Britânicos, espanhóis ou brasileiros, todos se derretem com as imagens do palco que Abu Dhabi criou para receber a F-1. Mas é inevitável ter um pé atrás após as duas primeiras provas no lugar. Martin Brundle, da britânica BBC, não entende como o layout da pista de Yas Marina não permite ultrapassagens. “As chicanes têm os pontos de tangência muito longe um do outro e isso tira a pressão aerodinâmica do carro detrás”, explica David Coulthard.
A dupla espera uma McLaren mais próxima da Red Bull, enquanto os brasileiros destacam a lembrança de Felipe Massa de que, da última vez que o ex-jogador de futebol Ronaldo o cumprimentou antes da prova, ele venceu. Já os espanhóis, especificamente Pedro De la Rosa, já tem sua previsão: Vettel terá um problema e Hamilton vencerá.
A expectativa de todos é para uma prova com duas paradas. Luciano Burti, na Globo, fala em “duas ou três”, mas Coulthard acredita que a segunda opção está “fora do radar”. Tentando tirar alguma informação do colega de Ferrari Marc Gené, De la Rosa cutuca. “A maioria fará duas paradas, algum valente, como a Sauber, pode tentar fazer uma e os que não conseguem fazer o pneu médio funcionar vão a três”, e ouve do piloto de testes da Scuderia, que ri. “Não vejo ninguém.”
E expectativa toma ares de mistério quando, logo na segunda curva, Vettel escapa com um pneu furado. “Como Vettel furou o pneu: Hamilton o tocou?”, o narrador espanhol Antonio Lobato vai à loucura. “Pedro, você é um bruxo”, se diverte Gené, lembrando da previsão do colega, que aposta em queda de pressão devido ao acerto do carro. “Será que ele largou com pressão tão baixa que o pneu se soltou da lateral devido ao peso do combustível? Também pode ter furado durante a volta de apresentação, mas foi uma coisa leve que a telemetria não mostrou.”
Os britânicos também não sabem o que pode ter acontecido. “Será que foi a zebra? Ele estava claramente à frente”, Brundle afasta possibilidade de toque. “Eles usam essa linha na classificação, só que agora os pneus estão com a pressão mais baixa… ou será que este pneu já estava danificado?”, Coulthard segue na linha de De la Rosa, para depois atentar a outra possibilidade. “Será que ele não perdeu o carro e, por causa da fricção da rodada, o pneu furou?”, questiona. “Estou convencido de que foi a zebra”, Brundle é irredutível. Na Globo, quando Vettel chega ao pit e vê que os danos são terminais, Burti acusa a suspensão. “O furo pode ser a consequência de um problema na suspensão, e não a causa.”
Mas a ação da primeira volta não se resumiu a Vettel. Brundle se animou com a briga entre as Mercedes. “Nenhum respeito entre esses dois”, enquanto Lobato se esgoela por Alonso. “Espetacular! Magic de novo ao ataque!” Na Globo, Luiz Roberto destaca Massa assistindo à disputa “de camarote”.
Reginaldo Leme atenta para a evolução de Rubens Barrichello – “está passando todo mundo” – mas Coulthard acredita que são “posições herdadas” pelas confusões da primeira volta. Seja como for, os britânicos destacam como o brasileiro “entrou no carro e fingiu que ia sair na classificação para forçar os rivais a gastarem um jogo de pneus”, como interpreta Brundle. Já Reginaldo afirma que é a primeira vez que Vettel vê uma corrida de fora, desde a estreia no GP dos Estados Unidos de 2007 e Burti, assim como todo mundo, não entende – “ele abandonou aquela corrida da Coreia ano passado também…”
De la Rosa começa a imaginar se Alonso pode vencer a prova, mas é logo interrompido por Lobato. “Vai ter de colocar os médios…” e Gené revela que a Ferrari cogitava fazer três paradas até no domingo de manhã, mas desistira. “Você me enganou”, De la Rosa se magoou. “Disse que seriam três. Eu, como sou macaco velho, não falei nada da minha equipe porque pensei ‘ele está em enganando’”.
Os espanhóis se divertem com a sucessão de imagens de Vettel no box da Red Bull. “Marko nem quer saber mais da corrida”, vê Lobato. “Daqui a pouco começam as guardar as coisas”, completa o narrador, que considera que o líder Hamilton “recebeu um presente do céu”, ao passo que Alonso “ganhou duas posições arriscando muito. Ele sabe que é sua única opção.”
Começa o show de ultrapassagens, uma na primeira zona de DRS e o troco na segunda. As opiniões se dividem. “Elas estão muito próximas uma da outra”, reclama Gené. “É artificial, mas é emocionante de qualquer jeito”, acredita Coulthard. “É automobilismo em estado puro, mesmo com a asa”, se empolga Luiz Roberto.
Button reporta um problema. Burti diz que não entendeu o que é, mas o fato é que o inglês não deu mesmo detalhes. E fica por isso mesmo. Na La Sexta, descobrem que é o Kers pela queda na velocidade final do McLaren, enquanto na BBC é Ted Kravitz que vai atrás da informação.
No pit stop de Massa, Luiz Roberto chama a atenção para a asa “igual à da Red Bull”, para prontamente ser corrigido por Burti. “Tinha uma asa boa e uma ruim. Escolheram colocar a boa no carro do Alonso.”
Um pit stop lento para Webber e Reginaldo chega à conclusão de que “não é o dia da Red Bull.” Também não seria o dia das melhores paradas da história da Ferrari. “Um dos problemas dos pilotos da Ferrari é que, além do carro ser ruim, os pits também são. Eles não foram os mais rápidos em nenhuma prova”, destaca o comentarista de maneira uníssona com os espanhóis. “É algo que a Ferrari tem de melhorar”, destaca Lobato.
As primeiras paradas de box e suas implicações estratégicas levam o narrador a 2010. “Quanta raiva passamos olhando a traseira do Petrov. Foi a única corrida em que não cometeu nenhum erro”, lamenta. “Se tivesse acontecido uma primeira volta como a de hoje…”, De la Rosa entra na onda. “Mas isso não tem remédio, tem de olhar para o futuro, em 2012.”
Olhar para o futuro também é o remédio na Globo. “Felipe tem de pensar em 2012, temporada que pode começar muito bem no Brasil para ele pensar em manter-se na Ferrari depois de 2012”, acredita Luiz Roberto. “Nada como uma vitória para limpar tudo. Você é tão bom quanto seu último resultado”, completa Burti.
Atendo-se ao presente, os britânicos se preocupam com o ritmo de Hamilton, acham que o inglês perdeu rendimento no segundo jogo de pneus cedo demais. “Será que esse é o ritmo real dele? Não vimos nada parecido com esse ritmo do Alonso hoje em nenhum momento no final de semana”, surpreende-se Coulthard.
De volta dos comerciais, Lobato resume a prova até aqui. “Do filme de terror do ano passado, estamos vendo um filme de suspense. Aconteceu algo pela primeira vez neste ano, Vettel abandonou. Alonso segue aguentando como pode para conseguir um pódio, em um fim de semana em que teve muitos problemas. O objetivo é aumentar a distância para quando colocar os duros.” O narrador não vê seu piloto disputando a vitória, se preocupa mais com a diferença em relação a Button.
Enquanto isso, Massa e Webber trocam de posição nas zonas de DRS. “Tomara que eles continuem assim por muitas voltas para vermos a delicadeza da pilotagem”, pede Luiz Roberto. “O problema é que Webber tem um carro mais lento na reta e não se aproxima o suficiente quando tem a DRS.”, vê Brundle, que também observa uma falta de confiança nas frenagens do australiano. “Ainda bem que era o Webber, porque se fosse o Hamilton”, Lobato deixa no ar. “Não sei quem é pior. Webber vai no limite”, testemunha De la Rosa. “E se fosse Hamilton?”, o narrador insiste. “Não aconteceria nada.” Lobato ri e lembra o comentarista de que “foi o que você disse momentos antes deles baterem na última prova.”
Mas quem rouba a cena é Pastor Maldonado. O venezuelano, que quase batera na saída dos boxes – o que levou Brundle a brincar com Coulthard, perguntando se ele já havia feito isso, ao que respondeu, resignado, “em 95, quando liderava” (veja o vídeo) – tinha problemas em respeitar as bandeiras azuis. Os espanhóis já haviam percebido que ele fizeram Alonso perder um segundo com Hamilton – e reclamaram que a punição recebida de nada adiantara ao asturiano – classificam a atuação do piloto da Williams de “horrível.” Coulthard concorda. “Não é aceitável. Isso é pilotagem muito ruim. Ele está levando uma volta, já foi punido, e opta por disputar roda a roda com Webber”, se impressiona. “Imagino os comissários pensando: será que ele não aprende!”, se diverte Brundle. “Daqui a pouco mudam a cor da bandeira”, completa Luiz Roberto
Webber para pela segunda vez e opta por colocar pneus macios. “É importante a informação para Alonso ver se vai fazer três paradas também”, De la Rosa segue sem confiar no ritmo da Ferrari com médios. “Webber não tinha opção porque Button já não tem mais problemas e estava escapando. Mas me surpreendeu muito”, reconhece o comentarista. “Ele tem que fazer 1s250 mais rápido por volta para funcionar. A diferença entre os pneus não é tão grande”, Brundle faz as contas. “Webber não tinha escolha porque os pneus dele tinham acabado e, se colocasse médios, perderia 1s por volta”, Kravitz traz a versão da Red Bull.
Os brasileiros também estão descrentes e acreditam que tudo isso pode ser “bom para o Felipe se Button e Webber começam a brigar”.
Nesse momento da corrida, os espanhóis continuam achando que Alonso chegar em Hamilton “é impossível”, percepção que vai mudando à medida que o espanhol diminui a vantagem para o inglês. “Que trabalho que Fernando está fazendo com esse jogo de pneus”, se impressiona Gené, enquanto Lobato siga alertando sobre o ritmo com pneus médios e como seria difícil manter-se à frente da McLaren. Ainda que Brundle se surpreenda com o ritmo da Ferrari – “nunca vou desistir de destacar como Alonso nunca desiste” – ele e Coulthard não acreditam que seja possível a ultrapassagem no box. “Falta ritmo no segundo setor para ele conseguir abrir o necessário.”
Já Reginaldo só vê uma possibilidade. “Ele tem de andar muito rápido e torcer para a Ferrari pela primeira vez no ano fazer o pit mais rápido da prova.”
Antes da parada, Hamilton tenta abrir caminho e se surpreende quando o retardatário Barrichello usa a DRS para superá-lo. Faz um gesto para indicar que é o primeiro colocado. “Ele fez isso porque sabe que está passando por um piloto que já andou muito em primeiro”, interpreta Reginaldo. Os britânicos valorizam a prova de recuperação do brasileiro e lamentam que o piloto não tenha um lugar garantido na F-1 ano que vê. “É uma pena”, diz Coulthard.
Alonso acaba sem o tempo suficiente e a Ferrari ainda é lenta na parada mas, mesmo assim, os espanhóis chegam a ver por alguns instantes Alonso saindo à frente de Hamilton. “Deu para ver problema na dianteira direita. Não pode”, diz Burti. “O tráfego na entrada e a lentidão da parada não ajudaram”, resume Brundle.
As atenções se voltam para a tentativa de Webber, cuja briga já não parece ser mais com Button. Britânicos e brasileiros focam na diferença com Massa, enquanto os espanhóis até considerem que a Red Bull possa chegar atrás da Mercedes. “Daqui a pouco vamos ouvir o Rob Smedley falando para o Massa acelerar porque o ritmo dele com médios é muito ruim”, aposta Brundle.
O brasileiro roda e isso sela a disputa, como a dupla da BBC observa. Porém, as posições invertidas por diferentes estratégias confundem e ambos acreditam que Webber será quinto. No Brasil, Luiz Roberto lê de forma equivocada a tabela de tempos e confunde a diferença em relação a Button – 18s – com a para o líder – que no momento era de 46s – e crê que a posição do brasileiro está segura. Já os espanhóis apontam para o risco de Massa perder posição para Rosberg.
Todos concordam, no entanto, que a rodada tem a ver com os pneus. “A Ferrari não tem o mesmo rendimento com o pneu médio e Felipe deve estar com mais dificuldade de guiar”, aponta Burti. “É pneu”, crava De la Rosa.
Os britânicos lamentam a chance desperdiçada por Webber. “Ele não ganhou nenhuma prova no ano e essa seria uma boa oportunidade. Ele não tem bom posicionamento na pista, mas tem ritmo”, acredita Coulthard. Burti também se volta ao assunto. “A diferença entre Webber e Vettel pode ser explicada por mudanças nos pneus. Sabemos que os melhores pilotos se adaptam, mas às vezes o estilo de pilotagem atrapalha.”
Para De la Rosa, uma parcela de culpa fica com a Red Bull. “Optaram por três paradas em uma prova na qual houve pilotos que fizeram uma… atrapalharam Webber de novo. Ano passado quem tinha mais chances na Red Bull era ele e fizeram uma estratégia terrível”, lembra.
Lobato destaca o trabalho de Alonso. “Fernando se aproxima do décimo pódio na temporada, que alguns dizem ter sido ruim. Não houve título, mas o ano do Alonso foi incomensurável, assim como Button não foi campeão e fez a melhor temporada da vida”, compara.
Já De la Rosa destaca seu companheiro de McLaren. “Hamilton teve a corrida controlada, fez como ensinou Vettel, mantendo de 3 a 5s de vantagem, parecia que sempre tinha algo no bolso.” O comentarista, sem querer, dá início a uma discussão. “Ele, Alonso e Vettel são aqueles que podem vencer sem o melhor carro.” Jacobo Vega e Antonio Lobato não se convencem a respeito do alemão De la Rosa cita Monza-2008. “Mas o Bourdais foi quarto, não 15º”, questiona veja, referindo-se à classificação do companheiro do alemão na ocasião. “Estou dizendo que são capazes de algo especial, não de milagres. Milagre ninguém faz”, responde o catalão.
Hamilton cruza a linha de chegada e Brundle declara: “Ele está de volta e a McLaren está de volta. Será que isso o devolverá aos dias felizes?” Se a vitória vira a página na vida de Lewis, não dá para saber, mas a dúvida de Luiz Roberto é outra. Hamilton dedica a conquista à mãe e vai abraçá-la após sair do carro. Talvez esperando traços diferentes, o narrador fica sem a certeza se a mulher loira é de fato a mãe do único negro da F-1. “Ele abraçou uma senhora ali…”, fica em cima do muro. Mas Gené já escancara o que todos estavam pensando. “Nossa, ele só puxou o pai mesmo”.
12 Comments
Julianne, Parabéns!!! Esta descrição da corrida, deve ter dado muito trabalho pra ser feita, mas ficou ótima!!!…
Muito bom ler os comentarios e opiniões de outras emissoras, e principalmente comparar com o que temos aqui!!!
Parabéns!!!!
Julianne,
ouvi dizer que é possivel baixar a trasmissão da BBC, procede? e por acaso é a trasmissão deles é tão melhor assim?
Abraço!!
É possível sim, por meio de torrent. A transmissão é melhor porque é muito mais completa, com pelo menos 1h antes e 1h depois de programação.
Legal, vou tenter baixar… Vlw!!!!
Mas é uma estraga raça essa aí heim!
estraga raça porque?
Mandou muito, muito!!!
Sem mais! Continue assim Juliane. Esse trabalho das transmissões e a contraposição das peculiaridades entre as diversas transmissões são deliciosas!
Parabéns!!!
Eu adoro essas comparações e morro de vergonha com a transmissão brasileira se bem que a espanhola também deve ser insuportável para quem não torce por Alonso na Espanha. A britânica pelo menos tenta ver nem só o que ‘é bom para os britânicos’ e abrange mais.
Excelente reportagem no blog! É muito legal ver como os espanhóis e britânicos vêem a F1. O ufanismo é similar ao que vemos aqui no Brasil… O diferencial lá fora é que tem pelo menos 2 pilotos profissionais comentando a prova…
Legal Julianne, keep going!!!
Adoro esses posts sobre as transmissões! Você é alguem que faz a diferença, parabéns! Eu me identifico mais com a transmissão britânica, mais imparcial e mais bem humorada.
Ju, dois pontos me chamaram atenção. Como eram frágeis as suspensões em 95! Pareciam de vidro, impressionante! Sobre o furo do pneu de Vettel, essa história da pressão incorreta, vc acha plausível?
Faz sentido.