Guia dos testes de pré-temporada da F1 - Julianne Cerasoli Skip to content

Guia dos testes de pré-temporada da F1

É chegada aquela época do ano em que toda expectativa é pouca. E toda a pressa, também: os testes de pré-temporada da F1. No entanto, ainda mais em um ano com tantas mudanças como em 2022, é preciso entender passo a passo o que as equipes estão fazendo antes de sair tirando conclusões logo de cara.

Os times têm várias lições de casa para completar antes de começarem a avaliar a performance dos carros novos. Primeiro, eles têm que entender se tudo funciona da maneira como foi projetado. Depois, se há problemas na interação entre as diferentes partes do carro. Em um terceiro momento, é preciso entender se tudo dura tanto quanto é necessário. E por aí vai.

Quais os sinais de que uma equipe está indo bem ou mal na pré-temporada da F1

Confiabilidade

Este é o sinal número um e deve ser mostrado logo de cara. A primeira prova pela qual os carros novos passam é a verificação de todos os sistemas. Logo, se algo falha, a equipe fica longas horas sem colocar o carro na pista. Com apenas seis dias de testes, ninguém faz isso de caso pensado. Problemas repetidos também são um forte sinal de alerta de que algo fundamental está errado.

Com um carro completamente novo em 2022, há muita coisa que pode dar errado. Não só a parte aerodinâmica, mas também muito da parte mecânica foi refeita, e tudo isso tem de interagir bem. Mesmo depois de tantas análises computadorizadas e em túnel de vento, é preciso verificar, por exemplo, a refrigeração e se o carro tem problema de estabilidade das peças internas.

Tipo de trabalho feito na pista

Cruzando o que vemos na pista com as informações passadas pelas equipes e as entrevistas concedidas pelos pilotos, dá para ter indicativos do tipo de trabalho que está sendo feito. 

Quanto mais cedo uma equipe passar da confiabilidade para a avaliação aerodinâmica e da avaliação aerodinâmica para o uso de diferentes acertos, melhor. Afinal, isso indica que o programa está correndo dentro do planejado e que não houve surpresas no caminho.

Esta fase de comprovação de dados de aerodinâmica geralmente passa pelo uso de grades de medição de fluxo de ar, então é fácil identificar. Além disso, essa avaliação é feita muitas vezes com velocidade constante, e sem dar qualquer importância ao tempo de volta.

Nesta fase, é possível que o carro passe algum tempo parado, mas isso muitas vezes acontece devido a uma mudança de configuração. E isso geralmente é um bom sinal: significa que o time entendeu a base do carro e está fazendo ajustes mais finos.

Simulações de corrida

Quanto mais cedo uma equipe começar a simular corrida, melhor em termos de competitividade. As simulações de corrida indicam que a equipe partiu para experimentar com acertos, visando entender a interação com os pneus e como o carro responde a mudanças. Os pneus, inclusive, também são totalmente novos neste ano (composto e dimensões).

Comparar stints com o mesmo tipo de pneu e número de voltas semelhantes ajuda a entender quem está onde nas relações de força do grid, especialmente quando as equipes fazem simulações completas de corrida, sem reabastecimento – algo que, inclusive, só acontece em pré-temporada. 

Isso porque, devido às diferentes metodologias, quando são feitos stints menores, é bastante comum que haja discrepâncias de peso – e 10kg de combustível geram uma diferença de cerca de 0s3 por volta em uma pista como a de Barcelona.

Isso sem contar em diferentes configurações de mapeamento de motor. É por isso que todo tipo de comparação de desempenho tem de ser feito com cuidado. E isso nos leva ao próximo e importante item.

Observação do comportamento do carro na pista

assistindo a pré-temporada da f1
Observação na beirada da pista é fundamental. Foto: Julianne Cerasoli

Essa é a métrica mais confiável, então é importante seguir o trabalho de jornalistas que fazem esse tipo de observação, como Edd Straw e Mark Hughes. Eu costumo fazer isso também, vamos torcer para que os horários não batam com meus compromissos com a Band.

Isso porque o bom jornalista vai saber a hora certa de ir na beirada da pista, quando os times estão na fase de acerto mais fino. Então, não espere este tipo de análise nos primeiros dias de teste.

De qualquer maneira, é impressionante como você consegue fazer uma lista de quem está com mais ou com menos dificuldade de controlar o carro e como isso se reflete na hora da verdade na primeira corrida do ano.

LEIA TAMBÉM: COMO É ASSISTIR AOS TESTES DA PRÉ-TEMPORADA

Inclusive, dá para os fãs também fazerem essa observação. Claro, pelo F1TV, mas melhor ainda ao vivo. Neste ano, só o teste do Bahrein será aberto ao público. Mas, geralmente, o de Barcelona também é.

Tabela de tempos (só nos últimos dois dias)

Recapitulando, o procedimento normal das equipes é buscar comprovar a confiabilidade geral, cruzar os dados de aerodinâmica com os obtidos na fábrica, colocar quilometragem e ver o que o carro pode fazer em corrida e, só depois, buscar tempos, quando o acerto começa a amadurecer. 

É possível, inclusive, que um time sequer faça uma simulação de classificação completa, unindo um setor aqui e outro ali para saber qual seu potencial. E também é possível que não seja usado o composto mais adequado. É o que se costuma chamar de esconder o jogo, mas que só o esconde aos olhares mais desatentos. 

E por que só nos últimos dois dias? Considerando que as equipes geralmente colocam um piloto por dia no carro, será dada a oportunidade cada um deles fazer essa simulação de classificação. Também é possível que o time divida o trabalho do último dia colocando um piloto em cada período, e isso vai gerar resultados diferentes devido à condição de pista (mais fria no final da tarde no Bahrein).

Como assistir os testes de pré-temporada da F1 

A Band terá equipe presente nos testes de pré-temporada, com matérias e links ao vivo. A TV não fará a transmissão ao vivo da ação na pista.

Os resultados em tempo real e transmissão são feitos pela F1TV, o aplicativo da categoria.

Por que os testes da pré-temporada da F1 são em Barcelona e no Bahrein?

Barcelona é considerada uma pista completa, por ter uma longa reta, curvas de alta velocidade de raio longo, mudanças de direção de média velocidade, e um trecho final mais sinuoso. 

Também é verdade que o inverno mais ameno da Espanha ajuda. E a localização é boa para que novas peças cheguem e outras sejam enviadas de volta para a fábrica para avaliação.

Isso porque há muitos voos para Barcelona vindos da Itália, da Suíça (sede da Alfa Romeo) e da Inglaterra e o acesso é mais fácil do que seria, por exemplo, se a F1 testasse em Paul Ricard. A pista francesa também seria uma boa opção, mas faz um pouco mais frio e, muito provavelmente, o aluguel seria mais caro.

Então por que o Bahrein também recebe testes de pré-temporada da F1?

Falando na questão financeira, é onde o Bahrein entra. A F1 é um dos cartões-postais país, que recebe muito bem a categoria. Tudo é facilitado para a F1 por lá, e um bom exemplo disso foi a campanha de vacinação que eles fizeram por lá em 2021, quando os países europeus só estavam vacinando seus idosos. Agora, como a temporada está começando no Oriente Médio, a pré-temporada vem sendo realizada no Bahrein por questões logísticas.

A pista do Bahrein não é tão variada (faltam curvas de alta velocidade), mas é um bom circuito para se testar. Principalmente porque o asfalto é abrasivo e a temperatura é mais representativa do que as equipes vão encontrar ao longo do ano. Porém, também por isso, os resultados podem ser mascarados porque o pneu conta muito.

Ainda sobre o circuito barenita, trata-se de uma das melhores estruturas de todo o calendário, e isso facilita o trabalho das equipes. 

LEIA TAMBÉM: COMO É COBRIR OS TESTES DE PRÉ-TEMPORADA (NA REAL)

O lado negativo do Bahrein é a questão da logística durante o teste, já que há menos voos e eles levam mais de 5h. Nada que um investimento do governo local não resolva, além da ótima tática barenita de conseguir a vaga de primeira corrida do ano. Com isso, faz sentido para as equipes manter parte de seus funcionários no país entre os últimos dias da pré-temporada e a abertura do campeonato.

Como funcionam as regras dos testes da F1?

Os testes em pista da Fórmula 1 passaram a ser muito limitados há mais de 10 anos, como maneira de manter os gastos sob controle. Antes disso, alguns times testavam quase continuamente, sendo a Ferrari o grande exemplo disso nos primeiros anos do milênio.

Com as limitações, as equipes passaram a focar em simulações, e já não dependem tanto dos resultados obtidos em pista para desenvolver o carro como antigamente.

As regras permitem alguns tipos de testes, por meio do artigo 10 do regulamento esportivo:

TCC – Teste de carros atuais (testing of current cars)

Inclui os testes de pré-temporada, testes durante a temporada e logo após o final e os testes cegos de pneus da Pirelli.

Com exceção do teste da Pirelli, todos os outros são coletivos e controlados pela FIA. Eles não podem ter mais de três dias consecutivos e, durante a temporada, necessariamente têm de ser nos dias após um GP, no mesmo circuito (novamente, a preocupação é com os custos).

Sobre os testes da Pirelli, limitados a 30 dias por ano, fala-se em testes cegos porque só os sistemas de coleta de informações dos pneus estão ligados, e a equipe não sabe o que a Pirelli está testando, nem pode usar o teste para obter qualquer melhoria em seu carro.

PE – Eventos promocionais

É a brecha usada pelas equipes para testarem os sistemas do carro (fazerem o shakedown) antes dos testes de pré-temporada. Estes testes são, oficialmente, para filmagens promocionais, que são feitas. Há um limite de dois eventos promocionais de 200km cada (eram 100km até o início de 2024), usando pneus próprios para teste.

Ou seja, as equipes não usam esse tipo de situação para extrair performance do carro. É mais para entender se tudo funciona bem. Quando eles usam um de seus PE (são dois por ano) ao longo da temporada, geralmente conduzem alguma avaliação aerodinâmica em velocidade estável.

DE – Eventos de demonstração

Também limitados a dois, a não ser quando trata-se de um evento da própria F1, como o feito em São Paulo em 2019. Eles não podem ser realizados em circuitos aprovados para uso da categoria.

TPC – Teste de carros antigos (testing of previous cars)

Muito usados pelas equipes para testes de jovens pilotos. Os carros são os projetados para os campeonatos de cinco a dois anos antes do atual. Então, em 2022, dá para usar carros de 2020.

THC – Teste de carros históricos

Refere-se a carros mais antigos do que os testes de carros antigos, se é que isso faz algum sentido.

2 Comments

  1. Ótimo texto Ju, bastante elucidativo… conhecia as limitações de regulamento, mas o nível de detalhes em seu texto enriqueceu o conhecimento, grato!

  2. Que texto super esclarecedor! Top


Add a Comment

O seu endereço de e-mail não será publicado. Campos obrigatórios são marcados com *

Adicione o texto do seu título aqui