Abrindo um breve parênteses em comentários sobre a pré-temporada e o que nos aguarda em 2012. Dia desses acabei cruzando com este vídeo, em que Fernando Alonso explica os momentos cruciais que lhe deram a vitória em Monza, em 2010. Para alguns, uma corrida decidida no pit stop não tem graça, mas quem acompanha o blog já deve ter percebido meu fascínio por tudo o que envolve uma estratégia perfeita. Afinal, dizer que o que o espanhol descreve no vídeo é uma ultrapassagem de box é simplificar um complicado trabalho de grupo.
Primeiro, é preciso dosar os pneus de forma que seja possível acompanhar o ritmo do piloto que vai à frente, mas guardando um pouco de rendimento que vai ajudar na volta anterior à parada (inlap). Afinal, apenas contando com um erro é possível voltar do pit à frente com mais de 1s, 1s5 de desvantagem – e esse é o primeiro motivo pelo qual isso não é simplesmente uma ultrapassagem de box, e sim uma espécie de xeque-mate preparado com antecedência.
O adversário para e a equipe decide fazer mais uma volta. É geralmente o melhor a fazer – e lembre-se que nesta corrida ainda eram utilizados os Bridgestone, com os quais ficar na pista era mais vantajoso; hoje, se para antes para ultrapassar – mas tem de levar em conta o tráfego.
O piloto também teve de fazer sua parte. Repare na quantidade de vezes que Alonso fala em “sem overdriving”, algo particularmente prejudicial em Monza. Os pneus já não estão 100% e o momento é de precisão, não de tentar frear o mais dentro possível. Frear no limite deve ser guardado para a entrada dos boxes, algo que os pilotos costumam treinar as sextas-feiras – e que acabam sempre gerando alguma multinha por excesso de velocidade nos treinos livres.
A decisão de fazer uma ou mais voltas antes de parar também é complicada e leva em consideração um monitoramento frenético em relação à outlap do adversário, o tempo de seu piloto com os pneus usados e o tráfego. Também é possível estimar se haverá outros carros no pitlane, mas sem tanta precisão. A Ferrari, inclusive, arriscou um pouco nesse quesito, trazendo Alonso junto da Force India. Um trabalho um pouco mais lento e o espanhol ficaria preso.
Ao piloto, cabe então parar exatamente na marca determinada, onde estarão os mecânicos para trocar o pneu, uma vez que qualquer deslocamento que tenham de fazer representa perda de tempo. Controlar o wheelspin na saída e acelerar assim que sair do pitlane. E, como Alonso descobriu, se tiver de dividir a freada com um carro que vem com mais velocidade e pneus mais aquecidos, confiar no taco – e dar uma torcida para o carro parar, pois é difícil antever qual o limite dos pneus neste momento.
A ultrapassagem no box é, de certa forma, uma forma de expressão das mais preciosas do nível de precisão da F-1. Alguém aí ainda acha sem graça?
E para quem quiser entender um pouco melhor como se desenhou a batalha estratégica daquela corrida, deixo o link da análise que fiz na época.
12 Comments
Realmente Ju, nos atemos apenas aos confrontos diretos, nos esquecendo das freadas perfeitas, das tomadas bem desenhadas, do trabalho no pit, enfim, por isso a F1 é tão apaixonante. E mais, vemos o quanto os grandes pilotos conseguem dosar o ímpeto com o racionalismo, atuando com maestria em pista. Alonso pertence ao seleto grupo de pilotos acima da média da história da categoria.
Julianne,
Você se lembra qual foi a corrida que o Hamilton, antes ainda de ser campeão, atrasou tanto a troca dos pneus que ficou quase na lona e quando tentou entrar nos boxes perdeu o controle, passou pela grama e quase bateu?
Alguém sabe por que ele atrasou tanto aquela troca?
Abs.
China, 2007. Hamilton só precisava chegar na frente de Alonso e podia perder até 6 pontos para Raikkonen para ser campeão. Estava em primeiro, com o finlandês em segundo e o espanhol em terceiro, mas começou a perder rendimento com o pneu intermediário e a pista secando. Brigou sem a menor necessidade com Kimi e destroçou ainda mais os pneus. Estava perdendo mais de 3s/volta para Alonso, tinha dificuldade para dar uma volta em Trulli, de pneus de seco, e a equipe não o chamava para os boxes.
É curioso que Ron Dennis tenha admitido após a prova que a McLaren estava correndo contra Alonso, seu piloto, para dar o título para Hamilton naquela prova, e por isso o manteve na pista. Queriam ganhar tempo para que a pista secasse mais, mas o pneu de Lewis traseiro direito já tinha uma marca branca, estava completamente acabado.
Aquilo foi um erro da equipe em mantê-lo na pista e dele mesmo, ao entrar num pitlane ainda molhado e sem pneus rápido demais. (veja nessa reportagem da época: http://news.bbc.co.uk/sport2/hi/motorsport/formula_one/7032284.stm)
É curioso você citar isso neste post: assim como uma corrida não é só ganha no box, como também depende de uma série de fatores que acontecem antes da parada, esse caso mostra que uma derrota no box também pode ser decorrente de uma série de erros anteriores.
Achei esse vídeo que explica bem como a corrida se desenrolou: http://www.youtube.com/watch?v=dwJZ1myxdTc&feature=related
Mas tem esse também, divertidíssimo, do jornal da TV5 espanhola. Para os desavisados, parece que o Alonso virou líder do campeonato, quando na verdade a diferença tinha caído para cinco pontos com uma prova para o final, ou seja, o possível tri ainda era bem difícil. Tem coisas que não acontecem só no Brasil… http://www.youtube.com/watch?v=n7TobzxNEhk&feature=related
Só um detalhe Julianne.
Após o GP da China em 2007, a diferença entre Hamilton e Alonso caiu para quatro e não cinco pontos.
Ótimos os vídeos!
A cara de desespero do Ron Dennis é impagável. Se ele pudesse, ia pessoalmente empurrar o carro do Hamilton para fora da brita. E o sorriso interno de satisfação do Alonso não fica atrás.
É engraçado como as equipes erram feio ao eleger um adversário a perseguir na estratégia de corrida. O próprio Alonso também se deu mal, alguns anos depois, na decisão do campeonato de 2010 com uma estratégia totalmente equivocada.
Abs.
Mas esse erro, para mim, supera Abu Dhabi, haja vista como Dennis falou o que não devia quando foi tentar explicar o inexplicável. Naquela da Ferrari era provável que todos tivessem de parar naquele momento, inclusive Button, Hamilton e Vettel. Em ambos os casos, porém, as corridas saíram da zona de conforto e as atitudes mostram o quanto uma decisão de título pode mexer até com quem tem zilhões de dados à disposição para tomar a posição correta. É realmente muito curioso.
Voltando à corrida da China 2007, é interessante ver os fatos que sucederam essa lambança:
1) Nem Hamilton, nem Alonso. Raikkonen foi campeão por um mísero ponto.
2) No ano seguinte, veio a público o escândalo de espionagem entre Mclaren e Ferrari. ( divulgado pelo Alonso?)
3) Max Mosley arrumou um bom motivo para punir a McLaren e indiretamente afastar o Ron Dennis das pistas.
4) Alonso partiu para a Renault e amargou 2 anos em um carro ruim.
Como o mundo dá voltas…
Ricardo,
Na verdade o escândalo já tinha vindo a público desde junho de 2007.
E não foi divulgado pelo Alonso. No processo de julgamento, ele cedeu provas que incriminavam a equipe.
Então, Ju. Não sou muito fã da ultrapassagem usando a parada nos boxes. Essa “arte” foi aperfeiçoada como ninguém pela Ferrari de Shumacher e Brawn. O mesmo Ross Brawn conseguiria depois, em 2007, a façanha de colocar o horrível Honda 2008 no pódio em Silverstone com Barrichelo . É claro que a chuva foi um tempero a mais, só que a Bridgestone e a tática ainda estavam lá.
No entanto, não há como negar que ainda é um bote muitas vezes mortal e uma resposta que toda a equipe (inclusive o piloto,claro) pode usar interferindo no andamento e no resultado da prova, uma vez que os Pirelli ainda precisam ser dominados para uma tática eficiente.
Ab.
Descreve teu ponto de vista da ultima sessão de treinos (barcelona) aí, Julliane Cerasol.
Ultrapassar no box as vezes parece não tão interessante assim, mas se pararmos pra pensar tudo e todos que envolvem é algo muito preciso, muito interessante, claro nunca será tão interessando para nós espectadores quanto assistirmos alguém ultrapassando por fora em uma curva ou dando o “drible da vaca”, mas é algo estratégico e em algumas pistas essencial.
Mas o envolver muitas pessoas traz muitos riscos e pode causar um grande prejuízo como em yas marina 2010 Alonso que o diga…