A F1 só tem piloto de família rica? - Julianne Cerasoli Skip to content

A F1 só tem piloto de família rica?

O automobilismo é um esporte caro. E que se desenvolveu de forma que é esperado que os próprios pilotos tragam consigo um pacote de patrocínio e talento, ainda que o equilíbrio dessa fórmula admita quantidades diferentes de um ou de outro. Só com talento ou só com dinheiro, é difícil chegar a algum lugar. Mas será que isso quer dizer que a F1 só tem piloto de família rica?

É claro que juntar dinheiro e talento é só o começo da história. Para atingir a excelência ou chegar perto dela, talento só não fecha a conta e é necessário muito treino, muito aperfeiçoamento. E, com a profissionalização do esporte, e especialmente um esporte que não é individual, passou a ser possível ‘comprar’ qualidade.

Lance Stroll é um ótimo exemplo. Quem olha a carreira do canadense, vê títulos e um talento precoce. Na F1, vê um piloto que começou com só 18 anos e que evoluiu com o tempo, fez pódios, pole position com condição de pista complicada. São fatos.

Lance Stroll tem uma equipe multidisciplinar ao seu dispor, e vem evoluindo com isso (Foto: Aston Martin)

Mas, por trás disso, você tem um pai bilionário que se certificou de que as equipes pelas quais ele correu nas categorias de base tivessem os melhores profissionais e ferramentas possíveis – e que seus companheiros fossem proibidos de batê-lo. E, na F1, Lance desde o início conta com um programa multidisciplinar com pelo menos seis profissionais trabalhando só para que ele se desenvolva da melhor maneira possível. Enquanto o pai segue mexendo os pauzinhos para que ele tenha carros mais competitivos.

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É só assistir a um vídeo onboard de Stroll e ouvir sua comunicação com os engenheiros para ver que suas limitações são bem claras, ainda que os resultados não sejam tão ruins assim.

Ou seja, é possível ‘comprar desempenho’ e veremos com o exemplo de Lance qual o limite disso. Mas ele existe.

Vira e mexe ouvimos por aí que a ‘’cada vez mais’’ a F1 é restrita a Strolls e, de fato, chegamos a ter três filhos de bilionários no grid: o canadense, seu compatriota Nicholas Latifi e Nikita Mazepin. Os três com pais que ‘compraram qualidade’. Mas essa é uma reclamação antiga, que veio junto do crescimento dos gastos e da glamourização do esporte especialmente a partir dos anos 1980. A diferença é o que a tecnologia permite para o futuro desses pilotos.

F1 hoje depende menos de milionários

Por outro lado, é um cenário que vem se transformando com o teto orçamentário. As equipes estão menos dependentes do dinheiro trazido pelos pilotos, ao mesmo tempo em que custa caro ter alguém que destrua o carro fim de semana sim e fim de semana também.

Prova disso é o cenário atual. Todos os pilotos do grid precisaram pelo menos de um mecenas para chegar onde estão. Para encontrar este mecenas (provavelmente mais que um na carreira), precisaram estar no lugar e na hora certos (primeiro em campeonatos nacionais, depois indo para as principais ligas europeias, e não surpreende que a maioria venha do continente) e aprenderam a lidar com a pressão (de ser de uma família ligada ao automobilismo ou de depender de resultados para manter os patrocínios). E, por fim, ter uma mãe cabeleireira parece ajudar (e você vai ter que ler até o fim para entender como!).

O fato é que, ou você tem uma família muito rica e bem conectada, ou você conhece pessoas e empresas ricas e conectadas. Não há muito lugar para o romantismo no automobilismo.

Qual a origem dos pilotos do grid de 2025 da Fórmula 1? 

Gabriel Bortoleto: Seu pai, Lincoln Oliveira, fez dinheiro no ramo das telecomunicações e depois passou a investir em automobilismo, comprando a Stock Car Brasil. Esse envolvimento e condição financeira deu a Gabriel a plataforma para ir morar cedo na Europa e ter as conexões necessárias para crescer no mundo do automobilismo. Unindo bom orçamento com resultados, chegou à F1.

Nico Hulkenberg: O pai de Hulkenberg é empresário e tem uma empresa de transporte. O piloto, inclusive, foi treinado para trabalhar no negócio do pai. Ele teve sucesso logo que começou no kart e chamou a atenção de Willy Weber, ex-empresário de Michael Schumacher. Isso abriu portas para ele ter o apoio de marcas ligadas ao empresário.

Esteban Ocon: filho do dono de uma mecânica pequena, que ficava no mesmo lugar onde a família morava. Eles venderam a casa para comprar um motorhome, com espaço para os equipamentos de kart e os quatro membros da família, e viajavam de circuito em circuito. Ocon precisou do apoio da Mercedes para seguir a carreira e chegar à F1.

Oliver Bearman: vem de origem rica, mas não multimilionária. Seu pai é o CEO de uma empresa de seguros multimilionária (a Aventum, que o patrocina) e seu irmão também é piloto. Ele frequentou colégios bem cotados na Inglaterra e foi cedo para a Itália para se dedicar à carreira. Entrou no radar da Academia da Ferrari, que apoiou seus últimos anos de carreira e facilitou a entrada na F1.

Yuki Tsunoda: O pai de Yuki Tsunoda, Nobuaki Tsunoda, foi seu mecânico por toda a carreira e é um grande entusiasta do automobilismo, tendo competido em eventos menores no Japão. Na verdade, foi depois de ver o pai competir que Yuki decidiu ser piloto e, quando eles iam ver as corridas, o pai mostrava as linhas de cada piloto (sempre destacando Fernando Alonso, que admirava). A carreira meteórica de Tsunoda na Europa tem a ver com o fato de que, sem o apoio da Red Bull, ele sabia que não teria como se manter fora do seu país, já que sua família não teria dinheiro para mantê-lo.

Isack Hadjar: A família francesa/argelina de Hadjar tem vários profissionais de educação/ciência e não era seriamente ligada ao automobilismo até o piloto demonstrar interesse pelo esporte, aos 6 anos. Seu pai até fez algumas corridas como amador, mas se dedicou à ciência e é PhD em física quântica. Trata-se de uma família de classe média para os padrões franceses, e Hadjar foi se apoiando em projetos de apoio para conseguir seguir a carreira. Foi contratado pela Red Bull em 2021.

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Alex Albon: O pai e o tio de Albon são ex-pilotos. Eles são ingleses. A mãe é tailandesa, e a razão para ele correr com a bandeira do país asiático, além de um distanciamento em relação ao pai. Mas essa também foi uma estratégia para se diferenciar dos outros e conseguir patrocínio, já que a família não tinha dinheiro para sustentar sua carreira. A mãe, inclusive, ficou presa por três anos devido a um esquema de pirâmide com carros de luxo. Alex tinha 12 anos e era o mais velho de cinco filhos, que ficaram aos cuidados do padrasto.

Carlos Sainz Jr: Filho de Carlos Sainz, campeão do Mundial de Rali e do Rally Dakar, o que lhe ajudou a abrir caminho com a Red Bull mesmo passando por cima da autoridade de Helmut Marko. Isso acabou o tirando do programa eventualmente, mas suas performances e as conexões de Carlos sênior lhe ajudaram a se firmar na F1.

Pierre Gasly: Vem de uma família de classe média alta (o pai lida com produtos têxteis) de enorme tradição no automobilismo. Sua avó foi campeã de kart regional nos anos 1960, seu pai e tios competiam de modo semi-amador. Ele e Ocon inclusive frequentavam a mesma pista de kart. Correndo com o apoio da Red Bull, chego até a F1.

Jack Doohan: Outro exemplo da junção de dinheiro e conexões. Ele é filho de uma das grandes lendas do motociclismo, Mick Doohan, e começou a correr quando ganhou um kart de Michael Schumacher. Ele sempre correu por equipes boas e foi contratado pela Alpine como reserva em 2023, durante seu último ano de F2.

Fernando Alonso: filho de um engenheiro que trabalhava com explosivos em minas e de uma atendente de loja de departamento. Por toda a carreira no kart dependia do dinheiro de premiação pela vitória de uma etapa para estar na outra.

Lance Stroll: Filho do bilionário Lawrence Stroll, que fez fortuna no setor de moda, recuperando marcas famosas que enfrentavam períodos de dificuldade e depois vendendo sua participação com lucro alto.

Oscar Piastri: Os avós de Piastri eram mecânicos, e seu pai também cuidava de seus karts em seus primeiros anos. Paralelamente, ele montou uma empresa especializada em diagnóstico de reparos para veículos. É uma família rica o para lhe dar uma boa educação na Inglaterra (aonde ele se mudou quando passou do kart para os carros de fórmula, estudando em um internato particular) e também ajudar na carreira. Mesmo quando ele estava na academia da Alpine, seu pai ainda bancava parte do programa de testes.

Lando Norris: Filho de um milionário que fez fortuna como assessor no ramo de aposentadorias. Adam Norris se aposentou aos 36 anos ao vender sua empresa por 250 milhões de dólares.

Charles Leclerc: Filho de um piloto de F3 cuja carreira não foi para frente devido à falta de investimento e que tinha uma empresa de painéis de sinalização. Eles respiravam automobilismo e dois dos filhos acabaram se tornando pilotos, mas se trata de uma família de classe média dentro dos padrões monegascos. A mãe era cabeleireira.

(Foto: Instagram)

Lewis Hamilton: Filho de uma cabeleireira com um engenheiro de computação que trabalhava na companhia de trens da Inglaterra. Anthony Hamilton, filho de imigrantes caribenhos, acabou acumulando três empregos para financiar a carreira do filho no kart. A realidade de karts e pneus de segunda mão mudou quando o piloto chamou a atenção da Mercedes, na adolescência, e passou a ser financiado pela marca alemã.

George Russell: Filho de um empresário que cuidava de uma grande fazenda que cultiva ervilhas e feijão, e que foi seu mecânico na época de kart. Seu irmão mais velho também chegou a competir no kart em nível nacional e sua mãe trabalhou como cabeleireira. Pelo nível de educação formal dele, é uma família de classe média alta.

Andrea Kimi Antonelli: Uma combinação de família com dinheiro e do ramo do automobilismo, Antonelli foi quase destinado a ser um piloto rápido. Após colecionar vitórias no kart, sempre correndo com boa estrutura, chamou a atenção da Mercedes, que não quis cometer o mesmo erro da época de Verstappen e tratou de acelerar seu caminho para que ele chegasse à F1 o quanto antes, como seu pai, o ex-piloto e chefe de equipe Marco, desejava.

Liam Lawson: Está entre os pilotos que tinham uma família mais “normal”, sem condições de bancar sequer uma carreira no kart tranquilamente. Tanto, que eles tiveram que vender a casa para financiar a carreira de Lawson na Nova Zelândia. O pulo do gato para ele foi uma competição nacional a Toyota Series (que hoje é a Fórmula Regional da Oceania), que costuma atrair talentos europeus por ser realizada no inverno no hemisfério norte. Lawson foi companheiro de um piloto apoiado pela Red Bull, impressionou Marko, e conseguiu um contrato que permitiu que ele corresse na Europa.

Max Verstappen: Filho do ex-piloto de F1 Jos e da piloto Sophie Kumpen. O investimento trazido pelos Verstappen ao kart e o profissionalismo com que a carreira de Max foi tratada logo cedo ajudaram a aumentar o investimento na base. Logo que saiu do kart, já era disputado por Mercedes e Red Bull.

7 Comments

  1. Minha mãe era cabeleireira… e F1, só por aqui e na TV. Hehehe…
    Julianne, parabéns pelo novo passo adiante em sua carreira, Desejo muito sucesso!
    Para nós, filhos de cabeleireiras que não competem, precisamos de um bom jornalismo como o seu. 🙂

  2. Olha só, Alonso, Hamilton e Vettel… os maiores campeões dos últimos anos eram de classe média… Vettel filho de carpinteiro, Hamilton filho de cabeleireira e Alonso filho de vendedora…

  3. Matéria mostra claramente as mudanças no perfil de um piloto da era “romântica” dos Cosworth para a F1 cibernética dos Flechas Negras

  4. Olha só… não deixa de ligação. Cabeleireira “mexe” com a cabeça das pessoas e com os filhos “mexeu” de tal forma que os tornaram vencedores.

  5. Afinal para se ser piloto de F1 basta ser filho de uma cabeleireira. Brincadeiras à parte, é lógico que o automobilismo é um desporto caro e que não está ao alcance de qualquer um.
    Para além dos pilotos que são filhos de milionários, há os pilotos filhos de pilotos. Será que o Mick Schumacher estaria agora na F1 se não fosse filho de quem é?

    Cumprimentos

    visitem: https://estrelasf1.blogspot.com/

  6. Só que a conexão do Checo ajudou muito com ele tendo um dos homens mais ricos do mundo o patrocinando.

  7. Sim é isso mesmo, porém como eles, tem centenas de pilotos financiados pela família ou algum Sponsor Amigo. Os de fórmula 1 Ativos são algumas dezenas sorteados pela Deusa da Sorte mas também que tem qualidades indiscutíveis e sem elas não estariam onde estão, só o dinheiro não dá mesmo. Qualquer profissão para ter sucesso precisa de enorme dedicação e sacrifícios à Fazer e non é só precisa ter un feeling con a profissão dos seus sonhos, é bom ter sonhos mas só sonhar não adianta nada.


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