a prova e contradiz as lições aprendidas até agora com os Pirelli.

Foi o mesmo que Bruno Senna afirmou ter sentido quando lhe chamaram para seu único pit: ainda havia vida no supermacio. Naquele momento, o brasileiro lutava com Hulkenberg, que terminou em oitavo. Provavelmente, com uma ou duas voltas a mais na pista, voltaria à frente do alemão. Hulk, contudo, foi um dos poucos que conseguiu passar Raikkonen na pista, manobra fundamental para que entrasse na zona de pontuação.

Massa, por outro lado, queria ter parado uma volta antes. Afinal, os dois segundos de desvantagem em relação à inlap de Alonso mostram que o brasileiro desgastou mais os pneus no primeiro stint e não conseguiria desfrutar de qualquer vantagem em permanecer mais tempo na pista. Mas seria, de qualquer maneira, uma decisão improvável: o normal é o piloto que vai à frente ter prioridade e foi Alonso quem fez a parada na volta em que Felipe queria parar.

O GP cozinhado ao banho Maria fica marcado pela melhor volta da prova, de Sergio Perez, 1s5 mais rápida que o melhor do vencedor Webber. Frustração para quem não vê a hora de sentar a bota; arte para quem sabe jogar xadrez dentro de um F-1.

11 Comments

  1. Meu Deus! Jamais imaginei que o automobilismo fosse depender tanto de estrategistas a ponto de virar um jogo de xadrez. Foi o estrategista do Alonso que conseguiu descolar a “ultrapassagem” dele sobre Hamilton. Justiça se faça, Alonso bem que tentou na pista, logo no início, ultrapassar Hamilton, forçando uma cunha em cima da McLaren para que Lewis não tivesse espaço, mas Hamilton é Hamilton e, qual um peixe ensaboado, conseguiu neutralizar Alonso por duas vezes e se manter na frente. Os mais atentos devem ter percebido essas duas sutis tentativas. Um duelo apenas esboçado entre dois monstros da Fórmula 1 de hoje. Estava até com vontade de fazer essa comparação da F 1 com o “movimentadíssimo e rapidíssimo” jogo de xadrez, mas você se antecipou ao meu post (sem qualquer intenção de menosprezá-lo ou aos seus aficionados que certamente também experimentam grandes emoções com ele, mas uma coisa é uma coisa e outra coisa é outra coisa, rsrsrs). . . No entanto, você tem inteira razão, a F 1 e o jogo de xadrez – quem diria – tem muito em comum hoje.

    Alonso tentando ser agressivo além do seu normal, Hamilton sendo elogiado por muita gente por sua “moderação”, Rosberg brilhando lá na frente, é, Julianne, o apocalipse está próximo, rsrsrs. . .

    Quem será que vai usar a Abertura Ruy Lopez no Canadá? E a Defesa Alekhine? Quem seria o Capablanca sobre rodas e Bobby Fischer ao volante? Aguardemos o final desta temporada. Aliás, quem repetir a vitória tem tudo para ser campeão por antecipação. . .
    Por outro lado, nunca a poupança rendeu tanto como ultimamente. . .

  2. Ju, vendo seu post, realmente a quinta feira fez muita falta na análise do fim de semana para os pilotos/ equipes. Tendo em vista a corrida de Barcelona, vc acredita que a Ferrari evoluiu, e a Mclaren estacionou? Acredito que a rapidez em pole da Mclaren é louvável, mas o efeito colateral do desgaste/rítimo de corrida ruim, parecem insolúveis no momento.

    • A Ferrari vem numa evolução lenta e constante. Em Mônaco, melhoraram a tração em saída de curva e agora vão comprovar no Canadá se conseguiram evoluir em relação à velocidade de reta. Já a McLaren parece sofrer com as variações no equilíbrio do carro quando a temperatura se altera. Além disso os erros de execução continuam.

  3. Mas olha só, aucam e resto do pessoal, até pouco tempo atrás (no mínimo até a época dos motores turbo, e desde os anos ´50) a F1 era muito um esporte de estratégia sim, devido à pouca confiabilidade e durabilidade do equipamento, comportamento dos pneus (como hoje, aliás), resitência física dos pilotos, etc.

    A diferença é que antigamente era tudo mais simples, com muito menos variáveis.

    motor quebrou/câmbio quebrou/vazou óleo/sistema hidráulico/pane elétrica/pneu estourou/pneu desgastou/o carro X se adapta melhor à pista Y… mais ou menos era isso que acontecia, e não muito mais do que isso.

    os pilotos tinham que lidar com isso tudo, dosar velocidade com equipamento poupado, etc etc etc.

    pra mim, acho muito legal que hoje voltamos à essa coisa de muitos aspectos para se observar. e sendo mais complicado, até melhor, é ginástica pros neurônios… hehehe

    convenhamos, essa coisa de “bridgestone com janela grande de performance, então só se passa nas paradas de box + só ganha carros das equipes X e Y” era um puta saco!

  4. Daí a entender que a Lotus, aparentemente dona do carro mais rápido do grid, e que tem o piloto mais rápido do grid, não é necessariamente a melhor equipe, pois não funciona bem em todas as condições.

    Pronto, aprendi a lição. Ou não?!

    • Perfeito, mas lembre-se que 0,5% a mais na umidade relativa do ar pode mudar tudo de novo… rsrs

  5. Desisto. Aliás, acho que sei porque de vez em quando meu piloto desiste. hahahaha

  6. Eh impressionante como o Alonso sabe trabalhar bem e que pena que a Ferrari foi tao conservadora com ele.

    Torco para o Espanhol ganahr o campeonato e quem sabe ateh o dos construtores se o Massa revive dos mortos.

  7. Excelente análise.
    obrigado

  8. “Em um dia de surpresas com os pneus, a durabilidade foi maior que o esperado e a dificuldade em aquecer os macios logo de cara fez com que parar antes se tornasse uma desvantagem, ao contrário do padrão dos Pirelli. Foi assim que a Red Bull lucrou com Vettel e a Ferrari, sendo conservadora e adotando a cartilha padrão destes pneus, perdeu a chance de vencer.”

    Mas a Red Bull do Vettel só parou depois por que estava de pneus duros, ao contrário do Alonso. Não é isso?

    • Isso está mais destrinchado no texto, mas vamos lá:
      – Sim, a estratégia de Vettel era parar depois e por isso largou com duros, mas as duas posições que ele ganhou com isso foram diretamente ligadas ao fato de que seus rivais, quando colocaram o mesmo pneu, andaram mais lentos que ele, mesmo tendo pneus novos. Isso ocorreu pela dificuldade de aquecimento, que não estava prevista.
      – Alonso estava com os supermacios, mas foi o que mais preservou a borracha no primeiro stint. Se a Ferrari tivesse visto o problema dos rivais em aquecer os macios (Webber, Rosberg e Hamilton já haviam parado nesse momento) e notado que o ritmo de seu piloto com pneus usados era mais rápido que dos demais, poderia deixá-lo na pista e ganhar posições com isso, da mesma forma que fez Vettel.
      Espero que tenha ficado mais claro.


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