F1 A Europa afunda, mas o circo segue - Julianne Cerasoli Skip to content

A Europa afunda, mas o circo segue

A Espanha de Alonso, em crise, quer se livrar de seus dois GPs por ano. A Bélgica de Spa estuda alternância com França. A Alemanha, cujos pilotos são maioria no grid e arrebataram sete dos últimos 12 campeonatos, sofre com problemas em Nurburgring. E a Itália, que chegou a ter 14 pilotos durante o ano de 1989, começará o campeonato de 23 anos depois sem um representante qualquer , algo que não ocorre desde 1970.

Eles ainda são a maioria no grid – 15 dos 24 pilotos – e não fazem feio ao sediar oito das 20 etapas do campeonato, mas é inegável que ver a F-1 como uma categoria essencialmente europeia é algo do passado. O motivo é simples. Hoje, o dinheiro está longe do velho continente, e, em busca dele, o circo segue seu caminho.

A F-1 sempre contou com pilotos de fora da Europa, mas hoje a categoria tem, não apenas profissionais “importados”, mas garotos-propaganda de mercados que significam uma alternativa à crise do modelo europeu. Mercados que ainda têm de sobra para gastar e veem na F-1 uma oportunidade de mostrar que vieram para ficar.

Sinal dos tempos

Quem imaginaria, há 10 anos ou até menos, termos no grid uma equipe baseada em Silverstone, mas com nome e cores indianos? E um proprietário de equipe malaio? Ou a volta do México promovida por meio de uma grande empresa do país? Ou mesmo a Rússia fazendo parte da agenda de Bernie Ecclestone a ponto de passar por cima de um contrato selado?

O grid de 2012 tem seus 15 europeus – sendo curioso o caso da França, que se organizou para voltar com força total à categoria nos últimos anos e vem colhendo os frutos, aumentando seu “exército” de zero a três titulares, graças a uma combinação entre trabalho de base e patrocínio – mas também conta com dois brasileiros, dois australianos, um japonês, um mexicano, um venezuelano, um russo e um indiano.

Destes, apenas o exemplo de Kobayashi é difícil de explicar, tendo em vista o baixo interesse japonês na categoria em comparação há 20 anos e a situação particular da economia do país. De resto, o interesse comercial, associado, na grande maioria dos casos, a talento nas pistas justifica um grid tão diverso.

Os pilotos se tornaram parte da plataforma de negócio para países antes periféricos na F-1. Mais do que um patrocínio, hoje as marcas buscam identificação e encontram seu lugar perfeito em equipes sedentas por dinheiro.

Assim, temos Massa na Ferrari graças em grande parte aos interesses da Fiat e do Santander, que visa expansão em seu maior mercado em potencial. Temos Bruno Senna e seu pool de capital nacional. Temos os australianos, que não coincidentemente vêm de um dos maiores mercados da Red Bull – empresa que também apoia um francês, na tentativa de se reerguer no país após anos de proibição da comercialização de seus produtos. Temos Perez e uma carreira que só pode ser construída graças ao financiamento da Telmex. Temos Maldonado e o dinheiro do petróleo venezuelano. Temos Petrov e Karthikeyan, ambos representantes de gigantescos mercados em expansão ainda praticamente virgens quando o assunto é F-1 e nos quais a categoria tem/terá GPs até 2014.

Dizem que o melhor piloto da história provavelmente é um siberiano que nunca foi descoberto, brincadeira que escancara a dificuldade em garimpar talento em um esporte no qual há muitos fatores além da qualidade do profissional que influem na sua formação. É só fazer um ano em uma equipe com orçamento baixo e uma carreira promissora pode ser jogada no lixo. Por isso a ajuda, seja de um programa de desenvolvimento de pilotos, seja financeira, é fundamental até para os gênios.

Essa espécie de copa das nações da F-1 atual não é necessariamente boa ou ruim. O fato de que hoje um italiano é menos interessante para uma equipe do que um russo só quer dizer que as oportunidades estão focadas em outros lugares. Qualidade não tem nacionalidade, e é fato que agora não basta mais estar no lugar certo, na hora certa. Também é preciso nascer no lugar certo. E se esse não for o caso, que o aspirante a piloto de F-1 siga o exemplo de Grosjean: suíço, mas criado no automobilismo francês, virou a vedete desta nova fase do país na categoria e conquistou sua vaga com um empurrãozinho da Total. Merci.

Coluna publicada no jornal Correio Popular.

10 Comments

  1. É mais do que apropriado, chamar o campeonato de F1 de circo. Pois ele migra atrás do dinheiro; quando o mercado se esgota, toma novos rumos.

    E o dono do circo é o Bernie, com o chicote domando os leões.

    Mas e o futuro, quando o dono se aposentar? Vira um Cirque du Soleil ou um circo decadente da periferia?

    • Essa é a pergunta de 1 bilhão de dólares – até porque falar em milhões em termos de F-1 é pouco! O que está comprovado pelo recente racha na FOTA é que não dá para deixar nas mãos das equipes, é preciso algum administrador muito habilidoso e independente.

  2. a f1 ta so engatinhando

  3. É verdade, Julianne. Sir Stirling Moss já dizia desde priscas eras que uma boa conta bancária é essencial para ser um piloto de sucesso. De repente, o melhor piloto da história da Fórmula 1 pode estar dirigindo (ou ter dirigido ao longo de sua vida) um ônibus em qualquer cidade do mundo. E não custa lembrar que Danny Sullivan foi taxista em Nova York, embora não fosse propriamente uma pessoa pobre. O futebol faz mais justiça com os seus verdadeiros talentos. No entanto, sem dúvida, virtuoses também existem ou existiram no automobilismo, independentemente de suas origens.

  4. E ainda tem gente que chama isso de ” esporte” !!!
    Hahahahhh
    Cansei!

  5. Ju, com sua experiência esportiva e jornalística, vc conseguiria colocar em números, a divisão da F1 entre esporte e negócio? Afinal sabemos que o esporte, sem a visão privilegiada de um visionário (estou dizendo isso, kkkk) não teria crescido tanto…

    • Olha, Wagner, sinceramente não entendo quem estranhe quando qualquer esporte é gerido como negócio. Afinal, trata-se do emprego de muitos e gera lucros às empresas envolvidas – e, sim, todos os esportes têm o envolvimento de empresas e, logo, têm seu sucesso medido pelo lucro.
      Esporte por esporte é aquilo que a gente pratica quando sai pra correr em um parque. A partir do momento em que o dinheiro entra em cena – e isso não é negativo de maneira alguma – e negócio passa a ser uma das coisas que rege a atividade.
      Por que os jogos de futebol são realizados às 16h da tarde? Não seria mais sadio fazer às 8h da manhã ou apenas à noite? É dessa maneira porque há interesses nisso, porque é algo feito não apenas pela competição em si, mas tendo em vista sua viabilidade econômica.
      Da mesma forma que isso gera anomalias como, por exemplo, um jogador desconhecido é convocado pela seleção brasileira para que seus empresários aumentem seu valor de mercado, faz com que um simples jogo, ou GP, se torne um grande espetáculo de entretenimento. E quem tenta enxergar a vida só no preto e branco, pensando que esporte é esporte, negócio é negócio, e esporte junto de negócio é algo essencialmente negativo, acaba se cegando para muitas coisas…

      • A diferença entre esporte e negocio é que no negocio os resultados sao influenciados pelo negocio como um resultado do business, em esporte nao é assim , embora sempre tentam dizer que é assim que tem que ser para ter algum sucesso! O que nao é verdade, e também nao quer dizer que seja bom ou ruim , mas uma coisa é uma, outra coisa é outra coisa.

  6. A F1 nunca foi barata, mas atualmente o custo é exorbitante, isso somado a uma europa falida e novos paises com muitos bilionários querendo colocar seus afiliados para correr e o resultado é uma uma atividade onde o que menos conta é a habilidade do sujeito que pilota o carro.

    • Não posso concordar, Laercio. Os gastos diminuíram enormemente nos últimos quatro anos e o grid deste ano é reconhecidamente um dos que reúne a melhor qualidade de todos os tempos. Falar que “o que menos conta é a habilidade do sujeito que pilota o carro” é puro alarmismo. De 24, há apenas dois ou três nesta situação. E isso não é novidade alguma na F-1.


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