F1 O legado - Julianne Cerasoli Skip to content

O legado

No dia 1º de maio de 1994, descobri que ninguém era imortal. Coisa de criança, claro. Mas parece que não estava sozinha. Em meio à tragédia de ver provavelmente o maior ídolo que a Fórmula 1 já produziu morrendo ao vivo pela TV, a FIA tomou uma série de medidas para se certificar de que, se aquela não fora a última vez que veríamos algo parecido, que pelo menos todo o possível fosse feito para que aquelas cenas não se repetissem.

Existe uma F-1 antes e depois daquele 29 de abril com Barrichello, daquele 30 de abril com Ratzenberger e daquele 1º de maio com Senna. E, por que não, do quarto aviso, de Wendlinger na corrida seguinte. Aquela F-1 conivente com o perigo sob a justificativa de que a coragem de desafiar a morte fazia parte do esporte havia sido chacoalhada com o acidente de Villeneuve 12 anos antes e morreu ali. E nasceu uma nova relação, mais sadia, com o limite.

Para o GP seguinte ao de San Marino, em Mônaco, a FIA determinou uma série de mudanças nos procedimentos no pitlane. É dessa época, por exemplo a restrição da circulação de mecânicos aos pit stops, algo que soa primário hoje. A Associação dos Pilotos foi recriada e, no GP da Espanha, menos de um mês após os acidentes de Imola, começaram as modificações nos carros para reduzir a pressão aerodinâmica e, consequentemente, a velocidade em curvas.

Para a etapa seguinte, dia 12 de junho, mais mudanças. Algumas, como o aumento do peso do carro, eram novas medidas para diminuir a velocidade, enquanto outras visavam exclusivamente a segurança. As laterais do cockpit foram levantadas, os braços de suspensão ganharam reforço para não se soltar em acidentes e o cockpit ficou mais longo, para evitar que o piloto batesse a cabeça. O HANS, desenvolvido desde a década de 1980 e que evita o excesso de movimentação da cabeça durante acidentes, chegaria à F-1 em 2001 e só seria adotado de forma obrigatória em 2003.

O passo seguinte foi aumentar a segurança das pistas, exigindo áreas de escape maiores e projetando novas barreiras de pneus, em uma evolução que chega hoje às placas de concreto preenchidas com água. As velhas britas também estão virando raridade, dependendo do tamanho da área de escape, pois hoje se sabe que as áreas asfaltadas e amplas são mais seguras.

Nos carros, os crash tests se tornaram cada vez mais exigentes e, inclusive, passaram recentemente por nova mudança. A partir de 1999, os pilotos passaram a ser retirados junto de seu assento, para evitar o agravamento de lesões na coluna. Os capacetes também sofreram mudanças e, desde 2011, contam até com uma faixa de Zylon, considerada a fibra mais forte já produzida pelo homem, no visor.

Contudo, ao mesmo tempo em que é louvável o esforço para tornar a F-1 – e o impacto no restante do automobilismo é direto – mais segura desde 1994, há algo que incomoda. Uma das possíveis causas da morte de Senna seria o impacto de um pneu em sua cabeça, além do corte causado pelo braço de suspensão que se soltou. Como ainda não foi criado um mecanismo 100% eficiente para manter as rodas afixadas em acidentes, é impossível cravar, mesmo após 19 anos de melhorias, que nada de grave aconteceria se as cenas daquele 1º de maio se repetissem hoje.

15 Comments

  1. Ju, apesar de hj reclamarmos dos Tilkódromos (pistas), é inegável a segurança passiva dos mesmos…Saindo um pouco da F-1, vendo o acidente da Stock, com a capotagem de Marcos Gomes, vemos o quanto uma pista sem estrutura pode ser perigosa, afinal sem área de escape para desaceleração, qualquer saída de pista pode ser muito perigosa…Infelizmente para se chegar em melhorias, temos que ter cobaias e, as vezes, algumas “cobaias” pagam com a vida. Vivemos em um mundo violento, onde muitas pessoas apreciam a agressividade, em qualquer área, pois acham normal um sujeito socar o outro e chamam de esporte… Faço parte da corrente que prefere o fair play, com os atletas saindo ilesos, nisso, os Tilkódromos são referência. De tudo que vc citou, além das rodas se soltarem, temos o exemplo do GP da Bélgica de 2012, onde Grosjean poderia ter decapitado Alonso…Além de Sutil/ Shumacher em Abu Dhabi 2011… Fica a eterna dúvida estética/segurança entre fechar ou não o cockpit. Ps: Ju, já que vc tocou no acidente de Senna, tenho uma dúvida que me acompanha desde 94: onde será que estão as derradeiras imagens on board da Willians nº2 ? Com Bernie? Frank Willians? Patrick Head? Pra ser sincero, essa história que as imagens foram cortadas antes do impacto não me convenceram até hj…

    • É bom aceitar, as imagens, SE, haviam, apagaram e sumiram com elas. Porque? Talvez porque fosse forte de mais??? Talvez porque houvesse algo ali que incriminasse alguém???

      Ou talvez seja porque realmente a imagem foi cortada, lembre-se, isso era em 1994.

      Acostume-se, mesmo tendo ou não imagens, nada vai mudar, ninguém vai saber ao certo o que ocasionou o acidente, a quebra da barra de direção??? Ou a baixa pressão dos pneus que fez o carro bater o assoalho no chão e perder o controle, como mostrou o documentário do NatGeo.

      O certo??? Morreu, acabou… passado, não volta mais.

      • Adrian Newey sabe….

      • Caro, Elizandro, na verdade, foi veiculado na época, tanto pela imprensa escrita quanto falada, que Senna havia pedido para a Willians diminuir a barra de direção, pois sua mão raspava no cockpit…O FW16, que herdara as especificações do FW 15, guiado por Prost em 1993, tinha o volante muito próximo da carenagem, e como Senna era maior que o francês, necessitava de “ajustes”. O fato é que o ajuste de última hora (gambiarra inglesa) foi um dos fatores que contribuíram para a fatalidade. A Willians foi absolvida, mas a responsabilidade da equipe é notória, pois fizeram a emenda, e Senna confiou. Essa história de “carro batendo o assoalho no asfalto”, foi uma forma de limpar a barra da equipe inglesa, a famosa justiça para inglês ver…Concordo com o Petrus, Newey sabe o que aconteceu, pois era engenheiro na época. A telemetria mostra a queda de pressão abrupta antes da batida. Enfim, “jeitinho brasileiro” existe em qualquer lugar…Ps: como Piquet mesmo disse: ” um piloto experiente como Senna nunca erraria numa curva de fácil tomada como a Tamburello, que nada mais é que uma reta curva”. O fato é: muitas coisas contribuíram para a fatalidade, como a emenda na barra de direção; uma curva de alta com área de escape ridícula e sem barreira de proteção. Interlagos na época tinha mais segurança que Imola. Como está na Europa, panos quentes foram colocados, mas imagina se essa tragédia fosse no Brasil?

    • Bom… vamos começar…
      Sobre as coberturas no cockpit acho totalmente inviável. Se dá algum acidente grave e o negócio trava? Até mesmo acidentes com caça em que o piloto não conseguiu ejetar o banco por travamento da cobertura já ocorreu. Na F1, acidentes são comuns. Se algum mais sério ocorrer e não se puder tirar o piloto a coisa fica irreparável em minutos. Não sei se o risco de ter compensa o ganho. Mas ver cenas como a morte de Henry Surtees por causa de um pneu quicando na pista é aterrador.
      Sobre o acidente. A barra de direção quebrou. O volante chega a mudar de lugar, indo parar no colo de Senna. A imagem mostra isso, nem precisa da imagem do impacto em si.
      Outra coisa importante. Senna sabia do ajuste na direção. Ele mesmo pediu. Assim como o time confiava nele, ele confiava no time. Mas ele sabia que um ajuste assim podia dar errado, assim como vários ajustes na época, por conta da falta de segurança de pistas e carros. Pra quem fica é fácil ter o dedo apontado dizendo “você é culpado”. Mas se Frank, Newey e Head são culpados, também o é o próprio Senna. Isso ninguém pensa. Acho que ao invés de achar culpados para o que eu vejo como uma triste fatalidade, devemos manter a imagem do eterno ídolo, o herói, que morreu fazendo o que amava e como sempre o veremos, em primeiro lugar.

      • Américo, o risco seria de as estruturas empenarem com a batida, é verdade, então realmente é um grande dilema adotar ou não as proteções. Mas como sou apenas um aficionado e não um projetista, não me atrevo a avançar uma opinião sobre a viabilidade e a praticidade delas. Mas esteticamente até que a coisa não ficou mal aí nesses estudos, isto é, no meu ver.

  2. Faz parte da vida, é como aviação, decolar é opcional, aterrizar é obrigatório. Temos que ter em mente que cedo ou tarde algo vai acontecer de errado e o treco vai despencar. Resta saber quem será o “sortudo” a bordo do aparelho.

    No automobilismo, assim como nos esportes radicais é tudo questão de quando acontecerá um acidente. Alonso só não teve a cabeça arrancada pelo carro do Grojean porque levou sorte.

  3. 31 de abril não existe, só para constar.

  4. As medidas de segurança também têm que ser acompanhadas de responsabilidade por parte dos pilotos. Imprensadas contra o muro e abalroamentos intencionais nos adversários são atitudes inadmissíveis e irresponsáveis que não têm sido objeto de punições mais rigorosas e deveriam sê-lo. Ressalte-se que esses fatos tem ocorrido na F 1 notoriamente tanto com pilotos que procuram afirmação como com campeões mundiais. Francamente! Uma coisa é um toque de rodas incidental numa disputa ferrenha com bastante espaço fora da pista, seja de caixa de brita ou de área asfaltada, como há na maior parte dos autódromos de hoje, outra coisa é jogar ou espremer o adversário contra o muro!

  5. Se vc for ver hoje, fazer uma curva como a Tamburello, de pé em baixo, tendo nada mais que um muro de concreto pra segurar um possível choque, é uma total insanidade. Mas na época parecia a coisa mais normal do mundo.

    Ainda existem autódromos de risco alto, Mônaco, Suzuka e Interlagos, por exemplo, têm muros muito próximos da pista.

    O incrível é que é exatamente dessas pistas que os pilotos gostam mais.

  6. A comoção pela morte do Senna depois de 19 anos é inacreditável…daquele sentimento de perder uma pessoa querida e que mesmo que se passem 40, 50 anos aquela dor e saudade continuam presentes.

    • Talvez com outra geração, que não conheça ou entenda o que foi, como estava o país à época e o que significou tudo que ele fez, erguendo a bandeira brasileira sempre nas vitórias, a imagem de Senna se perca um pouco. Mas enquanto essa geração estiver por aí a imagem está mais que segura.

  7. A F1 não acordou para a segurança só depois de Imola’94. A bandeira da segurança tanto nos carros como nas pistas foi levantada por Jackie Stewart, ajudado pelo Emerson, já no início dos anos 70. Guard rails foram melhorados, telas instaladas, novas idéias de tempos em tempos foram aparecendo para melhorar a segurança. Assim como na aviação, cada acidente serviu para provocar uma melhora. Com os do Ayrton e Ratzenberger não foi diferente. Uma das primeiras medidas que lembro foi do reposicionamento do aerofólio traseiro, seja na altura (antes dos anos 70) ou na distância do eixo traseiro à asa, limitada a partir de 1973. Os tanques que explodiam com muita facilidade foram substituidos pelos de borracha. As coisas evoluiram paulatinamente. Assim acontecia com os circuitos, sempre com novas exigências a cada ano. Coincidentemente, os primeiros pilotos a cuidarem da sua forma foram também Emerson e Stewart, que já cuidavam da alimentação, pelo menos nos dias da prova, não fumavam e não bebiam, para que pudessem fazer toda uma corrida não só com o máximo da capacidade mas também pensando na segurança, chegando inteiros e com menor risco de erros. Pelo menos há duas décadas antes de 94 a segurança já era uma preocupação constante. Poucos gostaram de assistir Roger Williamson, Ronnie Peterson e Ricardo Palletti morrerem praticamente diante de seus olhos, ou ver Lauda em meio a uma grande fogueira no Inferno Verde, Berger explodir na mesma Tamburello do Senna. E se salvar porque os carros já haviam avançado muito em termos de segurança.

  8. Ju, Ico e amigos vou passar um relato do que vivi naquela semana fatídica pós-morte de Senna.
    Eu era leiturista do Serviço de Água de Itu/SP, tinha 17 anos.
    Era semana de leitura, e em muitas casas o relógio era pra dentro e tinha que tocar e chamar o morador para eu entrar e a sensação era a mesma: parece que em cada casa havia morrido alguém, uma tristeza que parecia não se acabar.
    As pessoas estavam abatidas e tristes, falavam inconformadamente sobre a morte do Ayrton, alguns choravam…
    E nas rádios só tocavam o tema da vitória, uma maneira de recordar as alegrias das manhãs de domingo que Ayrton trazia.
    Desde então 19 anos se passaram, mas minha paixão pelas corridas nunca acabou, faço curto-as tanto quanto antes do Ayrton chegar a F-1 e durante sua era, mas Ayrton faz muita falta. Algumas pessoas são insubstituíveis….


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