F1 Centenário de Hamilton, expectativas e desencontros - Julianne Cerasoli Skip to content

Centenário de Hamilton, expectativas e desencontros

Lewis Hamilton largou pela 100ª vez na F-1 no último final de semana, em Hockenheim, em um momento delicado da carreira. Não que o inglês esteja andando mal ou tenha irreparavelmente manchada sua relação com a equipe que defendeu por todas as provas de que participou na categoria, mas, olhando para trás, ele certamente esperava ter conquistado mais – e que a McLaren lhe desse melhores condições para isto. Por outro lado, sabe que uma aposta que esteja fora da esfera das três que vêm disputando vitórias nos últimos três anos pode ser um tiro no pé.

Hamilton chega à 100ª corrida com ótimos números. São 18 vitórias, 21 pole positions (pouco mais de um quinto das provas que disputou) e 11 voltas mais rápidas. O inglês chegou ao pódio em quase metade dos GPs (46, sendo 16 segundos lugares e 12 terceiros). Por 79 vezes, cruzou a linha de chegada entre os 10 melhores (o que seria a zona de pontuação hoje, mas não em seus primeiros anos na F-1). São 12 abandonos, a grande maioria por incidentes – a primeira vez que o inglês teve uma falha técnica que o fez sair da prova foi em Abu Dhabi 2009.

Uma boa base de comparação é Sebastian Vettel, que teve um ano em equipe pequena, mas em compensação outra temporada com um carro cujo domínio Hamilton nunca experimentou. Em 91 GPs, foram 22 vitórias, 33 poles e 39 pódios.

O quanto dos bons números de Hamilton tem a ver com o carro que teve em mãos e o quanto sua habilidade fez a diferença é difícil precisar. O fato é que a carreira mais longa de um piloto numa mesma equipe na história – compilando aqueles que nunca trocaram de time – sempre foi calcada em uma dependência mútua: nessas cinco temporadas e meia, a McLaren nunca teve um carro dominante a ponto de poder descartar o talento inegável do inglês, ao passo que Lewis sabe que está na equipe que sempre está entre as melhores e tem orçamento para continuar no mesmo ritmo.

Mas o que é curioso destes 100 GPs de Hamilton é o desencontro entre expectativas e realidade. Lembremos que Lewis conquistou nove pódios nas nove primeiras provas na F-1, algo que nenhum de seus então concorrentes pelo título (o companheiro Alonso, Raikkonen e Massa) conseguiu e terminou aquele ano de 2007 com 12 pódios em 17 possíveis. Fez largadas destemidas – quem não lembra do impacto de suas quatro primeiras largadas na F-1? – e teve vitórias marcantes, como no Canadá, tendo de controlar da ponta um GP tenso, com quatro intervenções do Safety Car. Isso, sem contar nas ultrapassagens, sendo a mais marcante para mim em Raikkonen, em Monza. Naquela época, eram muitos os que calculavam que, quando chegasse aos 100 GPs, seria ao menos tricampeão do mundo.

As últimas duas provas daquele ano, por outro lado, deram sinais do outro lado de Lewis Hamilton: a luta desnecessária com Raikkonen na China, que levou a um excessivo desgaste de pneus e, em última análise, à perda daquele título se tornaram uma marca do inglês, que não demonstra entender o momento de ceder. Isso quase lhe tiraria o título de 2008, notadamente na afobação na largada no GP do Japão. Em 2009, esteve fora da disputa, mas ainda assim exagerou, como na volta final no GP da Itália. No ano seguinte, correu riscos desnecessários quando liderava o campeonato, também em Monza e, depois de zerar também na prova seguinte, após outro toque, saiu do páreo.

O ano de 2011 seria seu ponto mais baixo da carreira, após uma série de incidentes inexplicáveis e uma estranha apatia fora das pistas. Lewis nunca negou que deixou a má fase na vida pessoal entrar na pista e prometeu ser um novo homem neste ano. De fato, na maioria das provas tirou o máximo que a McLaren poderia dar e sabe que teria muitos pontos a mais não fossem os erros nos pitstops que atrapalharam pelo menos cinco de suas provas. Além disso, mostrou evolução no trato com os pneus e deixou claro que não é apenas um piloto que acelera.

Porém, a metamorfose está longe de ser completa e, com cinco temporadas e meia nas costas, é de se pensar se um dia poderemos dizer que Lewis está correndo pensando no campeonato ou tendo uma visão macro. Após 100 GPs, sabemos que aquele Hamilton de 2007 era exceção e dependia muito das características das regras – pneus mais duros e reabastecimento, o que favorecia estilos mais agressivos. Agora sabemos que Lewis é Lewis: ao mesmo tempo em que podemos esperar uma performance de gala, é melhor nunca duvidar que tudo pode ir por água abaixo num estalar de dedos. Afinal, um não existe sem o outro.

10 Comments

  1. Ju, Hamilton é um grande piloto, mas ainda tem que amadurecer a pilotagem. Algo que colocam como talento natural, ainda considero como um diamante bruto, tendo que ser lapidado, para chegar ao racionalismo de um Alonso por exemplo, com equilíbrio entre velocidade e constância. Acredito que uma mudança de ares seria boa para Hamilton, pois às vezes o piloto atrelado à apenas uma equipe, dá a sensação às vezes de sucesso atrelado apenas à “grande equipe”, talvez o desafio de uma Lotus ou Mercedes, seria salutar… como fez Shumacher saindo da Benetton, ou Alonso da Mclaren, ambos buscando novos desafios…Hamilton tem que “encarnar” o pilto camaleão, aquele que dança conforme a música, o regulamento e, nunca o contrário.

  2. Acho que Lewis é um cara genial… Entretanto, falta total tato no lado psicológico. Ele se compara muito com o Senna. Acho que ele é mais parecido com o Mansell… Afobado, pode ser provocado facilmente por um rival, afoito… Mas que tem performaces de gala, isso é inegável… Quando ele tira pra dar show, conduz sua McLaren como poucos pilotos poderiam ser capazes.

    Falta pra ele o que sobra pro Alonso… Saber entender que nem sempre se ganha e as por vezes quando se iria chegar em 10º por acidente, pneu, acerto de carro, sorte, ou qualquer outra coisa, chegar em 5º é sim uma vitória.

  3. É inegável o talento e a velocidade do Hamilton, porém este mesmo talento fez com que ele fosse alçado a estrela muito cedo e ficou uma falha na formação da sua pilotagem.

    Hamilton sempre teve equipamento de ponta e ele aprendeu a levar o carro ao limite ou além dele. Diferentemente de um Alonso que iniciou na Minardi, um carro precário equivalente à HRT atual e com recursos limitadíssimos, mas lá ele aprendeu a tirar o máximo do pouco que tinha.

    Hamilton depende muito das orientações do box para saber o que fazer durante a corrida e não é comum ele questionar ao vivo ou por em dúvida as orientações recebidas do engenheiro de pista. Já Alonso consegue ter uma visão completa da corrida e do campeonato, sabendo o momento exato de atacar e quando ceder. E mesmo nos piores momentos, nunca ataca a equipe, muito pelo contrário, procura proteger os membros mesmo quando erram na estratégia.

    Mas acredito que também há uma falha da McLaren, pois ela banca a sua formação desde o kart e deveria orientá-lo melhor, cercá-lo de pessoas que pudessem lhe ajudar, mostrar os erros e acertos, as consequências dos atos tomados em pista…

    Hamilton ainda é jovem, tem muito a aprender, mas precisa de um bom apoio.

  4. Julianne,

    Justa e isenta a sua análise sobre esse magnífico piloto, infelizmente tão pouco valorizado aqui no Brasil. Por essas e outras, minha blogueira favorita. Hamilton tem um instinto indomável, proporcional à sua extraordinária habilidade natural. Ele é o sal que tempera a F 1 e Kobayashi a pimenta (desde que estrearam). Creio que nunca veremos um Hamilton contido: seu talento deve ser admirado (assim como o de Kamui) pela capacidade que possui de gerar emoções – que é a essência do automobilismo, a meu ver. Naquele incidente de corrida (na minha opinião) em que se enroscou com Maldonado, Lewis definiu tudo, declarando que sempre irá lutar pela posição que estiver ocupando. Quem valorizar títulos e estatísticas irá se decepcionar com ele – Lewis só os obterá se tiver um carro muito dominante, (como já afirmou muito apropriadamente alguém neste blog) – mas quem aprecia as emoções fortes de uma ultrapassagem, de uma recuperação, de uma luta sem tréguas (e até sem sentido rsrsrs) será sempre servido em quantidades generosas. Eu, como um aficionado que não dá valor a estatísticas e números, mas que valoriza a habilidade natural e atuações inesquecíveis, que tem potencial para se tornarem lendárias, considero-me um privilegiado por ver em ação Hamilton, Vettel e Alonso, que compõem hoje uma nova Era de Ouro.

    • capacidade de gerar EMOÇÃO – etc
      TÊM potencial etc.

    • Bravo! Belíssima análise! Também me considero um afortunado por acompanhar essa geração! Espero uma reação ainda esse ano da Mclaren para que tenhamos o mais sensacional campeonato de todos os tempos, com Hamilton, Vettel e Alonso duelando volta a volta, corrida a corrida até o fim do ano. Que os Deuses do automobilismo não deixem que esse campeonato caia nas mãos de um mediano Mark Webber!

      • Caro João Paulo,

        Ótimo ver que você compartilha dessa percepção que estamos vivenciando uma nova Era de Ouro na F 1, proporcionada por esses três jovens pilotos – Hamilton, Alonso e Vettel – que desde precocemente, cada um à sua maneira, vem e vão continuar escrevendo muitas das mais emocionantes páginas da história do automobilismo. Oxalá todos três tenham carros à altura de seus respectivos talentos no restante deste fantástico campeonato. E ainda por cima, contamos com este blog padrão Alonso 2012, com a competente Julianne, que é PhD em pneus, destrinchando o funcionamento dos farelli, que só agora as equipes começam a entender melhor.

        Abraços.

      • Desculpa, mas se o Webber está a frente no campeonato, porque não pode vencê-lo? Não estou defendendo o Webber… Mas pra mim tem que ganhar o campeonato o que mais se sobressair frente os rivais… Não é só talento… Não é só equipe… Não é só carro… É uma mistura, tênue e fantástica a ponto de prender os rivais na cadeira… E garanto que todos ficaram muito presos quando o Webber partiu para o ataque em cima do Alonso, no final do GP da Inglaterra… Eu torço pra que continue assim… Os melhores correndo muito e se sobressaindo… E se tudo der certo, que o melhor vença… E mostre ser o melhor.

  5. Boa noite Julianne gostei da sua análise só não concordo quando você afirma que a metamorfose está longe de ser completa.
    Hamilton vem fazendo um campeonato com uma constância jamais vista , completamente diferente dos anos anteriores , não fosse os erros da mclaren estaria liderando o campeonato com folga só pra te lembrar as 2 corridas em solo espanhol seriam 2 vitórias de Hamilton sem dúvida.Portanto na minha opinião Hamilton mudou sim e pra melhor.
    Abs

  6. Julianne, parabéns por sua análise. A cada novo post fico ainda mais admirado de sua capacidade de análise e sintese.
    Eu sou Fã do Hamilton, gostaria que ele ganhasse mais corridas. Mas, mesmo não conseguindo sempre fico feliz em assistir suas corridas, pois ele nunca fica na burocracia. Creio que ele é pouco valorizado aqui no Brasil, por ter tirado do Massa aquilo que seria uma injeção de animo na corrida de monopostos no Brasil.


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