Em entrevista a Felipe Motta em Mônaco, Martin Whitmarsh deu seu diagnóstico para os problemas que Felipe Massa tem enfrentado nos últimos anos. O chefe da McLaren não cita o acidente e ignora a queda na competitividade dos carros da Scuderia. A questão para ele é puramente psicológica e passa pela filosofia da Ferrari, que encontrou em Fernando Alonso o líder que procurava desde Schumacher.
“Creio que a Ferrari e Fernando [Alonso] formam uma máquina implacável. Não conheço Felipe muito bem, mas é um piloto muito rápido e uma pessoa muito intensa. É muito difícil, e poderíamos perguntar isso para Rubens [Barrichello], existir em uma máquina como aquela mantendo seu nível de autoconfiança, porque ela é muito focada em seu companheiro. Essa é a desvantagem [de ter um primeiro piloto].”
A discussão é antiga e não parece ter uma solução clara. Afinal, o que é mais eficiente: dar condições completamente iguais aos companheiros dentro de uma equipe ou jogar sempre em duas frentes independentes?
Whitmarsh, claro, já viu o outro lado da moeda. Afinal, perdeu junto da McLaren um campeonato ao não assumir uma posição clara. Conhece de perto a filosofia de Alonso e admite “simpatizar” com a lógica cartesiana do espanhol de que, priorizando um piloto e evitando que se dividam os pontos dentro da equipe, aumenta-se matematicamente as chances no Mundial de Pilotos.
“Sempre tivemos a filosofia de tratar ambos os pilotos de forma igual, de deixar que disputem na pista. A filosofia de Fernando, a qual entendo e com a qual simpatizo é de que ‘se vocês colocarem todo o peso em mim, vou vencer o campeonato’. E, de fato, se tivéssemos colocado todo o peso em cima dele em 2007 ele teria vencido o campeonato. O mesmo aconteceria se tivéssemos agido assim com Lewis. Fomos justos e igualitários e não me arrependo.”
Olhando por essa prisma mais lógica, parece óbvio que a estrutura de 1º e 2º pilotos definidos é a mais eficaz. Porém, a história mostra que as variáveis são muitas. Primeiramente, a própria McLaren pode se gabar de nos ter proporcionado, com sua filosofia – que vai e volta, é verdade, que o digam Coulthard, Montoya e Kovalainen, para ficar em exemplos mais recentes – os incríveis dois anos de guerra entre Senna e Prost. Porém, devemos lembrar que a supremacia daqueles carros era tamanha que, mesmo dividindo pontos entre si, os pilotos nunca foram ameaçados pelos demais.
Em condições especiais como esta, de tamanha superioridade, ter um segundo piloto perde totalmente o sentido. E por isso comportamentos como o da Ferrari em 2002, sabendo que tinha um carro dominante e que o campeonato não corrida qualquer risco, são difíceis de entender.
Mas há momentos em que colocar suas fichas em apenas um piloto é positivo. Em uma disputa apertada, quando não se tem um carro dominante, é óbvia a ajuda de ter sempre o mesmo com os maiores pontos – e, em uma condição ideal, outro colocando-se entre o tal primeiro piloto e seus rivais. O problema é que esse cenário é difícil de obter-se. Afinal, pilotos são serem humanos e cada um reage de uma maneira diferente a essa espécie de rejeição.
Tomemos como exemplo Mark Webber e Felipe Massa. O primeiro, quando se sentiu deixado para trás em Silverstone 2010, venceu a corrida e soltou a famosa “nada mal para um segundo piloto” no rádio. O segundo calou-se diante das ordens de equipe e lembrou que fora beneficiado por elas no passado. Ambos tinham uma história longa na Red Bull e Ferrari, respectivamente, quando passaram por estas situações e viram pilotos virtuosos chegando e roubando seu espaço.
Sebastian Vettel e Fernando Alonso também são diferentes. O alemão brinca externamente e é duro internamente na equipe, enquanto o espanhol é político e intransigente em suas posições. A Red Bull, e suas raízes britânicas, prefere manter as aparências, enquanto a Ferrari se coloca acima de tudo. Um caldeirão de diferenças que leva a dois resultados completamente distintos: se por um lado Webber chega a tirar pontos de Vettel, Massa dificilmente age de forma efetiva como escudeiro de Alonso.
Esse é o grande risco da filosofia de priorizar um líder: fazer com que seu piloto se sinta tão excluído da equipe que ele mesmo se anule. Dessa maneira, ainda que o primeiro piloto continue marcando seus pontos sem ser incomodado internamente, não pode contar com a ajuda do companheiro, assim como a equipe dá um tiro no pé no Mundial de Construtores. Como sempre no mundo da F-1, é uma complicada questão de comprometimento. E de aparência.
7 Comments
Olá, Julianne.
Um outro problema desta tática da Ferrari, é apostar todas as fichas no piloto nº 1 e este piloto se acidentar e se afastar por algumas corridas, como já aconteceu quando o Schumacher quebrou a perna e tiveram que olhar para o 2º piloto da época, o Irvine. É um risco enorme, colocar todos os ovos na mesma cesta.
Ju, em todos esses anos vendo F1, uma imagem que me parece peculiar à toda equipe, é sempre haver, mesmo que subentendido, o piloto número 1. Por mais que parece que tenha igualdade, me parece que Hamilton é a atração principal da Mclaren, a aposta, algo que o experiente e campeão Button não parece levar à sério, sendo que venceu o rápido Hamilton em 2011. Em 2008, alguém tem dúvidas que Kova era segundão? Me lembro que em 1992, na invencível Willians, Patrese era o segundão de Mansell. Ju, caindo naquela sua teoria de melhor carro que equipara os rendimentos, vc acha que o fato de teoricamente e respectivamente, o fato de nos últimos três anos, RBR e Mclaren, que produziram bons carros, tiveram boas disputas entre os primeiros pilotos Vettel/ Hamilton x Webber/ Button, ao passo que nos últimos três anos, os carros ruins da Ferrari, criaram um abismo entre Alonso e Massa? Vc não acha que seria mais um caso de carro mal nascido, que expõe as falhas do segundo piloto, do quê uma questão de gerenciamento/psicologia, que atrapalhe a soma de pontos para a equipe? PS: as palavras de Witmarsh, penso que sejam mais uma pressão psicológica sobre Alonso, que está liderando o campeonato, pois ninguém atira pedra em gato morto.
Concordo contigo na “aparência” que prevalece na Red Bull e na McLaren e que um carro bem nascido pode mascarar o primeiro piloto da equipe.
Também acredito que o fator na Ferrari é muito mais ligado ao estado psicológico do Massa, que mesmo com essa tradicional predileção da Ferrari por um dos pilotos, não deixou criar situações onde o, teoricamente, segundo piloto tivesse condições de competir. Vide o próprio Massa em 2007 e 2008.
Além disso, mesmo com um carro não dominante, a Renault adotou uma política centralizadora em Alonso e isso lhe rendeu dois títulos de construtores, em 2005 e 2006. E ao contrario, mesmo com um carro dominante, a Red Bull quase jogou fora o campeonato de 2010.
É difícil sustentar isso se lembrarmos dos ótimos carros da Ferrari do início dos anos 2000 e do gerenciamento da situação interna da equipe na época. Por isso digo que depende dos envolvidos. É a química entre as características de dirigentes, o piloto-líder e seu companheiro que vai determinar se dará certo ou não. Até por isso vemos tantos exemplos de equações que não funcionaram.
Sim, concordo. Não há uma fórmula exata, apenas acredito que sempre há um 1° piloto nas equipes de F1. O que pode variar é a forma, velada como na McLaren ou escancarada como na Ferrari.
O problema na Ferrari é o carro que é ruim e assim, escancara as dificuldades de um piloto comum como o Massa e escancara as habilidades de um piloto genial como Alonso.
Em 2009 o péssimo carro da ferrari mostrou que Fisichella e o outro lá que esqueci o nome, assumiram o carro do Felipe e foram um desastre total, porque estavam despraparados e eram medianos.
Massa permanece como um mistério insondável, pois seu rendimento caiu demasiadamente, muito além do que seria de se esperar. Demonstra apatia e, sobretudo, resignação diante de sua enorme inferioridade a Alonso. Barrichello ainda esperneava diante de Schumacher. Como você observou, Julianne, cada um reage à sua maneira. Mas essas coisas sempre ocorreram na F 1. Assim como Webber reclamou, Innes Ireland, por exemplo, em priscas eras, sempre se achou injustiçado na Lotus em função da preferência que Colin Chapman dispensava a ninguém menos que Jim Clark, no qual já reconhecia a genialidade que viria a consagrá-lo depois. Ireland sempre que tinha oportunidade expressava sua mágoa. De Peterson então, que nunca reclamava, prefiro nem falar, para mim foi o campeão moral de 1978, sempre achei absurdo Chapman ter optado por dar preferência a Mário Andretti. Quanto a McLaren de hoje, o carnaval de erros da equipe atingindo os seus dois pilotos tem sido tão grande que a meu ver nem dá para perceber se a equipe prefere Hamilton (que estará livre para escolher seu rumo no final deste ano e ainda poderá pedir muito mais na hora da renovação com um bicampeonato nas mãos) OU Button (que já está assinado para mais uns dois ou três anos e já provou com a Brawn que com um bom carro nas mãos também pode ser campeão). Pessoalmente, eu gosto muitíssimo mais de Hamilton. Ele e Kobayashi sabem como ninguém mais como temperar uma corrida (se bem que ultimamente Lewis vem economizando no molho, por causa dos pneus). Com tudo isso, saiu em último em Barcelona e chegou em oitavo. Sou favorável a igual tratamento entre os pilotos de uma mesma equipe e que vença o melhor ou quem tiver mais competência circunstancial.