F1 Pneus com limites e pilotos exaustos - Julianne Cerasoli Skip to content

Pneus com limites e pilotos exaustos: está tudo interligado no GP do Qatar

O GP do Qatar não é daqueles fáceis de explicar. Por uma combinação de fatores, o uso dos pneus teve de ser limitado a 18 voltas por jogo na corrida. Por uma combinação de fatores,  sendo essa limitação dos pneus um deles, a corrida se tornou fisicamente extenuante a ponto de Logan Sargeant ter de parar por desidratação e outros pilotos relatarem terem sentido como se estivessem desmaiando ou a ponto de desmaiar no carro.

O limite de voltas no pneu também teve outro subproduto. Sem conseguir usar a vantagem que a Red Bull tem no consumo de pneus por conta das restrições, e com a equipe optando por fazer uma corrida mais defensiva, ditando a Verstappen apenas o ritmo suficiente para vencer, Verstappen levou mais uma, mas com menos de 5s de vantagem para Oscar Piastri, da McLaren, que ainda colocou também Lando Norris no pódio.

Por que o GP do Qatar teve limite para os pneus

Mas quais combinações foram essas? A Pirelli notou um princípio de separação entre o composto do pneu e sua carcaça após as sessões de sexta-feira. Isso era um sinal de que os pneus estavam sendo “esmagados” em algum ponto da pista. A suspeita recaiu sobre as curvas 11 e 12, em alta velocidade, longas, e com zebras no formato de diamante no canto externo.

Essa era a combinação: o formato da zebra, a carga que estava sendo exercida no pneu por conta da velocidade, e a duração dessa alta frequência de movimento. O temor era que, após uma longa sequência de voltas (e as equipes planejavam fazer só uma parada no domingo), o pneu poderia sofrer delaminação.

A solução veio em duas partes. A largura da pista foi encurtada em 80cm para que os pilotos não fossem mais na zebra. Isso causou o primeiro subproduto: sem sentir a vibração da zebra, os pilotos tinham que determinar no olhômetro se estavam dentro da curva. A 280km/h e sob condições físicas longe de 100%, como veremos mais adiante.

A segunda parte da solução foi limitar o número de voltas em 18 por jogo de pneus, incluindo voltas rápidas que tivessem sido dadas antes da corrida. Isso teria uma série de ramificações. 

Menos erros no shootout = mais flexibilidade na corrida

As equipes ficaram sabendo que essa era uma possibilidade no sábado de manhã, antes do sprint shootout. Afinal, os problemas com os pneus eram microscópicos, e só foram detectados após a Pirelli recortar os pneus devolvidos na sexta-feira.

Fatalmente, quem conseguisse economizar voltas rápidas (efetivamente, quem conseguisse passar do SQ1 e SQ2, em que se usa obrigatoriamente pneu médio, sem problemas com limites de pista ou quem fosse eliminado cedo) teria vantagem na corrida, com mais flexibilidade na estratégia.

Adivinha quem tinha mais flexibilidade entre os ponteiros, ainda que muito menos que em um GP normal? Verstappen, que teve problemas com os limites de pista, mas só quando calçou os macios, que mal apareceriam na prova tamanho o desgaste visto na sprint.

Falando nela, Verstappen não largou na frente desta vez, justamente pelas voltas deletadas, e coube a Oscar Piastri fazer prevalecer a vantagem do pneu médio para passar George Russell e vencer, na sprint que selou a conquista do tricampeonato por Verstappen.

Como o GP do Qatar se tornou uma batalha física

Toda essa história de pneus teria, ainda, uma influência em quão dura a corrida foi fisicamente. Tendo de fazer pelo menos três paradas para completar as 57 voltas com jogos que podiam fazer, no máximo, 18 voltas cada, os pilotos acabaram podendo forçar muito mais o ritmo do que fazem normalmente. E para entender isso é preciso compreender que uma estratégia de corrida leva em consideração a maneira mais rápida de terminar o GP, e não cada volta.

É por isso que é comum que os pilotos adotem um ritmo mais conservador porque isso permitirá terminar o GP com menos paradas. E gastando menos tempo do que se estivessem tirando tudo o que o pneu tem para dar e visitando os boxes mais vezes.

Como eles precisavam parar pelo menos três vezes, o jeito mais veloz de terminar a corrida passou a ser forçando mais o pneu. E isso também força mais o físico do piloto, que já estava sofrendo por outros fatores.

O clima do Qatar tem mudado, e o calor e umidade que marcam o verão (que termina em setembro por lá) chegaram até novembro ano passado e ainda não deram trégua neste ano. Isso não foi sentido em todos os dias: na sexta-feira e até a noite do sábado, ventava tanto que não se sentia a umidade. Quando o vento parou, ficou claro que estávamos em um caldeirão tão úmido quanto Singapura, só que mais quente, com sensação térmica de 35ºC à noite.

Mais extenuante que Singapura

Sabemos que o ritmo da corrida de Singapura é lento, já que o líder pode ditar o ritmo porque as ultrapassagens são muito difíceis. E a pista é lenta também. No Qatar, tivemos, paradoxalmente, uma corrida em ritmo de classificação devido à restrição dos pneus. E em uma pista com praticamente todas as curvas (tirando a 6) de alta velocidade, com somente uma reta para os pilotos terem uma trégua.

Estava desenhado um cenário terrível para os pilotos, que terminaram a prova escalando os carros com dificuldade por conta da desidratação. Já está acertado que o GP vai mudar de data e será em dezembro, logo antes de Abu Dhabi ano que vem. Na verdade, esse sempre foi o projeto inicial. O Qatar não escolheu essa data.

A questão que tem de ser questionada e resolvida é a das zebras. Para este tipo de pista, com curvas longas e rápidas, ela não pode ter esse formato. Até porque os pneus da F1 não vão mudar: a categoria renovou com a Pirelli até 2027.

Piastri e Norris se recuperam de erros na classificação

Oscar Piastri, McLaren, 2nd position, and Lando Norris, McLaren, 3rd position, congratulate each other after the race

As curvas de alta velocidade não poderiam ser uma notícia melhor para a McLaren, que teve seu melhor fim de semana em termos de ritmo do ano. Na classificação, uma chance foi perdida quando ambos os pilotos tiveram voltas deletadas no Q3, colocando Piastri em sexto no grid e um irritado Norris em décimo.

A situação começou a melhorar quando o australiano agradeceu a chance dada pela colisão das duas Mercedes na primeira curva e se colocou em segundo.

A tal colisão teve sua raiz no limite de voltas dos pneus: Hamilton não tinha como completar a prova com os médios e duro que tinha à disposição, então teria que largar com o macio. A sprint já tinha mostrado que o macio dava muito mais aderência nos primeiros metros, mas acabava muito mais cedo.

Hamilton só teve tempo de usar essa aderência: largou muito bem e estava a ponto de passar Russell e partir para cima de Verstappen, mas calculou mal o espaço, ensanduichou George, e acabou fora da prova. 

Russell teve de trocar os pneus prematuramente, o que significou que teria de fazer 4 paradas. Mas um misto de sorte pelo SC causado pela própria colisão no início e um ótimo ritmo podendo tirar tudo dos pneus fez com que ele conseguisse escalar até a quarta posição.

Norris foi de décimo ao pódio

Não foi mais adiante porque o ritmo das McLaren era superior. Norris logo percebeu que a condição de pista tinha melhorado do sábado para domingo e era possível forçar mais o pneu, e foi usando um misto de ritmo de overcuts (parando depois de seus rivais diretos) para ir abrindo caminho no meio do pelotão. O fez até chegar em Piastri mas, diferentemente do Japão, não havia uma diferença gritante de ritmo entre eles, que aparece nas corridas com alta degradação. Não era o caso da corrida toda especial do Qatar.

Charles Leclerc foi o quinto colocado com a Ferrari, surpreso pela diferença de ritmo para a Mercedes, embora a Ferrari tenda a sofrer mais em pistas que punem primeiro os pneus dianteiros. Coisas do acerto todo especial do carro de Maranello. E o monegasco ainda teve que pilotar várias voltas sabendo que, se saísse mais uma vez da pista, seria punido. E se segurou, ao contrário do que fizeram Gasly e Perez (punidos três vezes), e Albon e Stroll (punidos duas cada).

Corrida de sobrevivência

Foi uma corrida de sobrevivência. Alonso foi sexto reclamando de superaquecimento do assento. Ocon foi sétimo mesmo tendo vomitado na primeira parte da corrida. Stroll fez dois pontos, sofreu para sair do carro e logo foi atrás da ambulância.

Mas tinha uma equipe celebrando a regra especial dos pneus. A Alfa Romeo fez duas estratégias diferentes, se aproveitando dos jogos novos que tinham à disposição. Bottas aproveitou o SC no começo para se livrar dos macios, e Zhou colocou o composto macio no finalzinho. Ambos chegaram nos pontos. Outros pilotos que tinham vários jogos novos, como Magnussen e Albon, não pontuaram.

Há várias lições deste GP do Qatar. A F1 não vai mais arriscar correr remotamente perto do verão no Oriente Médio. O composto da Pirelli não aguenta passar por esse tipo de zebra nesse tipo de pista. E talvez gerar a obrigatoriedade de usar os três compostos na corrida (indiretamente obrigando duas paradas e que haja menos administração) pode não ser uma má ideia.

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