As luzes vermelhas se apagam é dada a largada para o GP da Espanha. Rosberg vai passar Hamilton na largada? Ricciardo consegue se colocar entre as Mercedes? Massa faz mais uma de suas boas saídas? Nada disso. “Hamilton primeiro, Felipe arriscou mas não conseguiu ganhar as posições, ficou ali mesmo atrás das Ferrari”, diz um frustrado Galvão Bueno na Globo. É o mesmo tom de Antonio Lobato na espanhola Antena 3. “Fernando tenta pegar o vácuo de Raikkonen, vai pelo interior. Freada brutal de Grosjean e Fernando teve de levantar um pouco e foi prejudicado. No momento, não há muitas mudanças de posições, mas Vettel, que não está acostumado a largar atrás, está sofrendo.”
Sim, Vettel também chama a atenção de Galvão. “É diferente largar no meio do pelotão, amigo”, diz o narrador, que ‘pega no pé’ do alemão por toda a primeira parte da prova, incrédulo de suas chances de recuperação após largar em 15º.
Na Sky Sports britânica, o comentarista Martin Brundle destaca a largada de Bottas, que superou Ricciardo e pulou para terceiro e diz que “Alonso sabe que precisa passar Raikkonen na primeira volta. Mas as Ferrari parecem que não têm aderência nenhuma e Massa está chegando.”
De fato, tudo fica como está, com Hamilton na ponta, “forçando como um animal”, na visão de Lobato. “Fico imaginando o que a Mercedes pode fazer de diferente. Talvez a chance de Rosberg seria usar o pneu duro, que é ruim, em uma parte diferente da corrida, como no Bahrein. É sua única chance”, avalia, acertadamente e logo na segunda volta, o repórter britânico Ted Kravitz.
Os espanhóis não veem isso e querem Rosberg pressionando Hamilton. “Não gosto do que vejo. A luta entre Rosberg e Hamilton seria muito boa, abriria a possibilidade de algo”, acredita o comentarista Pedro de la Rosa. Na outra briga, Ricciardo fica colado em Bottas, mas não consegue passar. “O Ricciardo vai ter de se decidir rapidamente porque seguir um carro de perto é muito ruim nesta pista, porque deteriora os pneus dianteiros”, avalia Rubens Barrichello.
Sem luta na ponta e com Alonso para trás, o desânimo toma conta dos espanhóis, que mudam o foco. “É impressionante o número de pessoas nas arquibancadas, muito diferente de quando comecei. Carlos Gracia me contou que Senna lhe perguntou no final dos 80: ‘você sabe qual a diferença entre o GP da Espanha e os demais? Nos outros, os espectadores conhecem os pilotos. Aqui, os pilotos conhecem os espectadores.’ Hoje é muito diferente e isso é impressionante em tempos de crise. Mas, dito isso, queremos ganhar”, diz De la Rosa.
Logo chegam as primeiras paradas e a escolha da Ferrari de parar Alonso antes de Raikkonen, mesmo que o finlandês fosse à frente, chama a atenção.“Se Raikkonen é a primeira Ferrari na pista, por que foi Alonso que parou antes?”, questiona o narrador britânico David Croft. “Pode estar em seu contrato, quem sabe?”, responde Brundle. Na Globo, a tática é vista como uma jogada para colocar o espanhol na frente sem pedir para o finlandês abrir. Na Antena 3, há outra explicação.“Vai ser complicado na Ferrari porque Kimi não vai querer que Fernando pare antes, mas Fernando tem de entrar agora porque Massa parou e está logo atrás dele”, explica De la Rosa, prevendo que o brasileiro conseguiria superar o ferrarista caso ele não parasse logo. No final das contas, Alonso pega tráfego e as três posições – Raikkonen, Alonso, Massa – se mantêm inalteradas.
Na Red Bull, os dois pilotos antecipam suas paradas, por motivos diferentes, nem sempre compreendidos pelos comentaristas. Galvão segue duvidando que Vettel esteja progredindo. “Com um carro de ponta, você larga atrás e as seis primeiras ultrapassagens vêm automaticamente, mas a situação agora é outra e Vettel está brigando pelo 12º e acaba parando porque a equipe viu que não ia passar.” Mas Barrichello vê a jogada. “Esse é um cálculo que a equipe faz para ele ter pista livre e ganhar posições quando os outros pararem.”
Para De la Rosa, o problema de Vettel é que ele colocou o pneu duro. “No caso de Ricciardo, entendo ele ter parado cedo porque precisa fazer isso para superar Bottas e, mesmo assim, pode converter a uma estratégia de duas paradas. No caso de Vettel, não entendo, porque ele não vai conseguir fazer três paradas pois voltará no tráfego. E ainda mais com pneus duros. Mas eles têm mais informações que eu.” Já Brundle estranha o fato de Bottas não ter respondido à parada de Ricciardo e seguir na pista.
Chega a hora da parada de Hamilton. Para Galvão, isso prova sua tese: “Há uma diferença de tocada entre os dois. O Hamilton dá voltas mais rápidas na classificação e o Rosberg consegue fazer os pneus funcionarem por mais tempo.” Para Lobato, uma chance perdida do alemão, que estaria perto o suficiente para parar antes e superar o companheiro.
A surpresa só aumenta quando Rosberg coloca os pneus duros, mas o narrador logo entende a jogada. “Parece-me muito bom, é por isso que ficou mais tempo na pista. É para ter chance no final. É uma alternativa correta, mas não significa que será suficiente.” Para Galvão, isso quer dizer que o alemão “fará uma parada a menos”, mas o narrador é logo socorrido por Luciano Burti. “Acho que a ideia é o Rosberg colocar o pneu mais rápido no final. Ele sabe que não será ameaçado pelo Ricciardo, então arriscou para tentar ganhar. Está certo.”
Na Sky Sports, Brundle diz que “o que Hamilton tem de fazer é evitar a tentação de tirar tudo do pneu para superar Nico” e destaca que “temos de dar o crédito para a Mercedes, que está deixando os dois disputarem. Isso é importante.”
Todos deixam o monitoramento das diferenças na ponta de lado quando “Raikkonen chegou em Grosjean como um tufão! Grosjean deve estar com alguma falha na recuperação de energia.” Brundle está certo: o francês perdeu rendimento em algumas voltas e foi superado com facilidade pelas Ferrari. Os espanhóis não viram, estavam nos comerciais. “Isso é bom para o Felipe”, considera Galvão, mas o brasileiro não supera a Lotus. Até pela volta 40, inclusive, os brasileiros acham que a estratégia de Massa é boa e destacam que ele ganha terreno cada vez que antecipa uma parada.
Falando em estratégia, De la Rosa não gosta nada da tática de três paradas de Vettel. “É que depende muito dos demais, e o resto vai fazer duas. Ele vai ter que passar na pista.” Algumas voltas depois, quando percebe que Alonso adota o mesmo princípio, admite: “Essa terceira parada de Fernando me desconcertou um pouco.” A tal terceira parada, inclusive, não foi vista pelos espanhóis, assim como a ultrapassagem de Vettel no asturiano. Afinal, foram três comerciais apenas nas 15 voltas finais!
Na briga pela ponta, os palpites se dividem. “O que vai acontecer? Não faço ideia! Parece que Nico tem vantagem, mas é muito pequena”, diz Brundle. “Se o Rosberg parar antes, ele pode passar. Caso contrário ele vai ter que passar em uma pista em que é difícil ultrapassar. Então vou de Hamilton”, crê Barrichello. “Apostaria no Hamilton porque acho que ele vai parar primeiro”, vê Burti. Entre os internautas espanhóis, a 15 voltas do final, só 66% apostam em Hamilton.
Principalmente na última parte da corrida, o tom de Hamilton no rádio chama a atenção de todos.“Lewis está meio paranoico, mas ele tem posição de pista e isso é o mais importante”, defende Brundle. “Não é muito bom Hamilton ficar dando tantas informações assim para a equipe porque elas vão diretamente ao companheiro, que é seu primeiro rival no momento”, alerta De la Rosa.“Até o tom da voz de Hamilton está meio apavorado, mas é a aquela velha história da F-1: chegar é uma coisa, passar é outra”, avalia Galvão.
E não era apenas Rosberg que estava chegando nas voltas finais. Ainda que a transmissão brasileira tenha focado quase exclusivamente na luta pela liderança, os demais se dividiam entre a progressão de Vettel, que caçava primeiro Raikkonen, e depois Bottas, e a seguinte luta interna na Ferrari.
“É o GP do Bahrein revisitado. Hamilton tem a posição de pista, Rosberg tem teoricamente a melhor estratégia”, resume Brundle. Sobre Vettel, o comentarista acredita que seu desempenho comprove que “é a Red Bull que tem a chance de chegar na Mercedes durante a temporada. Imagina a cara do Alonso no final da corrida.” De fato, entre os espanhóis, o clima é de resignação. “Alonso segue forte e tentará ficar na frente de Raikkonen porque, sejamos francos, é o máximo que pode hoje.”
Vettel passou por Raikkonen com facilidade. Para Brundle, porque “o alemão pegou o finlandês dormindo”. Para Lobato, “Kimi facilitou porque sabe que sua briga é com Fernando.” Os espanhóis destacam o lado psicológico da briga interna na Ferrari. “Não tem nada que Kimi goste menos de ver do que Alonso chegando nele. Em 96% das voltas antes desta prova ele ficou atrás.” Já para Galvão, o fato de Alonso ter parado uma vez a mais e chegar mais forte no final indica que “não precisa de ordem na Ferrari, eles dão um jeitinho de inverter.”
Faltando três voltas para o final, quase simultaneamente, Vettel supera Bottas – e ganha elogio de Galvão, que o considera “cirúrgico nas manobras” – e Alonso passa por Raikkonen, após uma “pilotagem brilhante dos dois campeões do mundo. Era o que queríamos ver quando a dupla Alonso e Raikkonen foi anunciada”, como destaca Croft, que logo foi corrigido por Brundle. “Mas esperávamos ver isso pelo primeiro lugar, né?” Na Globo, focada nas Mercedes, Barrichello se limita a dizer que “Esse [Alonso] conhece”, enquanto os espanhóis vão à loucura, com direito a citação ao time do coração de Lobato, o Atlético de Madrid. “Fernando tenta com algo além da velocidade, além da mecânica, numa tática meio Diego Simeone [treinador do Atlético]. Como ele foi bem, que barbaridade! Como ele preparou a ultrapassagem!”
O foco de todos volta no duelo Hamilton x Rosberg, mas está tarde demais e Galvão deita e rola com seu bordão “chegar é uma coisa, passar é outra” e o inglês cruza a linha de chegada na frente. “Ele teve de lutar por isso”, destaca Croft. “A posição de pista foi o principal. Rosberg fica sempre no ar turbulento, isso acaba destruindo suas corridas. Ainda bem que eles deixam os dois correrem entre eles. O sexto colocado foi o último na mesma volta”, lembra Brundle.“O pior é que ele não sabe o que fazer para deter o Hamilton”, avalia Barrichello. E isso acontece, para Galvão, porque “além da velocidade maior, Hamilton conseguiu tirar o que o carro não tinha nas últimas voltas.”
Conseguiu, mas foi suado, como viu De la Rosa. “Foi uma corrida em que você se perguntava ‘mas Hamilton está em primeiro ou está tudo dando errado para ele?’ porque ele só reclamava. Mas está claro que ele teve dificuldades com os pneus.”
Mesmo assim, o inglês não foi considerado o piloto do dia. Bottas ganhou destaque de Galvão, que justificou que “Massa não chegou nos pontos porque fez três paradas.” Curioso, porque, para espanhóis e britânico, o grande destaque adotou a mesma tática: “o piloto do dia foi Vettel, com grandes ultrapassagem e ritmo”, sentenciou Brundle.