Perguntei a Mario Isola, da Pirelli, ainda no grid do GP da Rússia: quando saberemos quem tomou a melhor decisão, se a Ferrari de largar com os pneus macios ou a Mercedes, com os médios? “Lá pela volta 15”, disse o italiano, com a expectativa de que o calor, maior que o esperado, prejudicasse a durabilidade do composto macio e colocasse os alemães na corrida.
Isso porque, como a chuva que era esperada para o sábado e que lavaria a borracha da pista não tinha caído, a opção da Mercedes pelos médios só podia ser explicada como uma tentativa de fazer algo diferente, sabendo que, no mano a mano, não seria páreo para a Ferrari mesmo em um circuito no qual se acostumou a dominar. Havia, contudo, no sol que apareceu domingo em Sochi, uma chance.
Mas, na volta 15, os pneus da Ferrari ainda estavam em boas condições, e os carros vermelhos estavam tão velozes como se previa. Isso, mesmo com toda a ebulição interna. Sabendo do poder do vácuo nesta temporada, especialmente na segunda prova com maior distância – 890m – entre a posição do pole e a primeira freada, o time tinha estabelecido entre seus pilotos que o papel de Vettel (que, em teoria e na prática, teria uma largada melhor que Hamilton por estar com pneus mais macios) nos primeiros metros seria impedir que o inglês pegasse o vácuo de Leclerc, lembrando que a Scuderia calculava que o poder do vácuo equivaleria a uma posição e meia no grid. E o monegasco não se defenderia, sabendo que a posição seria invertida mais tarde.
Mas Vettel entendeu que sua largada foi melhor e que isso lhe daria o direito de manter a dianteira, mesmo que ela tenha sido obtida com Leclerc sequer tentando a defesa. O alemão seguiu executando, com perfeição, seu plano nas voltas seguintes, dizendo que era arriscado efetuar a troca com Hamilton próximo e forçando o ritmo para que Leclerc, correndo na turbulência tão prejudicial para as corridas de Sochi desde sua entrada no calendário e deslizando nas curvas, acabasse com seus pneus mais cedo que ele. Dito e feito.
A Ferrari acabou invertendo as posições ao deixar Vettel mais tempo na pista do que Leclerc – ainda que Mattia Binotto tenha dito que a parada do monegasco foi antecipada por um pedido do mesmo, e a do alemão foi adiada para evitar o risco de exposição ao VSC – mas o fato é que isso foi bastante conveniente para colocar a ordem na casa. Mal sabiam os ferraristas que seriam eles que iriam causar o tal VSC que entregaria a prova de bandeja para a Mercedes.
Mas será que esta seria a única chance de vitória de Hamilton no último domingo? Os números sugerem que sim.
Perguntei a Hamilton se ele acha que teria chance de bater as Ferrari sem o VSC sob medida. Ele titubeou um pouco, disse que não lembrava exatamente da distância, mas achava que o engenheiro havia lhe dito que ele estava a 2s de Vettel. Não era bem assim. O “líder” já era Leclerc e Hamilton estava 19s na frente dele na pista, tendo de fazer um pit stop que lhe custaria 26s.
Como a Ferrari reagiu bem aos pneus médios – testemunho do próprio Leclerc, que inclusive parecia surpreso com isso – e degradação foi muito menor do que se esperava em ambos os compostos, a tática de overcut (sem o VSC causado por Vettel, Hamilton ficaria na pista por mais um menos 15 voltas e muito provavelmente perderia mais que os 7s que já tinha de desvantagem naquele momento por conta disso, já que estaria correndo com médios mais gastos contra a borracha nova das Ferrari) não seria suficiente para uma ultrapassagem no box.
A chance de Hamilton seria parar com 15 voltas para o fim (pelo menos era isso que a equipe lhe dizia via rádio, que a degradação era tão baixa que ele faria a volta alvo + 15), colocar os macios e partir para o ataque. Mas ele teria de tirar no mínimo 10s com um pneu que era 0s6 mais rápido por volta e encontrar uma maneira de passar um carro mais veloz de reta.
Houve, portanto, quem questionasse se foi a Ferrari quem perdeu a corrida ou a Mercedes quem venceu, mas os números são muito claros: a única chance da Mercedes vencer em Sochi era com um SC ou um VSC (ambos dão um “desconto” de 9 a 10s na parada), e foi a Ferrari quem o entregou de bandeja.
Quem também se deu bem com o VSC causado por Vettel foi Alex Albon, que se recuperou de um erro na classificação para chegar na posição em que provavelmente terminaria de qualquer maneira, mas com o alento de ter andado, no final da prova, no mesmo ritmo do “entediado”, nas suas próprias palavras, Max Verstappen.
A McLaren, por outro lado, acabou tendo de correr atrás do prejuízo, pois ambos os pilotos já tinham parado quando Vettel quebrou. Carlos Sainz conseguiu se manter como líder do “resto”, mas Norris se viu numa briga com Perez, o qual acabou não conseguindo superar, e Magnussen, que acabou em nono depois de seguir reto na briga com o mexicano e não voltar para a pista da forma indicada e ter 5s adicionados a seu tempo final. Nico Hulkenberg conseguiu salvar um ponto depois de voltar para a corrida com o VSC, depois de uma parada desastrosa no começo da prova.
Acabou sendo uma prova mais movimentada, por conta do VSC na hora certa para alguns e terrível para outros, e também pelos Red Bull fora de posição mas nem mesmo Albon, que foi do box ao sexto posto, lembrava de alguma manobra especial, em um circuito em que só nos acostumamos a ver ultrapassagens se há uma grande diferença de rendimento entre os carros.
2 Comments
Ju, primeiramente parabéns pelo post, como sempre muito bom.
Uma dúvida: Essa vida que o carro da ferrari ganhou foi devido a asa dianteira nova ? ou teve mais coisas além disso ?
Parece que eles tratam melhor os pneus agora. Houve evolução da parte mecânica do carro, como suspensão também ?! O salto foi gigante desde as férias do meio da temporada.
Não, explico melhor no F1 on demand da sexta