Corte de gastos. A Fórmula 1 repete essas palavras há pelo menos quatro anos, alertando para a impossibilidade do modelo atual de gestão se perpetuar sem o apoio de grandes montadoras, que promoveram a bonança da primeira década dos anos 2000.
Isso pode soar como daqueles assuntos chatos, mas têm grande efeito nas corridas em si, quando vemos jovens talentosos e campeões de categorias de acesso sem apoio para continuar, pilotos pagantes de qualidade duvidosa inundando até o meio do pelotão, e as mesmas equipes de sempre na ponta.
Em qualquer negócio, a captação de recursos é mais difícil para empresas menores e focadas em uma única atividade do que para grandes corporações que, inclusive, conseguem absorver dívidas geradas por braços que, eventualmente, não estejam indo bem, sem comprometer a qualidade. Por exemplo, a Honda sustentou altos níveis de investimento mesmo sem resultados na pista. Se seu espólio, a Brawn, não tivesse um carro vencedor, dificilmente terminaria a temporada de 2009.
É essa captação de recursos que está comprometida na Fórmula 1 atualmente. Não que a categoria em si vá mal das pernas – a movimentação financeira é contada em bilhões – mas o negócio é mais concentrado e, consequentemente, frágil do que há 10 anos, por exemplo.
E por isso fala-se em corte de gastos, algo que parece funcionar mais com restrições técnicas – como nos motores e nos testes, por exemplo – mas que precisam ser pensadas com cuidado para não influenciar no nível de disputa – e a “subestimação” da Pirelli em Silverstone está aí para não me deixar mentir. Além disso, a vontade política das equipes após o choque da saída em massa de Jaguar, BMW, Honda e Toyota ajudou a cortar gorduras. A própria Toyota era campeã de gastos em 2007, por exemplo com algo em torno de 420 milhões de dólares anuais, e hoje acredita-se que o orçamento de Ferrari e Red Bull não passe de 300 milhões.
Mas será que gastar menos é a única solução? O mundo também mudou muito em 10 anos. A preocupação com o meio ambiente, especialmente na Europa, vem pautando as pesquisas e lançamentos do meio automobilístico. Se em mercados como o Brasil e os Estados Unidos – onde a Ferrari e seus beberrões de luxo não param de crescer – parece que ninguém se importa com sustentabilidade, uma base importante para a Fórmula 1 já não se empolga tanto com motores de combustão.
Observando as mudanças, a categoria adotará uma unidade de potência mais ligada ao uso eficiente da energia a partir do ano que vem. Mas a adoção do V6 1,6L turbo somado aos sistemas de recuperação energética duas vezes mais potentes que os Kers de hoje é uma medida tímida – e que vai custar caro para, muito provavelmente, não convencer ninguém da intenção de tornar a categoria mais “verde”. Quem precisa da Europa quando se tem os maravilhosos novos mercados? deve pensar Bernie Ecclestone. Mas até quando as pessoas verão sentido em uma corrida de carros? Será que o propagandeado ciclo de montadoras vai realmente acontecer sem uma mudança profunda nesse sentido?
Assim como na questão do corte de gastos, ficar no meio do caminho também nessa mudança de cara da categoria pode ser uma pá de cal no futuro da Fórmula 1 enquanto negócio.
7 Comments
Ju, imagino que além do fator financeiro, o fator tecnológico hj em dia torna o abismo entre grandes e pequenas quase intransponível. Não sei se o teto é concebível, mas para começar, uma melhor divisão dos prêmios de construtores ajudaria muito…Ao menos nessa era dominada pela aerodinâmica, os melhores técnicos e meios de concepção dos carros demandam meios laboratoriais sofisticadíssimos. O bom da debandada das montadoras, de certa forma, foi a produção um pouco mais enxuta e racional, mas não sei até que ponto a falta de testes em pista afete as pequenas, afinal, creio eu que seja mais difícil corrigir erros de projeto em computadores do que em pista, sei lá. Sempre houve desníveis na categoria, mas me parece que a concepção e desenvolvimento dos carros nessa era tecnológica demandam muitos recursos produtivos e financeiros. Ju, quando vc fala da relação entre a disputa e o meio ambiente, imagino que podem conviver separados, tomando-se a disputa como algo surreal e separado do dia-a-dia, não tendo necessariamente que ser politicamente correta.
Da mesma forma que os pagamentos são feitos do maior para o menor pontuador, ganhando mais para quem mais pontua, poderia-se fazer o inverso para os testes, tem mais direito a testes quem menos pontua, tendo a possibilidade de melhorar o carro. Ah, mas não vai se ter dinheiro para fazer o teste. Então que seja permitida a venda de km de testes, para que os times pequenos arranquem (literalmente) mais dinheiro dos grandes e consigam ter um pouco de km para seus próprios testes. Não sei se funcionaria, mas é uma tentativa.
A ideia eh boa!
Na minnha opinião o maior problema da F1 atual está no projeto e desenvolvimento dos carros, torna-se muito caro construir um novo carro todo ano (projeto novo, túnel de vento etc). Antigamente um F1 bem construído poderia ser usado por vários anos (vide algumas Lotus). Creio que o ideal seria a FIA impor um projeto único dos bólidos, para que todas as equipes construissem seus carros com um projeto único, havendo alterações somente nas asas e aletas aerodinâmicas. Sendo que esse projeto só poderia ser revisado depois de um certo período de tempo. Era só pagar um bom dinheiro para que o Adrian Newey se fosseo projetista exclusivo da FIA
A F1 já está muito parecido com categoria ‘spec’, fazer isso seria jogar a última pá de terra na criatividade dos engenheiros que lá trabalham.
Categoria “spec”, o que é isso?
Categorias spec são categorias mais padronizadas, com um regulamento técnico bem restrito para balancear a performance dos carros o máximo possível…o que deixa relativamente pouco espaço para os engenheiros trabalharem.