Fechando as quatro semanas em que vocês tomaram o comando do blog, separei um texto de outro tema recorrente: respeitem o Seb! Os fãs do alemão estão com as esperanças renovadas com o novo desafio do tetracampeão. Mas nada como aprender com o que (não) deu certo na Ferrari para seguir adiante. E esse foi tema da Cibele Bastos, que tem formação em Economia e Gestão Pública, é apaixonada por F1, gaiata e clubista no Avexados Podcast, o único podcast cearense a falar sobre automobilismo.
Falando em Ceará, imagino que vocês perceberam o que guiou esse Blog Takeover: a diversidade. De quem escreveu ao que foi escrito. Porque pluralidade nas vozes só faz a gente crescer. Vamos ao texto?
Obs: este texto foi escrito sob doses cavalares de paixão alimentada desde 1996, ano em que um certo alemão iniciou sua vitoriosa jornada na equipe mais tradicional do automobilismo mundial, influenciando várias gerações deste esporte e que me fez ficar apaixonada pela equipe do cavalo rampante. Dito isso, sigamos.
Quando, em meados de outubro de 2014, os rumores da saída de Sebastian Vettel da Red Bull para a Ferrari estavam mais fortes que nunca, os ferraristas certamente pensaram que os anos sem títulos estavam terminando, afinal, já fazia sete anos desde o último mundial, aquele conquistado por Kimi em 2007.
Seb, como é carinhosamente chamado, nunca escondeu o sonho de trilhar o mesmo caminho do seu ídolo na categoria, Michael Schumacher. Mesmo depois de conquistar seus quatro títulos na equipe austríaca, decidiu ir para a Ferrari, para a alegria daqueles que tinham saudade de escutar a sequência mais famosa dos domingos: o hino alemão seguido do italiano. Multicampeão, jovem, talentoso, fã de Schumacher, o que poderia dar errado?
Tudo.
O início de um sonho.
Preciso confessar que a primeira vitória de Vettel pela Ferrari me fez criar mais expectativas que gente apaixonada depois do primeiro encontro. A regência do hino em homenagem ao Schumacher preencheu de esperanças esse coração vermelhinho que já estava fatigado de tanto esperar.
Tudo bem que o Vettel não fez aquela reformulação da equipe como fizera Michael ao entrar na Ferrari, mas só o fato de ser fã declarado e mostrar a vontade de continuar seu legado, me foi suficiente para alçá-lo à condição de amor eterno.
Era muito bom poder ouvir novamente aquela sequência de hinos e vislumbrar um futuro vitorioso com outro alemão, mesmo que as condições do carro não fossem boas o suficiente para alcançar a Mercedes, que aprendeu o caminho da vitória e parece não mais querer sair de lá.
Não deu em 2015, 2016 e 2017, mas 2018 parecia que as coisas iriam mudar. O carro era bom, as vitórias foram convincentes e finalmente víamos um campeonato competitivo entre duas equipes. Até que…
Deu tudo errado.
Hockenheim testemunhou o início do calvário de Vettel. Aquele 22 de julho de 2018 certamente ainda martela na cabeça do alemão.
Seb vinha de um ótimo final de semana, fez sua quinta pole no ano, estava à frente no campeonato e parecia que desta vez o penta estava mais perto do que longe. Confiante, carro competitivo, estratégia certa, as coisas se encaixavam e fluíam e, a espera por títulos parecia que terminaria, até que tudo escorregou. Literalmente.
Desde este dia, Seb não foi mais o mesmo. Aqueles pingos de chuva o atingiram com tanta força que não seria exagero comparar seus efeitos com a mola que atingiu o capacete de Massa em 2009 na Hungria.
Sua confiança foi duramente minada por uma culpa que devia fazer sessões de reprise em sua mente. O “SE”, aquela partícula da língua portuguesa que muitas vezes assume a função de condição, desenhava vários cenários possíveis, talvez alguns que evitariam o erro cometido na Alemanha. Aquele Vettel tetra campeão aos poucos foi transformado em um piloto que alimentaria memes do pião da casa própria.
É sabido que pessoas reagem de forma diferente às adversidades que a vida impõe. Alguns conseguem extrair forças e sair do estado de torpor mais rápido, outros vivem um processo mais lento e deteriorado. A própria F1 traz exemplos, como Daniil Kvyat que, após ser rebaixado para a Toro Rosso depois da colisão com Vettel (karma is a bitch!), abriu espaço para o jovem Max Verstappen e quase viu sua carreira chegar precocemente ao fim.
No caso de Vettel, o caminho parecia ficar ainda mais tortuoso, pois dias após o erro na Alemanha, a Ferrari recebia a triste e chocante notícia da morte de Sérgio Marchionne, seu então presidente desde 2016.
A morte de Marchionne deixou os ferraristas com saudades das temporadas anteriores, pois sua ausência certamente bagunçou a equipe e suas tomadas de decisões. Com ações nitidamente equivocadas, que podem ser explicadas por uma ausência de gestão direcionada para resultados, a Ferrari viu sua competitividade dissolver-se após cinco dobradinhas seguidas da Mercedes na temporada de 2019 – mas isso daria outro texto.
Voltando ao calvário de Seb, outro acontecimento deixou o caminho mais difícil do que já estava: a entrada do talentoso Charles Leclerc.
O monegasco chegou à Ferrari fazendo muitos se perguntarem se daria conta do recado, afinal, um piloto tão jovem aguentaria a pressão de entrar na mais tradicional equipe e que amargava um jejum de mais de dez anos sem títulos? Isso foi respondido logo na segunda prova pela equipe, quando fez sua primeira pole, no GP do Bahrein.
Charles mostrou de cara que estava pronto para ganhar e que, na oportunidade que tivesse, faria. O fato de ter um tetra campeão como seu companheiro de equipe parecia não incomodá-lo, tampouco intimidá-lo, tanto que suas primeiras vitórias foram emblemáticas: a primeira, no tradicional circuito de Spa Francorchamps e a icônica vitória em Monza, que deixou qualquer ferrarista louco.
Confiança minada, companheiro talentoso, ausência de resultados, erros repetitivos, ambiente insalubre, possibilidade de títulos cada vez mais longe, o que mais faltava? Uma demissão humilhante.
O mundo é bão, Sebastião!
Há um trecho de Pais e Filhos (Ivan Turgueniev) que diz: “para um homem de boa cabeça, não existe fim do mundo”, ou seja, quando estamos bem conosco, mesmo que haja problemas, temos uma maior clareza para sairmos destas situações. Quando a dúvida, a culpa e a descrença em nossas habilidades nos consomem, às vezes é difícil enxergar o caminho de volta. Como retornar à nossa essência?
É obvio que Seb não desaprendeu a pilotar de um dia para o outro, assim como é obvio que um ambiente melhor poderá lhe conferir melhores condições para realizar um trabalho condizente com quem possui quatro títulos na bagagem.
Apesar da incerteza que marcou essa temporada, bem como os resultados nada satisfatórios, além do fracasso retumbante em continuar o legado de Schumacher na Ferrari, Vettel contrariou os fiscais do INSS ao ser contratado pela Aston Martin, equipe que fará parte da categoria a partir do ano que vem.
Muitos cravam que será sua redenção, outros apostam em sua derradeira aposentadoria, apontando que foi um erro a Aston Martin contratá-lo. Porém, como pode ser um erro contratar quem sabe trilhar o caminho da vitória? Isso também daria outro texto.
Bem, como não é possível prever o futuro e, depois das expectativas criadas e malogradas em sua passagem pela Ferrari, aprendi que o melhor a fazer é esperar e torcer. Torcer para que Vettel consiga reencontrar sua essência e para que tenhamos a volta daquele menino que costumava apelidar seus carros e vibrava como nunca em cada vitória.
Apesar dos pesares, há um genuíno sentimento de gratidão por sua passagem na Ferrari. Houve momentos muitos felizes e esperançosos nas suas 14 vitórias, mas o que realmente ficou foi a sua faceta mais humana demonstrada em cada gesto de fraqueza, ternura e amor.
Ademais, como canta Nando Reis, o mundo é bão, Sebastião. O mundo é teu, Sebastião.
2 Comments
Belo texto, parabéns!!!
Fechou com chave de ouro o Takeover.
Espero que o Vettel retome a autoconfiança e possa voltar a ter belas performances.
Não sou torcedor do Vettel, mas, corroborando a visão do artigo, a sua passagem pela Ferrari mostrou um lado muito humano do piloto, com simpatia, humildade e bom humor. Foi um momento rico também para observar todos os aspectos psicológicos duros envolvendo a competição e o processo de queda de um grande vencedor.
Não sei o que vai ser do Alemão na Aston Martin, não acompanhei a carreira dele desde o início, mas ficou uma forte sensação de que seus títulos foram inflacionados pelo domínio do carro da Red Bull. Apesar de ser um grande piloto, e certamente ter talento para ser campeão mundial, talvez, e só talvez, não fosse um caso de tetra…