Ao final do GP da China, Hamilton perguntou a Rosberg se ele tinha feito alguma ultrapassagem. O alemão deu de ombros. Não fora necessário. Enquanto isso, a dupla da McLaren narrava a mão de obra que haviam tido para chegar naquele pódio. “Teve uma hora em que éramos oito na reta”, contava Button. Uma regra dos tempos de Pirelli havia sido quebrada. A grande marca das estratégias no ano passado foi o abismo que se formava por vezes até antes da primeira parada atrás dos cinco, seis primeiros, permitindo que os ponteiros fizessem três pit stops, independentemente do que os carros de Mercedes para trás escolhessem, e ainda assim fugissem do tráfego.
O fim desse abismo de performance foi o que, ao mesmo tempo em que decidiu a corrida em favor de Rosberg, provocou um dos finais mais animados dos últimos tempos.
Fazer três paradas só é mais efetivo que duas se for possível extrair o máximo do carro o tempo todo. A necessidade de poupar pneu é menor e o ritmo na pista tem de ser ao menos cerca de 20s mais rápido. Algo difícil quando há ultrapassagens a serem feitas.
Matin Whitmarsh reconheceu que dois fatores surpreenderam a McLaren: a equipe esperava que mais pilotos fizessem três paradas, o que aliviaria o tráfego, assim como não previam que o pneu médio renderia tão bem, dois fatores que deram vantagem à estratégia de duas paradas.
Não que parar três vezes tenha sido um erro abissal. Muitas equipes o fizeram por terem usado os pneus macios logo no Q1 e reutilizado essa borracha na primeira tentativa do Q3. Como ela foi a melhor devido à queda da temperatura da pista, acabaram tendo de largar com pneus de 6 voltas, como foi o caso das McLaren, enquanto as Mercedes tinham jogos mais novos.
Ainda assim, a vitória de Button não era impossível, mesmo que bastante difícil: sem o erro do pitstop, o inglês voltaria a 14s de Rosberg com um pneu 5 voltas mais novo e a 17 voltas para o final. Os seis segundos perdidos no pitstop o fizeram voltar no meio do pelotão, algo que não teria acontecido em uma parada normal. Se já era difícil tirar os 14s, ainda mais porque o ritmo de Rosberg no último stint foi forte, a missão se tornou impossível com carros rápidos à frente.
Duas paradas no meio do pelotão: Raikkonen, Massa, Senna
Tudo isso leva à pergunta: por que a estratégia de duas paradas não funcionou tão bem para pilotos como Raikkonen, – não incluo Vettel pois, ainda que tenha perdido três posições no final, o alemão pulou de 15º na primeira volta a 5º com sua tática – Massa e Perez?
A questão não foi apenas acertar o número de paradas, mas também lidar com o desgaste dos pneus no tráfego, com o qual Rosberg não precisou se preocupar, e a divisão dos stints. Em outras palavras, se a tática de duas paradas foi a melhor para vencer, talvez não tenha sido a mais adequada para lutar no meio do pelotão.
A maioria apostou no macio-médio-médio, enquanto Massa fez o contrário. Até fazia sentido ganhar o máximo de posições parando uma vez menos e tendo o melhor pneu no final, mas ultrapassar com aqueles restos de borracha provou ser uma tarefa inglória. Massa fez a última parada praticamente junto de Kobayashi, saiu 5s atrás do japonês e assim se manteve até o final. A diferença foi que o piloto da Sauber conseguiu passar Di Resta e herdou posições de Raikkonen e Perez, que caíram no final, sem pneus. Massa ficou atrás do escocês, provavelmente pela falta de velocidade de reta – só cinco carros eram piores que o do brasileiro no quesito.
Foram vários os problemas de Raikkonen, que o levaram a cair de segundo a 14º em três voltas. Talvez ainda indecisa em relação à estratégia, a Lotus parou o finlandês na volta 10 para evitar o undercut de Webber e Alonso, ainda na décima volta – lembrando que o australiano arriscou, parando na volta 6, marcando melhores voltas e atraindo os rivais. Em dia no qual as paradas na ponta ficaram de 20.0 a 20.5, os 21.4 de Kimi não ajudaram e foram decisivos para que voltasse lutando por posição com Webber.
Raikkonen pararia pela segunda vez uma volta depois de Alonso – que fez um pit a mais. Esse foi o ponto crítico da corrida do finlandês que, com mais uma parada em 21s5, voltou atrás de Massa. Hamilton, Webber e Alonso também o fizeram, mas se livraram do brasileiro rapidamente, algo que o piloto da Lotus não conseguiu fazer. Foram 12 voltas praticamente colado em seu ex-companheiro, que só foi superado quando parou. Assim, o excesso de voltas no terceiro stint (28, mais do que qualquer outro piloto) + tráfego foram decisivos para que seu pneu acabasse. O que também acredito ter influído é a pouca experiência de Raikkonen com os Pirelli. O que aconteceu com ele é a clássica “queda do precipício”, como os ingleses se referem ao momento em que a borracha acaba. Talvez pilotos com mais tempo nesses pneus tivessem previsto isso e mudado a tática.
Outro fator ficou claro em Raikkonen, Grosjean e Alonso– pelo menos! Parece que o pneu, depois de pegar os pedaços de borracha fora da trajetória, chamados “marbles”, não se recuperava por completo. Por isso o ritmo dos três caiu e manteve-se relativamente ruim após escapadas.
Prova de que erros sutis salvaram ou acabaram com corridas é Bruno Senna. O piloto vinha bem, andando no ritmo de Vettel, que estava na mesma estratégia. Porém, seus tempos de volta caíram a partir da volta 26, provavelmente antes da janela prevista pela equipe para sua parada. Após ter sido superado em apenas uma volta por dois carros, a Williams o chamou.
É um compromisso complicado, tendo em vista que pode-se escolher perder tempo no meio e ganhar no final, fazendo menos voltas no último jogo de pneus, ou o inverso. A equipe o parou na volta 29 e ele ainda assim andou bastante (27) no último jogo. Porém, diferentemente de Raikkonen, correu sozinho na partir inicial deste stint, o que ajudou a manter os pneus em melhor forma. E, no final, foi inteligente ao deixar Grosjean passar e não insistir na briga, pois sabia que o stint era longo demais. Aliás, tudo causado pelas míseras 12 voltas no pneu médio no início da prova, resultado do toque com Massa na primeira curva e do consequente desequilíbrio do carro, algo corrigido na primeira parada com um ajuste na asa dianteira.
10 Comments
Muito bom, Ju.
Assim dá pra entender perfeitamente (ou quase) como esses pneus estão trabalhando.
Um baita quebra cabeças para todos, imagino.
Abs
O melhor das colunas da Juliana é que ela foca na competição como um todo, e não só em um ou outro piloto. Assim a gente entende muito melhor o quadro geral…
Preciosa análise. Fico pensando como deve ser isso em tempo real, os chefes tomando as decisões. Por isso são tão bem pagos.
Ah, uma coisa. Seu nome está com a grafia errada no menu principal, está Blogs->Julianne Cesarolli. Engraçado que sempre li assim, foi ouvindo o credencial do Ico que percebi que era diferente.
Ansioso pelo post das narrações, só vi pela BBC no outro dia por causa da madrugada.
Já avisei o pessoal de web a respeito disso, obrigado.
Estou com um pequeno problema com o post das transmissões, pois não estou conseguindo ter acesso à TV espanhola. Vou escrever apenas com Globo e BBC, infelizmente!
Como voce acessa aas transmissoes? Eu adoraria poder ver a da BBC… :-/
Baixo via torrent, não é difícil encontrar. Inclusive, estou escrevendo agora mesmo o post das transmissões. Assisti a BBC desta vez, não a Sky. Gostei muito mais e recomendo.
Muito bacana o texto. Finalmente consegui descobrir o que aconteceu com o Raikkonen.
Aliás, penso que o fato de o Massa ter segurado Raikkonen e outros pilotos durante algumas voltas da corrida foi o fator principal para o grande número de ultrapassagens no final. Vários pilotos conseguiram se aproximar com a vacilação do Kimi em ultrapassar o brasileiro, formando um “trenzinho”.
Esses pneus induzem ao raciocínio, tanto de pilotos quanto equipe de boxe, mas fico imanginando, salvo o caso de se largar na pole, e poder controlar a velocidade/desgaste, em uma pista que possibilita ultrapassagens, as vezes parar menos é prejuízo, afinal do que adianta parar menos como Raikknen e Vettel, e terminar a prova rastejando? Esse ingrediente dos pneus é uma corrida a parte, e de tudo, prefiro esses pneus do que os “eternos” Bridgestone.
Nossa menina!!!, que bela interpretação da corrida. Concordo plenamente contigo. Creio que poderiamos acresentar ao analisis o fato da baixa temperatura, com uma temperatura 10 graus a mais os efeitos e resultados serían diferentes.
A análise das estratégias é como ver uma outra corrida!
Ao vivo, é muito difícil perceber tudo o que está acontecendo e é muito fácil cometer um equívoco, como as equipes cometem.
Não tenho a menor saudade das corridas com pneus indestrutíveis da Bridgestone, em que quase nada acontecia a não ser uma ou outra troca de posição nas paradas de boxes para reabastecimento.