Não vá se animando com o título do post. Ninguém achou a receita infalível para recuperar o dinheiro das cifras absurdas cobradas por Bernie Ecclestone pelo direito de sediar uma corrida de F1. Pelo menos para os organizadores – dependendo da localização do circuito, a cidade lucra com o evento – esta continua sendo uma tarefa inglória.
Mas o exemplo de Silverstone é importante para os países que têm tradição no esporte, mas não conseguem concorrer diretamente com o caminhão de dinheiro dos emergentes que vêm tomando o calendário. O circuito é de propriedade do Clube de Pilotos Britânicos e precisa encontrar na iniciativa privada e na própria receita recursos para se sustentar.
É claro que esse modelo foi o que quase tirou o GP da Inglaterra da antiga base aérea da 2ª Guerra Mundial, mas o excesso de ganância do projeto de reconstrução de Donington Park e uma inteligente contra-proposta deixaram Ecclestone sem escolha.
Com um projeto de modernização, que inclui a construção de um novo paddock e a transferência da reta dos boxes para o local entre as curvas Club e Abbey, serão investidos US$ 47 milhões (US$ 64 no total, incluindo as alterações já feitas na pista). Uma barganha se comparado aos planos de gastar quase US$ 220 milhões na renovação de Donington. A intenção é que a obra diminua a diferença da estrutura do velho Silverstone em relação às obras faraônicas do Oriente. Depois de muita resistência, a pressão de Ecclestone, que fez um verdadeiro leilão, ameaçando o futuro do GP que marcou o início da F1 em 1950, fez os administradores botarem a mão no bolso. Isso sem qualquer ajuda governamental.
Mas Silverstone tem lenha para queimar. O circuito movimenta ao menos US$ 75 milhões ao ano – tem crescido a um ritmo de 14%/ano de 2007 para cá – e teve um lucro de US$ 3,24 milhões em 2010.
Há vários motivos para o sucesso na gestão do circuito. Especula-se que o contrato para a realização do GP da Inglaterra, fechado em dezembro de 2009, renda cerca de US$ 20 milhões aos cofres da FOM, sendo que o valor é aumentado em pelo menos 5% a cada ano. Apesar de ainda ser uma quantia considerável, é pouco se comparado ao que países menos tradicionais pagam. Afinal, um circuito inglês tem mais poder de barganha que um coreano, por exemplo, pois há muito mais investimento vindo de nações como Inglaterra, Itália e, nos dias de hoje, Espanha, que de qualquer outro lugar.
Mesmo assim, eventos em outros locais tradicionais têm passado por dificuldades. O presidente da Catalunha reclamou dos prejuízos, Spa e Hockenhein também andam perdendo dinheiro, e a França sequer tem um GP. Qual seria o segredo dos ingleses?
Uma explicação plausível, comprovada pelo fato do aumento do dinheiro movimentado nos últimos 4 anos, é o sucesso de Lewis Hamilton e o ressurgimento de Jenson Button. A Inglaterra ficou 12 anos sem ter um campeão do mundo e emplacou logo dois seguidos. Na esteira do sucesso na categoria máxima, o fato de ambos serem cria do automobilismo local faz crescer o interesse pelo esporte em geral.
Com isso, outro diferencial de Silverstone é sua alta rotatividade durante o ano, uma vez que a cultura do esporte a motor na Inglaterra, não somente da F1, é muito forte. Mesmo as categorias de base atraem um ótimo público. No total, o circuito recebe nada menos que 1 milhão de pessoas por ano.
Assim como construções para Jogos Olímpicos e Copas do Mundo, muitos dos circuitos novos ficam às moscas durante boa parte do ano. Isso, porque são pensados exclusivamente para atender às demandas da F1, quando poderiam ser utilizados até para outros tipos de eventos, não necessariamente automobilísticos. Mas como atrair público para qualquer coisa que aconteça no meio do nada, no caso de pistas como Abu Dhabi, Istambul Park e Shanghai?
Ao menos no Brasil, Interlagos é localizado numa área urbana e vem sendo utilizado para eventos extra-F1. O quanto São Paulo paga à FOM pelo direito de organizar a prova é segredo de Estado, mas não ouvimos reclamações da prefeitura, mesmo sendo ela quem arca com os custos das reformas, que consomem entre R$ 15 e 20 milhões ao ano. Ainda assim, a estrutura do circuito há tempos não comporta a F1 de hoje e a promessa é de que um novo paddock será feito. Talvez não nos moldes de Silverstone – quem sabe no dia em que o circuito atrair 1 milhão de pessoas por ano! – porém, ficar parado, da maneira como os ingleses fizeram por anos, esperando que a tradição lhes salvasse, não é uma opção.
2 Comments
A viabilidade do circuito de Silverstone está ligado ao fato da torcida inglesa ser apaixonada por esportes a motor e pelo fato da Inglaterra ser sede de diversas equipes, não apenas de F1, mas das categorias de acesso. Isso faz com que haja um maior uso do circuito, aumentando a geração de receitas.
Se olharmos para o lado de cá do Atlântico, temos a CBA – Confederação Brasileira de Automobilismo, que pouco faz para estimular o esporte a motor e vive envolvida em escândalos. Tanto que já se prevê que em poucos anos não teremos mais nenhum piloto na F1, pois não temos campeonatos das categorias de acesso.
Por outro lado, temos a transmissão oficial que peca pela falta da qualidade em explicar o que realmente acontece durante as corridas (estratégias, previsão de paradas,etc.) apesar de ter gente com condições para fazer isso. Muitas vezes preferindo o discurso passional de que determinado piloto brasileiro está sendo prejudicado pela equipe, o que por final mais prejudica o esporte ao afastar o telespectador comum, que se sente traído em seu orgulho nacional.
Se juntarmos a falha de gestão da CBA, mais a falha da transmissora ao não incentivar a divulgação das corridas de carro como um produto, mais a falta de visibilidade para o esporte a motor, temos como resultado: pouco público, o que acaba por afastar patrocinadores, que não patrocinam novos pilotos, o que acaba por diminuir o interesse pelo esporte.
Se a crise econômica mundial se agravar, talvez a prefeitura de SP não consiga mais sozinha bancar os custos de promover um GP. Então em pouco tempo não teremos mais nada, nem pilotos, nem GP e talvez só a lembrança dos bons tempos de Emerson, Piquet e Senna…
Então, o Brasil fará jus à frase: ” O país do futebol…”
Belo texto! Pontualidade britânica, de uma jornalista brasileira. Mts fatores contribuem, é fato, mas a gestão profissional, com agregação de valores em uma arena multiuso, abrem o leque de degustação. Tudo bem que suntuosidade é desnecessário, mas sistema de transporte integrado, boas acomodações, ingressos condizentes com a renda do país, podem ajudar. Interlagos parece que parou no tempo, como qualquer grande obra esportiva brasileira. Me lembro a última vez que fui em um estádio de futebol, em 1996, no Mineirão (MG), em jogo entre Cruzeiro(MG) e Portuguesa(SP), pelo brasileirão da série A. Como qualquer estádio brasileiro que ser preze, os banheiros eram fétidos, nada que nã possa ser mudado por “uma obra super faturada de emergência para a copa de 2014”, depois tudo volta ao “normal”.