Uma das maiores dores de cabeça para pilotos e equipes que a dupla KERS e DRS trouxe para a F-1 foi na regulagem da caixa de câmbios. Mais do que uma questão de acertar ou errar, a maneira como cada piloto regula suas marchas se tornou uma estratégia, que deve levar em consideração as características da pista e do carro.
A grande questão da F-1 atual é como trabalhar com a adaptabilidade. Com o carro em regime de parque fechado e sem poder sem mexido desde antes da classificação, é necessário equilibrar vários fatores para que ele seja rápido com pneus de compostos e usos diferentes, para que lidem bem com o tráfego e andem forte ao ar livre e, principalmente, mantenha-se estável com cerca de 160kg, no início da corrida, ou menos de 10kg de combustível, em classificação e nas voltas finais.
Pior, com o advento de KERS e DRS, em determinados momentos o carro ganha 1.000 giros no final de uma reta, dependendo do circuito. Isso acontecerá certamente na classificação, mas é mais difícil de prever na corrida, pois fatalmente haverá diversas voltas em que a DRS não poderá ser utilizada pelo piloto.
Para um motor que trabalha com limitação de 18.000rpm, isso significa que o piloto deixará de ganhar velocidade assim que atingir esse limite ou, na linguagem das corridas, bater no limitador. Além disso, e mais importante do ponto de vista das equipes, o motor sofrerá um estresse de 15 a 20% maior.
É para evitar que isso ocorra que as equipes trabalham com o câmbio. Ao configurar marchas mais longas, diminui-se o risco de bater no limitador. Até aí, sem segredos. O problema é que, principalmente em circuitos mais de alta velocidade, isso pode comprometer o tempo de volta.
Basicamente, optando-se por marchas mais longas, o carro continua ganhando velocidade durante toda a reta, mas demora mais a fazê-lo. No caso contrário, as marchas mais curtas facilitam a retomada de velocidade, mas fazem com que o limitador entre em ação.
É lógico uma equipe escolher o caminho que lhe favorece do ponto de vista de tempo de volta, colocando na balança outros fatores – quem tem pouca carga aerodinâmica, por exemplo, tende a trabalhar com menos asa para ganhar nas retas, já que faz as curvas mais lentamente – mas o problema é planejar a corrida tendo em vista estas configurações.
Isso porque, mesmo com DRS e KERS, é improvável que um piloto ultrapasse com o motor no limitador. Isso acontece claramente quando vemos um carro pegando o vácuo mas, quando coloca de lado, parece que perde o “mojo”. Na verdade, é o motor que não tem mais força para empurrar, pois já está limitado.
Tudo depende basicamente de onde você pretende se classificar, e um grande exemplo disso foi a configuração escolhida por Sebastian Vettel em Monza. O alemão tinha um carro no chão, o que facilita no equilíbrio nas saídas de curva. Porém, perde na velocidade final de reta. A opção foi, portanto, trabalhar com marchas mais curtas para já estar longe o bastante dos rivais quando batesse no limitador. O que seria a defesa perfeita acabou o ajudando na ultrapassagem sobre Alonso: saindo com mais ação nas retomadas de velocidade, foi para cima do espanhol antes do final da reta pois, se tentasse uma manobra “tradicional”, fatalmente bateria antes no limitador e ficaria preso.
Foi o que aconteceu com Hamilton na mesma prova. O inglês era claramente mais rápido que Schumacher, mas quando o piloto da McLaren se aproximava, estava longe demais da freada para tentar a manobra. Desse ponto em diante, como o alemão havia apostado em priorizar a velocidade de reta, conseguia respirar, pois continuava ganhando velocidade, enquanto o inglês batia no limitador.
O duelo entre Felipe Massa e Nico Rosberg em Spa é outro bom exemplo. Trabalhando com marchas curtas, nem a velocidade extra da DRS é suficiente para ultrapassar um carro razoavelmente equilibrado e equipado com o motor Mercedes.
Por mais que a F-1 seja recheada de botões hoje, trata-se de um acerto físico, é uma questão de estratégia que sempre terá um lado negativo. Não é todo mundo que, como Vettel mostrou na Itália, pode se dar ao luxo de acertar o carro de uma maneira que teoricamente é menos eficiente para lidar com o tráfego e, ainda assim, ganhar corridas.
8 Comments
Na ultrapassagem do Vettel sobre o Alonso, o espanhol foi criticado por espremer o alemão para fora da pista, mas na verdade era o único modo que ele conseguiria ultrapassar com essa regulagem de câmbio. O Vettel é que foi ousado.
Como 2011 foi o primeiro ano de uso do DRS, as equipes meio que foram “surpreendidas” com esse problema do motor atingir o limitador de giro quando da asa aberta e acréscimo de 15 a 20 km/h de velocidade final. Eles devem ter utilizado o setup básico do carro dos anos anteriores.
Acredito que este ano, já terão parâmetros suficientes para usarem nos simuladores e escolherem as melhores relações de marcha.
Será que há alguma proibição da FIA pata o desenvolvimento de um câmbio com uma 8ª marcha?
Sim, os câmbios podem ter de 4 a 7 marchas, além da ré, de acordo com o regulamento.
Excelente texto…parabéns.
Ju,
Mais uma vez parabens pelo seu texto !!!
Uma aula para muita gente , queria tanto que os nossos jornalistas e meios especializados tivessem algumas Juliannes escrevendo para eles, imagina vc escrevendo para o pessoal do site grande premio, fabio seixas, teo jose , flavio gomes enfim… que bom que temos ao Total Race !!!
Muito obrigado !!!
“Sentimos” esse problema jogando F1 2011! Parabens pelo post!
Parabens pela matéria.Só acho que Vettel tinha margem de manobra pra optar pelo acerto que achasse melhor.Quanto a importancia do piloto nessa questão, é um pouco contrverso, porque muitas equipes usam pilotos sem experiencia na f1 pra ajustes nos carros quando podem treinar.Os engenheiros e softwares são muito mais importantes que o piloto, infelizmente.
Ju, unindo o post anterior a esse, tendo em vista a necessidade da durabilidade dos motores, você acha que a liberdade de rotações do motor, tendo que haver o limite de durabilidade, não seria mais indicado para apimentar as disputas, sendo muito mais natural ,empolgante e barato que kers e asa móvel por exemplo?
Wagner, chegou um momento em 2004, 2005 que os carros tinham se tornado “monstros” rápidos demais – e caros demais também. Houve essa opção por restrições para, de uma maneira torta, manter o DNA de inovação sem prejudicar o negócio e a segurança. Restringiram para que o direito de cada uma fazer seu carro continuasse e acredito que a linha de pensamento em congelar os motores do que os construtores seja o caminho mais adequado.