Estilos de freada na F1 - Julianne Cerasoli Skip to content

Estilos de freada na F1

Dá para identificar os diferentes estilos de freada na F1 e como eles influenciam a performance? Ouvimos os pilotos o tempo todo dizendo que os pneus não estavam funcionando. Ou estavam muito quentes. Muito desgastados, que não havia aderência, e daí por diante. Fica claro que eles são a parte mais sensível de todo o conjunto, por um motivo óbvio. É a única “peça” que está em contato com o carro e com o asfalto. E muito deste trato dos pneus tem relação a outro fator bastante sensível: a freada.

O estilo de Lewis Hamilton

Assistimos nos últimos anos ao domínio da Lewis Hamilton, em partes, pela vantagem de seu carro, mas também por sua grande marca em termos de estilo de pilotagem. As freadas sempre bem dentro da curva, fortes, provocando que o carro saia de traseira levemente à medida em que Lewis vai tirando, aos poucos, a pressão dos freios enquanto endireita o carro e aciona o acelerador também aos poucos para sair da curva. Isso ajuda a evitar que o carro saia de frente porque o peso é transferido de forma rápida para os pneus dianteiros.

Para ele conseguir frear dessa maneira mais forte, seu carro costuma estar acertado com as suspensões mais duras, e o equilíbrio de freio tem de estar mais para frente. Ou seja, uma porcentagem maior nos dianteiros. Aliás, com o tempo, as suspensões da Mercedes foram ficando mais rígidas.

comparação de estilos de freada
Traços de Hamilton x Verstappen no GP do Bahrein de 2021

Essa técnica ficou conhecida como trail braking. Sua origem é ligada ao escocês Jim Clark nos anos 1960, e é bastante útil (e largamente usada no grid).

Pneus Pirelli não gostam de movimentos laterais

Outra técnica usada é o cadence braking, que acaba substituindo o que o ABS (banido da F1 há mais de 10 anos) faria. Ao invés de pressionar o pedal de uma vez, você pressiona e solta rapidamente. E isso permite que se consiga virar o volante ao mesmo tempo em que se freia.

O problema é que, especialmente depois da mudança da construção da Pirelli em 2021, os pneus passaram a não responder nada bem a pilotos que tentam frear e girar o carro ao mesmo tempo. Deixando para frear bem dentro da curva, e controlando o movimento do volante juntamente com uma pressão menor nos freios. Isso ajuda na retomada de uma forma que vai gerar menos superaquecimento do que iniciar a curva mais cedo com o volante e ir aplicando uma pressão mais lenta nos freios até chegar à tangente.

Essa é a técnica que sempre foi usada por Daniel Ricciardo e o prejudicou muitas vezes. Não há um certo ou errado em termos de freada, mas no momento existe uma maneira melhor de parar o carro e manter os pneus na janela ideal de temperatura. E essa maneira é evitar ao máximo movimentos laterais, pois isso vai estressar o pneu longitudinalmente e lateralmente ao mesmo tempo. Os Pirelli não gostam disso.

É importante minimizar o tempo em que a aceleração lateral ocorre ao mesmo tempo que a longitudinal

Curiosamente, os pilotos mais jovens e que passaram pela “escadinha” da FIA, sempre com os Pirelli, como Leclerc, Norris e Russell, parecem vir com este “opcional” de fábrica. Até porque basicamente fizeram toda a carreira em carros de corrida com pneus, ainda que não exatamente iguais, do mesmo estilo. Então eles conseguem se adaptar com muito mais facilidade. 

Como é funciona o freio na F1

Outro ponto importante é o funcionamento diferente dos freios dianteiros (cujo sistema é só hidráulico) e os traseiros, bem mais complexos de 2014 para cá. Ali são três elementos que vão parar as rodas. A fricção dos freios em si, a resistência do motor (ou engine braking) e o sistema elétrico que vem da recuperação de energia por meio do MGU-K. O efeito de cada um desses elementos pode ser ajustado de maneira independente no volante. Mas no momento em que o piloto pisa no freio, eles atuam como um só por meio do sistema Brake by Wire, unindo a parte mecânica e a eletrônica, conectada com a unidade de potência.

Note que, por haver muitas variáveis, é difícil para um piloto se entender com o BBW de uma nova equipe logo de cara. Na verdade, é comum ouvirmos de algum estreante ou que está de casa nova que ele não tem confiança na freada ou não tem a resposta que queria da direção assistida. E é outro problema comum e complexo de se resolver. Até mesmo Alonso sofreu com isso no retorno com a Alpine, e depois se “blindou”.

Frenagem é sensibilidade

Poder frear com uma pressão bastante forte (estamos falando de uma pressão de 100kg em freadas mais fortes, travando os pneus levemente, o que é chamado de limit braking) e bem dentro da curva é algo particular da F1 por dois motivos. Primeiro a incrível capacidade dos freios usados na categoria (que, para muitos, são até bons demais, dando pouco espaço – literalmente – para a disputa por posição, para decidir quem vai frear mais dentro, justamente porque eles são potentes demais). E também a alta pressão aerodinâmica.

Essa grande potência dos freios faz com que o grande diferencial hoje em dia não seja tanto na freada em si, mas sim na maneira como o piloto vai soltando o pedal e recuperando a velocidade. A palavra chave aqui é leveza. Quando você está fazendo uma curva, o peso do carro está sendo jogado de um lado para o outro, então os seus comandos têm de ser leves para que esse equilíbrio não seja quebrado de maneira brusca. É muitas vezes, por retomar a velocidade de forma muito precipitada, que vemos pilotos rodando, enquanto entrar com muita velocidade vai fazer com que ele perca a tangente e muito provavelmente escape na saída.

Via de regra, se você está perdendo o controle na entrada da curva, provavelmente precisa usar menos os freios traseiros. E, se o carro está saindo muito de frente e teima em não virar, deve fazer o oposto.

Estilos de freada mudam conforme a necessidade

Tudo isso envolve muita sensibilidade, e é por isso que os pilotos usam sapatilhas bastante finas e super justas, a fim de sentirem a resposta dos pedais. Isso porque podemos ficar horas aqui falando sobre frenagem e não conseguir explicar tudo, porque sempre será uma resposta à aderência que aquele carro tem naquele momento (entrando aí a condição dos pneus e do asfalto, se ele está mais verde ou não, a temperatura, etc), naquela curva. E é por isso que ficar bastante tempo na mesma equipe ajuda, tanto porque é o seu feedback que é usado para tornar o carro mais rápido, quanto pela maior facilidade que você terá de prever qual será a reação do carro naquela determinada situação

Outro ponto interessante é que vemos mais as diferenças de frenagem em classificação do que na corrida, pois utiliza-se muito o lift and coast, especialmente quando o carro está mais pesado. Trata-se simplesmente de usar o arrasto do carro para freá-lo, tirando o pé do acelerador antes do ponto de freada para poupar combustível. Não é o jeito mais rápido de pilotar em uma volta, claro, mas pode ser o caminho mais veloz até a bandeirada.

5 Comments

  1. Muitíssimo bom! Agora fiquei curioso para o sentido oposto: técnica de aceleração, se deve ser uma “patada” ou no sistema pé de pano.

  2. Muito interessante. Até agora não tinha conseguido relacionar os comentários de dificuldade do Riccardo com nada concreto. Finalmente fez sentido. Tem um ex-piloto inglês chamado Scott Mansell (no relation). Ele trabalha como treinador de pilotos e tem um canal no youtube onde ele costuma falar sobre técnicas e conceitos. Eu vi um vídeo recente onde ele aborda frenagem, mas o seu texto na verdade explicou as mesmas coisas muito melhor e me ajudou mais do que o vídeo dele. Ótimo conteúdo.

  3. Que excelente análise. Análise de muito conhecimento. Parabéns.

  4. JULIANNE, seu texto sen-sa-cio-nal sobre estilos de frenagem é a PROVA CABAL de como NÃO SE PODE JAMAIS COMPARAR PILOTOS DE ÉPOCAS DIFERENTES. Refiro-me particularmente a TAZIO NUVOLARI. Em seu post acima, você descreve e disseca brilhantemente as técnicas de frenagem requeridas nos dias de hoje pela Fórmula 1. E o que dizer dos anos 30, da Era dOS monstruosos AUTO UNION, MERCEDES e ALFA ROMEO, tocados por gênios do calibre de um RUDOLPH CARACCIOLA, BERND ROSEMEYER e TAZIO NUVOLARI, para me limitar só aos três maiores expoentes dessa época? TAZIO NUVOLARI DIZIA QUE NÃO USAVA FREIOS!!! O fato foi comprovado quando seus mecânicos viram PERPLEXOS que as panelas de freio de seu MASERATI estavam geladas logo imediatamente após o término Grande Prêmio da Itália de 1934: eles tinham esquecido de repor o óleo no sistema após a drenagem para a pesagem do carro antes da corrida!!! TAZIO para mim talvez seja a maior figura da HISTÓRIA do AUTOMOBILISMO!!! Arrojado e corajoso como ninguém, com um talento incomparável, ele não conhecia limites, nem os próprios limites físicos. Seus feitos viraram lendas tanto em 4 como em 2 rodas,  e o Dr. FERDINAND PORSCHE tinha razão quando disse que NUVOLARI era “o maior piloto de hoje, de ontem e de amanhã”!!!


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