“Depois da sexta-feira, já sabíamos o que fazer”. Ir para o GP de Sakhir já tendo decidido fazer uma parada foi fundamental para o resultado da Racing Point, como explicou Sergio Perez. O foco era pontuar mais do que as rivais diretas na luta pelo terceiro lugar entre as equipes. A vitória (e o pódio duplo para o time) foi o resultado de uma série de circunstâncias – uma delas, inclusive, que ao mesmo tempo atrapalhou e facilitou a própria vitória do mexicano.
Ao final da primeira volta, ele se viu em último lugar, após toque com Charles Leclerc, pelo qual o monegasco foi punido com a perda de três posições no grid do GP que encerra a temporada. Foi um lance que acabou tirando um rival da Racing Point (o ferrarista) e um piloto que teria um ritmo muito maior (Max Verstappen, que não encontrou aderência do lado de fora da pista para controlar seu carro), e fez com que Perez pudesse usar a melhor estratégia da prova: fazer o primeiro stint com os médios e o segundo com os duros. E também fez com que, no fundo do pelotão, ele conseguisse adotar um ritmo tão rápido quanto o grupo do meio, enquanto todo mundo estava limitado um pelo outro, atrás do trenzinho de Sainz. Então, antes mesmo de as paradas começarem, na volta 26 (desconsiderando a parada antecipada de Norris), ele já estava em nono e tinha perdido só 11s em relação a Sainz.
Como a Racing Point já entrou na corrida decidida a fazer apenas uma parada, isso significava que o time sabia, naquele momento, que estaria na frente de todos os que parariam duas vezes. Restava saber quem eram eles. Albon e Ocon eram os grandes candidatos, já que tinham largado, fora do top 10, com pneus médios: Perez tinha passado Albon e Ocon estava logo à frente dele. Em sexto, Stroll estava tentando a mesma estratégia de uma parada, mesmo tendo largado com os macios.
Foi então que os carros começaram a sair da frente das Racing Point: Sainz, Ricciardo, Gasly, Kvyat estavam, como esperado, numa tática de duas paradas. Na volta 40, Stroll liderava a corrida do meio do pelotão e era terceiro na pista, com Ocon atrás e Perez em “terceiro”. O mexicano, então, estendeu seu stint.
Quando voltou à pista, com pneus seis e cinco voltas mais novos que seus rivais, passou Stroll e Ocon e se colocou em terceiro na corrida de verdade e em primeiro na corrida do meio do pelotão. De motor mais velho mesmo (já que o novo quebrou no GP do Bahrein e a opção do time foi por usar um velho e não levar punição), e com o assoalho também antigo.
Estamos na volta 61 de 87: lá na frente, George Russell vivia uma corrida dos sonhos. Mesmo sem estar totalmente adaptado ao carro, cuja frente é tão presa, gerando tanta aderência, que ele até tinha dificuldade de saber como contornar as curvas da melhor maneira, o fato de ter tomado a ponta na primeira curva tinha o colocado na melhor situação possível. Poderia ditar o ritmo, o melhor cenário para cuidar dos pneus e ganhar de ponta a ponta logo na sua primeira oportunidade numa equipe grande, como Max Verstappen também conseguiu, embora num contexto um pouco diferente.
A Mercedes fazia a melhor estratégia para corrida, e a mais segura também: médios no primeiro stint, duros no segundo para ir até o final sem sustos, usando o único jogo de pneus novo que tinha à disposição para ambos os pilotos. Bottas estava apostando no ritmo com pneu duro, que sabia ser melhor que o de Russell, então ficou mais tempo na pista com os médios, planejando dar o bote nas voltas finais, com borracha mais nova.
Quando Jack Aitken, ironicamente, no carro de Russell, tocou no muro e perdeu a asa dianteira, trazendo um Safety Car para a pista, o inglês liderava com 5s de vantagem para Bottas, e a dupla da Mercedes tinha 40s de vantagem para Perez. Não havia muito o que pensar: 5s era tempo suficiente para fazer uma parada dupla e, mesmo se houvesse algum atraso com Bottas, a dobradinha estava garantida tamanho a vantagem para o terceiro. Ficar na pista com os duros e arriscar que eles perdessem temperatura atrás do SC, prejudicando os pilotos na relargada, não fazia sentido algum. E eles sabiam que seria um SC longo, já que sete retardatários tinham voltas para recuperar. Para Perez e Ocon, que também estavam com os duros, isso significaria perder posição de pista, então a decisão foi arriscar não parar (no caso de Perez, era uma decisão ainda mas fácil, depois que o time tinha perdido um pódio em Imola justamente por cometer exatamente este erro).
No pitwall da Mercedes, os dois lados da garagem foram avisados para trazer os pneus médios para as paradas. Mas George estava falando com o engenheiro no mesmo momento em que a mensagem foi passada para os mecânicos, que não ouviram o primeiro chamado. Parece ser mais um exemplo (assim como o que ocasionou o chamado a Hamilton em Monza, com o pitlane fechado) de um sistema mal implementado na Mercedes, já que uma mensagem não deveria influir na outra.
Com esse atraso, foram os pneus de Bottas que chegaram primeiro. Russell fez a parada normalmente, e só quando Bottas estava trocando seus pneus o mecânico do dianteiro esquerdo parece ver que está colocando o pneu com a inscrição lateral de GR no carro de VB. A única solução é recolocar os duros usados no carro de Bottas e chamar Russell de volta aos boxes para que ele use seus pneus, e não os do companheiro.
Isso, geralmente resultaria em uma exclusão do resultado do piloto, mas a FIA usou o bom senso e aplicou a mesma linha de pensamento de quando compostos diferentes são misturados numa parada: se o time reverter em menos de três voltas, não há punição esportiva. E levou em consideração que foi um erro, que prejudicou o resultado da equipe, e não algo intencional.
Mesmo assim, a corrida não estava perdida para Russell. Com duas paradas sob o SC, ele estava em quinto, atrás de Bottas, que se apoiou no fato de estar com os pneus duros frios para se render. Que ele seria mais lento que Russell na relargada, era claro, mas a maneira como teve 18 voltas para reagir com o melhor carro do grid (e os mesmos compostos de Perez e Ocon lá na frente) e terminou só em oitavo dá a medida do quão entregue ele está. Bottas definitivamente é um piloto melhor do que tem sido de metade do campeonato para cá.
Começou a parte impressionante do fim de semana de Russell: mesmo com toda a decepção, ele não tirou os olhos da vitória, nem estava esperando chegar na curva 1 para fazer ultrapassagens, e em cinco voltas tinha pulado para segundo e estava à caça de Perez. Mas talvez sua própria agressividade nas manobras tenha feito com que ele pegasse algum detrito no pneu, que causou uma perda lenta de pressão, algo não raro para a Mercedes neste ano (que o diga Bottas!). Voltou em 15º com oito voltas para o fim e chegou em nono, com a volta mais rápida da prova.
Como 2020 não é o ano dos contos de fadas, no alto do pódio Perez vibrava sem saber se essa seria sua última chance de vencer na F1, e Russell lamentava os primeiros pontos que tanto perseguiu na categoria.
3 Comments
Excelente texto, eu nao sabia exatamente o que aconteceu sabia q tinham trocado o pneu, mas agora sei o que causou o erro da troca
Quase que se pode dizer que a vitória do Pérez foi ofuscada pelo brilhantismo do Russell.
O mexicano no meio do azar teve sorte pelo seu carro não ter sofrido danos, no toque que levou do Ferrari do Leclerc. Depois foi inteligente e fez uma excelente corrida, aproveitou os erros da Mercedes e ganhou.
É pena se ficar de fora no próximo ano.
Cumprimentos
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Qual TV vai transmitir F1 ano quem no Brasil ?