F1 A “ciência” das vitórias de Vettel: como o alemão usa a relação de marchas a seu favor - Julianne Cerasoli Skip to content

A “ciência” das vitórias de Vettel: como o alemão usa a relação de marchas a seu favor

O GP da Bélgica expôs como usar bem as qualidades do carro é determinante para alcançar resultados. Vimos Sebastian Vettel passando Lewis Hamilton como uma flecha na primeira volta, sem precisar de DRS, e Fernando Alonso executando duas manobras – e se defendendo de Hamilton – também com o uso da velocidade de reta de sua Ferrari.

A velocidade de reta depende de vários fatores e, com as limitações impostas ao desenvolvimento dos motores, hoje tem mais a ver com a configuração aerodinâmica e a relação de marchas. E é nisso que vamos focar hoje.

A relação de marchas é definida antes da classificação. Basicamente, ter marchas mais curtas vai melhorar o ganho de velocidade nas saídas de curva, enquanto marchas mais longas vão permitir que se continue ganhando velocidade por mais tempo em uma reta. Isso tem a ver com a limitação de giros do regulamento atual, em 17.000 rpm. Se um carro ganha velocidade mais rapidamente durante uma reta, a tendência é que ele “bata no limitador” e continue com essa velocidade constante até a freada.

Em termos de tempo de volta, é melhor ter marchas mais curtas, enquanto, durante a corrida, as marchas mais longas vão ajudar a ganhar posições. Isso falando de modo geral, porque o efeito do combustível minimiza essa diferença. Portanto, um carro “acertado para classificação” (ou seja, com marchas mais curtas) também será rápido de reta nas primeiras voltas da corrida, quando estiver mais pesado.

Voltemos à corrida: qual é a receita das vitórias de Vettel? Classificar-se na frente, tomar a ponta logo na primeira oportunidade e abrir uma diferença suficiente para não ser atacado quando o DRS estiver liberado, a partir da terceira volta. Isso tem a ver com o tipo de configuração que seu carro tem, “pacote” que inclui uma relação de marchas curta. Tanto, que quando ele não consegue se livrar rapidamente do tráfego, suas provas automaticamente se complicam porque, ao longo da prova, a tendência é que seu carro “bata no limitador” no meio da reta e ele não consiga ultrapassar. Isso também explica por que Webber se livou rapidamente de Button no começo do GP e, depois, passou o resto da corrida atrás de Rosberg.

O acerto da Ferrari de Alonso costuma ser menos agressivo nesse sentido, até porque a equipe não tem carro para se classificar na frente. Mas é lógico que o espanhol sabe que é mais fácil compensar essa deficiência nas primeiras voltas, em que o pelotão está mais homogêneo, então costuma ter inícios bem fortes. Na Bélgica, o F138 estava acertado para correr muito de reta com o DRS ativado, ou seja, com marchas um pouco mais longas do que a Red Bull de Vettel.

Quem exagerou em Spa foi a Mercedes, isso menos por uma questão de marchas e mais de carga aerodinâmica. Hamilton foi 1s mais rápido que Vettel no segundo setor, de curvas de alta, na classificação. Mas pagou caro na corrida, pois não corria nada de reta. Tanto, que seu plano de deixar Alonso passar para se aproveitar da DRS, a fim de que ambos chegassem em Vettel, acabou sendo furado porque a Ferrari, mesmo sem a asa aberta, era tão rápida quanto a Mercedes.

Essa é uma das questões que ganham grande importância para o ano que vem, pois o regulamento prevê que as equipes definam de antemão a relação das oito marchas – hoje são sete. E isso não poderá ser mudado, mesmo com os circuitos diferentes. É um desafio enorme, que pode, inclusive, obrigar Vettel a mudar sua receita vencedora.

38 Comments

  1. De antemao, vc quer dizer antes de cada GP (treinos e corrida), ou antes que comece o campeonato ?

    Obrigado

    FP

    • Do campeonato

      • Uia, a relação de marchas vai ser fixa durante todo o campeonato?

      • Muito Obrigado JU por responder, achei interessante isso.

  2. Definir de antemão a relação de marchas para toda a temporada 2014? Mais uma regra engessante que a meu ver vai depor contra a competitividade, pois tira o poder de reação de determinada equipe com uma certa característica de carro que casa com algumas pistas (vide Mercedes em Monaco e Hungria, por exemplo). O rendimento ficaria comprometido porque o time teria que equilibrar a relação para um ponto de equilíbrio com todas as outras pistas do calendário.

  3. Realmente, uma regra ridícula buscando unicamente bagunçar o grid. E o pior é que é um ano de enormes mudanças. Se a FIA queria engessar, devia ter pegado leve (separando, por exemplo, os GPs em grupos, permitindo três relações, uma para cada grupo de GPs, de acordo com as características das pistas).

  4. o vettel passou o hamilton com toda aquela facilidade porque o hamilton erro feio na eau rouge, só pegar o onboard que você vê o tamanho da cagada.

      • Também, neste caso. Mas no onboard dele dá para perceber como a aceleração da Mercedes é bem mas lenta quando ele passa da 6ª para a 7ª.

    • Não errou feio. Só não tinha tanta aderência ali.

      O que falou mais alto foi a diferença de máxima entre os dois sim.

  5. Excelente analise! Sobre ano que vem… vai ser um saladão… quem começar melhor o ano pode abrir vantagem e pode parar em detrimento do crescimento de outras – desenvolvimento, da metade (férias do meio do ano)…. vai ser bacana o campeonato de 14!

    • Como sempre uma analise excelente para nós os leigos, isso mostra o quanto o Vettel é completo como piloto, quanto a configuração de marcha para o ano todo em 2014 as equipes tem os simuladores e conhece cada metro de todos os circuitos portanto não vejo muitos problemas naturalmente eles vão fazer uma média e ver quanto vão ganhar e perder circuito a circutito.

  6. A mercedes errou no acerto do carro em spa. O hamiltom é o piloto mais veloz do grid, mas de vez em quando erra no acerto como aconteceu em monza 2010 ele errou e button acertou quem lembra. torço muito para ele acertar em monza esse ano e ganhar a prova assim ainda ter esperança eese ano, ser piloto de formula não só guiar o carro é saber passar informações para os engenheiros é acertar o carro para cada circuitoe ser arrojado, por isso embora torça pelo Hamilton acho o vettel o mais completo do grid e não entendo porque tem alguns que ainda duvida.

  7. Julianne,
    Uma dúvida, são 8 relações de marchas pré-definidas no começo do ano, podendo utilizar algumas delas, como 6, 7 ou 8, ou sempre as 8?

    • Os carros terão 8 marchas. A mesma relação de marchas será usada o ano todo.

  8. Ótima análise, não tinha percebido isso.

  9. Ju, em uma situação hipotética de chuva, esse acerto de Vettel seri ruim, não? Afinal com mais torque, a perda de aderência seria maior!? Procede a dúvida?

    • Sim, procede. O acerto da Mercedes era mais “híbrido” em todos os sentidos.

      • Sim, pois contavam com a chuva…

  10. É raro passar por aqui e não sair conhecendo um pouquinho mais desse negócio que é bem mais do que uma mera corrida de carros em que ganha quem chega em primeiro.

    O que eu queria saber é o que você, pessoalmente, acha dessa regra da relação fixa de marchas, Ju?

    • À primeira vista, não me agrada. É uma variante a menos para adaptar no carro a cada prova. Mas ainda não tive oportunidade de conversar com engenheiros para tentar entender se isso é um subproduto da nova unidade de potência.
      Assim como você sempre continua aprendendo, nós jornalistas constantemente temos aquela sensação “nossa, não tinha pensado nisso!” É essa complexidade que torna o esporte fascinante.

      • Ju, existe algum “workaround” das relacoes de marcha? O que quero dizer eh, as engrenagens da caixa de marchas eh a mesma, mas pode-se mudar a relacao do diferencial, por exemplo? Acho dificil que o mesmo setup de motor seja eficiente em Monaco e Monza, por exemplo.

  11. Da hora esse post, Ju. Parabéns. Outra coisa que percebo é que em imagens onboard a Ferrari me parece ter uma transmissão mais eficiente que as demais. Observe as mudanças de marchas em sequências ou reduções. A Scuderia tem um equipamento superior.

    Acredito que os motores Turbo peçam relações mais longas que os aspirados, mas esse negócio de pré-definir relações não tá com nada. É nesse quesito que engenheiros quebram a cabeça com cálculos sem fim.

    Deveriam liberar logo os CVT com regulagem manual pra cada marcha (que seria virtual). Isso só pra ter um equipamento que não existe em carros de produção normal, como nos velhos tempos.

  12. Um tema complexo tratado com clareza, sem condecendência e com capacidade de gerar esse debate e tantos esclarecimentos só pode ser algo de alguém muito competente. Eu me junto aos elogios, e acrescento: se este post tivesse um ajuste inicial geral e imóvel não chegaria a tantas boas ultrapassagens!

  13. E no conjunto geral das 8 marchas, Julianne, teremos essas caixas com viés bem mais longo? Teremos retomadas chochas em Mônaco, com pilotos se “virando” para conseguirem tração na saída e aderência para curvas, ali? Esses caras que comandam a F 1 não param de inventar coisas. . . O dia em que assumirem a Federação Mundial de Pingue-Pongue hahahaha vão querer espalhar farinha grossa em cima da mesa e armar a rede bem na beirinha, com inversão de campo alternadamente. . .

  14. Julianne,

    Acredito que a motivação pela opção única de relação de marchas seja redução de custos, pois os custos de desenvolvimento das novas unidades de potência já serão bem altos.

    Apenas no ano de 2014, as equipes poderão solicitar uma mudança de relação de marchas após o campeonato ter começado, tornando nula a opção original apresentada aos fiscais no início do campeonato.

    Sobre a dúvida do Muguello, não será possível alterar o diferencial nas corridas, pois ele fica localizado dentro da caixa de câmbio e com exceção do óleo, apenas partes externas à caixa de câmbio podem ser substituídas, como sensores, mangueiras, embreagem, etc.

    • Ricardo,

      Obrigado pelo esclarecimento!

  15. Uai, mas não é a relação de marchas que não permitiu ele ultrapassar na Hungria?

    • Exato. É um exemplo de corrida em que ele não conseguiu se livrar dos adversários nas primeiras voltas e, depois, não tinha velocidade de reta para ultrapassar.

  16. Ju, aproveitando o assunto, sabemos que Webber não é um primor de pilotagem, além é claro que as teorias conspiratórias tornam-se irracionais em equipes grandes, afinal podem bancar melhorias em ambos carros, além da premiação nos construtores. Sendo assim, vc consegue enxergar os motivos técnicos e de execução das más largadas de Webber? A própria RBR fez uma mea culpa em relação ao equipamento do australiano. Seria só falta de talento, sorte, desmotivação? O que vc acha?

    • Os problemas do Webber são sempre na primeira fase da largada. Pela câmera onboard, não vemos problemas de tempo de reação, o que seria a única diferença que o piloto poderia fazer nesse momento. O resto é o carro. É, portanto, um problema de configuração de embreagem.

  17. Ju… Vc pretende fazer algum post sobre todas as alterações que teremos entre campeonatos 2013 – 2014? Mesmo que seja depois do final deste? Só para nós sabermos o que muda, onde muda e o que esperar.

  18. Interessante essa regra. Será que algumas equipes, especialmente as médias, visando bons resultados, quiçá vitórias, em circuitos de alta, apostarão numa relação de marchas mais longa? Force India normalmente tem bons pacotes p’ra circuitos de alta.

    Julianne, essa relação padrão é estabelecida para os dois carros de uma mesma equipe? Ou é algo resolvido entre engenheiro/piloto?

    • Os detalhes das regras ainda não foram publicados, mas acredito que seja por equipe.


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