Entre uma temporada e outra, gosto de abrir o espaço do blog para vocês, os fãs, publicarem seus textos. Cada um pode trazer um pouquinho do que conhece ou sente, e por isso que essa experiência tem valido muito a pena. E é o que vocês vão perceber nos 10 textos ou vídeos selecionados nesta nova temporada do Blog Takeover.
Eu sei, esse poderia ser um texto sobre grandes marcos do esporte, acontecimentos extraordinários em sua história ou sobre um dos grandiosos nomes da maior categoria do esporte a motor mundial. Mas me veio a mente a ideia de exaltar a categoria em uma narrativa em primeira pessoa, e provavelmente eu esteja sendo um tanto presunçosa em me colocar nessa posição, mas faço isso pois tenho certeza que cada fã de automobilismo, e cada um que está lendo esse texto, tem sua própria história pra contar em relação à Fórmula 1.
Cada visão diferente e de pontos de vista únicos, mas que acabam fazendo, de certa forma, parte também da história do esporte, e chega a ser fascinante como simplesmente o que é apenas carros correndo em círculo para alguns, acaba mudando vidas.
Com isso, o que venho apresentar a vocês hoje é como a ilustre história desse grandioso espetáculo de categoria e como isso mudou a minha história, embora isso possa parecer dramático e exagerado. Minha vida se moldou em volta e agora se desdobra dentro do automobilismo, tudo graças a uma curiosidade.
Sendo sincera, nunca havia me interessado por esportes, definitivamente esse tipo de paixão não era para mim, seja de dentro de campos, quadras, pistas, piscinas e arenas, ou se quer como espectadora em qualquer desses. Ou era só o que eu pensava. Tudo mudou em maio de 2016, enquanto eu cursava o segundo ano de faculdade, e em uma sexta-feira, mais precisamente dia 13 daquele maio, passando pela frente da TV me chamou atenção uma reportagem sobre o fato de um piloto de 18 anos que estava prestes a fazer sua estreia numa equipe de ponta da Fórmula 1, e de imediato, a pouca idade, que era quase a mesma que eu tinha na época, me espantou visando a considerável periculosidade do esporte. Me propus assistir à corrida daquele domingo para entender do que se tratava, porém por ironia do destino, eu acabei não lembrando que pretendia.
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Acredito que uma boa parte dos fãs lembram do que aconteceu naquela corrida, e na segunda-feira, eu também fiquei sabendo. A notícia do dia seguinte a corrida contava sobre o feito do tal piloto, que havia vencido a corrida e se tornado o piloto mais jovem a vencer uma corrida na F1. Uma parte de mim estava incrédula que eu havia perdido um momento assim para o esporte justo quando pretendia assistir, e
ainda indignada me prometi que não perderia a próxima etapa para conhecer mais sobre a categoria.
Foi então, que na etapa seguinte eu estava em frente e TV para acompanhar o meu primeiro Grande Prêmio, e a verdade é que sinceramente, eu nem lembro tanto o que houve nos fins de semana seguinte, mas a verdade é que eu não conseguia mais perder nenhuma corrida. Fórmula 1 se tornou minha obsessão, e eu que tanto julgava as pessoas que eram fanáticas por esportes, me conheci da mesma forma. Me descobri torcedora nos bons e maus momentos, o que inclui a mais pura forma de oscilação entre sofrimento e felicidade, por vezes na mesma corrida. Me apeguei a pilotos, a carros e a histórias, e me vi encantada por cada parte daquilo tudo.
A Fórmula 1 tinha se tornado oficialmente um traço da minha personalidade absolutamente do nada, e eu provei da seriedade na frase “corre velocidade na veia” porque foi isso que eu senti, e foi aí que comecei a questionar esse acontecimento repentino ou “do nada”. Descobri com isso
coisas sobre mim e minha família que nunca me haviam sido contadas, e que por mais que eu tenha começado sozinha e “por acaso’, o automobilismo poderia não ser tão novidade assim ao meu redor. Comecei a me dar conta de que jogos de corrida eram os únicos que eu queria jogar nos vídeos games na infância, que minha coleção de carrinhos e fascinação pelas pistas da hotwheels do meu irmão poderiam não ter sido
uma fase.
Talvez meus pais também já devessem ter desconfiado com a história que voltou a ser contada recentemente nos encontros de família, de quando eu com 1 ano os fiz ficar horas alugando carrinhos após carrinhos na orla porque eu queria dirigir a noite inteira, ou até quando eu ficava revoltada aos 8 anos por não poder ir num kartódromo perto de onde eu morava, e o barulho do motor me encantava.
E então comecei a ouvir com frequência que “você deve ter puxado isso da sua bisa que era louca por Fórmula 1 e não perdia uma corrida”, então era genético, porque infelizmente pouco tive oportunidade de conviver com minha bisa, e por algum acaso, nenhuma das lembranças que tenho dela se relacionam com Fórmula 1.
Aos poucos também foram se abrindo outras curiosidades sobre minha família e o esporte, como o fato de um primo de um primo que havia pilotado em formulas na Europa, e meu tio e minha mãe, que não me deixava andar de kart na infância, treinavam com ele de kart. E até segredo de família veio a tona nesse meio, como a história de meu tio que pilotava em corridas de arrancada e que havia ganhado vários prêmios, esses que eram acobertados pela irmã mais velha dele, minha mãe, e isso só chegou a conhecimento de geral da casa já durante a pandemia, 30 anos depois e minha avó descobriu não somente o que os filhos faziam, mas que essas peripécias eram feitas com o carro da família e meu avó pode entender finalmente porque tinha época que o carro parecia um foguete na estrada, justo.
Coisas que como eu disse, nunca me foram contadas, mas talvez o sangue carregue velocidade. Por isso costumo dizer, se alguém acha que começou a gostar de automobilismo sem inspiração em familiar, talvez só ainda não saiba de algumas coisas, ou se realmente ninguém mais por aí se interesse, esse será o primeiro que espalhará pra sua família.
Os anos se passaram e o meu vício, que podemos chamar assim no melhor sentido da palavra, só crescia e eu me encontrava cada vez mais no esporte. Encontrei ídolos e conheci a rivalidade na melhor das formas, que é claro a de forma saudável e respeitosa como acredito que o esporte deva ser sempre apesar de tudo, adversários em pistas sim, inimigos fora delas, jamais. Me tornei hipócrita ao gritar com a TV durante as corridas
enquanto costumava julgar quem faz isso assistindo a futebol.
Chorei de tristeza e de alegria, me frustrei e decepcionei muitas vezes, mas também aprendi e cresci com cada descoberta que formou minha personalidade. Em 2019 terminei minha graduação em Direito, e não me imaginava desenvolver um trabalho de conclusão de curso distante da minha paixão, ainda que pra muitos não parecesse existir pontos em comum entre ambos. Dei uma sorte tremenda em encontrar um orientador de projeto tão louco por automobilismo quanto eu e que topou tal ideia inédita na faculdade.
O tema do meu trabalho foi lapidado com muita responsabilidade acima de tudo, e em algo que de maneira genuína também me colocasse como primeira pessoa em uma discussão tão necessária e ainda pouquíssimamente levantada àquele tempo. É ele “Mulheres na Fórmula 1: O caminho machista até o pódio”, tema o qual inclusive cheguei a recusar abordar e que precisei reconsiderar por semanas justamente pelo seu peso e
responsabilidade dentre todas as mulheres do meio, mas foi inspirada por essas mulheres que já têm seus espaços dentro e fora das pistas nesse cenário, e até nas arquibancadas ou do outro lado da transmissão, que decidi falar sobre. E que por mais que tenha em seu título a maior categoria do automobilismo mundial, a verdade é que nele está presente muito além de somente essa.
O subtítulo era apenas uma metáfora enquanto na realidade era abordado todas as faces e espaços e questionado o porquê de insistirem em não nos aceitar como parte igual dentro do esporte. Admito felizmente e me orgulho de ver que desde aquela época algo já vem sendo mudado em relação a
essas imagens e espaços, embora ainda se tenha um longo caminho a frente. Recebi nota máxima em sua apresentação, com indicações para um mestrado na área em que eu pudesse continuar a desenvolver o tema, publica-lo como artigo ou até mesmo, como livro, e foi aí que me vi com uma missão nesse meio.
Eu era e sou apenas uma fã, mas como fã todos somos importantes para o esporte tanto quanto ele nos é, e esse espaço nos pertence, era importante tratar disso. Porém o início de 2020 não foi fácil para ninguém, e isso acabou atrapalhando alguns dos meus planos também. Mas foi também durante a Pandemia que os meus caminhos no esporte se intensificaram e começaram a ser escritos.
Continuei desenvolvendo meu projeto por 1 ano e meio, até que em 2021 a minha paixão me inspirou a começar a criar conteúdo para redes sociais, o que me fez vencer uma barreira que me bloqueou a vida inteira, a minha timidez. Me convenci a isso por estar divulgando o esporte que eu amo e poderia ajudar outros interessados nesse meio. Através da criação de conteúdo, em poucos meses me veio mais um marco nisso tudo, quando fui contratada como Social Media de um dos pilotos da maior categoria do automobilismo nacional, a Stock Car.
Foi um sonho se realizando, trabalhar na área, oportunidade essa que me ajudou a conhecer um pouco mais do meio e sou muito grata a ela, mesmo que ainda infelizmente de maneira remota, já que moro em Pernambuco e nunca havia ido se quer a um autódromo antes. E aí está mais um bom ponto, ainda que tenhamos bons representantes e uma extensa quantidade de campeonatos, infelizmente o esporte no Nordeste ainda não é tão enaltecido e por tantas vezes nem apresentados a nós mesmos, e isso é mais uma barreira que tento quebrar. Também graças aos meus conteúdos eu me tornei comentarista de Fórmula 1 em uma web radio ainda naquele ano.
No passado ano de 2022, veio mais um marco na minha vida com o automobilismo. Tudo se deu após uma visita a um kartódromo na Paraíba, que também marcou minha primeira ida a um kartódromo. Depois daí virou tudo uma bola de neve que vem se embolando até hoje e sem freio, que eu provavelmente nem saberia como parar ainda que quisesse.
Quando souberam dos meus conteúdos, os responsáveis pelo kartódromo me convidaram para participar das transmissões de campeonatos que acontecem lá, e no mês seguinte os organizadores de campeonatos de rental junto ao próprio kartódromo me propuseram o projeto, que era inacreditável pra mim, e um tanto louco, de que eu me tornasse piloto também. Aí vamos aos fatos que preciso mencionar, mesmo aos 25 anos, eu não tenho se quer carteira de motorista, o que talvez seja uma falha de coerência vindo de uma fã de automobilismo, mas isso decorria da minha falta de coragem e medo de dirigir. E a essa altura qualquer um percebe que coragem definitivamente não é um traço da minha personalidade, assim como qualquer coisa que me desafie, mas me pego sendo hipócrita mais uma vez ao admirar tanto um esporte que vai contra isso tudo, já que o próprio automobilismo é sobre se desafiar e pular com tudo pra enfrentar seus medos e testar seus limites.
Afinal, o sentimento que regeu a minha curiosidade para ver uma corrida foi justamente regida pelo medo e receio em relação ao esporte, e era esse justo mesmo medo o que me pegava agora. Porém com um agravante decisivo, a vontade de experimentar já havia sido plantada em cada célula do
meu corpo.
Além disso, foi exatamente enfrentando meus medos e saindo da minha zona de conforto que eu comecei a criar os conteúdos que mudaram a minha vida, então o kart era mais um salto pra fora desse espaço. É obvio que eu toparia, ou talvez nem tão obvio assim. Fazia parte também de um sonho que nunca imaginei poder realizar por não achar que era capaz, e ali estava a oportunidade. Inicialmente o projeto de me transformar em piloto contaria com 12 corridas em três datas no semestre que seriam um campeonato completo.
Mas o que eram apenas um campeonato se tornaram cinco, e as 12 acabaram totalizando 40 no final da temporada. Isso tomou o meu semestre, com treinos semanais e corridas praticamente todos os finais de semana. Eu estava vivendo o automobilismo na pratica, como eu costumava acompanhar pela TV. Minha primeira corrida aconteceu no final de julho, quando eu tinha apenas duas semanas de aula de kart e meu desempenho foi condizente com de um filme de comedia, mas tudo faz parte da evolução, que é comum do esporte.
Na minha última corrida da temporada, em dezembro, fui Campeã da categoria feminina de um dos campeonatos. Também por causa da criação de conteúdos, esse ano pela primeira vez eu pude assistir o GP de São Paulo ao vivo. Os planos eram feitos todos os anos anteriores, mas nunca
conseguiam se concretizar, até 2022! Até hoje as lembranças daqueles dias me parecem sonhadas. Eu estava acompanhando de perto a categoria que mudou a minha vida justamente num ano onde essas mudanças estavam mais aparentes.
De volta ao início desse texto, agora vocês talvez entendam quando eu digo que minha vida se moldou em torno de um esporte que eu conheci por curiosidade, e isso é até onde uma paixão pode levar. Infelizmente ouvi por mais vezes do que gostaria de admitir que esse lugar onde me encontro não é pra mulheres, ditas nem sempre da maneira mais direta, assim como também que aqui no Nordeste não é lugar para isso de automobilismo. Coisas que para mim, como mulher e nordestina não fazem sentido pois como poderia não ser para mim um lugar onde me sinto extremamente confortável e que me faz feliz? A minha paixão por automobilismo fez eu me conhecer e evoluir como pessoa em sentidos que eu nem
imaginaria, e ainda é difícil prever até onde isso vai dar porque é apenas um começo.
Mas é melhor assim, todo começo é uma linha de partida para milhões de possibilidades e não há nada mais promissor do que uma empolgação do que um começo. Então, que se apaguem as luzes vermelhas.
1 Comment
Adorei o texto!! Encantador e muito motivador!