Os primeiros 30s do GP da Espanha foram os mais longos dos últimos tempos na Fórmula 1. “É uma super largada de Nico Rosberg. Hamilton tenta cobrir seu companheiro mas ele vai por fora e passa!”, o narrador britânico da Sky Sports, David Croft, já se empolgava mesmo antes da saída da curva 3. “Hamilton está na grama! Ele teve um grande acidente, ele bateu no companheiro! As duas Mercedes estão fora. Ele coloca as mãos no olhos e não vai querer mesmo ver o que aconteceu. Vai haver muita discussão a portas fechadas.”
Na brasileira Globo, Galvão Bueno pegou pesado com o inglês. “Olha o Hamilton como voooooltoou… acabou para os dois! E olha que o Marchionne vai ver uma vitória da Ferrari. Hamilton, Hamilton, Hamilton, o que você fez? Se isso é estar com a cabeça boa, imagina se estivesse ruim?” Reginaldo Leme emenda: “Quando ele tomou por fora, pensei ‘lá se foi a cabeça do Hamilton’.” E Galvão continua. “Ele fez uma das grande bobagens dos últimos tempos na F-1 porque a ultrapassagem do Rosberg foi limpa e clássica. O Rosberg fez o que tinha direito porque o piloto pode mudar a linha uma vez. Ali não tem moleza entre os dois.”
Na Movistar espanhola, o lance causa discussão entre os comentaristas. “O alemão vai, o alemão vai! Hamilton perdeu o carro, as Mercedes vão embora! Cena de cinema!”, narra Josep Merlos. “A tensão mostrava que isso ia acontecer”, observa Joan Villadelprat. “Rosberg fechou e não deu espaço. Hamilton tentava recuperar posição, mas não havia espaço”, diz Merlos. “Hamilton sai muito mais rápido da curva e Rosberg diminui o espaço”, avalia Pedro de la Rosa. “Mas foi demais. Ele não deixou espaço”, retruca Villadelprat. “Mas o regulamento diz que ele pode usar a pista inteira”, responde De la Rosa. Para encerrar a conversa, Merlos diz que é “uma manobra que lembra, como vocês sabem, Alain Prost e Ayrton Senna na decisão do mundial. Será que Rosberg não teve algum problema? Porque Hamilton chegou muito forte.”
De fato, os replays fazem os comentaristas se atentarem à lentidão de Rosberg na saída da curva 3. “Vimos a luz do carro de Rosberg piscando, o que significa que ele estava recuperando energia. Não vimos o carro de Hamilton, mas acreditamos que não era o caso dele. Dá para ver que o pneu dianteiro já estava do lado quando Rosberg cobriu. Não diria que é 100% culpa dele, mas a equipe pode perguntar por que ele foi tão agressivo”, define Martin Brundle na TV britânica. “Dá para ver a luz vermelha no carro do Rosberg, o que quer dizer que ele estava sem energia híbrida. Por isso é um uma jogada difícil de analisar. Mas para mim Hamilton foi muito otimista”, vê De la Rosa.
Luciano Burti, por sua vez, não presta atenção na luz. “O Rosberg foi conservador na curva 3 porque estava à frente. O Hamilton veio com muito mais embalo, mas não precisava ter ido para a grama. Ele tinha que ter, ou tirado o pé, ou ido para o outro lado. O Rosberg mostrou que ia defender. Não é que ele jogou o Hamilton para fora.”
Com as duas Mercedes fora, Brundle diz que “vamos saber quão boas as corridas estariam sendo” e De la Rosa considera que “a porta está aberta para uma vitória da Ferrari”, ainda que o britânico avise: “quando Ricciardo tem a chance de ganhar, ele não costuma falhar.” Só Reginaldo aposta em algo ainda melhor. “Já pensou ver uma vitória do Verstappen logo na primeira corrida dele na Red Bull?”
Começam então as intermináveis especulações sobre as estratégias, com cada um tendo um ponto de vista diferente. “Pode ser que alguém com um carro estável consiga fazer duas paradas”, diz Galvão, mas britânicos e espanhóis duvidam.
Ted Kravitz, da Sky, comemora quando a Red Bull é a primeira a mexer suas peças e chama Ricciardo ao box – “é arriscado, eu gosto disso, eles não esperaram a Ferrari dar a primeira cartada!” – mas logo começa a ver que talvez a disputa tática na corrida não se limitaria a ver quem pararia antes e, sim, poderia ter estratégias diferentes. A primeira suspeita é quando Vettel alonga seu primeiro stint. “A Red Bull sabe que, andando na frente, é melhor fazer três paradas. Mas agora parece que a Ferrari dividiu suas estratégias e o Vettel vai fazer duas. Nesse caso, ele vai ter posição de pista no final e isso significa que as Red Bull terão de passar na pista, o que é muito complicado aqui”, avalia o repórter.
Na 20ª volta, De la Rosa começa a duvidar que Vettel fará apenas duas paradas “porque o ritmo é muito forte”. O espanhol, na verdade, acha muito difícil que alguém consiga completar a prova com apenas três jogos e pensa em outro tipo de estratégia. “Se a Red Bull quiser ganhar a corrida, deveria sacrificar Verstappen. Deveriam usá-lo para parar Vettel. Iriam ouvir um monte de coisa no rádio, mas é o que tinham de fazer.”
Com pouco menos de metade da prova completada, Ricciardo faz sua segunda parada e coloca pneus macios, deixando claro que faria três. A resposta da Ferrari é imediata e Vettel também se compromete a ir a três pits. “A corrida agora é entre Ricciardo e Vettel”, é a primeira reação de Merlos.
Porém, duas voltas depois, a Red Bull não reage com Verstappen e os espanhóis começam a acreditar que o holandês pode fazer outra tática. “Que bonito”, se empolga De la Rosa, ainda sem acreditar que tal estratégia possa dar a vitória ao estreante. “Vai ser interessante porque acredito que deram a estratégia sub-ótima porque eles [Verstappen e Raikkonen] estavam atrás de seus companheiros. Vão lutar pelo pódio”, diz o comentarista. “Não pensa em vitória?”, questiona o narrador. “Não falo a vitória porque a diferença de ritmo para Ricciardo e Vettel é muito grande.”
Praticamente neste mesmo momento da prova, Burti avalia: “Verstappen não parou. Será que a Red Bull vai tentar algo diferente com ele? A chance dessa corrida ficar muito boa é a seguinte: se o Verstappen fizer mais umas cinco voltas, pode ser que ele arrisque fazer só duas paradas.”
Na Sky, é o narrador Croft quem imagina a possibilidade de Verstappen parar uma vez a menos que os rivais. “Será que ele consegue? Acho que o Vettel está numa ótima posição”, avalia Brundle que, duas voltas depois, admite: “Parece que as duas equipes dividiram suas estratégias e não sei o que vai acontecer.”
As dúvidas só aumentam quando o holandês faz o que seria sua última parada com mais de 30 voltas para o fim. Seria o suficiente? “Poderia funcionar, mas precisavam ficar mais cinco voltas na pista com o outro pneu”, acredita Kravitz. “Acho que ele estava tentando ir a duas paradas, percebeu que não dava e desistiu”, concorda De la Rosa. “Mas o carro está mais leve agora. Será que não consegue?”, questiona Merlos. “Os dois colocaram os médios, então vão a duas paradas. Podemos explicar assim: a estratégia de Vettel e Ricciardo é para lutar pela vitória e de Verstappen e Raikkonen é pelo pódio”, crê De la Rosa, o último dos comentaristas a se convencer de que o piloto de 18 anos pode vencer.
Outra surpresa acontece logo depois, quando a Ferrari antecipa bastante a última parada de Vettel, garantindo o undercut em Ricciardo de maneira muito agressiva. “Estou indo na Ferrari para saber se há algum outro motivo porque isso não faz sentido nenhum”, diz Kravitz, que logo informa que a parada foi apenas tática. “Me parece que comprometeu a possibilidade de vitória.”
Na verdade, tal possibilidade já estava comprometida pelo bom ritmo de Verstappen e Raikkonen, mesmo com pneus mais desgastados. É o que Brundle observa a 26 voltas do fim. “O ritmo do Verstappen e do Raikkonen também está muito bom. Essa estratégia de duas paradas está funcionando no momento”, diz o comentarista que, poucas voltas depois, emenda. “Verstappen pode vencer essa corrida”. E Croft lembra que a pista de Montmeló tem seus segredos. “Lembra quando falávamos que Maldonado não iria vencer? Ele não tem de ser rápido, precisa defender nos lugares certos nesta pista.”
Mesmo com a esperança de um resultado inusitado crescendo, ninguém crava que os pneus aguentarão. Na volta 44, o repórter espanhol Albert Fabrega diz: “Cuidado porque, se Verstappen aguenta, está lutando pela vitória porque quem tem os pneus mais novos está em quarto.”
Até cerca de 10 voltas para o fim, contudo, todos duvidam que seja possível. “Me nego a acreditar que esses dois vão aguentar 32 voltas. Tudo bem que a pista se emborracha, mas não deveria passar de 25”, diz Brundle. “Existe a chance, muito pequena na minha opinião, de um dos dois ir até o final. Mas pelo ritmo deles não tem pneu para fazer isso”, afirma Burti. Mesmo observando que “Vettel está lento”, De la Rosa só se convence de que a vitória de Verstappen é possível com 10 voltas para o fim. Brundle, com cinco.
“Max está usando todos seus anos de experiência muito bem, não? Ele parece tão calmo”, brinca o comentarista britânico. Já os espanhóis acreditam que Verstappen vai conseguir segurar a pressão, “porque nenhum dos jovens da F-1 parece que tem a idade que tem, é como se estivéssemos falando com senhores”, como diz De la Rosa, e Merlos aproveita para apontar que “se Carlos Sainz estivesse nesse carro, estaria fazendo o mesmo”, ao mesmo tempo em que Croft diz que “quando Kvyat não achava que sua vida poderia piorar, o cara que pegou o carro dele vai lá e ganha a corrida.” Para Galvão, contudo, “chegar na F-1 com 17 anos é muito pouco.”
Depois de lembrar que “vão ser dois pilotos perguntando: pq vocês fizeram três paradas comigo e duas com ele?”, Brundle ainda faz uma menção ao acidente da primeira volta, que permeou grande parte da transmissão britânica, brincando com a presença da ex-Spice Girl Geri Halliwell: “Uma boa música para o que aconteceu na primeira volta é 2 Become 1”, citando uma música do grupo que diz “quando dois se tornam um”.
Mas o momento é todo de Verstappen. “Aí vem ele! Max Verstappen vence o GP da Espanha e faz história na F-1! Esse vai ser o cara”, Galvão capricha na narração, assim como Merlos. “Que bestia, que bestia! Senhoras e senhores, estamos vivendo isso ao vivo. Ele foi apresentado como o novo Senna, o que pode soar como algo atrevido, mas como duvidar da capacidade desse cara? Na Red Bull, eles sabem o que fazem. Talvez não sejam os mais simáticos, e Marko é carnívoro da vitória.”
Claro que todos lembram dele, Marko, orgulhoso de sua cria, e não podem esquecer do pai de Max. “Agora Jos tem que desfrutar. Criou um monstro”, resume Merlos.