F1 Raio-X do GP da Rússia (antes, e depois da chuva) - Julianne Cerasoli Skip to content

Raio-X do GP da Rússia (antes, e depois da chuva)

Dá para separar o GP da Rússia em duas partes: o cenário antes, e o depois da chuva. E as decisões tomadas quando os radares começaram a mostrar que vinha água do sul nas últimas voltas tiveram muito a ver com o que acontecera nas quase uma hora e meia antes que a garoa começou a cair em Sochi, em outra prova cheia de surpresas e que ficará marcada pelo impressionante feito de Lewis Hamilton e suas 100 vitórias na carreira na F1.

Hamilton era o favorito depois que as Mercedes pareciam estar em uma liga própria, tanto nos treinos livres, no seco, na sexta-feira, quanto na classificação com a pista molhada no sábado. Até que um trilho começou a se formar e o time, ainda mais sabendo que Max Verstappen largaria em último pela troca de unidade de potência, optou por não arriscar tanto quanto Williams (ainda que por uma falha de comunicação), Ferrari e McLaren, e esperou a última tentativa para trocar os pneus intermediários pelos de pista seca. 

Mesmo se Hamilton não tivesse errado e batido na entrada dos boxes, a vida da Mercedes seria mais difícil, pois os pilotos não teriam muito tempo para aquecer os pneus, além de terem que ir para o lado molhado enquanto os demais estavam em volta rápida, já que eles tinham sido os primeiros a irem para a pista no Q3, então sempre estavam “dessincronizados” com grande parte do trânsito. Mas é claro que o toque no muro e os 65s que Hamilton ficou parado, já com os pneus slick colocados no carro e perdendo temperatura (já que a equipe teve que parar o ‘conserto’ no meio para trocar os pneus de Bottas), não ajudaram em nada. E os favoritos ficaram em quarto e sétimo na classificação, com a primeira pole position da carreira de Lando Norris, seguido por Carlos Sainz e George Russell. Os únicos que conseguiram fazer os pneus slick funcionarem numa pista ainda úmida e fria.

A Mercedes ainda encontraria um problema no motor de Bottas, e aproveitaria para trocar também o turbocompressor e o MGU-H. E, de quebra, claro, colocou o finlandês para marcar o último colocado Verstappen, que teria na corrida a vantagem de escolher um acerto totalmente voltado para o domingo, uma estratégia priorizando o pneu duro, e a potência extra.

Essa informação sobre o pneu duro ser o melhor para a corrida vinha da sexta-feira, quando Sebastian Vettel fez uma simulação de corrida com o composto e obteve um ritmo semelhante ao de Hamilton com os médios. E, como a pista foi lavada no sábado, freando sua evolução, e a temperatura da pista era até mais baixa no domingo devido ao céu nublado, a tendência de graining nos dianteiros nos compostos mais macios estaria ainda mais acentuada.

Antes da chuva

Foi o que Carlos Sainz percebeu ainda nas primeiras voltas da corrida, depois de assumir a ponta em uma largada movimentada: ele aproveitou o espaço deixado por Norris, preocupado em frear Hamilton que, por sua vez, ficou encaixotado, freou cedo e fechou a primeira volta em sétimo. E, pior: passaria a primeira parte da corrida atrás da McLaren de Daniel Ricciardo.

As McLaren são equipadas com o mesmo motor Mercedes, mas geram menos arrasto aerodinâmico e, por isso, são difíceis de serem superadas em pistas como Sochi e Monza, em que usa-se asas menores (e Ricciardo tinha optado pela asa menor entre os dois pilotos do time inglês). Hamilton já sabia pela experiência de Monza que seria difícil passar o carro laranja na pista, então o que ele tinha de fazer era uma corrida de paciência, já que Verstappen estava tendo de escalar o pelotão e o fato de carros mais lentos estarem na liderança fazia com que todos ficassem mais agrupados. Então, mesmo em sexto nas 11 primeiras voltas, ele só perdeu 10s em relação ao líder.

Voltando a Sainz, a Ferrari sempre seria o primeiro carro a sofrer com graining, uma tendência nesta temporada, e o espanhol parou na volta 14, logo após ter sido superado por Norris, saindo da briga pela vitória. Logo antes, a Aston Martin tinha tentado um undercut na Williams de George Russell, e o time inglês respondeu, o que tornaria a vida de ambos difícil, com muitas voltas para fazer com os pneus duros. Não era necessário parar tão cedo: os pilotos que estavam gerindo bem os pneus médios conseguiriam ir mais adiante com um bom ritmo, sempre de olho naqueles que vinham com os duros, mais consistentes – no top 10, Perez e Alonso e, vindo de trás, Verstappen (sem trazer consigo Bottas, que não conseguiu abrir caminho no pelotão).

Lá pela volta 20, com Norris primeiro, Ricciardo em segundo e Hamilton em terceiro, Perez estava se tornando um grande problema para o piloto da Mercedes, perto o suficiente para tentar um undercut no inglês, com Verstappen aparecendo já em sexto, a 3s de Lewis.

Em um dos momentos que poderiam ter mudado a história do domingo, a Mercedes se preparou para a parada e pediu para que Hamilton fizesse o contrário de Ricciardo. E respirou aliviada quando o australiano, defendendo-se do que poderia ser uma tentativa de undercut, parou: Hamilton agora poderia, finalmente, mostrar a vantagem do ritmo da Mercedes.

Dito e feito: Lewis logo conseguiu abrir de Perez, enquanto Verstappen, que tinha desgastado demais seus compostos duros, perdia rendimento. É justo dizer que foi nesta primeira fase da prova, ainda que discretamente, que Hamilton se colocou em posição de ganhar a corrida, guardando ritmo nos pneus médios para conseguir o overcut em cima de Ricciardo, voltando na frente após fazer sua parada, na volta 26. Enquanto Verstappen acabou parando antes de outros pilotos que estavam na mesma estratégia que ele porque já estava perdendo tempo, sentindo os efeitos de ter escalado o pelotão.

Depois que o líder Norris parou na volta 28 e aqueles que estavam na estratégia de duro-médio fizeram suas trocas (Perez e Alonso conseguindo ir até a 36), a corrida tinha 16 voltas para o fim e o seguinte cenário: Hamilton tinha tirado 5s em relação a Norris em oito voltas e estava a 2s atrás do líder. Os dois estavam em uma liga própria: o terceiro, Sainz, vinha mais de 20s atrás, e Verstappen era sexto (e seria logo ultrapassado por Alonso, pois já tinha acabado com seus pneus médios).

Focando em fazer bem o último setor para evitar que Hamilton tivesse o DRS (com sucesso) ao mesmo tempo em que economizava combustível para as voltas finais, Norris parecia ter a situação sob controle. Ele não era a McLaren mais rápida de reta naquela tarde, mas sabia (pela experiência da Itália e da Áustria) que podia mantê-lo atrás, e vinha economizando combustível para poder dar tudo nas voltas finais.

Depois da chuva

Até que uma garoa começou a cair apenas nas curvas 5 e 7 da pista, com sete voltas para o fim. De um lado você tem uma equipe que acabou de ganhar sua primeira prova em oito anos. De outro, os líderes do campeonato, mais de olho no que Verstappen e a Red Bull faziam do que na vitória. Entre os dois, o mesmo radar de meteorologia, interpretado de maneiras diferentes.

A primeira providência da Mercedes quando começou a garoar na volta 47 foi chamar Bottas, então 14º colocado, para colocar intermediários. Ele serviria de termômetro para Hamilton. Na volta seguinte, Ricciardo e Verstappen comunicam a suas equipes que queriam parar.

Neste momento, na volta 48, a Mercedes já tinha chamado Hamilton para os boxes, uma vez que esperava que a chuva apertasse e sabia que tinha 40s em relação ao terceiro colocado Perez, mais que o suficiente para fazer a troca e voltar em segundo. Para a McLaren, a decisão era mais complicada: e se eles parassem, Hamilton continuasse, e parasse de chover? Desistir da liderança é sempre mais difícil.

Mas a Mercedes chamou e Hamilton não entrou. Ele, Norris, Alonso, Perez, Leclerc… todos os pilotos que tinham pneus mais novos, ou seja, com mais borracha, pareciam ter mais confiança com a pista molhada e mais fria. Todos eles estavam tentando ficar de slick na garoa que estava virando chuva.

Mas a Mercedes não deu mais opções para Hamilton depois que concluiu que a condição de pista iria se deteriorar e, principalmente, depois que viu Verstappen parando. A corrida do inglês não era com Norris, afinal, e ele parou na volta 49.

Neste momento, a única chance de Norris vencer era ficando na pista, já que Hamilton passou a ser imediatamente mais rápido e conseguiria o undercut. Além disso, as mensagens dadas a Lando mostram que a McLaren não parecia ter tão claramente a visão de que a chuva apertaria de vez, o que aconteceu na volta 50, a três para o fim. Norris escapou, se arrastou até os boxes, e chegou apenas em sétimo, deixando o caminho aberto para a centésima vitória de Hamilton na F1.

Tendo superado Ricciardo e Sainz quando o asfalto estava escorregadio, e lucrando com os pilotos que insistiram em ficar na pista, Verstappen surgiu em segundo e perdeu apenas sete pontos para Hamilton em um dia no qual o prejuízo tinha tudo para ser maior, e Sainz levou a Ferrari ao terceiro posto.

1 Comment

  1. Oi Ju, muito boa análise (como sempre), só acho que faltou mencionar que o Riccardo foi prejudicado na troca de pneus e perdeu muito tempo, o que facilitou o cenário para o Hamilton, já que mesmo de pneus novos Ric ficou muito atras


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