Lando Norris até apostou com seu engenheiro que terminaria o GP da China 35s atrás das Ferrari, mesmo largando em quarto e tendo Charles Leclerc em sexto e Carlos Sainz em sétimo.
Afinal, o rendimento do carro italiano tinha sido melhor em todas as corridas até aqui e a McLaren esperava sofrer nos trechos de média e baixa velocidade do ótimo circuito de Xangai.
A classificação tinha sido disputada com a pista fria e já tínhamos descoberto no Japão que a Ferrari não fica muito confortável em uma volta lançada quando isso acontece.
Ao final das 56 voltas, Norris não só terminou à frente das duas Ferrari, como também superou a Red Bull de Sergio Perez. Em parte porque economizou tempo fazendo sua única parada sob regime de VSC, mas também porque estava perto o bastante do mexicano, em um fim de semana muito forte da Red Bull, para se aproveitar do SC que apareceu na hora errada para eles.
Até porque nem mesmo isso ameaçou Verstappen. Ele abriu 12s em 12 voltas para Norris antes de parar pela primeira vez e, quando Valtteri Bottas causou primeiro o VSC e depois o SC na volta 21, já tinha voltado à liderança mesmo com uma parada a mais.
Por que Norris bateu as duas Ferrari?
Era impossível prever que esse seria o cenário depois da sprint. Norris tinha saído na frente, mas perdeu posições após sair da pista na segunda curva e foi parar em um trenzinho de DRS liderado por Alonso e junto das duas Ferrari. Quando eles conseguiram se livrar do espanhol, dispararam, dando a entender que tinham muito mais ritmo do que conseguiram mostrar.
A Ferrari fez mudanças no carro na classificação, na tentativa de fazer a frente escorregar um pouco mais. Isso, para lidar com um desafio único que muito provavelmente vem do tratamento feito no asfalto na China.
Não havia nem degradação térmica, nem graining. O que estava acontecendo é que a superfície do pneu traseiro estava superaquecendo, trazendo um desequilíbrio em relação aos dianteiros. E os engenheiros aproveitaram que a regra do final de semana de sprint mudou, abrindo a possibilidade de mudanças no acerto, para fazer os dianteiros escorregarem um pouco mais.
Ao que tudo indica, a Ferrari foi mais longe nesse sentido que a McLaren, a julgar pelas saídas de frente que os pilotos estavam tendo especialmente com o pneu duro.
O melhor piloto da Ferrari neste fim de semana, Leclerc tinha perdido muito tempo em relação a Norris no começo da prova, indo parar atrás de Hulkenberg após a largada e tendo de passar também Russell e Piastri. Mas seus pneus médios estavam durando mesmo com tudo isso e ele estava a 8s de Norris, já em quarto lugar, quando o VSC foi acionado.
Com o VSC virando SC, a diferença, é claro, ficou praticamente zerada. Agora, os dois estavam com pneus duros e iriam até o final. Leclerc achava que passaria Norris facilmente. O inglês pensava o mesmo.
“Não entendi o que aconteceu. Com o duro, ele era meio segundo mais rápido que eu. E era mesmo porque eu sei que aquele era o limite do carro”, me disse Leclerc quando eu perguntei onde tinha ido parar o ritmo da Ferrari.
Talvez o acerto escolhido pela Ferrari não tenha casado bem com a queda na temperatura do asfalto no domingo em combinação com o pneu duro, uma prova de como esses carros são sensíveis.
Mas parece haver algo na pilotagem também. Sempre quando há uma condição de pista que exige mais sensibilidade, Verstappen dá uma lavada em Perez. E Norris se sobressai com uma tocada muito precisa e delicada. E esses pneus gostam de precisão.
Não dá para comparar diretamente o resultado dele com Piastri porque o australiano fez a segunda metade da corrida com o difusor “bem diferente de como ele foi desenhado”, nas palavras do mesmo. Afinal, foi uma das vítimas da desatenção de Lance Stroll na relargada.
Piastri teve mais degradação que Norris na primeira parte da corrida, e tinha parado quando o VSC foi acionado, ou seja, ele deveria estar no grupo que faria duas paradas e estava disputando com a outra Ferrari, de Sainz. Também estava à frente de uma Ferrari, mas deu o azar de ter colocado pneu médio na primeira parada, sendo obrigado a fazer uma segunda parada durante o SC, o que o jogou para trás do espanhol e também de Alonso. Sainz tinha colocado os duros quatro voltas antes do VSC/SC e foi até o final.
Por que Perez não fez a dobradinha?
Essa precisão de Norris é o que falta a Perez. Ele vai tirando um pouco mais do pneu a cada volta, e isso se torna um fator limitante quando ele tem que se recuperar. Na largada na China, ele foi ultrapassado por Fernando Alonso e levou cinco voltas para se livrar do espanhol.
Por um lado, para a Red Bull, isso foi bom, pois Verstappen já tinha aberto 5s, abriu ainda mais depois, e isso permitiu que eles parassem ambos os pilotos na mesma volta, com estratégias idênticas de duas paradas, usando os jogos de duros que eles tinham guardado, ao contrário dos rivais, que não acreditavam muito no composto.
As paradas foram de 2s0 e 2s1, mostrando que todos ali estão trabalhando em altíssimo nível. As paradas foram na volta 13, oito antes do VSC, e Perez não teve que passar ninguém, enquanto Verstappen superou Leclerc e Norris. Mesmo assim, a diferença entre os dois subiu de 9s para 13s quando o VSC foi acionado. E depois passou para 19s quando os dois pararam sob regime de SC, dando a impressão de que Perez “dormiu” na hora de minimizar o tempo perdido neste período.
São essas pequenas coisas que vão aumentando a diferença entre ele e Max. Mais dificuldade para ultrapassar, gerando mais dificuldade para preservar o pneu, não maximizar períodos de VSC. E o mexicano se viu em quarto após a relargada, demorou oito voltas para passar Leclerc e já estava longe demais. Terceira colocação para ele.
Safety Car veio na hora certa para uns, errada para outros
Dá para dizer que teve uma corrida antes do VSC/dois SC em sequência e outra depois. O que vinha se desenhando era uma disputa entre pilotos que fariam duas paradas (as Red Bull, Alonso, Sainz, Russell, Piastri) e Norris e Leclerc com uma.
Tudo indicava para uma vitória de Verstappen de qualquer maneira, mas com a dobradinha incerta. O resultado de Norris e Leclerc dependia muito de até onde eles conseguiriam levar o pneu médio e qual o rendimento do duro.
Mas a neutralização da prova colocou todo mundo na mesma estratégia. Ou quase todo mundo, já que Alonso tinha parado bem cedo para trocar o médio pelo duro, e não tinha outro jogo de duros para colocar na hora do SC, foi primeiro de macios e depois de médios. Nenhum dos dois poderia chegar até o fim de qualquer maneira, então não havia outra opção para eles.
Sainz, por exemplo, não parou no SC, mas ele já tinha usado os dois compostos, o que não era o caso de seus rivais diretos Piastri e Russell, que não tiveram outra opção senão calçar os duros naquele momento.
Piastri foi quem levou a pior. Ele estava andando na frente de Sainz, com estratégia semelhante à dele (mas fazendo médio-médio ao invés de médio-duro). Obrigado a parar de novo no SC, voltou atrás também de Russell, e bem no lugar errado. Na relargada, Lance Stroll se surpreendeu com todo mundo freando bastante na penúltima curva e encheu a traseira de Ricciardo, que por sua vez bateu no outro australiano.
Piastri continuou, mas terminou só em oitavo. Ricciardo perdeu a chance de pontuar pela primeira vez no ano, e permitiu que Lewis Hamilton escalasse de 18º para nono com “o carro que mais saía de frente da vida”, e que Nico Hulkenberg conseguisse outro top 10 para a Haas.
Na frente, Verstappen venceu com 13s7 de vantagem abertos em 24 voltas, seguido por Norris, Perez, Leclerc, Sainz, Russell e Alonso.
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