Entre uma temporada e outra, gosto de abrir o espaço do blog para vocês, os fãs, publicarem seus textos. Cada um pode trazer um pouquinho do que conhece ou sente, e por isso que essa experiência tem valido muito a pena. E é o que vocês vão perceber nos 10 textos ou vídeos selecionados nesta nova temporada do Blog Takeover.
Texto por Isabella Girardi. Psicóloga e fã de Fórmula 1.
Brasil, Copa do Mundo de 2014, Semifinal, 08 de julho no Mineirão; Alemanha 7×1 Brasil. Brasil, 2019, jogo contra a Seleção do Peru, Gabriel Jesus é expulso do jogo após condutas consideradas violentas, mesmo Tite pedindo “Calma, Gabriel, calma” e, ao receber o cartão vermelho, entra em crise de raiva e choro, acompanhada ao vivo. Qatar, Copa do Mundo de 2022, quartas de final, Brasil segue ganhando com 1×0, mas aos 117 minutos, nos acréscimos e faltando apenas 3 minutos para encerrar o jogo, a Croácia faz um gol. Pênaltis, Croácia 4×2 Brasil, sem o titular, Neymar, chutar. O silêncio toma conta dos brasileiros no Estádio enquanto os croatas comemoram.
No dia seguinte, as principais manchetes brasileiras traziam informações desconhecidas pelo povo; Tite recusou o trabalho de psicólogos para a Seleção durante a Copa. Os jogadores que contavam com psicólogos, eram de busca própria. Tite disse que os jogadores não queriam e que o profissional de psicologia “não teria tempo”, mas foi rebatido por João Ricardo Cozac, psicólogo e presidente da Associação Paulista da Psicologia do Esporte; “(…) talvez Tite não conheça o modelo das grandes seleções (…) Inglaterra, França, México, Alemanha, Holanda contam com departamentos de psicologia no esporte atuantes durante todo o processo” e completa dizendo que “Tite não é psicólogo, não conhece todas as linhas de trabalho e de treinamento psicológico no esporte. Há linhas que têm formatos mais breves de atuação”.
GP de Bahrein, 2022, Charles Leclerc conquista a pole e finaliza a corrida no lugar mais alto do pódio, seguido pelo companheiro de equipe, Carlos Sainz. Um ótimo começo de temporada para o piloto considerado o maior rival do atual campeão (agora bicampeão), Max Verstappen. Leclerc largou na pole position mais 8 vezes durante a temporada, mas só venceu mais 2 corridas, enquanto Verstappen largou na pole 7 vezes e venceu 15 corridas. Muito se falou sobre os problemas técnicos, estratégicos e práticos da equipe de Leclerc, Ferrarri, mas, também, sobre a possível frustração e pressão sofridas por Leclerc. Emerson Fittipaldi, ex-automobilista brasileiro, soltou em entrevista que “Ele [Leclerc] ainda está sob uma pressão tremenda”, durante a temporada de 2022. Leclerc teve apenas 3 abandonos na temporada, duas a mais que Verstappen, porém ficou fora do pódio em 8 corridas, tendo como pior resultado o 6° lugar por algumas vezes. Fim de temporada, Leclerc terminava em segundo lugar geral, apenas 3 pontos à frente do terceiro lugar e 146 pontos atrás do campeão, a maior diferença entre 1° e 2° colocados desde 2013.
Leclerc fez a melhor temporada de sua carreira, mas terminou “não satisfeito e frustrado”. Durante a temporada, dava entrevistas dizendo que não sentia-se pressionado, mas, deixava escapar algumas emoções e pensamentos contraditórios, como no circuito de Ímola (país de sua equipe), em que seu erro o tirou do 1° lugar. Leclerc enfrentou erros como passar na zebra sozinhos e rodar, batidas e, principalmente, comunicação com a equipe, além de certa falta de autonomia e tomada de decisão, resultando em frustração, xingamentos e caras fechadas. Final de 2022, pós temporada, especula-se a saída de Mattia Binotto, chefe da equipe Ferrari e, por fim, deixa o cargo à duras críticas da mídia, fãs e até de ex-pilotos, como René Arnoux.
Aqui os outros textos escritos por fãs no Blog Takeover
Em 2018, Toto Wolff, chefe da até então equipe campeã invicta, Mercedes, disse ao Autosport que [eles] estão em uma área onde se esforçam muito para serem capazes de desempenhar um nível alto de energia, o que pode ser pouco saudável para o ambiente de trabalho. Reforçou que toda a equipe possui acompanhamento médico, inclusive com psicólogos. Já Lando Norris, piloto da McLaren que estreou na F1 em 2019 aos 19 anos, disse que o início não foi fácil e revelou ter sofrido com problemas psicológicos como a ansiedade ao se adaptar à categoria. Falou sobre a pressão e estresse que pilotos precisam lidar desde jovens e o preço dos “muitos olhos” direcionados a eles, crenças de insuficiência, comparação e competitividade e a pouca fala sobre saúde mental e dificuldades, para evitar “dar vantagem aos outros ou mostrar uma falha”.
Ainda em 2019, começou o acompanhamento psicológico e um ano depois, dizia sentir-se mais confiante e preparado, além de apresentar maior autonomia, conhecimento e independência sobre sua saúde mental. Grosjean, piloto francês com grande número de falhas e peripécias na carreira, em 2018 já falava sobre a importância, para ele, do acompanhamento psicológico, que tinha experiência desde 2012. Em 2020, após um grave acidente, voltou ao acompanhamento para trabalhar os possíveis traumas pós eventos e disse estar sentindo-se capaz de lidar bem e voltar às pistas, sem apresentar pesadelos e flashbacks, sintomas do chamado Transtorno de Estresse Pós-Traumático, comum em pessoas que vivenciaram situações extremamente assustadoras e de risco de vida.
A Psicologia do Esporte e a Clínica se apresentam como facilitadoras de relações e desempenho, por exemplo, além da identificação de sentimentos, pensamentos e autoconhecimento. São poucos os dados sobre sua aplicação justamente pelo pouco espaço dado a esses profissionais dentro de esportes de alta performance. Apesar disso, os que buscam acompanhamento profissional particular, apresentam melhores falas, entendimento e manejo com frustração, medo e problemas relacionais, além de comentários maldosos da mídia e espectadores. Autores do artigo “Adoecimento psíquico em atletas de alto rendimento: A importância da Psicologia do Esporte” ressaltam que o “que determina a vitória ou a derrota de um atleta profissional não são apenas suas habilidades técnicas (…) o aspecto psicológico é uma questão fundamental no meio esportivo para atingir o seu êxito profissional”. Talvez a copa e o Tite não digam algo sobre a Fórmula 1 e os pilotos, mas, pelo menos, servem de comparação quando se pensa no mundo do esporte nos dias atuais. De jogadores de futebol a pilotos de Fórmula 1 e até mesmo você aí, sentado no trabalho lendo esse texto, saiba que ninguém está livre de passar por frustrações, estresses e problemas, mas, ao menos, sabe-se que não precisa ser uma caminhada solo
No comment yet, add your voice below!