Ganhadores e perdedores de Xangai e os gráficos do mundial

O circuito nunca foi dos mais favoráveis. Afinal, coloca muito estresse nos pneus dianteiros devido às curvas longas de média velocidade e às freadas fortes e, como a Red Bull costuma funcionar melhor com a dianteira bem presa, o que colocaria ainda mais energia nos pneus dianteiros, foi preciso trabalhar o carro com outra filosofia. E menos veloz.

A estratégia, por sua vez, parecia uma boa, mas teve dois problemas de execução: o nono lugar no grid com direito a fritada justamente no pobre dianteiro direito e a perda de tempo com o tráfego no primeiro stint.

Em suma, o final de semana de Sebastian Vettel foi ruim. E ele saiu da China com 12 pontos.

Assim como a Red Bull, Lotus e Ferrari demonstraram ter ritmo para vencer corridas e, como Raikkonen salientou, este equilíbrio faz com que a adaptação a determinada pista faça a diferença em cada final de semana. A Mercedes, também rápida especialmente na classificação, promete roubar pontos, ainda que não convença o bastante em corrida para pensar em título.

Não é de se duvidar que Vettel, Raikkonen e Alonso vencerão quando estiverem em vantagem em um final de semana, como o espanhol mostrou com propriedade na China. Tendo isso em conta, em um campeonato que tem todos os ingredientes para ser tão disputado quanto o do ano passado – carros no limite de seu desenvolvimento, pilotagem de alto nível na ponta e uma crescente adaptabilidade aos pneus ao longo da temporada – são os “match points” salvos nos GPs em que as coisas não sairão como o planejado que vão decidir.

Fora o “trio de ferro”, fica a menção às grandes classificações de Lewis Hamilton nestas três primeiras etapas, colocando 0s544 em média em Nico Rosberg. Outro Nico, o Hulkenberg, agora pode dizer que liderou uma prova com duas equipes (médias) diferentes, e olha que não foi apenas por uma questão de estratégia, já que tinha carros mais fortes no mesmo barco, a exemplo de Interlagos. E Ricciardo foi irrepreensível durante todo o final de semana.

Por outro lado, Mark Webber e Nico Rosberg, os dois que saíram infelizes da Malásia pelo jogo de equipe, tiveram outro GP para esquecer, agora por problemas externos. E a tendência de Massa em deixar o carro escorregar nas curvas novamente lhe traiu com o composto médio, algo que já tinha aparecido de forma mais tímida na Austrália e cuja solução deve ser uma prioridade para o brasileiro. Afinal, como vimos que o composto macio é basicamente um pneu de classificação, os médios deverão ser usados com muita frequência ao longo do ano.

Conjuntos afiados

Em 2012, Fernando Alonso foi vice-campeão do mundo mesmo largando por 15 vezes, ou seja, em três quartos do campeonato, da terceira fila para trás no grid. Boas largadas, primeiras voltas agressivas, estratégias corretas, boa leitura de corrida e um carro cujo ritmo se aproximava bastante dos rivais aos domingos foram a receita para que o espanhol ganhasse, em média, quase 3 posições por prova em relação à largada.

Mas faltava velocidade para a Ferrari poder dizer que estava na briga pelo campeonato apenas pelas próprias pernas. O início ruim da Red Bull e as quebras e falhas da McLaren criaram um ambiente propício para Alonso desfilar seus dotes. Para lutar pelo título, era preciso largar mais à frente, para correr sem tráfego e impor o bom ritmo de corrida que o carro já tinha.

Sim, até que os carros andem em uma gama mais ampla de circuitos/condições com os quatro compostos, ainda podemos ter lapsos de adaptabilidade de um carro com determinado composto/circuito e não dá para cravar que carro X ou Y é superior.

Porém, começa a aparecer um padrão: Mercedes e Red Bull são melhores aos sábados e Ferrari e Lotus ganham nos domingos – a não ser, como ficou claro na Malásia, com água.

A Mercedes, segundo Lewis Hamilton, se livrou do desgaste acelerado de pneus, mas ainda deve em termos de ritmo puro. A Red Bull tem uma queda bem menos acentuada do sábado para o domingo e muito provavelmente teria um resultado melhor na China não tivesse apostado em uma estratégia arriscada. E sabe-se lá o que Raikkonen poderia ter feito se realmente a perda pelo bico danificado fosse da ordem de 0s25, como diz a equipe.

Ou seja, as diferenças são pequenas e o GP da Espanha, tradicionalmente palco de grandes evoluções nos carros, ganha importância, lembrando que as equipes vivem a dúvida do quanto apostar no projeto de 2013, que ficará obsoleto em novembro.

Enquanto Barcelona não vem, fica claro que há alguns conjuntos afinados. E são os mesmos há algum tempo. As execuções aos domingos de Alonso-Ferrari têm sido perfeitas, enquanto Raikkonen completa um ano nos pontos e Vettel, mesmo em um dia ruim, fica a 0s2 do pódio. Sim, os três primeiros do ano passado, que passaram com louvor pelas três “fases” de interação com os pneus de 2012. Lembre-se de que as provas iniciais foram marcadas pelo alto desgaste e a dificuldade em compreender as reações da borracha. Depois tivemos algumas das melhores corridas do ano, como Canadá e Valência. E, no final, como as equipes já haviam domado os pneus, passaram a fazer duas paradas com facilidade e as disputas ficaram engessadas. Agora, a Pirelli “resetou” o jogo, mas o mesmo padrão deve se repetir. E com os mesmos personagens, talvez ganhando o ingrediente Hamilton na Mercedes. E ainda que há quem tente vender a imagem de “pneus farofa” e “corridas artificiais”, como se isso trouxesse resultados randomizados.

Quem já comentou por aqui antes vai perceber que completei o último parágrafo, pois vi que anteriormente ele abria para outras interpretações. Minha intenção era apenas mostrar que os melhores conjuntos se adaptam a quaisquer situações. Mas certamente voltaremos ao tema do modelo de disputa atual em breve. Parece-me, pelos comentários divergentes, que o gosto por determinado estilo de corrida tem a ver com as expectativas. E dá para entender por que quem liga a TV querendo ver brigas ferrenhas e velocidade pura anda desanimado.

Chuva de favoritos

Uma batalha estratégica em um circuito em que é fácil ultrapassar – a média nos últimos três anos fica acima de 85 manobras por GP – promete um GP da China movimentado. Não me lembro de uma prova recente em que era tão difícil apontar um favorito, mesmo após a classificação.

Até aqui, os três carros que ocupam as três primeiras filas do grid são os que apresentaram o melhor equilíbrio entre o rendimento com os pneus médios, favoritos para a corrida, e os macios, que não devem ser usados por mais de 8 voltas na prova. Correndo por fora estão os pilotos que, mesmo dentro do top 10, vão largar com o composto mais durável.

O principal deles é Vettel, largando em nono com médios, cuja estratégia deve ser a mesma de Sutil na Austrália. Na ocasião, o alemão ia muito bem na prova até sofrer uma forte degradação com o pneu mais macio no final. A Red Bull deve ter um equilíbrio melhor no rendimento de ambos os compostos.

Para a estratégia funcionar, o líder do campeonato precisa se livrar rapidamente de Button, que larga a sua frente também com médios, e Ricciardo, e estender ao máximo seus primeiros stints para lidar com a rápida degradação do macio no final da prova, provavelmente o momento em que optará pelo pneu mais rápido.

Logo após a classificação, Raikkonen afirmou que a Lotus optara por classificar-se com o pneu macio porque “é o caminho mais rápido, pensando na classificação e na corrida.” Porém, isso varia de acordo com a interação do carro com os compostos.

Sua Lotus, por exemplo, parece ter um ritmo mais lento que os rivais diretos com os médios, mas tem a capacidade de fazê-los durar por mais tempo, abrindo a possibilidade de Kimi repetir a tática da Austrália e fazer uma parada a menos. Para isso, será importante que o finlandês fique mais tempo na pista com os macios na primeira parte da prova. Isso será decisivo para ele. Por outro lado, um Safety Car seria bastante prejudicial, pois abriria a possibilidade dos rivais fazerem duas paradas também.

Para Hamilton, será uma questão de sobreviver com os macios, ponto fraco da Mercedes no final de semana, para depois ter boa posição de pista – ou seja, não se ver no tráfego – para aproveitar o excelente ritmo demonstrado nos treinos com os médios.

Alonso e Massa não terão muito espaço para ganhar terreno na largada como de costume, pois a reta principal de Xangai não é muito longa, nem tem uma freada forte no final. Contudo, o ritmo da Ferrari pareceu bastante equilibrado durante os treinos e os italianos vivem seu melhor final de semana até aqui.

Os candidatos são muitos e tudo depende de como momentos-chave da corrida se desenvolverão, como largada, tráfego, etc. Alguém arrisca um palpite?

As surpresas da China

Ninguém era de ninguém nas últimas voltas do ano passado

Em nove edições, foram oito vencedores, de cinco equipes diferentes. Resultados inesperados , como a primeira vitória da Red Bull em 2009 em pleno passeio da Brawn, a conquista de Lewis Hamilton em meio ao domínio de Sebastian Vettel em 2011 e a estreia de Nico Rosberg na pole e no lugar mais alto do pódio em 2012. O histórico mostra que o GP da China não é muito chegado a comprovar tendências. É lugar de surpresas.

Isso é resultado da combinação entre o tipo de traçado, o asfalto liso e as temperaturas, geralmente amenas. Note que as grandes surpresas do GP da China aconteceram de 2009 para cá, ou seja, desde que a prova passou de outubro para abril. Com os termômetros permanecendo perto dos 20ºC e as características da pista, quem acertar a mão na configuração do carro sai ganhando.

O circuito de Xangai apresenta uma série de curvas de baixa e média velocidade de raio longo, combinada com duas retas bastante longas. Não se parece, portanto, nem com o circuito de rua de Melbourne, nem com a alta velocidade da Malásia.

Por ter freadas fortes, mas raras curvas de alta, o traçado chinês tem uma particularidade: força mais os pneus dianteiros do que os traseiros, devido à transferência de peso nas freadas e às curvas de raio longo. Assim, o desafio das equipes será fazer os dianteiros aquecerem rapidamente durante a classificação e não se degradarem demais na corrida.

A explicação para a súbita superioridade da Mercedes em 2012 tem a ver com isso: eles conseguiram não apenas fazer os dianteiros funcionarem na classificação, como também evitaram a degradação por falta de temperatura. Porém, ainda que a Pirelli vá fornecer os mesmos compostos do ano passado, os pneus deste ano são diferentes, se aquecem mais facilmente e têm uma zona de funcionamento mais ampla. Por isso, não dá para transferir diretamente o sucesso de Rosberg para 2013.

Falando em compostos, o GP marca a estreia do pneu macio e a terceira prova do médio. Este composto durou até 30 voltas em Melbourne e menos de 20 na Malásia. Como o traçado chinês coloca menos energia no pneu e a temperatura certamente estará mais baixa, é de se esperar um desgaste menos que o de Sepang. Outro fator a ser observado é que, como na China as ultrapassagens são relativamente fáceis, o leque estratégico se amplia

Portanto, tudo indica que teremos uma briga entre carros com duas e três paradas, assim como nos dois últimos anos: em 2011, Hamilton venceu parando uma vez a mais que Vettel e ultrapassando o alemão nas últimas voltas; em 2012, Rosberg fez a estratégia de dois pits funcionar e bateu as duas McLaren, que pararam três vezes.

Qual será a tática vencedora desta vez? Será que a Lotus vai lidar melhor com os pneus que os rivais? A Red Bull resolveu de vez os problemas de desgaste – e os internos? A Mercedes consegue repetir 2012 – e com quem? E a Ferrari, tem mesmo o ritmo de corrida da Austrália e de classificação da Malásia ou foi tudo uma questão circunstancial?

As perguntas são muitas. Porém, ao mesmo tempo em que todos querem um final de semana sem chuva para entender melhor a relação de forças, talvez a China não seja o lugar ideal para isso.

Velocidade pura ou estratégia pura?

Corridas de 2008 ou de agora?

Uma discussão interessante surgiu nos comentários do post anterior, vinda das evidências de que, ainda que o desempenho em classificação de Massa tenha melhorado – em relação a seu próprio rendimento e, consequentemente, frente ao companheiro Alonso – os resultados em corrida ainda têm um caminho mais longo a ser percorrido.

Lembrando os anos “de ouro” do brasileiro, entre 2007 e 2009, o ritmo aos domingos não era algo que deixava a desejar. Inclusive, na comparação direta com Kimi Raikkonen, cujo racecraft, ou seja, o conjunto de habilidades necessárias para gerir uma corrida, pode ser comparado ao de Alonso, Massa foi melhor nos dois anos e meio em que andaram juntos: levou 4 a 8 no primeiro ano, reverteu para 8 a 3 no segundo e fechou com 3 a 2 em 2009, sempre calculando somente as provas que ambos completaram.

De 2010 em diante, já com Alonso do outro lado do box, a tendência se inverteu fortemente: 13 a 3 no primeiro ano, 14 a 2 no segundo e 17 a 0 no terceiro. Ainda que tenha havido ordens de equipe desfavoráveis ao brasileiro neste período, elas não chegam a deturpar os números.

A questão sobre onde foi parar a consistência de Massa nas corridas esbarra em outra, levantada também nos comentários: as exigências nas corridas de hoje mudaram consideravelmente em relação à época do vice-campeonato do brasileiro.

Defendo que, para avaliar pilotos, sempre é necessário atentar ao conjunto homem/máquina/regulamento/estrutura de trabalho da equipe. Para haver um período de domínio como o de Schumacher ou mesmo o atual de Vettel, é preciso um casamento perfeito entre esses fatores, além de estabilidade. Era muito importante para Schumacher que os carros pudessem ser guiados de maneira extremamente agressiva, que os testes fossem ilimitados, que a equipe lhe deixasse dar as cartas. Como a segunda carreira dele evidenciou, a quebra nesse equilíbrio ceifou seus ares de mito.

Não que os feitos de Massa especialmente entre 2007 e 2009 sejam comparáveis ao heptacampeão, mas uma sequência de mudança de regras que alterou o modo das corridas serem disputadas e acabou fazendo com que sua maior qualidade, a velocidade, ficasse em segundo plano. Agora, vale mais pensar a prova de forma estratégica, algo que nunca foi o forte do ferrarista, e saber o momento de atacar. Isso não é uma desculpa, é uma constatação.

As corridas não apenas com pneus de alta degradação, como também com motores e câmbios bastante limitados, são disputadas mais com a cabeça do que com o acelerador. E fazem florescer os especialistas em controlar todas as variáveis, como Alonso, Kimi “I know what I’m doing” Raikkonen e o próprio Button, que acabou superando Lewis Hamilton, um piloto consideravelmente mais rápido, em número de pontos nas três temporadas em que dividiram a McLaren. E, claro, Sebastian Vettel, cuja receita tem como recheio a precisão para lidar com os efeitos aerodinâmicos do escapamento e, como cobertura, a tática de escapar do DRS no início da prova sem danificar os pneus. Para vencer na F-1, é preciso fazer com que carro, equipe e até o regulamento trabalhem a seu favor.

Sei que muitos de vocês preferem um retorno ao pé no fundo, algo que predominou desde o final da década de 1990. O problema foi que este período representou justamente uma queda brusca no nível de ultrapassagens.

Para mim, se a briga fosse decidida só em velocidade pura, bastava a classificação. E, convenhamos, velocidade é o que não falta em um grid de Fórmula 1. Os 300km de corrida servem para mostrar algo a mais, agressividade e cuidado na hora e medida certas. E os incomodados que se adaptem.

Massa, Alonso, classificações e recordes

A última vez que vimos essa cena até o final de uma corrida foi na China, em 2011

O GP da China está se aproximando e certamente veremos muitas matérias citando a possibilidade de Felipe Massa se tornar o primeiro companheiro a superar Fernando Alonso em cinco classificações seguidas. Mas é motivo para comemorar?

Vamos aos fatos. Em 12 anos de carreira, apenas dois companheiros de Alonso o bateram em quatro sábados seguidos: Trulli, em duas oportunidades, e Hamilton.

Perguntei ao italiano sobre essa batalha interna. “Ele era um bom companheiro de equipe, lutávamos de maneira limpa. É possível bater Alonso, eu sei que sim. Mas, obviamente, nos últimos anos, ele construiu um nome e agora parece mais forte”.

Trulli quer dizer que Alonso conquistou uma espécie de blindagem com o tempo. Vencedor, tem a equipe na mão para se beneficiar disso quando necessário. Na corrida, é fácil ver, com ordens claras e prioridades estratégicas. Na classificação, isso acontece na hora de escolher o momento em que cada piloto vai para a pista.

Dito isso, confesso que o que mais me surpreendeu nestes últimos três anos foi a lavada que Massa levou do espanhol em treinos. A classificação nunca foi o ponto mais forte de Alonso, mas sim de Felipe. E ele levou 15 x 4 nos dois primeiros anos e 17 x 3 em 2012. É isso, também, que gera interesse na sequência atual.

Afinal, quem esperaria que um piloto arrasado por três anos seguidos, como num passe de mágica, começasse a andar mais rápido?

Vejo uma combinação de fatores que favorece Massa neste momento: sua mentalidade positiva, um carro equilibrado e pneus que se aquecem com mais facilidade. E esse conjunto tem tudo para permitir ao brasileiro seguir forte nos treinos. Se às vezes à frente, às vezes atrás de Alonso, não importa. O foco é ter uma boa posição de largada.

O problema é que, ainda que a performance de Massa tenha melhorado enormemente desde o final de 2012, Alonso é um osso muito mais duro de roer aos domingos. Para qualquer um do grid, verdade seja dita. Hoje, o único que está no mesmo nível do espanhol em termos de gerir e farejar oportunidades em uma corrida é Kimi Raikkonen. Além disso, é bem provável que o bicampeão, menos agressivo em saídas de curva, poupe mais os pneus em stints longos, revertendo uma das vantagens que Massa vem tendo.

Tanto, que a última vez que Massa terminou uma corrida à frente de Alonso foi no GP da China de 2011. Houve interferências da equipe – Monza, Interlagos – mas isso não é a regra. A regra é ver o bicampeão deixando para trás com boas largadas, estratégias perspicazes e uma ótima gestão de ritmo até conjuntos mais fortes.

Essa sequência em classificações afasta a ideia de que Massa nunca seria o mesmo após o acidente de 2009. Uma série de circunstâncias abalou o desempenho do brasileiro e fez muitos duvidarem de suas capacidades, mas as últimas performances são condizentes com o que já o vimos fazer – e, talvez por esse motivo, nem ele entre nesse oba-oba. Portanto, é uma ótima notícia, mas não chega a ser algo de outro mundo. Impressionante mesmo seria superar Alonso em corrida. Até porque, sabe quantas vezes o espanhol foi batido por um companheiro em quatro provas seguidas? Nunca.

Luz no fim do túnel para a McLaren

Eles começaram o ano a 1s5 dos líderes e andam ouvindo por aí que estão na mira da Force India, cujo objetivo nesta temporada é superá-los no Mundial de Construtores. Mas tudo indica que os dias de vacas magras da McLaren têm prazo de validade.

No GP da Austrália, a equipe que completa 40 anos em 2013 fez papel de time médio, com Jenson Button terminando em um tímido nono lugar. O resultado final do GP da Malásia foi rigorosamente o mesmo, mas a equipe pelo menos viu uma luz no fim do túnel.

O problema central da McLaren não está diretamente ligado às mudanças fundamentais que foram feitas no modelo deste ano. A diferença no comportamento entre Melbourne e Sepang mostrou que o problema está na altura correta do carro.

Isso está diretamente ligado ao nível de pressão aerodinâmica. Quanto mais o assoalho se aproxima do chão, mais pressão é criada. É a diferença entre a velocidade com que o ar passa por debaixo de carro e por cima que determina o quanto ele fica “grudado” no chão.

Mas nada na F-1 é tão simples assim: a altura varia de acordo com a superfície, com o tipo de curva e pela quantidade de combustível. Lembre-se de que os carros não podem ser alterados entre a classificação, quando estão com tanques praticamente vazios, e a corrida, iniciada com cerca de 150kg a mais. O desafio é, portanto, considerar essas variáveis ao buscar aproximar o assoalho do chão ao máximo sem que ele fique batendo no chão no início do GP ou perdendo muito downforce por estar alto demais na classificação.

O MP4-28 precisa andar muito baixo para ter um bom nível de downforce. Em condições realistas de altura, o fluxo de ar é ruim e inconstante, deixando o carro nervoso. Para remediar isso, na Malásia, a opção foi levantar bastante o carro, o que amenizou o problema de equilíbrio, mas ainda não resolve a questão central de falta de pressão aerodinâmica.

Porém, pelo menos foi descoberto um caminho e, agora, por meio de novas formas de direcionar o ar no assoalho é possível solucionar essa questão. Outra boa notícia para o time é que, depois do tapete de Sepang, o calendário tem na sequência outras duas pistas bastante lisas. Quanto menos ondulações, mais previsível é o comportamento do carro. E é exatamente disso que eles precisam agora.

Sabe-se que a McLaren, que terminou 2012 com provavelmente o melhor carro do grid, não viu sentido em dar continuidade aos conceitos explorados na última temporada, acreditando que havia levado o projeto ao limite. Assim, ao contrário dos rivais diretos, repensou o bólido e, naturalmente, começou 2013 um passo atrás. Porém, ninguém no time esperava ter um abacaxi tão grande.  Agora, a equipe se inspira na virada da Ferrari, que saiu de situação semelhante em 2012 para lutar pela vitória após apenas 5 GPs.

Para pensar em título em uma condição desta, seria necessário ter um piloto acima de tudo consistente, algo que não vejo na dupla de Woking. Contudo, se falar em grandes conquistas soa demasiadamente otimista, apostar em vitórias ainda em 2013 parece bem realista.

É só de ingenuidade que vive o 1º de abril?

Vettel suspenso. Vettel suspenso?

Sabe quando você não sabe se ri ou se chora? É mais ou menos por aí que eu acompanho os primeiros de abril a cada ano. Não pelas suspeitas mudanças de status de relacionamento de amigos assumidamente baladeiros, mas pelas notícias reproduzidas sem qualquer discernimento pela internet. E repassadas, compartilhadas e comentadas sem dó.

Há especialistas para opinar sobre tudo por aí. De detalhes do que seria uma 12ª equipe na Fórmula 1 a uma suspensão imposta pela Red Bull a Sebastian Vettel. Será tão difícil assim parar para pensar por um segundo sequer de onde vieram estas notícias bombásticas e ligar os pontos?

Engana-se quem pensa que é apenas ingenuidade de alguns, coisa de dia da mentira. Nunca foi tão fácil plantar uma notícia – em qualquer dia do ano. Principalmente nesse mundo em que ficamos malucos se o Facebook passa 30 segundos sem uma atualização sequer. “Alguém poste alguma coisa, qualquer coisa, é impossível que não esteja acontecendo nada!!” Não é assim? E não digo isso com ares saudosistas, longe disso, já que devo muita coisa ao blog que comecei de forma independente, em 2010. Porém, há modos e modos de usar toda essa inundação de informação que a internet nos proporciona.

Quando comecei o blog, tinha uma preocupação básica: iria trabalhar com dados que eu tinha em mãos. E ponto. Afinal, nunca tinha pisado num paddock de F-1 na vida, não poderia passar por cima disso e tomar ares de especialista. Não ia julgar o caráter de ninguém ou tentar descobrir o que estava por trás de acontecimentos aos quais não tinha acesso direto. Em pouco mais de um ano, tal postura foi recompensada, ganhei respeito de profissionais que respeitava e comecei a cobrir algumas corridas.

Sinto muito em ver que essa preocupação seja rara. Sinto muito que as informações de fontes fidedignas percam espaço para notícias passadas adiante sem qualquer checagem e repletas de juízos de valor. E lá vamos nós compartilhando o link dessa nova bomba!

Compartilha quem quer com a opinião que lhe convém, e esse é o barato da internet. Mas há efeitos colaterais do uso indiscriminado dessa liberdade. Por que um meio de comunicação investiria em uma cara cobertura in loco se a informação que o jornalista presente no evento traz tem o mesmo valor de quem está sentado no sofá de casa?

Então sugiro que, ao invés de apenas cobrar uma cobertura melhor, do assunto que for, que cada um pare para pensar para que tipo de jornalismo está dando audiência. Afinal, trata-se de um mercado, como qualquer outro, regulado em última análise pelo consumidor.

Porque, do jeito que está, pode parecer até mentira, mas nossa sede de estar por dentro de tudo ao mesmo tempo – e julgar, julgar e julgar –, nos roubou até o senso de humor.

GP da Malásia por espanhóis, britânicos e brasileiros: “Até carros diferentes se tratam com mais carinho!”

Sebastian Vettel larga na frente, mas ninguém colocaria dinheiro nele para ser o primeiro a cruzar a linha de chegada no GP da Malásia. “Pode ser um dia para as Ferrari, pois a Red Bull está sofrendo muito com os pneus. Muitos dizem que eles terão de parar quatro vezes”, lembra o narrador da Sky Sports britânica, David Croft. “A posição do Felipe Massa é favorável porque a Ferrari é boa de largada e, largando por fora, ele pode fazer a curva dois por dentro”, prevê Luciano Burti na Globo.

Na largada, quem acaba executando o plano do piloto da Stock Car é Fernando Alonso. Porém, mesmo com o aviso do narrador espanhol Antonio Lobato – “cuidado com toques, a curva é longa!” – tudo vai por água abaixo quando o espanhol encosta na traseira de Vettel e deixa sua asa torta. “A asa está muito quebrada e daqui a pouco vai começar a soltar peças, mas ele não deve estar percebendo porque não dá para ver e ele está conseguindo brigar com Webber. Vão acabar dando bandeira preta e laranja para ele se continuar assim, ele precisa parar”, acredita Martin Brundle, na Sky.

Lobato se desespera. “Não vai ter jeito, vai ter de entrar. Como isso começou mal”, mas o comentarista Jacobo Vega questiona: “E aguentar? Ele não está tão lento”. Pedro de la Rosa observa a preferência da equipe por perder o mínimo possível e aproveitar para colocar slicks. “O que ele pode fazer é tentar aguentar por uma volta e depois entrar se acharem que vai perder menos assim. Não está tudo perdido.”

Lobato se impressiona com a performance de Alonso, ultrapassando Webber mesmo com a asa quebrada e De la Rosa considera, ao mesmo tempo, um ato “grande e arriscado” quando vê o compatriota seguindo na pista. Instantes depois, a asa se quebra e para embaixo da Ferrari, fazendo o espanhol perder o controle e acabar sua prova na brita. Na Antena 3, se apressam a culpar Webber, vendo uma mudança de trajetória e um toque. Depois veem que a Red Bull passou longe da asa. “Dissemos que era um risco, que desastre”, lamenta Lobato.

“A pressão aerodinâmica era muito alta na reta e a asa acabou quebrando. Preferiram não parar para aproveitar para colocar slicks”, explica Burti. “Era um risco muito grande. Com Alonso fora, fica uma ótima oportunidade para a Ferrari trabalhar por Massa”, aponta Reginaldo Leme. “Fico surpreso que a equipe não tenha mandado ele entrar”, diz Brundle. “É o número 3 das coisas mais assustadoras que podem acontecer. Primeiro é o acelerador travar, segundo é o freio falhar e terceiro é a asa dianteira ir para baixo do carro. Era muito fácil disso acontecer. Ele, dentro do carro, não conseguia ver com certeza. E, como sempre, Alonso compensando a perda de pressão e nunca desistindo.”

Os espanhóis não param de lamentar. “Na grande maioria das vezes, com um toque desses, não acontece nada. Foi muito azar”, diz De la Rosa. “Vettel na frente, sem inimigos”, observa Lobato.

No que seria uma tarde inspirada, o repórter inglês Ted Kravitz informa que “a equipe estava pronta com a asa nova, mas sem pneus”, e completa: “Apostar assim e perder não é algo que se espera de Alonso e da Ferrari, ele é sempre o primeiro a dizer que a corrida é longa.”

Poucas voltas depois, outra decisão incomum deixou uma pulga atrás da orelha dos comentaristas: mesmo líder, Vettel arrisca e é o primeiro a colocar slicks. “Ele tem que esperar outro valente trocar, já que é primeiro. Geralmente, o valente é Button”, aposta De la Rosa segundos antes que o alemão entre. Depois, o espanhol critica a decisão. “É arriscado. Ele tinha que esperar os tempos de volta chegarem a 1min52 e estão em 1min56. Button não entrou”, ri.

Os comentaristas, porém, estranham que Webber não entre logo em seguida do companheiro, que é lento em determinados trechos e rápido em outros. “Seb está superando todo mundo no final da volta. Pode ser que não dê certo”, observa Brundle. De la Rosa concorda com o inglês e também quer que o australiano pare logo. Lobato questiona, rindo. “Mas Button não entrou” e o comentarista gagueja. E o narrador aproveita para dar uma secada. “Nessa de ganhar no seco, perder no molhado, quem sabe não há um toque?”

As divagações param quando Lewis Hamilton erra o box e vai para a ex-equipe, a McLaren. É curioso que todos demoram alguns segundos para perceber o que há de errado, como se cometessem o mesmo ato falho do inglês. “Rapaz, ele parou na McLaren…”, se surpreende Luis Roberto depois de ser avisado por Burti. “Lewis teve uma falha de memória e entrou no box errado. Os mecânicos acenaram, falaram que ainda gostam dele, mas para ele sair logo porque estavam esperando o Jenson”, Kravitz tenta fazer piada. “Não posso acreditar! Que imagem! Ele foi para a McLaren!!”, Lobato não para de rir. “Há dois anos Jenson parou na Red Bull e os mecânicos brincaram depois fazendo uns óculos enormes para ele”, revela De la Rosa. Depois, os ingleses calculam que a perda de 6s de Hamilton com o engano o colocaria na liderança naquele momento.

Os espanhóis seguem estranhando a demora de Webber de entrar nos boxes. “A Red Bull vai atrapalhar o Webber?”, pergunta Vega. “Não vou falar nada sobre a Red Bull porque vão falar mal de mim. Podem apostar aí e pensem o que quiserem”, diz Lobato, em tom de deboche. O australiano volta na frente de Vettel, mas com pneus duros, o que vira motivo de estranheza. “Webber deve ter escolhido o prime porque é mais duro com os pneus, já que, pelo asfalto estar mais frio pela chuva, o médio seria melhor. Eles estão prevendo parar três vezes para colocar pneus de seco”, informa Kravitz. Na Antena 3, Lobato pergunta “qual a diferença de duração dos pneus?” e ouve de De la Rosa que é “muito pouca ou nenhuma, nem os especialistas da Pirelli sabem”. Sem saber dessa previsão, Burti acredita que “com esse pneu, se ele fizer pouco mais de 20 voltas poderá fazer duas paradas.”

Um tanto sem assunto com a ausência de Alonso, os espanhóis repetem a todo momento que Raikkonen é o líder do campeonato e está bem atrás. Enquanto Reginaldo não acredita que Vettel vai aceitar bem o fato de ter se dado mal no primeiro pit stop. “Se eu o conheço, vai dar problema. Mas se foi uma tentativa, deram toda a prioridade a ele e não deu certo.”

Contrariando as expectativas, é Webber, com pneus duros, que faz a segunda parada antes de Vettel. “Acho que aconteceu algum problema porque ele tinha um ritmo bom”, diz Burti. Para De la Rosa, é o alemão que está mudando as regras do jogo. “Vettel arriscou muito alargando tanto essa segunda parada. Ele está cozinhando a vitória em banho-maria. Ele está preparando para o último pit stop”. Brundle vê outra realidade: “É normal ouvir que a Red Bull favorece o Vettel, mas nesse caso a decisão deles foi muito boa para Webber.”

Após a segunda parada, Webber coloca pneus médios, e Vettel, duros. Nas primeiras voltas após o pit, o australiano diminui o ritmo e o alemão começa a ser pressionado pelas Mercedes. “Webber está recebendo a instrução para cuidar dos pneus e ouvindo que Vettel faz o mesmo”, destaca Kravitz. “É o jeito da equipe dizer que ele não será incomodado. Mas as Mercedes estão chegando, então até quando isso vai continuar?”

Para Croft, “parece que Webber errou ao trocar o composto do pneu do duro pelo médio”, pois o ritmo é bem inferior. De la Rosa concorda. “Não entendo por que colocou o pneu médio já que fez um bom stint com o duro. Então mantenha! É um carro com problema de degradação e, ainda que duros e médios durem mais ou menos o mesmo, um degrada mais que outro.”

Brundle suspira quando ouve Vettel pedir para a equipe tirar “Webber do caminho, pois ele está muito lento”. Enquanto ensaia um comentário a favor do alemão, o australiano supera o companheiro em seis décimos. “Ele não me parece lento”, revê o comentarista. Para Croft, “são as frustrações aparecendo em um homem que largou na pole e que está tendo um trabalho muito mais duro que esperava”. E Brundle brinca “Posso imaginar Mark colocando esse rádio como toque de telefone por semanas”. Reginaldo vendo “uma pressão de Vettel”, que “até está merecendo [que a equipe interfira] porque está bem mais rápido.”

“Vamos ver como eles lidam com isso”, diz Lobato, quase festejando após a mensagem via rádio. “Como disse Jacobo antes… a Red Bull já está cozinhando essa corrida. A coisa não parece boa para Webber.”

Burti tem dúvidas sobre qual a estratégia. Ora acha que Vettel colocou os duros para tentar ir até o final, ora acredita que é a Mercedes que está diminuindo o ritmo para dar “o pulo do gato”. O brasileiro não é o único perdido. “Parece um jogo de xadrez em alta velocidade”, define Croft. Mas ingleses e espanhóis só têm uma certeza: “ainda bem que a Mercedes está aí, senão a Red Bull estaria só administrando”, diz Brundle, mesma linha seguida por De la Rosa. Enquanto isso, Lobato dá as coordenadas para os torcedores. “Como Alonso está fora, temos de pensar como repartir os pontos. O que não pode é Vettel vencer. Webber, Hamilton, Rosberg, tanto faz.”

A expectativa espanhola aumenta ainda mais quando a Mercedes antecipa a parada de Hamilton, que volta à frente de Vettel. “Boa jogada da Mercedes. Vettel não queria parar na volta 32, mas teve de cobrir Hamilton”, acredita De la Rosa. Reginaldo não entende o undercut e se surpreende “porque Hamilton só deu nove voltas com esse pneu.”

Os ingleses não se animam muito com o compatriota na frente, porque “ele recebeu a mensagem para ‘lift and coast’, o que geralmente tem a ver com economia de combustível”, como observa Kravitz. Logo, Vettel o ultrapassa. “Todos com Webber agora. Já hasteei a bandeira aqui. Vale tudo porque essa não é a situação predileta deles”, avisa Lobato.

Jogos de equipe

Após a quarta parada dos líderes, Vettel vai para cima. E a equipe pede para o alemão ser cuidadoso. “Eles deveriam estar pedindo para Vettel ter cuidado? Ele é um piloto e sabe o que fazer”, defende Croft. “Eles parecem sentir a necessidade de cuidar dele, cuidar do humor dele”, observa Brundle. Para Reginaldo, “todo aviso aos pilotos da Red Bull vale porque há três anos eles bateram de maneira feia mais por culpa de Vettel.” Lobato vai à loucura. “Aguenta, Mark, como puder! Lembrem que eles já bateram em 2010!”

De la Rosa adota outro tom. “Que bonito que eles possam competir. Houve momentos em que isso não ocorreu”, diz o comentarista, mas o narrador avisa: “Calma que ainda não terminou.” Enquanto isso, Brundle se surpreende com a mensagem de Horner para Vettel de que “isso é bobo”. “As mensagens demoram 15 a 20s para aparecer no ar e Horner devia estar se referindo ao medo por um incidente. É o preço que se paga por ter dois grandes pilotos: você tem de encontrar um jeito de administrá-los.”

Croft não sabe que lado escolher. “Por um lado, Vettel havia pedido para a equipe tirar Mark do caminho, por outro, Webber não conseguiu abrir uma grande vantagem e Seb resolveu fazer justiça com as próprias mãos.” No Brasil, Luis Roberto destaca o “momento sensacional que pilotos e equipe proporcionam.”

Após a ultrapassagem, as reações são distintas. Brundle parece se divertir. “Pode ser o fim de uma bela relação que nunca se materializou.” Lobato acha que foi fácil demais e De la Rosa também estranha a manobra. “Aconteceu alguma coisa com ele. Está acontecendo algo, dá para ver ele fazendo gestos. Quero ver a repetição.”

Ainda sentindo que há algo estranho, o comentarista novamente parabeniza “a equipe Red Bull por tratar a briga como se fosse entre carros diferentes, assumindo muito risco”, enquanto Lobato ironiza. “Acho que até carros diferentes se tratam com mais carinho!” “Acho que até carros diferentes se tratam com mais carinho!” Depois de avisados pelos produtores, os espanhóis chamam a atenção para a conversação suspeita no rádio. “Atenção às conversas de rádio da Red Bull. Preparem-se porque muito pode acontecer até o GP da China.”

Mais uma vez, Kravitz acerta. “Estou imaginando o porquê da mensagem para Seb, como se ele fosse o vilão. Será que eles não tinham um acordo prévio para evitar que eles ficassem lutando e acabassem com os pneus?”

As atenções logo se voltam à Mercedes, com uma ordem de equipe clara de Ross Brawn. “Oh, dear”, suspira novamente Brundle quando ouve o “negative” do dirigente ao pedido de Rosberg para passar Hamilton. “Imagino que eles tenham dito a Lewis para diminuir o ritmo e queiram deixar assim porque sabem que não dá para chegar nas Red Bull.” Kravitz questiona. “Mas imagina o lado psicológico do Nico”, e Croft opina: “Entendo, mas se um piloto está com dificuldades de combustível por um erro de cálculo da equipe, não seria um erro tirar um pódio dele?” Brundle pensa melhor e tem outra visão. “Acho que é bem mais simples que isso. Eles forçaram muito para tirar Lewis da McLaren. Me surpreenderia se ele não tivesse assinado um contrato com prioridades, porque tinha todas as ferramentas para isso.”

De la Rosa está no lado de Brawn. “Eles têm Grosjean muito longe e a Red Bull também. Não têm nada a ganhar, então faz sentido”. Na Globo, a ordem mostraria um posicionamento claro da equipe. “Verdade seja dita, para a Mercedes é muito mais negócio o Hamilton ficar na frente pensando no campeonato.” O comentarista é apoiado por Reginaldo. “Concordo porque o Hamilton é muito mais piloto.”

Na transmissão brasileira, constantemente o espectador é lembrado que, com o abandono de Alonso, Massa supera o companheiro no mundial de pilotos, enquanto, na Espanha, a cada ultrapassagem do brasileiro, Lobato diz que tem “raiva de ver isso, pensando no que Fernando poderia estar fazendo.”

A corrida acaba, Vettel vence, mas ninguém entende direito por que o clima não é de vitória. “Fizeram dobradinha e estão com cara de quem abandonou com os dois carros. Deve ter acontecido algo mais além do que ouvimos”, diz Lobato. “Há muito a ser explicado aqui na Malásia. Vettel venceu, mas foi pedido a ele que mantivesse posições? Webber repetia a ele antes do pódio ‘multi 21’, que é o código da equipe para isso”, salienta Croft. Com mais de 1h10 de programação pós prova, os britânicos conseguem desvendar a questão, assim como os espanhóis, que também continuam no ar.

Na Globo, Burti destaca que “a Red Bull, em uma semana, aprendeu a lição e mostraram que o ritmo de corrida é muito bom”. Sobre a animosidade entre os companheiros, Reginaldo vê “coisa de corrida. Webber jogou duro, mas com companheiro de equipe às vezes clima fica pesado”. E Luis Roberto fica sem entender nada: “Só porque é companheiro de equipe não pode passar?”

Exagero nos pneus dificulta leitura de estratégia e ritmo

O que já estava complexo ano passado piorou com os novos pneus Pirelli. Para compreender como são pensadas as estratégias neste início de ano, é preciso entender que a queda de rendimento dos pneus é mais forte volta a volta, e não em forma de “penhasco repentino” como ano passado. A saída é tentar equilibrar um ritmo decente, a perda de tempo pelo número de trocas e os pneus à disposição.

Cada piloto tem três jogos de pneus option (os mais macios do final de semana) e três prime (os mais duros) à disposição para classificação e corrida. Portanto, imagine em uma situação como no GP da Malásia, em que a perda era de 0s4 por volta, o quão importante é avaliar o uso da borracha na classificação.

Por isso, pode-se até dizer que a Pirelli deu sorte pela chuva no Q3 e nas primeiras voltas da corrida em Sepang: isso fez com que os pilotos dessem 12 voltas a menos (contando duas tentativas na classificação e as voltas com intermediários no domingo) com pneus de seco. Caso contrário, possivelmente seriam necessários 4 pits mesmo em uma prova totalmente sem chuva.

Você pode perguntar: mas a degradação não é boa para a F-1? Certamente, mas a corrida malaia beirou o artificial por um exagero nesse sentido. Certamente, também, as equipes vão aprender como lidar com os novos pneus e os carros vão se desenvolvendo também nesse sentido mas, por ora, a estratégia é quase de guerra.

Um jogo de pneus duros na Malásia durava cerca de 18 voltas. Porém, como o desgaste era muito alto, os cálculos mostravam que seria melhor diminuir o número de voltas por cada stint e controlar o ritmo para perder menos tempo no total. Sim, os pilotos estavam andando em um ritmo controlado pelas equipes para chegar ao final com um mínimo de paradas possível – e esse mínimo foram quatro!

Por isso, tentar entender quem teve o melhor ritmo de corrida nunca foi tão difícil. Existe um ritmo verdadeiro quando os tempos são ditados pelo pitwall? Isso também explica a flutuação de melhores voltas durante a prova: ora a Red Bull era mais rápida, ora a Mercedes, ora a Lotus.

Com essa corrida de freio de mão puxado, a prova foi decidida pela capacidade dos carros lidarem com os pneus intermediários. Sofrendo com graining, a Ferrari e a Lotus perderam 22 e 27s, respectivamente, nas 9 primeiras voltas – e chegaram 25s (Massa) e 35s (Grosjean) atrás após 56. Note que Grosjean e Kimi pararam uma vez a menos e fizeram os stints mais longos (22 voltas) do top 10, então as qualidades mostradas em Melbourne continuam lá, só não foram tão decisivas nas condições de Sepang.

Mesmo com corridas tão difíceis de ler do ponto de vista estratégico, acho que vale a pergunta: sabendo que, durante toda a prova, o piloto que parava antes ganhava cerca de 2s em relação ao que ia à frente, e já que não queria ter problemas na parte final da prova, por que diabos a Red Bull inverteu o havia feito no pit anterior e parou Vettel antes de Webber no último stint?

Grandes marcas, caras fechadas #MalásiaFacts

Vettel igualou número de vitórias de Stewart

Em um final de semana especial para Sebastian Vettel, Mark Webber e Fernando Alonso, todos saíram do GP da Malásia com um sabor amargo na boca. O primeiro igualou uma marca que, durante muito tempo, foi tida como imbatível: as 27 vitórias de outro tricampeão, Jackie Stewart, mas acabou a prova dizendo que preferia não ter ganhado da maneira como o fez. Os outros dois não tiveram muitos motivos para comemorar sua 200ª aparição em um GP.

Vettel alcançou 27 vitórias após 103 GPs, contra 96 do escocês – que viria a se aposentar com 99 largadas. Também é de se notar que, por correr nas décadas de 1960 e 1970, Jackie teve de conviver com mais abandonos, 36 contra 17 de Vettel. Ainda assim, uma marca impressionante para o alemão de 25 anos. Para efeito de comparação, Schumacher tinha 28 conquistas com o atual número de GPs de Vettel, que marcou ainda a 38ª pole position em Malásia.

Para a Red Bull, foi a 13ª dobradinha, sendo que em 10 oportunidades era Vettel quem estava na frente. Inclusive, desde o GP da Alemanha de 2010, nenhuma equipe a não ser a atual tricampeã mundial conseguiu uma dobradinha.

Falando no espanhol, que antes da prova posou com a equipe para uma foto comemorativa, o 200º não saiu como esperado. Pelo menos o clima interno era bem melhor do que nas celebrações para o 100º GP, no GP da Turquia de 2007, quando Ron Dennis, ao entregar ao então piloto da McLaren uma placa comemorativa, disse que havia pensado “em lhe dar algo pesado para que pudesse jogar em nós”. Clima leve, não?

Da 100ª à 200ª corrida, o espanhol quase dobrou seus números – eram 18 vitórias e 44 pódios no GP de número 100 e 30 vitórias e 87 pódios hoje. Mas título que é bom, nada.

Para Webber, todas as nove vitórias foram conquistadas neste segundo centenário. O australiano, contudo, deve comemorar sua marca no Bahrein. Na verdade, tanto ele quanto Alonso têm 200 GPs, mas não 200 largadas. Ambos pilotavam pelos times que usavam pneus Michelin e não largaram nos EUA em 2005. E Webber se classificou, mas não largou no GP da Espanha de 2002 após a Minardi decidir não correr por questões de segurança.

Massa embalado

O GP da Malásia também marcou a quarta vez seguida em que Alonso foi superado pelo companheiro Felipe Massa em classificação. É apenas a quarta vez que isso acontece com o espanhol, que ficou atrás por 4 GPs consecutivos de Trulli (em 2003 e 2004) e Hamilton (em 2007). Isso, porém, nunca se repetiu por cinco vezes seguidas.

Massa também aproveitou o abandono do companheiro para superá-lo no mundial pela primeira vez desde o GP da China de 2010. Na verdade, nas corridas em que ambos terminaram, Massa não chega na frente de Alonso desde a prova de Xangai de 2011. Talvez possa aproveitar a boa fase – primeira vez que faz mais pontos que um companheiro nas duas primeiras provas desde que chegou à Ferrari – para derrubar a marca justamente no GP chinês deste ano.

Se o início do brasileiro é positivo, pela terceira vez – em sua terceira temporada – Pastor Maldonado não completa as duas primeiras provas do ano.

A Ferrari está a cinco provas de igualar a sequência de 55 GPs com pelo menos um carro nos pontos, recorde obtido entre 1999 e 2003. No geral, a melhor marca é da McLaren, com 60 – e contando. Isso, mesmo com o time de Woking tendo seu pior início desde 2000 – e, claro, os dois nonos lugares obtidos até agora não resultariam em pontos na época do recorde ferrarista.

Quem não conseguiu manter-se nos pontos foi a Force India. A equipe atravessava sua melhor fase – 10 provas seguidas nos pontos – e não abandonava com ambos os carros desde o GP do Japão de 2010.

Entre os pilotos, a maior sequência atual é de Kimi Raikkonen, com 19 corridas seguidas nos pontos. O recorde geral é de Schumacher, com 24. Ano passado, Alonso chegou a 22. Será que dessa vez a marca cai?

Agora é com vocês, Red Bull

Happy family

“Vocês honestamente acham que ele devolveria a posição caso pedíssemos? Não fazia sentido. Ele deixou muito claro qual era sua intenção ao ultrapassar. Ele sabia qual era a comunicação e optou por ignorá-la. Ele colocou seu interesse acima da equipe. Focou nos sete pontos a mais – o que era errado. Ele aceitou que era errado.”

A declaração de Christian Horner foi o que mais me chamou a atenção no turbilhão de acontecimentos do GP da Malásia e dá a medida da real questão levantada pela atitude de Vettel: o alemão se colocou acima da Red Bull, e com plena consciência.

Segundo a dinâmica da Fórmula 1, pouco importa se seus campeões passam dos limites éticos para vencer. Afinal, trata-se de um mundo de competitividade extrema e sempre será difícil estabelecer a linha entre demonstrar vontade de vencer e fazer qualquer coisa para que isso aconteça. Na prática, a categoria sempre se promoveu em cima desses extremos – e com sucesso.

Igualmente, pouco importa que haja intervenções das equipes. Vociferar contra isso também me parece ingênuo. A F-1 é o que é por ser um campeonato de construtores, em que cada time faz seu carro. Essa obrigação a torna especial porque faz com que os carros sejam muito desenvolvidos e atrai os grandes profissionais do esporte. E isso inclui os pilotos. Porém, em determinados momentos, o interesse individual, alimentado pelo mundial de pilotos, vai entrar em conflito com o coletivo, da equipe. Não há nada que possa mudar isso, está intrínseco à razão de ser da F-1. E quando as ordens de equipe estiveram proibidas, de 2003 a 2010, na realidade a categoria só estava jogando a sujeira para debaixo do tapete. Há diversas formas de lidar com isso? Fato. Mas não dá para fugir de algo que te define.

A grande novidade desta situação é o claro recado de Vettel. Com três títulos na mão, o alemão se sentiu poderoso o bastante para colocar-se à frente da equipe com a qual conquistou seus triunfos. Deu seu recado e, com quatro anos de Red Bull e muitos outros de ‘firma’, deve saber onde está pisando. Ao que tudo indica, espera o mesmo que Webber previu logo na cerimônia do pódio: ser protegido.

O próprio fã número 1 de Vettel, Helmut Marko, admitiu que “a coisa saiu do controle”. A Red Bull tem em seu histórico uma série de atitudes conciliadoras quando a harmonia interna é quebrada. Vimos isso durante todo o ano de 2010, na Grã-Bretanha em 2011 e no GP do Brasil do ano passado (e, diga-se de passagem, por seu histórico, Webber talvez não tivesse sobrevivido em outro time não fosse pela, também, proteção de Mateschitz).

Será que, frente à recente insubordinação, a tônica vai mudar? O piloto jogou a batata assando para a mão de seus chefes, resta saber se eles vão aceitar que seu interesse se sobreponha ao time ou se o GP da Malásia será lembrado como o momento em que o casamento de Sebastian Vettel com a Red Bull começou a ruir. Estão abertas as apostas.

Era uma vez o interesse da equipe…

Cavando nas minhas primeiras memórias sobre a Fórmula 1 encontro o sorriso de Prost celebrando seu tricampeonato, em 1989. Era o auge da mais famosa das brigas entre companheiros de equipe, um exercício de equilíbrio para Ron Dennis, que tentava domar dois egos gigantescos estabelecendo acordos que ninguém estava disposto a cumprir e fazendo promessas de igualdade impossíveis de cumprir.

Talvez por isso a sempre complicada relação entre o interesse individual do piloto versus as prioridades da equipe – e a necessidade que um tem de confiar no outro para todos avançarem – seja um dos fatores que mais me atrai na F-1. Relaciono a paz dentro de uma equipe à total imparcialidade jornalística: apesar de impossível, deve ser uma busca constante.

Afinal, todas as combinações têm lados positivos e negativos. Se eu libero os companheiros para lutar na pista, dou um show de esportividade mas corro o risco de perder pontos, seja por colisões ou desgaste excessivo de pneus, por exemplo. Se eu determino um claro número 1 e um número 2, arrisco a credibilidade das vitórias do primeiro e acabo com a motivação do segundo. Se eu estabelecer um meio termo, como parece ser o caso da Red Bull, assumo a possibilidade de cada um entender de um jeito. Justamente por ser tão difícil encontrar um equilíbrio, é um desafio interessante.

Interessante, também, para os torcedores. Há quem espere de grandes campeões atitudes como a que Vettel teve na pista hoje. Há quem fique na espreita por um sinal de que um piloto é capaz de tudo para vencer para questionar sua esportividade.

Queria saber a opinião de vocês. Há quem prefira deixar tudo isso para trás e contar com 22 equipes diferentes. Ou sumir com o campeonato de construtores. Pouco factível, claro, mas será que tornaria a competição mais interessante? Ou acabaria com grande parte da graça?

Estratégias da classificação abrem mundo de possibilidades para GP da Malásia

A diversidade de estratégias escolhidas pelas equipes na classificação e a dificuldade em prever qual o rendimento de cada carro após a chuva ter atrapalhado as simulações de corrida na sexta-feira abrem um leque de possibilidades interessante para o GP da Malásia.

Vettel conquistou a pole com quase um segundo de diferença em relação a Massa, mas ninguém espera que o alemão tenha facilidade no domingo: o alto desgaste de pneus da Red Bull na Austrália deixou uma pulga atrás da orelha dos rivais e, diferentemente da própria corrida de Melbourne, o próprio tricampeão reconheceu que sua pole malaia teve muito a ver com a chuva no Q3.

O fato da Red Bull ter adotado uma estratégia de guardar pneus para a corrida mostra uma incerteza em relação ao número de paradas que serão necessários no domingo. Vettel tem um jogo a mais de duros do que os rivais diretos (Ferrari e Mercedes), ou seja, caso tenhamos uma prova com três paradas e stints com médio-duro-duro-duro, terá um ‘respiro’ de 3 ou 4 voltas, que pode fazer a diferença. (Lembrando que cada piloto tem a disposição 3 jogos de cada composto para dividir entre classificação e corrida).

Por outro lado, as equipes que usaram apenas um jogo de intermediários no Q3 – e a mais rápida delas é a Mercedes – podem ter vantagem caso chova. Some a isso o fato do time alemão ter sido o único que conseguiu fazer uma simulação de corrida – e de maneira bastante consistente – na sexta-feira e temos motivos para acreditar que Hamilton e Rosberg podem incomodar.

Na Ferrari, Alonso afirmou que as simulações foram inconstantes demais para se ter um diagnóstico, mas só o fato do carro ter se comportado bem sob altas temperaturas já anima os italianos, que também estão na briga pela vitória. Outra aposta seria Raikkonen, mas, largando em 10º após punição, o finlandês dependerá muito do desenrolar das primeiras voltas – se ficar travado no tráfego, terá pouco a fazer.

Qual a aposta de vocês?

GP da Austrália por brasileiros, espanhóis e norte-americanos: “Esses pneus deveriam estar acabados!”

Ano novo, emissora nova. O primeiro texto da quarta temporada do post das transmissões tem uma substituição momentânea: aproveitando a estreia da F-1 na NBC, resolvi assistir aos norte-americanos neste GP da Austrália. Norte-americanos em termos, é verdade, pois o narrador Leigh Diffey é australiano, os comentaristas David Hobbs e Steve Matchett e o repórter Will Buxton são ingleses, um time que já atuou junto nos anos de Speed Channel. Mas vou chamá-los de norte-americanos para facilitar!

Hobbs espera problemas na primeira curva e até sabe onde olhar. “Massa e Hamilton lado a lado na primeira curva na Austrália não é uma boa combinação.” O brasileiro também ganha amplo destaque na Globo, principalmente por ter se classificado à frente de Alonso. “Vamos ver até quando continua essa história do Alonso ser boa gente se o Felipe continuar andando mais que ele”, diz Galvão Bueno. Já Antonio Lobato, na Antena 3, da Espanha, espera ver “o que Massa vai inventar.”

Os pilotos passam sem grandes incidentes pela primeira curva e as Ferrari pulam para segundo e terceiro. “Bonita a largada do Felipe! Os dois pilotos da Ferrari largaram bem e já vai vir pressão porque o Alonso é muito agressivo.” Os norte-americanos destacam Webber, que “nunca consegue uma largada decente”, Raikkonen, que também ganha menção de Reginaldo Leme na Globo, e Vettel, “que mais uma vez escapa na frente, numa cena familiar.”

O ritmo do alemão deixa os espanhóis inquietos. “Agora Fernando vai para cima de Massa. Muito agressivo nestes primeiros metros. As Ferrari têm de entrar no ritmo porque não interessa que Vettel se vá. Ele quer se livrar rapidamente porque vê que Massa é mais lento”, crê Lobato. O narrador e Jacobo Vega fazem planos sobre como Alonso vai passar Massa na primeira zona de DRS para ter direito ao apetrecho na segunda e se aproximar de Vettel: “Calma, primeiro Massa”, avisa Pedro De la Rosa.

Hobbs aposta mais em Raikkonen. “Se ele passar Hamilton, vai dar trabalho.” Leigh Diffey concorda: “É seu segundo ano, agora não tem nada mais a se acostumar e vai para cima.” Will Buxton acredita que o início lento do inglês tem a ver com o terceiro lugar no grid. “Sabemos que Hamilton sabe extrair muito dos pneus, mas talvez tenha tirado demais na classificação para ficar em terceiro e está pagando agora.” Enquanto isso, Steve Matchett acredita que quem está exagerando no ritmo nas voltas iniciais da corrida é Massa.

Button surpreende parando com a McLaren na quarta volta. Ao ver o estado de seus pneus, os norte-americanos se impressionam e duvidam que seja possível fazer apenas três paradas. De la Rosa discorda. “A janela da primeira troca se abre na volta 5, mas vão tentar ficar na pista para evitar o tráfego. Por isso Vettel segue mesmo estando lento. É uma corrida típica de três paradas, com supermacio, médio, médio, médio.”

Galvão faz seu ataque costumeiro à “escolha prematura da McLaren com Perez, porque é fácil impressionar com time pequeno”, e destaca o ritmo de Vettel, que “não é o esperado e está segurando as Ferrari”, enquanto os espanhóis celebram que o alemão esteja “nas cordas, como não estamos acostumados a vê-lo”, mas estão mais preocupados com Raikkonen. E os norte-americanos chamam a atenção para a performance de Sutil. “Essa Force India parece conservar melhor os pneus do que ninguém”, diz Hobbs. “É uma performance incrível para Sutil. Entrando nos ‘se’, caso comece a chover e os pilotos tiverem de colocar os intermediários, o regulamento o livraria de colocar os supermacios e isso poderia funcionar muito bem”, completa Matchett.

Como Sutil segue na pista e prende Vettel, Massa e Alonso, que já haviam feito sua primeira troca, De la Rosa começa a analisar as saídas. “O normal é que, quem está primeiro, tome a decisão [referindo-se a Massa e Alonso]. Porém, também é certo que parar mais tarde pode não ser rentável agora, mas pode fazer a diferença no final da corrida, em que você terá pneus mais frescos. O tráfego e as decisões diferentes que ele pode trazer que vão decidir essa prova, porque as diferenças são mínimas.”

Os norte-americanos não acreditam que esse é o ritmo real de Vettel. Ora creem que o alemão está preservando os pneus, ora veem uma reação à informação que recebeu via rádio de que a equipe perdeu a telemetria de seu carro. Para os espanhóis, o tricampeão não passa Sutil por falta de velocidade de reta. “Os long runs do Sutil foram os melhores dos treinos livres, não é uma surpresa. Vai fazer duas paradas”, lembra De la Rosa. “É preciso lembrar que as Mercedes vão fazer uma parada a menos e estão na briga. Por isso é tão ruim esse trem com o Sutil.”

Alonso decide se desgarrar do grupo e para com apenas 11 voltas no pneu médio, surpreendendo a todos. Os norte-americanos não entendem a tática de cara a creem que “esses pneus não estão aguentando mesmo”, duvidando, até, que o espanhol consiga se manter na estratégia de três paradas. Para Galvão, o ferrarista parou porque “não tem velocidade para passar Felipe e tentou um plano B.”

Todos só percebem a aposta por antecipar a parada para sair do ‘trenzinho’ quando Vettel e Sutil respondem e voltam atrás do espanhol, para a irritação de Reginaldo. “Aí não dá, né? Já foi feita a inversão de posição com o Alonso”, referindo-se a Massa, que segue na pista.

O brasileiro pergunta ao engenheiro Rob Smedley o que fazer. “Essa mensagem mostra bem a relação de Massa e Smedley: ele só pergunta ‘o que a gente faz?’”, aponta Matchett. “Ele espera que o engenheiro lhe indique o que fazer”, critica Hobbs. E vão ao comercial – um dos oito durante a prova – antes da parada do brasileiro.

Enquanto isso, na Antena 3: “Vamos aos primeiros comerciais, antes de Sutil. É que já ficamos sem pneu”, diz Lobato. Eram as últimas curvas da volta 19, logo antes de Alonso fazer o pit stop que mudaria sua prova. Quando a transmissão volta, o narrador tenta inteirar o público. “Vamos ver como explicar isso: Massa está liderando, Alonso saiu da estratégia prevista, deixando de seguir Massa, Vettel e Sutil. Na volta seguinte, Vettel e Sutil responderam e Fernando ultrapassou Vettel no box e Sutil na pista, em uma manobra incrível. Agora Fernando está muito bem posicionado e Massa está perguntando o que está fazendo na pista, porque está rodando muito mais lento.”

Os brasileiros não param de reclamar. “A Ferrari sabe que sacrificou o Massa. Felipe continua sendo mais rápido que Alonso, mas deram um jeito dele ficar para trás. Vai ter de remar tudo de novo. Ficou feio para a Ferrari”, vê Galvão.

Vega também acredita que “Massa deve estar irritado”, mas De la Rosa explica. “Quem arriscou foi Fernando. No final, terá um pneu mais velho e pode acabar sofrendo. A questão de Massa era decidir se mantinha a estratégia original.”

Sem atentar-se aos pilotos que tentavam fazer duas paradas, Galvão acredita que “a corrida vai caindo no colo do Alonso”, já que Vettel não tem ritmo. Porém, na Espanha, não cantam vitória. “Estou começando a ficar preocupado com Raikkonen, porque o ritmo segue bom e pode ser que só tenha de parar uma vez”, diz Lobato na volta 27. As Mercedes e até Sutil também preocupam. Ou preocupavam, até a quebra de Rosberg e o fim prematuro do segundo jogo de Hamilton, que para a 27 voltas para o final. “Duvido que ele vá até o fim”, sentencia De la Rosa, enquanto Vega se irrita com a defesa do inglês quando lutava com Alonso, que vinha bem mais rápido. “Foi absurdo defender tanto porque ele perdeu muito tempo”, afirma. “Certamente só entrou porque travou o pneu”, completa De la Rosa. Mesmo com a intervenção de Lobato, que lembra Jacobo que “é Fernando e é Lewis. Sabe como é?”, o comentarista não se rende. “Seria mais inteligente o engenheiro falar para deixar passar porque ele ia perder muito tempo.”

Voltas depois, os brasileiros continuam na bronca com a Ferrari. “Não se pode questionar a capacidade do Alonso e pode ter sido um erro do Felipe com o Smedley, mas a estratégia é pensada por alguém acima deles”, explica Galvão.

A corrida já está em sua segunda metade quando Diffey diz sentir-se “um pouco culpado de não termos falado tanto de Kimi Raikkonen.” Ainda assim, se mostram mais empolgados com a corrida de Sutil do que do finlandês. “Se ele tiver de fazer só mais uma parada, os outros também vão parar e ele poderia vencer isso”, diz Buxton. Mas Matchett acredita que “depois de seis voltas, o supermacio vai acabar e ele vai perder terreno.”

Após a segunda parada do alemão, a previsão do comentarista se confirma e começam a focar na luta direta entre Raikkonen e Alonso, mas duvidam que o espanhol chegue. “Há uma faixa muito escura nos pneus esquerdos desse F138, o que é indicativo de muito desgaste”, vê Matchett.

Mesmo com Alonso na liderança, os espanhóis não se animam. “O problema é que os pneus de Kimi não acabaram no final do último stint. Sabemos que os pneus dele vão durar. Por isso, Alonso está forçando como um animal, mas é difícil”, aponta De la Rosa. Algumas voltas à frente, inclusive contanto com torcida para que Sutil segurasse Kimi, o que não acontece, Lobato se rende. “Fernando não pode com o ritmo de Kimi. Pelo menos temos de ficar felizes pelo resultado e por Vettel estar atrás. Massa que poderia atacar a Red Bull para colocar duas Ferrari no pódio.”

O ritmo, ou a falta dele, na Red Bull também chama a atenção dos norte-americanos. “A Red Bull não está tendo o dia que pensei que teriam”, diz Matchett, impressionado “porque Raikkonen fez a melhor volta com duas para o final, quando os pneus deveriam estar acabados! Alonso parece estar apenas administrando as voltas finais e tenho certeza de que os engenheiros da Lotus gostariam que Kimi estivesse fazendo o mesmo: ‘eu sei que você sabe o que faz, mas tome cuidado por favor!’”

De la Rosa chama a atenção para a diferença que a combinação Lotus/Raikkonen fez na corrida. “Estamos falando de como o carro cuida dos pneus, mas o piloto também está indo muito bem, cuidando dos pneus o tempo todo, não indo muito rápido no início. É o único que largou com supermacio e está conseguindo fazer isso. Só há dois pilotos que estão gerindo bem os pneus: é só olhar o ritmo de Alonso e de Kimi em relação a seus companheiros.” Mas Lobato trata de evitar preocupações dos espanhóis quanto às chances de Alonso frente ao finlandês. “Todos sabíamos que a Lotus seria uma rival importante, mas será muito mais difícil para eles desenvolver o carro para lutar pelo título.”

Os norte-americanos salientam a evolução da Ferrari em um ano, inclusive do próprio Massa. “Ano passado, Massa se classificou em 16º e abandonou, então terminar com um quarto lugar é fantástico. É o que ele precisava”, diz Hobbs, enquanto Diffey lembra que Sutil “teve um momento na vida em que pensou que nunca mais pilotaria um F-1.”

Para Galvão, “ficou claro que a Red Bull não é tudo isso e que Ferrari, Mercedes e Lotus vêm forte”, ainda que Reginaldo volte a lembrar que “aquela atitude da Ferrari prejudicou a luta do Felipe pela vitória e pelo menos o colocou atrás de Vettel.” Galvão concorda e prevê mais problemas no futuro. “O Felipe forte de cabeça vai dar muito trabalho para o Alonso. A Ferrari vai ter de inventar muita coisa.”

Sobre o vencedor, De la Rosa acredita que Kimi ganhou a corrida nas primeiras 15 voltas, “porque ele não se meteu nas batalhas dos outros, até por não precisar já que faria uma parada a menos. Aí pôde cuidar dos pneus e fazer sua corrida.”

A receita de Kimi

Dessa vez, não deu para escapar

O fato do GP da Austrália não ter vencido pelo carro mais rápido do final de semana diz uma série de coisas ao menos sobre o início desta temporada. Digo o início porque a tendência é que as equipes, à medida que vão coletando dados, adaptem a maneira de trabalhar e de acertar o carro para obter um equilíbrio melhor no uso dos pneus. Assim, ao longo do ano – como vimos já em 2012, inclusive – os carros mais rápidos irão se sobressair.

Mas isso deve demorar algumas etapas. Ninguém sabe ao certo, por exemplo, como os carros e pneus vão se comportar no calor da Malásia. Portanto, a máxima de Melbourne deve valer por algum tempo.

Seria justo dizer que a Lotus é o carro que cuida melhor dos pneus e ponto final? Observando a corrida de Grosjean, não. Pela postura dos dois pilotos mais bem classificados no último domingo, dá para traçar um perfil vencedor: tanto Raikkonen, quanto Alonso deram o pulo do gato ao adotar um ritmo mais cadenciado no início do stint e forçar depois. As Mercedes também mostraram a eficácia disso no primeiro stint, e depois se perderam.

Funciona da seguinte maneira: forçando os pneus logo de cara, a tendência é que o graining seja intenso; caso contrário, o pneu vai passar pela fase inevitável do graining e render mais e por mais tempo.

Alonso só pôde fazer isso no início do terceiro stint, quando adiantou sua parada para se livrar do tráfego de Sutil, Vettel e Massa – sim, aquele trenzinho colocou a prova no colo de Raikkonen, que não se envolveu em brigas e pôde adotar seu ritmo durante. Primeiramente, Alonso dava a impressão de que seria pressionado por Vettel, mas depois começou a sobrar. A Ferrari de repente decidiu andar? Não, era o piloto que dosava o ritmo no início para aguentar o stint de 19 voltas que tinha adiante.

Essa tendência foi ainda mais forte no caso de Raikkonen e foi bastante perceptível no último stint, quando parecia que Alonso se aproximaria, chegando a ficar 4s atrás do líder. Nas últimas 10 voltas, o finlandês mostrou seu ritmo real e evitou qualquer reação do espanhol.

É provável que isso não tivesse acontecido caso Kimi forçasse no início de seu último stint, algo que vimos muito claramente em três momentos da corrida: com Vettel no início, com Hamilton de pneu médio e com Sutil no final com supermacios. Os três forçaram demais no início e tiveram quedas violentas de performance.

Se essa realidade se mantiver, será interessante observar qual a reação especialmente de Vettel. O alemão e a Red Bull se acostumaram a vencer configurando o carro mais para garantir a pole do que para lutar no pelotão, priorizando a pressão aerodinâmica em detrimento da velocidade de reta. Assim, o trabalho do tricampeão era adotar um ritmo alucinante nas primeiras voltas para se livrar da pressão dos rivais e ditar o próprio ritmo, podendo cuidar dos pneus.

Porém, vimos na Austrália que isso não funciona, pois destroça estes pneus. Será que, pelo menos até compreender melhor essa nova borracha, o conjunto mais vencedor dos últimos anos terá de mudar sua tática e adotar uma configuração a la Abu Dhabi 2012, arriscando a classificação?

Grid mais jovem da história vai bem na estreia: confira os números curiosos do GP da Austrália

A geração mais jovem e menos experiente em números de GPs desde 2004 não fez feio em sua primeira corrida, na Austrália. Ano passado, a Fórmula 1 abriu o ano com cinco abandonos por acidentes. Em 2013, apenas Pastor Maldonado ficou de fora após uma escapada. O venezuelano, inclusive, abandonou pela 15ª vez em 40 GPs, tendo a maior porcentagem (37.5%) do grid, seguido por Romain Grosjean (37.0%).

Curiosamente, há dois anos, a temporada contou com o grid mais experiente da história. Porém, principalmente com as aposentadorias de Michael Schumacher, Rubens Barrichello e Jarno Trulli, a média de largadas por piloto caiu de 96,95 para 74,86. O grid atual conta ainda com média de 27 anos de 61 dias, a menor da história. O mais jovem é Esteban Gutierrez, com 21 anos e 230 dias no domingo e o mais velho, Mark Webber, com 36 anos e 211 dias.

Apesar do atual domínio da Red Bull em termos de títulos, a primeira prova do ano foi vencida pela quinta equipe diferente em cinco anos: Brawn (2009), Ferrari (2010), Red Bull (2011), McLaren (2012) e Lotus (2013).

Outro sinal da atual competitividade da categoria é o fato do GP da Austrália ter tido sete líderes diferentes, menos apenas que o GP da Itália de 1971. Entre eles estava Adrian Sutil, estreante no posto.

Mas quem recebeu a bandeirada em primeiro foi Kimi Raikkonen, pela 20ª vez, igualando a marca do compatriota Mika Hakkinen, ainda que com mais largadas que o bicampeão (177 contra 161). E, assim como em sua primeira vitória na Austrália, em 2007, Kimi teve a seu lado direito Fernando Alonso, sendo que nenhum dos dois voltara ao pódio em Melbourne desde então.

Raikkonen protagonizou a 21ª vez na história em que o piloto que largou em sétimo lugar venceu uma corrida. O próprio Kimi o fez em duas oportunidades, em sua primeira conquista, na Malásia em 2003, e no Canadá em 2005.

O finlandês marcou ainda a 38ª volta mais rápida da carreira, ficando a três do segundo melhor no quesito na história, Alain Prost. O primeiro é Schumacher, que tem ‘só’ 77. Já Sebastian Vettel conquistou a 37ª pole da carreira.

Com a volta ao pódio de Melbourne após seis anos, Fernando Alonso agora só não conquistou trofeús para a Ferrari na China e na Bélgica. O bicampeão também garantiu sua 11ª temporada consecutiva com pelo menos um pódio, igualando a marca de Alain Prost. Mais que ele, apenas Nigel Mansell e Gerhard Berger, com 12 anos, e Michael Schumacher, com 15.

O espanhol, contudo, não se classifica à frente do companheiro Felipe Massa desde o GP da Índia, há três etapas. Isso não acontecia desde que Lewis Hamilton o superou nas últimas provas de 2007.

Mas nem tudo são flores para o brasileiro, que bateu na Austrália um recorde negativo para a Ferrari. Massa se tornou o piloto com a maior sequência sem vitórias, 68 GPs após a corrida do Brasil de 2008. A marca anterior era de Jean Alesi, entre 1991 e 1995.

Falando em estatísticas menos agradáveis, Sergio Perez se tornou o primeiro piloto desde David Coulthard em 1996 a não pontuar em sua estreia pela McLaren. Nico Hulkenberg prosseguiu com seu inferno astral em Melbourne, circuito no qual se envolveu em acidentes em 2010 e 2012 e em que nunca completou uma volta e, em 2013, sequer largou com um problema na alimentação do combustível. Por fim, mais uma vez os australianos não viram um compatriota no pódio: nos 28 GPs disputados no país, nunca um piloto da casa estourou o champagne.

Aposta arriscada ou inversão de posições na Ferrari?

Como era de se esperar, muitas questões ficaram em aberto após o GP da Austrália. O ritmo da Lotus teve a ver com a temperatura de pista ou é uma tendência para a temporada? E o caso curioso da Mercedes, que parecia ter se livrado dos problemas de desgaste andando muito bem com o supermacio, mas depois caiu com os médios? Onde foi parar o ritmo demonstrado pela Red Bull nos treinos? E a Force India, tão eficiente com os médios quanto péssima com os supermacios?

Porém, por aqui o que ganhou destaque foi a diferença da estratégia da Ferrari para Massa e Alonso, em parte responsável pelo segundo lugar do espanhol e o quarto do brasileiro. Prefiro olhar a questão pelo mesmo prisma do Ico, exaltando a corrida consistente de Massa e abrindo o caminho para uma boa temporada. E trago alguns números para explicar por que o que vimos em Melbourne foi muito mais uma aposta arriscada que deu certo do que uma inversão maligna de posições.

Vamos aos fatos: Alonso vinha em último em um trenzinho com Sutil, Vettel e Massa. Assim como o companheiro, se mostrava mais rápido que Vettel e que o alemão da Force India, ainda que não o bastante para colocar de lado.

Caso respeitasse a ordem natural das coisas, teria de esperar a parada de Massa, a exemplo do primeiro stint, e fatalmente continuaria atrás. O espanhol decidiu, então, antecipar a segunda parada para adotar um ritmo mais forte e voltar na frente.

A Ferrari sabia que, parando Alonso primeiro, lhe daria a chance de superar Massa e Vettel? Obviamente. Porém, a manobra ao mesmo tempo resolveria o problema momentâneo do espanhol e arriscaria sua estratégia para o restante da corrida.

Explico: o bicampeão havia feito a primeira parada na volta 9, uma depois de Massa. Antecipou a segunda em três voltas, fazendo um stint curto, de 11 com os médios. Com 38 para o final, portanto, teria de cumprir mais dois stints de 19 para completar o GP. Ou seja, eles não tinham certeza se Alonso pagaria o preço da ousadia lá na frente, com o desgaste excessivo, mas decidiram correr o risco.

Isso explica também por que Massa não o seguiu logo na volta seguinte e parou três voltas depois, respeitando o plano original numa tentativa de ganhar lá na frente. No final das contas, os pneus de Alonso aguentaram os stints de 19 voltas e a aposta deu certo, mas Massa simplesmente não tinha essa informação quando decidiu ficar na pista mais tempo.

Choveu, acabou

“Mas eles não são os melhores do mundo?”, era a pergunta na boca de todos nesta madrugada em que os donos do show não tinham volantes, mas rodos à mão. Como se a Fórmula 1 fosse tão simples que dependesse apenas da habilidade dentro do cockpit.

São vários os fatores que explicam por que a Fórmula 1 é tão mais cheia de frescura do que antigamente em relação à chuva. É fato que a questão da segurança é abordada de outra maneira – antes o risco de um acidente grave era entendido como parte inerente e até que dava graça ao esporte, hoje não mais. Mas isso não explica tudo.

Com a maior dependência e o refinamento da aerodinâmica, os carros são bem mais nervosos e sensíveis que há 10, 20 anos, sendo projetados para andar o mais próximo possível do solo. Assim, quando passam por cima dos rios formados pela chuva, a água preenche esse espaço pequeno, provocando fortes e repentinas saídas de traseira.

Os pneus de chuva serviriam para amenizar esse efeito, mas os Pirelli são reconhecidamente ineficientes nesse quesito. Os Bridgestone, por exemplo, dispersavam 80l/s a 250km/h (pneu para chuva extrema) e 55l/s a 275km/h (pneus intermediários). A borracha utilizada hoje tem dispersão de 60l/s a 280km/h (chuva) e 40l/s a 280km/h (intermediários), sendo que as velocidades apresentadas seriam as máximas alcançadas pelos carros em tais pneus. Não é por acaso, portanto, que a direção de prova tem sido mais cautelosa.

Nem mesmo o melhor piloto da história conseguiria segurar um carro em uma pista encharcada com essa combinação de chassi baixo e pneu com pouca dispersão, até porque nessas condições há perda de contato entre o bólido e o asfalto. “Você podia fechar os olhos e tirar a mão do volante, porque o carro fazia o que queria”, testemunhou Jenson Button, sempre um dos primeiros candidatos a se dar bem quando a água cai. E, principalmente em pistas como Albert Park, com muitas linhas pintadas por se tratar de um circuito de rua, e muros próximos, o fator segurança ganha força.

Que os pneus Pirelli para o molhado têm de melhorar não há dúvida. Quanto à aerodinâmica, a F-1 sabe que ela tem influência exagerada nos carros hoje, mas vem enfrentando dificuldades em frear os engenheiros. As regras de 2014, inclusive, são uma nova tentativa nesse sentido.

Também é fato que o treino não foi só adiado pela chuva. Caso os horários na Austrália fossem os usuais – classificação e corrida às 14h – as decisões seriam outras. É compreensível economicamente que se busque o melhor horário para a TV, mas é preciso que haja um plano B. É caro instalar um sistema de luz artificial como em Abu Dhabi? Certamente. Mas e o prejuízo comercial e esportivo do que vimos na madrugada?

Invertendo os papéis

GP do Brasil de 2012: McLaren faz pole e vence, enquanto a Mercedes luta para entrar no top 10.

GP da Austrália de 2013: McLaren sofre para ficar entre os 10 e Mercedes está entre os melhores.

Os mais apressados podem associar a inversão de papéis das equipes à ida de Lewis Hamilton do time inglês ao alemão, mas a aritmética da Fórmula 1 não costuma ser tão simples.

Que Hamilton tem mais velocidade que a atual dupla da McLaren, Jenson Button e Sergio Perez, e que a antiga da Mercedes, Nico Rosberg e Michael Schumacher em final de carreira, não há dúvidas. Mas as razões para o que temos visto deste a pré-temporada passam pelas filosofias dos times.

A Mercedes vem em uma luta de três anos para se equiparar tecnicamente aos times de ponta, após comprar a estrutura deficiente da Brawn. O progresso tem sido lento e contínuo e, ainda que a meta seja lutar pelo título em 2014, ao menos de início a decisão da equipe de abandonar cedo o desenvolvimento do carro do ano passado para arrumar a casa parece ter dado resultado.

Há quem possa lembrar que a Mercedes começou bem a temporada passada, inclusive com uma vitória incontestável na China, mas logo perdeu terreno. Contudo, pelas contratações de grandes engenheiros e a melhoria do túnel de vento – além, é claro, da chegada de Hamilton – seria uma surpresa se essa queda voltasse a acontecer.

Na McLaren, a opção foi por iniciar um projeto cheio de inovações mesmo em um ano no qual, pela continuidade do regulamento, a grande maioria preferiu desenvolver modelos semelhantes aos do ano passado. A equipe inglesa apostou em uma suspensão nos moldes da Ferrari, por exemplo, com um tipo de geometria que não é simples de trabalhar. Por isso, é esperado que tenha certa dificuldade no início.

Porém, essa é uma faca de dois gumes, pois existe a possibilidade real da McLaren, por começar um projeto com mais inovações, ganhar muito mais que os concorrentes ao longo do ano. Essa é a estratégia da equipe, que já mostrou em diversas oportunidades seu poder de reação. Por outro lado, se esse ganho demorar muito a ficar claro, o time logo será obrigado a jogar o projeto fora e focar apenas em 2014, quando haverá uma grande mudança de regulamento.

A primeira impressão é de que Lewis Hamilton pulou do barco na hora certa – e foi para o lugar certo – algo que parecia impossível há seis meses, quando o piloto anunciou que bateria em retirada da McLaren depois de seis temporadas e um título mundial. Mas será que o toque de Midas tem prazo de validade?

Coluna publicada no jornal Correio Popular

Corridas clássicas de Melbourne. Qual é a sua?

Amigos, amigos...

O sono às vezes atrapalha, e muito, mas o GP da Austrália em Melbourne é sempre um belo começo para a temporada. O público comparece em peso, tem toda a tradição do desfile de carros antigos e a pista serve para testar a confiabilidade dos carros – que o digam os freios! – e o nível de “ferrugem” dos pilotos, com uma largada sempre complicada e muros e britas pouco coniventes com erros.

Villeneuve, em 1996

Sua tradição como prova de abertura também lhe rendeu uma série de estreias marcantes. Na minha memória, vai ser difícil alguma superar a de um piloto que seguia muito de perto na Fórmula Indy e que chegava em 1996 com seu jeitão grunge e o sobrenome famoso para a equipe mais vencedora da época, a Williams.

Nunca ligou para muita coisa, aquele tal de Jacques Villeneuve. Nem para a pressão da estreia. Fez uma pole que surpreendeu muitos que esperavam um novo Michael Andretti e só não venceu por um vazamento de óleo, respondendo bem à relargada após outro incidente marcante daquele GP: o voo de Martin Brundle na Jordan dourada.

Webber, em 2002

Seis anos depois, seria a vez de outra estreia gloriosa, com direito a pódio mesmo com um quinto lugar. Correndo em casa, Mark Webber sobreviveu na pista e levou a Minardi aos pontos.

Tudo bem que o hoje piloto da Red Bull chegou à frente apenas de dois carros: seu “fantástico” companheiro Alex Yoong e Mika Salo, que rodou sua Toyota tentando passar o australiano com uma volta para o final. Mas valeu pela festa e pelo feito de um piloto que só viria a superar o quinto lugar da estreia em casa ano passado.

Hamilton, em 2007

Pulando mais cinco anos no tempo, é a vez de Lewis Hamilton chegar à Austrália com a faca e o queijo na mão para uma estreia daquelas. E o inglês não decepcionou. A bordo de um carro competitivo e com toda a pressão no companheiro bicampeão Fernando Alonso, deu seu cartão de visitas logo na largada, passando o espanhol por fora.

No desenrolar da prova, é bem provável que a McLaren tenha mexido seus pauzinhos para garantir que Alonso chegasse na frente, tendência que foi mudando ao longo da temporada. Mas o “estrago” já estava feito e Hamilton trouxera uma enorme dose de alívio para os ingleses: fazia tempo que eles não tinham um “championship material”, como costumam dizer, em uma equipe de ponta. E pensar que não sabiam que seria só o começo de uma sequência de pódios que terminaria apenas oito provas depois.

Brawn GP, em 2009

Meu último GP da Austrália que marcou foi o de 2009. Fazia tempo que não víamos o grid “invertido” na Fórmula 1, com Brawn, Red Bull e Toyota na frente – e as consequências de tudo o que deu errado para McLaren e Ferrari naquela época sentimos até hoje.

Isso sem contar na história inacreditável da Brawn GP. A Honda, cansada de andar do meio para o fim do pelotão, abandona o barco, o time é confirmado aos trancos e barrancos e o carro é, disparado, o melhor do grid. Com difusor duplo ilegal? Sim, mas quando eles foram pegos a história já era boa demais.

E para vocês? Quais foram os GPs mais marcantes na Austrália?

Fique de olho na temporada – parte 2

So far, so good

“A sensação no carro é a mesma de Interlagos”, comparou Fernando Alonso após o primeiro contato com o F138. Mas será que podemos esperar um cenário exatamente igual ao do final da temporada passada em Melbourne?

De fato, as poucas mudanças no regulamento sugerem que sim, pois é difícil fazer milagre com um conjunto de regras que está em vigor basicamente desde 2009, mas há algumas variáveis.

Os pneus Pirelli podem oferecer um desafio a mais a uma ou outra equipe – e só deve ficar claro quem fez bem a lição de casa e vai conseguir tirar proveito da nova borracha na classificação sem destroçá-la na corrida após as quatro primeiras etapas, pois os testes pouco serviram para isso. De resto, a questão é saber quem fez melhor a licão de casa no inverno.

Fundão e meio do pelotão

Lá atrás, se a Marussia parecia caminhar para superar a Caterham, os testes tumultuados e a pouca quilometragem – o time só andou mais que a Lotus – colocaram um grande ponto de interrogação nesta briga.

Sauber e Williams usaram bem o dinheiro trazido pelos mexicanos e venezuelanos, respectivamente, e se organizaram. O resultado começou a ser plantado ano passado e tem tudo para seguir na mesma linha. Apostaria mais na Williams aos sábados pela velocidade de Maldonado e mais na Sauber aos domingos pela consistência de Hulkenberg.

Mas ambas as equipes terão um rival duro pela frente: apostando na experiência de sua dupla de pilotos, a Force India busca continuar com a forte ascensão do final do ano passado e tem calibre para ser o destaque do meio do pelotão – isso, se não faltar dinheiro para desenvolver o carro. Na outra ponta, a própria Toro Rosso reconhece que tem muito trabalho pela frente e surpreenderia se desse um salto em relação a 2012.

Vamos ter um G5?

Mesmo tendo passado em branco em cinco das últimas seis provas em 2012,a Mercedes pode ser colocada entre os candidatos pelo menos a pódios. Isso porque o time passou 2012 reestruturando sua parte técnica e abandonou cedo o projeto do W03. O plano é dar o pulo do gato só em 2014, mas os frutos devem começar a aparecer agora.

E lá na frente? Nas últimas três provas de 2012, a Red Bull não dominou, perdendo terreno em relação à McLaren, da mesma forma que a Ferrari ficou devendo para ambas. Já a Lotus dependeu muito da interação dos pneus com a pista e o clima.

Isso significa nova vitória de Button na Austrália? Pelo menos pelo visto nos testes, a McLaren não parece tão no chão quanto a Red Bull. O time de Woking preferiu começar um novo projeto a desenvolver o carro de 2012 e pode levar mais tempo para compreender suas escolhas, como as suspensões dianteiras em pullrod, algo difícil de acertar. Talvez colham os frutos mais para frente.

A Lotus parecia candidata a incomodar a Red Bull, mas os problemas de confiabilidade que enfrentou nos testes colocam um ponto de interrogação no potencial da equipe. Mesmo que os problemas em si tenham sido resolvidos, é inegável que houve atrasos no desenvolvimento.

Assim, a bronca fica com a equipe que esteve mais longe da Red Bull nas últimas etapas. Com a correlação de dados da simulação com a pista em dia, acabaram as justificativas para a Ferrari se perder no desenvolvimento. Mas será que o ganho já foi suficiente para dizimar a diferença, principalmente em classificação? O carro não parece tão no chão assim…

O que já sabemos é que a Austrália pouco vai servir para nos dar todas essas respostas, por ser um circuito atípico. E depois vem o caldeirão da Malásia. E depois o frio e outra pista “estanha” na China. Bom, melhor voltarmos ao assunto da relação de forças em maio!

Fique de olho na temporada – parte 1

É bem verdade que não há grandes mudanças do lado técnico em 2013. Ao mesmo tempo, as poucas novidades prometem ter um impacto decisivo na forma como as equipes vão trabalhar no campeonato que começa neste final de semana. Veja quais os desafios dos times para este ano:

Pneus

Mais uma vez, a Pirelli promete roubar a cena – afinal, ela foi contratada para isso. A borracha de 2013 ganhou um perfil mais rígido nas laterais, castigando menos os pilotos que tendem a virar e frear ao mesmo tempo – ou seja, o pneu suporta movimentos laterais e longitudinais em conjunto.

Outra mudança busca ampliar a zona de temperatura em que o pneu funciona, diminuindo a roleta russa do início do ano passado, quando as equipes não compreendiam por que seus carros ora voavam, ora decepcionavam. Fora isso, os compostos devem ser mais diferentes entre si, mais macios de uma forma geral e, consequentemente, devem se degradar de maneira mais rápida.

O resumo aponta para pneus mais fáceis de lidar na classificação, mais “justos” por ter funcionamento mais previsível, e com maior degradação termal, resultando em mais pit stops. Tudo isso aumenta o leque de estratégias e causa mais diferenças de desgaste, levando a mais ultrapassagens.

DRS restrito

A princípio, a restrição do uso da DRS na classificação, limitado aos mesmos locais em que estarão as zonas de ultrapassagem nas corridas, não parece tão importante, mas muda a abordagem das equipes.

Com o uso ilimitado em classificações, a DRS chegava a representar um ganho de até 1s2/volta (no caso de Spa), ainda que isso esteja diretamente ligado ao tipo de circuito. A velocidade adicional, que chega aos 15km/h, altera a configuração de asas e, principalmente, a relação de marchas, que precisa equilibrar-se para que o motor não entre muito cedo no limite de 18.000 giros quando estiver na sétima marcha. Afinal, isso compromete o ganho de velocidade na reta e atrapalha ultrapassagens.

Para ler mais sobre os diferentes impactos da DRS, clique aqui e aqui.

Se, por um lado, o efeito menor da DRS facilita no acerto do carro, isso acelera a busca por outras formas de torná-lo mais rápido nas retas perdendo o mínimo de rendimento nas curvas, o que leva a nosso próximo tópico.

Dutos passivos

Muitas vezes chamados de DRS duplo, o que gera certa confusão, pois seu funcionamento independe do dispositivo, os dutos visam sanar parte da perda com as restrições da asa móvel. A busca dos engenheiros é diminuir a resistência do ar nas retas por meio de um sistema passivo. Porém, a falta de controle para sua ativação é um desafio importante e, até onde se sabe, ninguém conseguiu domar o conceito ainda, mesmo que os carros estejam cheios de pequenos dutos direcionando o ar das mais variadas formas, até nos bicos. Leia mais sobre o tema aqui.

Painéis no bico

Esteticamente, a mudança mais clara estará nos bicos dos carros, que ganham painéis que cobrem os pouco estéticos degraus. Porém, a novidade não foi adotada por todos, pois traz seus desafios técnicos, como discutimos aqui. Será curioso observar se haverá um padrão nos carros ao longo da temporada.

Carros anoréxicos

A tendência de miniaturizar a parte mecânica especialmente da traseira do carro para ampliar a área em que se pode trabalhar a aerodinâmica ganhar força a cada ano. Nesta temporada, as laterais também estão igualmente enxutas, o que pode causar problemas de refrigeração no decorrer da temporada.

2013 ou 2014?

Em um ano de continuidade técnica, o grande desafio para as equipes promete ser o equilíbrio entre o investimento – financeiro e de tempo – no desenvolvimento do modelo deste ano e o da temporada que vem, quando o regulamento muda de maneira significativa.

A princípio, tudo vai depender da maneira como cada equipe começar a temporada e, quem tiver mais chances de título deve focar mais em 2013 mas, ainda assim, será difícil determinar o tamanho desse foco. É só lembrar do prejuízo de McLaren e Ferrari em relação à Red Bull desde as últimas mudanças, em 2009: caso um time comece 2014 com um projeto equivocado, demorará para escalar novamente o pelotão.

Para complicar ainda mais, como a grande mudança para 2014 não é aerodinâmica, e sim na unidade de potência, não há muito que testar durante a temporada. Então o momento é de calibrar as simulações para se assegurar de que o projeto está no caminho certo.

No post de amanhã, vou falar das expectativas dos pilotos para 2013.

Com ou sem cirurgia plástica?

Se há algo visivelmente diferente nos carros desta temporada que se inicia em uma semana, são os bicos. Mas nem tanto quanto se imaginava.

O regulamento deste ano abriu uma brecha para que as equipes revestissem o degrau formado pelas mudanças nas regras do ano passado. Uma medida puramente estética, tanto, que a peça foi apelidada pelos ingleses de modesty panel, ou painel de modéstia. O termo vem de placas que eram colocadas na frente das mesas de secretárias para esconder suas pernas. E, como cirurgia plástica não faz sucesso na F-1 a não ser em grid girl, nem todos adotaram a novidade.

Os bicos com degrau surgiram ano passado visando aumentar a segurança dos pilotos. Na verdade, eles são o resultado de uma regra que buscou diminuir a altura dos bicos, algo pensado após o acidente na primeira volta do GP de Abu Dhabi de 2010, quando Michael Schumacher rodou e viu Vitantonio Liuzzi chegar perigosamente perto de seu capacete, em um raro choque frontal. Para evitar isso, a FIA determinou que a altura limite dos bicos caísse de 625mm para 550mm. Porém, como a altura do monocoque não foi alterada, criou-se um degrau de 75mm.

A nova mudança deste ano não quer dizer que a preocupação com a segurança foi deixada para trás. A estrutura permitida para, literalmente, cobrir o pouco estético degrau – e, por que não, aumentar a visibilidade dos patrocinadores nesta área – deve ser fina o bastante para se desfazer em caso de choque, evitando que se torne uma rampa de lançamento do bico em direção à cabeça do piloto em choques frontais.

Cobrir ou não cobrir?

Para as equipes, a decisão de usar o tal painel da modéstia não foi fácil. E a temporada deve começar na Austrália com diversas soluções, desde a manutenção do degrau de Caterham e Lotus, passando pelos interessantes “escorregadores” de Sauber e Red Bull, com as laterais mais altas que o centro, e as linhas harmônicas de Ferrari e McLaren.

As diferentes soluções decorrem da difícil equação entre os prós e contras do painel. O benefício é tornar o fluxo de ar na região mais harmônico, o que altera toda a interação com as laterais e o difusor. Além disso, elimina-se uma área de alta pressão causada pelo salto abrupto do ar.

O lado negativo é relacionado ao peso adicional em um lugar no qual ele é bastante indesejado. Estamos falando de poucas centenas de gramas, mas elas estariam em uma região muito alta e muito para frente do carro. Não é por acaso que tudo o que é mais pesado está o mais baixo possível: isso diminui o movimento lateral nas curvas e faz com que a suspensão se concentre mais em otimizar a altura do carro – e mantê-lo “no chão” é a grande busca dos engenheiros para ganhar velocidade.

Não por acaso, vemos soluções bem diferentes no grid, que têm a ver com o comprometimento de peso ou de aerodinâmica e com a interação com o restante dos carros. E, de item estético de primeira necessidade, os painéis se tornaram um interessante palco de novas ideias.

Luz e sombra

Sei que vocês querem mesmo é saber das apostas para a temporada, mas deixo isso para o Credencial que gravaremos nesta semana no TotalRace. Aqui, o clima será outro e a causa é nobre. Foi divulgada recentemente uma entrevista com um dos profissionais que mais admiro no paddock da F-1. Ele não pilota ou não desenvolve carros, nem dirige equipes. Mas retrata tudo isso como ninguém.

Darren Heath sempre conviveu com a paixão pela F-1 em casa e conta que, quando James Hunt venceu o campeonato de 1976, seu pai lhe jogava para o alto de forma que ele chegava a bater a cabeça no teto. Seis anos depois, quando assistia ao GP da Grã-Bretanha em Brands Hatch, percebeu que gostava de ‘gravar’ os momentos que via na pista. Ainda adolescente, descobriu o que queria fazer da vida: ser fotógrafo de F-1.

E como é bom nisso. Suas fotos prendem a atenção mesmo em um mundo em que somos inundados por imagens o tempo todo. Preparando-se para sua 24ª temporada, o inglês revelou alguns de seus segredos. Quando chega à corrida, por exemplo, desenha a pista e o caminho do sol, para saber onde estará em cada uma das sessões. “Tento mostrar o que a F-1 significa para mim. Tento mostrar que não são só 60 voltas em uma tarde de domingo, é uma novela, um show. Por isso mexo muito com cores, movimento – as mãos também dão esse tom”, explica. “Você tem de tentar se destacar em tudo o que faz. Não adianta eu tirar as mesmas fotos dos outros fotógrafos. Não gosto de tirar fotos que parecem estáticas, quando o carro está ‘estacionado’ na curva e você consegue ler até o nome da marca de pneu.”

O gosto por gestos fortes faz Heath ter uma admiração a mais por Fernando Alonso. “As comemorações dele são muito boas e sei que um colega lhe explicou que, quanto mais expressivas suas celebrações, mais cobertura terá. E você nunca sabe o que ele fará na próxima corrida. Schumacher também… nunca fui fã dele, mas a maneira como ele se portava nas comemorações era fantástica. Como piloto, gosto do Kimi Raikkonen, ele é sensacional em uma volta, mas quando ganha uma corrida… se bem que prefiro isso do que isto [imita o famoso dedo em riste de Vettel]”.

Entre as corridas, nada bate Cingapura para o fotógrafo. “Os carros brilham mais, você vê as chamas do escapamento. E Abu Dhabi é especial porque, como a corrida é ao entardecer, cada vez as imagens ficam melhores.”

Heath não gosta do zoom das máquinas, diz que torna os fotógrafos preguiçosos. Assim, carrega um batalhão de oito lentes, de 14mm a 600mm. “Mas minha favorita é de 50mm, acho que dá para cobrir uma corrida inteira com ela”. E sua máquina predileta, desde a temporada passada, é a Canon 1D X. Porém, o novo brinquedo tinha um problema: era comum que, com a máquina a tiracolo mudando de um lugar para o outro, um botão fosse acionado para diminuir a resolução das fotos. Heath, então, pediu que os mecânicos da McLaren encontrassem uma solução e acabou com uma máquina personalizada, cheia de fibra de carbono. Mais F-1, impossível.

Dá para ver a entrevista feita por Mario Muth aqui e mais fotos de Heath em seu website.

Ruim para as equipes, bom para nós

Ah, os testes...

Nos nove primeiros dias de testes da pré-temporada da Fórmula 1, foram nove os pilotos que lideraram a tabela de tempos. E o atual tricampeão, Sebastian Vettel, não esteve entre eles. Sinal de que o domínio da Red Bull está com os dias contados? Nada disso. Os resultados nessa época do ano dizem pouco, especialmente em 2013.

No total, são 12 dias de testes, espalhados em três sessões. Na última realizada em Barcelona, Espanha, os carros têm uma configuração próxima da qual usarão no início da temporada, dia 17 de março.

É o mesmo todo ano, mas em 2013 o cenário é ainda mais incerto pelas condições de tempo enfrentadas nos testes. Imagine que ninguém colocou o carro na pista com temperaturas superiores a 20ºC e, durante a temporada, dá para contar nos dedos de uma mão as corridas realizadas com essa temperatura. Isso interfere na compreensão dos pneus e do próprio carro.

A Ferrari, por exemplo, tem problemas com altas temperaturas na água e no óleo do F138 mesmo no inverno europeu e não sabe como o carro se comportará quando tiver de enfrentar o caldeirão de um GP da Malásia, por exemplo. Aliás, com a tendência seguida pela grande maioria das equipes de diminuir as entradas de ar, é possível que muitos tenham esse tipo de dificuldade.

Em relação aos pneus, ninguém testou em condições válidas com os super macios, que serão usados junto dos médios na primeira etapa, na Austrália.

Uma solução seria buscar lugares mais quentes para os testes, como ocorria na década de 1980, quando a F-1, inclusive, vinha para o Brasil. Uma opção economicamente mais viável hoje seria o Oriente Médio, mas isso não será possível enquanto a situação política do Bahrein não se normalizar e o traçado de Abu Dhabi não é atraente para que os times avaliem a aerodinâmica dos carros. Outro motivo de resistência é a maior dificuldade no fluxo de novas peças durante as práticas, o que acontece com bastante frequência quando se testa na Europa.

Deixando os tempos de lado, o que deu para ver até agora é uma Red Bull bastante equilibrada – Sebastian Vettel e Mark Webber fazem poucas correções no volante – e uma Lotus no chão, mas possivelmente menos veloz. Por outro lado, a Ferrari sofre com saídas de traseira e a McLaren, de dianteira.

Porém, do lado dos espectadores, toda essa incerteza pode ser positiva. Afinal, abre a possibilidade de resultados imprevisíveis ao menos até as equipes se acertarem. Será o bastante para termos sete vencedores nos sete GPs iniciais, como em 2012?

Coluna publicada no jornal Correio Popular

Brincadeira de gente grande

Sem balada dessa vez?

A movimentação de peças no mercado de pilotos da Fórmula 1 mostra o nível de complexidade que as relações técnicas e comerciais atingiram na categoria, algo que é espelhado pelo que acontece na pista e a cada mudança de regulamento. Não é uma questão de teoria da conspiração, mas de um poucas vezes claro jogo de interesses.

Na Force India, chegou-se a cogitar a contratação de Narain Karthikeyan, interessante pela grana e pela nacionalidade, e só. O fato do indiano ter sido preterido dá uma boa amostra de que a Force India não precisa tanto assim de dinheiro: Vijay Mallya certamente vem deixando a dívida rolar enquanto procura um comprador para a falida Kingfisher, pois dinheiro ele tem após vender parte da United Spirits por US$2,2 bi.

Adrian Sutil acabou ficando com a vaga, em decisão à primeira vista conservadora. Afinal, o alemão traz dinheiro, tem experiência e certa velocidade, tornando-se um pacote atraente para um time médio. Contudo, Jules Bianchi poderia ser comparado a Valtteri Bottas em termos de experiência e abriria as portas para um acordo com a Ferrari, que provavelmente perderá a Toro Rosso e quer fornecer seu motor para mais equipes ano que vem.

Quem também vai precisar de motores novos é a Marussia, uma vez que a Cosworth não está desenvolvendo os V6 turbo que serão usados em 2014. Ponto para Bianchi, membro da academia de jovens pilotos da Scuderia? Pode ser, mas há quem duvide que a McLaren gostaria de ter um piloto Ferrari usando seu simulador – e a equipe tem um acordo técnico com a Marussia.

Sim, a possibilidade de uma vaga abrir na Marussia também não tem nenhum motivo técnico. Já está claro que Razia não vem treinando porque o sinal acordado por contrato não chegou, algo que pode tirá-lo do grid e que abre uma série de possibilidades.

É bom lembrar Timo Glock foi dispensado justamente porque tinha um dos maiores salários da equipe, ou seja, a Marussia precisa de dois pilotos pagantes. Por isso, os rumores de que a vaga poderia ficar com Heikki Kovalainen não fazem muito sentido, a não ser que o finlandês mude a condição de “assalariado” que também lhe custou uma vaga, na Caterham. Outras possibilidades seriam o próprio Karthikeyan e outro endinheirado cujo país interessa muito ao crescimento da F-1, Vitaly Petrov.

Certa vez ouvi de um amigo médico que, se todos os profissionais da área fossem como os médicos do seriado House, os hospitais e sistemas de saúde públicos faliriam. Afinal, Dr. House não mede exames e procedimentos para descobrir qual a doença de cada um de seus pacientes. Na vida real, nenhuma vida vale tanto assim para quem administra as contas de um hospital.

Se até na hora de salvar vidas é preciso fazer as contas, imagine para manter uma equipe? Ao invés de criticar, vale mais a pena tentar entender as decisões, que acompanham a complexidade do que vemos nos carros e nas corridas. E a graça da F-1 está justamente nisso.

Astros da McLaren brilham – nos rivais

A Red Bull tem Adrian Newey. A Ferrari tem Pat Fry. A Williams tem Mike Coughlan. A Mercedes, ao que tudo indica, terá Paddy Lowe a partir de 2014. Em comum, os quatro têm papéis de liderança no corpo técnico de suas equipes – e uma longa passagem pela McLaren. Tudo bem que o fluxo de profissionais técnicos entre as equipes de F-1 é grande, mas que a McLaren tem histórico de perder grandes engenheiros, que se tornam chefes em equipes rivais, ninguém duvida. Isso levanta uma série de questões, desde os motivos pelos quais o time de Woking não consegue manter suas estrelas até o quanto disso tem a ver com o período de relativa seca de títulos, com uma conquista nas últimas 13 temporadas.

Sim, a McLaren se mantém disputando títulos, fazendo carros competitivos e vencendo corridas. Porém, parece que faltou aquele algo a mais, ainda que não esteja necessariamente apenas no corpo técnico, como também no campo administrativo e operacional.

É como se a McLaren fosse o Arsenal da F-1. Economiza ao contratar e formar Fábregas e Van Persies da vida, joga um futebol bom o suficiente para manter-se entre os classificados da Champions League, mas título que é bom, nada.

Haja vista a declaração do diretor administrativo da McLaren, Jonathan Neale, de que Lowe foi atraído por uma proposta salarial “de número de telefone”, tamanho o montante, a resposta para o êxodo de estrelas pode estar na maneira como a equipe se organiza.

O time é montado de maneira horizontal, sem alimentar o domínio de grandes estrelas, o que pode servir de argumento para os rivais atraírem os engenheiros. Isso foi importante na saída de Fry, descontente com o pouco espaço entre Tim Goss e Lowe. O atual diretor técnico da Ferrari, inclusive, levou consigo nomes importantes como Promodou e Iley ( e vale lembrar que os carros são projetados por Tombazis e o trabalho no simulador, a partir deste ano, é realizado por Pedro de la Rosa, ambos também ex-McLaren). A partir do ano que vem, é possível que o mesmo aconteça com a ida de Lowe para a Mercedes.

Por outro lado, o próprio Lowe, em declaração do início do ano passado, garantiu que a McLaren forma tantos engenheiros que “poderia perder 20 por ano por 10 anos e ainda assim não faltaria qualidade”.

De fato, a equipe é conhecida por isso, o que evidencia a maneira diferente como busca sua sobrevivência. Afinal, apesar dos projetos recentes de supercarros, ainda não pode tomar ares de montadora, como Ferrari e Mercedes, assim como não tem as garantias financeiras de uma Red Bull. Sua estratégia é semelhante à da Williams, que presta serviço em diversas áreas. Foram projetadas na McLaren, por exemplo, as bicicletas usadas pela equipe britânica de ciclismo nos Jogos Olímpicos de Londres.

Essa estratégia de diversificação de atividades para formar engenheiros de vários níveis unida com organização descentralizada acaba servindo como um escudo contra o maior poderio econômico dos rivais diretos.

É como se a McLaren constantemente se blindasse para perder seus talentos, o que diminui o impacto de uma saída como a de Lowe, responsável pela renovação da estrutura de simulação da equipe na primeira década dos anos 2000. Para o lugar dele, foi promovido Goss, projetista de alguns dos carros recentes da equipe e “pai”, inclusive, do MP4-23, que deu o último título para o time, em 2008. É como se eles sempre tivessem um Alexandre Pato no banco. Mas é inegável que, assim como constantemente recorrer aos reservas atrapalha o esquema tático e o ritmo de jogo de uma equipe, ficar cobrindo buracos no corpo de engenharia é um obstáculo a mais para formar uma base sólida e vencedora.

A “justiça” por trás dos pneus de 2013

“Uma parada é impossível, duas também, então teremos pelo menos três”, garantia Sebastian Vettel antes do GP da Austrália de 2011, que marcou a estreia da Pirelli na Fórmula 1. “Dá para ver a HRT mais rápida do que a Ferrari quando coloca pneus novos. Poderemos ver uma HRT ultrapassando uma Ferrari!”, alardeava Jaime Alguersuari. Na época, o diretor de automobilismo da empresa italiana, Paul Hembery, não dava ouvidos à chiadeira. “Pelos nossos dados, não sei por que fariam quatro paradas.”

De fato, o próprio Vettel venceu aquela corrida em Melbourne após duas trocas de pneu – e Sergio Perez ainda levou a Sauber aos pontos com apenas uma troca. Mesmo assim, dois anos depois, nem mesmo o mexicano acredita que isso será possível com os novos compostos:

“Normalmente nos testes de inverno vemos muita degradação, mas não tanto assim. Mas ainda estamos entendendo os pneus e espero que as coisas mudem, porque estamos em uma situação em que teremos em Melbourne algo como sete ou dez pit stops.”

Novamente, Hembery não concorda com as expectativas pessimistas. “Houve muita degradação em Barcelona, mas isso teve a ver com o clima. O frio tira os pneus de sua zona de funcionamento, o que gera graining.”

De fato, a temperatura do asfalto durante os testes da semana passada raramente superou os 20ºC e teve mínimas de um dígito. Logo, os pneus não permaneciam por mais de duas voltas em sua zona de funcionamento, o que compromete a aderência e faz com que os carros escorreguem, o que, com essa fricção com um asfalto já abrasivo, gera degradação intensa. Até por isso, as equipes fiam-se mais nos dados obtidos em Interlagos, quando andaram com os pneus de 2013 na primeira sessão de treinos livres e, sob intenso calor, não tiveram problemas.

Tanto, que a Pirelli segue com sua previsão de duas a três paradas para as provas. Isso, porém, não significa que os pneus mudaram para não mudar nada. A declaração que mais me chamou a atenção nessa pré-temporada foi de Jenson Button, comemorando que os pneus de 2013 são “mais justos”. O inglês se referia à maior previsibilidade para fazer com que a borracha entre em sua janela operacional – ou seja, quando o pneu tem seu melhor desempenho e menor degradação, tanto por não estar frio demais e se desgastando pela fricção causada pela queda de aderência, quanto pela degradação termal ocasionada por superaquecimento.

A roleta russa de performances do início de 2012 não foi resultado direto da degradação dos pneus, e sim de sua pequena janela operacional de temperatura – inclusive, com variações entre pneus dianteiros e traseiros. Assim, determinadas interações entre o carro, tocada do piloto, acerto e circuito provocavam alternâncias de rendimento como o domínio de Nico Rosberg na China após dois sétimos lugares no grid (e duas corridas fora dos pontos) nas etapas anteriores ou o final de semana irretocável de Pastor Maldonado na Espanha, que duas etapas depois, estava lutando para entrar no top 10 no Canadá. Se isso não foi nada ruim para o show, foi um pesadelo para as equipes, que não sabiam nem por que falhavam, nem por que acertavam.

Um misto de alterações no pneu e o maior entendimento dos carros fez que essa tendência se atenuasse fortemente na segunda metade do ano. Tanto, que a borracha passou a durar demais, obrigando a Pirelli a uma nova alteração, visando melhorar o rendimento ao mesmo tempo em que os compostos, mais macios, se degradem mais.

A boa notícia é que não há surpresas com as janelas operacionais e os pilotos são unânimes em dizer que o pneu responde bem logo na primeira volta. O esperado é que as faixas de temperatura fiquem, por exemplo, entre 90 a 115º para o médio e 105 a 125º para os macios e 85 a 110º para os supermacios. Ou seja, diferentemente do ano passado, quando Kimi Raikkonen chegou a culpar uma nuvem pela queda de rendimento no GP dos EUA – e não era exagero, uma vez que a faixa era tão pequena que uma diferença de 3 ou 4ºC já mudava o comportamento dos carros – espera-se menos loteria.

Isso não significa que a emoção vinda dos pneus acabou. A meta da Pirelli é ter corridas com dois a três pit stops. A experiência das pré-temporadas anteriores mostra que o apocalipse de Perez é exagerado, mas a degradação estará presente em Melbourne e será um desafio igual para todos. A diferença é que a maluquice provocada pela neura com as temperaturas deve permanecer no passado.

DRS parte 3: O desafio dos dutos passivos

Os engenheiros da F-1 têm a missão de gerar o máximo de downforce (pressão aerodinâmica) para prender o carro nas curvas, ao mesmo tempo em que tentam diminuir o drag (arrasto aerodinâmico) nas retas. A busca por maximizar estes dois elementos fez até com que os pilotos tivessem de tapar buracos no cockpit com mãos e pés, como vimos na temporada 2010, época do (hoje banido) duto aerodinâmico.

Em 2012, foi a vez de buscar a diminuição da resistência do ar pegando carona na DRS: Red Bull e Mercedes abriram buracos nas laterais das asas traseiras para que, quando o dispositivo fosse acionado, o fluxo de ar extra entrasse em dutos para estolar (ou seja, tornar alguma superfície mais plana em relação ao solo para diminuir sua interferência aerodinâmica) a beam wing (parte da asa traseira localizada perto da suspensão) e a asa dianteira, respectivamente.

Isso, que foi chamado pela imprensa de DRS duplo ou DDRS está banido em 2013 após a FIA determinar que a ativação da DRS não pode causar nenhum efeito secundário no carro. Mas, como nada freia os engenheiros, uma das grandes vedetes técnicas dessa temporada promete ser o duto passivo ou DRS passivo. Ele é legal porque não requer interação com qualquer outro sistema do carro ou ação do piloto.

As imagens mostram a entrada dupla de ar da Lotus e um dos experimentos da Mercedes para servir como periscópio. Clique nas fotos para ampliá-las.

Trata-se de um desafio para Adrian Newey nenhum botar defeito. Vou tentar simplificar: parte do ar recolhido na entrada de refrigeração do motor, acima da cabeça do piloto, é canalizada por debaixo da carenagem por meio de tubos para um periscópio. Com a pressão elevada, o ar é direcionado à asa traseira, fazendo-a “estolar” – também é possível adotar o mesmo princípio com a própria beam wing. O princípio é semelhante ao duto aerodinâmico (aquele do tapa buracos), mas sem a interação do piloto.

Este vídeo explica de forma detalhada uma das soluções possíveis para direcionar o ar:

É justamente porque não há um “botão liga/desliga” que trata-se de um grande desafio: ao “pressionar” a lâmina da asa traseira dessa maneira, ela perde eficiência. Isso é bom para aumentar a velocidade de reta, mas ruim para o downforce necessário nas curvas. Portanto, a questão é como controlar esse fluxo de maneira ele só funcione na reta, a partir de determinada velocidade – lembrando que ele tem de ser passivo, não pode interagir com nenhum comando. E, pior o quanto de pressão eu quero imprimir nessa asa levando em consideração que as necessidades variam de acordo com condições climáticas, acerto e altura do carro, diferentes velocidades de reta em cada circuito…

“É muito complicado ter um sistema que seja confiável, que aguente seguir outro carro sem ser acionado em momentos nos quais seria embaraçoso, e fazer com que isso gere mais ganhos que perdas durante o final de semana”, explica Newey.

O desafio é grande, mas, principalmente com as restrições ao DRS na classificação, quem conseguir uma saída para correr mais nas retas largará na frente.

DRS parte 2: Uma dor de cabeça a menos para a Ferrari

Um dos grandes mistérios da temporada passada foi o abismo do ritmo da Ferrari entre o sábado e o domingo. Afinal, a explicação para Fernando Alonso ter ficado a quatro pontos do título mesmo largando em apenas quatro provas no top 3 não pode se resumir à “mágica” do espanhol: o F2012 por vezes levava 1s na classificação e ganhava vida na hora que importava, andando em média um ou dois décimos mais lento que o melhor carro nas corridas.

Há uma teoria interessante para explicar esse fenômeno – e por que isso não deve se repetir em 2013. Foi Gary Anderson, ex-projetista e comentarista técnico da BBC, que surgiu com a plausível explicação: o problema do F2012 era na interação entre a asa traseira e o difusor, potencializado pelo uso da DRS.

Veja bem, não era a DRS em si da Ferrari que gerava problemas. Ela, na verdade, passou a ser uma das mais efetivas no grid e é a base da solução das deficiências de velocidade de reta que o carro apresentava no começo do ano. A questão é a instabilidade no momento em que a asa é ativada e, principalmente, desativada.

Quando se ativa a DRS, a resistência ao ar é reduzida já que uma das lâminas da asa fica plana, aumentando a velocidade de reta. Quando mais veloz o carro, mais a traseira cola no chão, o que diminui o downforce produzido pelo difusor. Isso é desejado para que o carro ganhe velocidade de reta. Porém, quando o piloto pisa no freio para a próxima curva, o interessante é que o nível de downforce aumente para que ele consiga efetuar a troca de direção de maneira rápida e estável. Assim, o carro muda de comportamento com a freada e a traseira sobe.

Para que essa transição seja eficiente, todo o pacote aerodinâmico deve ter um bom “diálogo”. E, haja visto a instabilidade em freada e as saídas de frente que marcaram o 2012 da Ferrari, havia alguma falha nesse sentido no F2012. Imagine que, em uma freada de 1s, a traseira demore 0s3 para subir e fazer com que o difusor ajude a manter o carro no chão: isso vai criar instabilidade, que reflete ainda na velocidade com que o piloto contorna e sai da curva.

E o que a DRS tem a ver com isso? Quando ela está ativada, gerando cerca de 10km/h a mais na reta, a queda de downforce na traseira é obviamente maior. Quer dizer, quando a asa estava funcionando em sua configuração “normal”, o diálogo entre as configurações de reta e curva era bom; quando ela perdia ainda mais downforce com a abertura da DRS, não. Para piorar o cenário, a tendência para corrigir instabilidade de traseira é tirar asa dianteira, mas isso faz o carro sair de frente e reduz o downforce geral do carro.

É visível que a Ferrari trabalhou muito na traseira de seu carro de 2013, priorizando trazer a suspensão mais para baixo para melhorar o fluxo de ar nessa região fundamental. Mas também é inegável que, com a restrição do uso da DRS em classificação, a equipe tem uma dor de cabeça a menos nesta temporada.

DRS parte 1: Regras mudam para igualar o jogo

Em um esporte no qual cada décimo de segundo conta, não é de se estranhar que o DRS tenha passado de artifício para fomentar ultrapassagens a diferencial de performance. Passou do ponto, inclusive. Tanto, que a solicitação dos próprios pilotos fez a FIA restringir seu uso a partir deste ano. Agora, o DRS só poderá ser ativado nos trechos previamente delimitados – uma ou duas retas, dependendo do circuito – mesmo durante a classificação, quando antes eram liberados. Mas como isso afeta os carros?

Primeiramente, é bom deixar claro de onde vem esse pedido. “Os pilotos estavam pedindo isso há algum tempo. Por que adicionar mais risco?”, questionou Mark Webber. Com o DRS liberado, os pilotos tentavam acioná-lo o mais cedo possível na saída das curvas e, quando passavam do limite, geralmente em treinos livres, as saídas de pista eram inevitáveis. Isso porque é necessário que o carro esteja estabilizado para manter a eficiência aerodinâmica sem parte da asa traseira funcionando para grudá-lo no chão.

A função do DRS é diminuir a resistência do ar – o drag – para aumentar a velocidade de reta. Na curva, portanto, um carro com o DRS aberto teria menos pressão aerodinâmica e não conseguiria ir tão rápido – ou então, o piloto perderia o controle.

Mas então o DRS caiu porque pilotos que não tinham “braço” suficiente para usá-lo no limite achavam a brincadeira perigosa? Bom, certamente a sensação de perder o carro numa reaceleração não deve ser das melhores. Porém – e não dá para saber o quanto isso influenciou a pressão dos pilotos – é inegável que o DRS liberado é uma vantagem para os melhores carros.

O carro que gera mais pressão aerodinâmica em condições normais vai estar no chão antes dos demais nas saídas de curva, permitindo que o piloto acione mais rapidamente o DRS. Com a asa aberta, ganha-se algo perto de 10km/h, dependendo do circuito. A diferença no tempo de acionamento é bastante sutil – é normal que, a olho nu, só fique clara quando se compara, por exemplo, uma Red Bull e uma HRT – mas, quando repetida por diversas vezes na volta, o resultado se vê no cronômetro. Ou se via.

Claro que ter essa vantagem com o DRS liberado não chega a ser injusto, até porque é um prêmio a quem tem as melhores soluções aerodinâmicas e a F-1 é, essencialmente, um campeonato de construtores temperado com os melhores pilotos. Mas, juntando a inquestionável preocupação com a segurança com uma chance de igualar mais o jogo na classificação, a FIA não teve dúvida. E o DRS será rei agora apenas onde nasceu para ser, nas corridas.

Nos próximos posts, vou explicar por que a Ferrari tem motivos para comemorar as restrições no DRS e que história é essa de DRS passivo.

A sala secreta dos comissários

Se a tecnologia é apontada por muitos para resolver as falhas dos juízes em jogos de futebol, o exemplo da F-1 mostra que é melhor ficar com um pé atrás. A FIA divulgou ontem detalhes do que chama “comissariado cibernético”, mostrando a quantidade de informações que os “juízes” têm à disposição para tomar suas decisões durante os GPs.

Enquanto todos nós temos acesso a replays por dois ou três ângulos de câmera, eles podem ver e rever o incidente por todos os ângulos existentes – que nem sempre são mostrados na TV – além de filmagens do circuito interno e onboard.

Além das “provas” de imagem, os comissários têm à disposição um sistema de GPS, para saber onde os carros estão em determinado momento; a comunicação via rádio com as equipes – novamente, não apenas aquelas mostradas na transmissão – e, a partir de meados do ano passado, a telemetria dos carros em tempo real. Esses profissionais também dispõem de um disco rígido com todas as punições do passado e podem verificar se um piloto é reincidente e, assim, aplicar uma punição mais dura.

Primeiramente, isso mostra por que as decisões demoram tanto. O volume de dados que os comissários têm à mão e absurdamente grande. E, pior: mesmo assim, por várias vezes as punições ficam para depois da prova, já que eles sentem a necessidade de ouvir os pilotos. Isso gerou episódios em que o resultado final só foi divulgado horas após o fim do GP.

E, sim, eles são inconsistentes. À primeira vista, a determinação em vigor após o GP do Bahrein deste ano de que um piloto não pode forçar o outro além dos limites da pista depois que o rival coloca a asa dianteira em paralelo com seu carro parecia colocar um toque de lógica no mundo de subjetividades das regras esportivas. Porém, houve episódios, como na dupla ultrapassagem de Hulkenberg sobre Hamilton e Grosjean na Coreia, em que isso foi ignorado.

Mas é fato que uma regra objetiva ajudou bastante. Talvez o caminho para os comissários não passe por tanta tecnologia na hora de apurar o que aconteceu, mas em deixar absolutamente claro o que pode e o que não pode.

Sim, automobilismo é um campo difícil para se aplicar regras esportivas porque o “campo de jogo” não é sempre o mesmo. Jogar um carro fora da pista em Mônaco não é o mesmo que na Malásia; passar reto nas chicanes de Monza não é o mesmo que em qualquer outro lugar, por exemplo, e essas diferenças costumam entrar na pauta das reuniões dos pilotos, que tomam ares de encontros de maçonaria. Por que não tornar esse processo também mais transparente?

Mas talvez o que mais incomode junto da demora nas decisões seja a falta de consistência nas punições. Isso, principalmente nas classificações – ora piloto X perde 3 lugares, ora piloto Y perde 10 pelo mesmo delito. Isso é explicado pelos comissários pela reincidência, e é um princípio que faz sentido. Porém, a maneira como o reincidente é punido deveria ser mais clara. Houve uma tentativa nesse sentido com as advertências, mas nunca ficou claro com quantas “faltas” se leva um “cartão”. Como as transgressões às regras podem ser variadas, quem sabe um sistema de pontos na carteira não daria conta?

A F-1 é mais complexa que um jogo de futebol, é inegável, e pode ter um sistema de comissariado cibernético e de regras ao mesmo tempo mais específicas e com certa flexibilidade. Inventem o que for necessário, desde que não esqueçam da coerência e da agilidade. Ou será que é pedir demais querer que um evento esportivo seja justo e acabe quando termina?

Um olho em 2013, outro no futuro

Há quatro anos...

A temporada 2013 nem começou e as equipes parecem obcecadas com o ano que vem. Não é para menos. Afinal, desde 2009 a Fórmula 1 não passa por uma revolução tão extensa nas regras – na verdade, para o diretor técnico da Lotus, James Allison, as alterações de 2014 serão ainda maiores.

Os carros sofrerão várias alterações conceituais: o efeito aerodinâmico do escapamento não será o mesmo devido ao uso do turbo e pelas modificações no posicionamento das saídas – na prática, o uso aerodinâmica do efeito Coanda será coibido; as dimensões da asa dianteira serão outras, influenciando o fluxo de ar do carro todo; a asa traseira também será diferente. Isso, sem contar na nova unidade de potência, integrando um ERS com o dobro de potência ao motor turbo, que traz, entre outras questões, desafios de refrigeração.

Por isso, algumas equipes começaram a trabalhar nos modelos ainda em 2011 e ano passado já dividiram sua estrutura ao meio para garantir que acertarão a mão. Isso é capital porque grandes mudanças de regras servem para chacoalhar a relação de forças – e não apenas em 2014: quem começar um passo à frente, ganha uma vantagem importante, que pode resultar em uma era de domínio.

Foi o que aconteceu em 2009, quando houve uma tentativa de reduzir consideravelmente o efeito da aerodinâmica nos carros. Enquanto McLaren e Ferrari lutavam palmo a palmo pelo campeonato de 2008, a Honda usava dois túneis de vento – sendo um deles em escala de 100%, algo inclusive proibido hoje – e a Red Bull aproveitava suas instalações e grupo técnico reestruturados para focar exclusivamente no modelo do ano seguinte.

Quando chegaram ao GP da Austrália, McLaren e Ferrari perceberam o preço que pagariam por levarem o desenvolvimento do modelo anterior até a última etapa: os ingleses não passaram do Q2 e os italianos levaram 0s8 do pole, atrás de Brawn, Red Bull, BMW e Williams. De lá para cá, vêm correndo atrás do prejuízo.

Correndo atrás da Red Bull, porque a Brawn ficou pelo caminho. A equipe que surgiu como um foguete após a saída da Honda herdou um projeto milionário, mas não conseguiu manter-se na ponta por duas questões: seu carro era baseado no difusor duplo, uma brecha no regulamento que seria fechada no ano seguinte e, pior, não havia mais dinheiro e estrutura para continuar o desenvolvimento. Ambos os fatores sobraram na Red Bull, que viu um Adrian Newey cheio de recursos cavar buraco atrás de buraco nas regras para usufruir daquela vantagem obtida em 2009 – e até aumentá-la em 2011.

Ano que vem, veremos o resultado de outra batalha de estruturas e competência técnica para enxergar além do óbvio. Porém, o que fazer se o carro de 2013 nasce bem e o título é disputado até o final? Saber até que ponto sacrificar o futuro para apostar em algumas tecnologias e conceitos que virarão sucata em 12 meses será um desafio e tanto.

Primeiras impressões

“Presidente, é um desastre”. O telefonema de Felipe Massa para o manda-chuva da Ferrari, Luca di Montezemolo, após andar pela primeira vez com o carro da Ferrari em 2012, era a pior notícia possível para a equipe italiana. Depois de um 2011 embaraçoso, com apenas uma vitória, o time arriscara no carro do ano seguinte, mas a aposta não surtiu o efeito esperado.

Doze meses depois, o telefonema do mesmo Massa, mais uma vez o primeiro a testar o modelo novo, deve ter sido muito mais animador. “Ano passado eu me recordo que o carro era muito instável, difícil de manter na pista, mas a base deste modelo é completamente diferente. Senti que estamos em uma boa direção com a parte traseira, com boa tração. E essa é uma pista muito difícil para a traseira, a degradação é muito alta. Em comparação ao ano passado, os carros estão em planetas diferentes”, sentenciou o brasileiro após o primeiro dia a bordo do F138, em Jerez, na Espanha.

A evolução era esperada, uma vez que as regras pouco mudaram de 2012 para cá e o carro do ano passado da Scuderia evoluiu bastante durante a temporada, permitindo que Fernando Alonso lutasse pelo título até o último GP. Mas como um piloto sabe logo de cara que um carro é bom ou uma verdadeira negação?

Os tempos dos primeiros testes da pré-temporada não costumam indicar muita coisa. Afinal, cada equipe tem um programa de desenvolvimento e fica difícil comparar. Mas um piloto experiente consegue identificar em poucas voltas quais as deficiências do carro: se ele é muito instável em freada, se precisa esperar muito para retomar o pé no acelerador após as curvas, enfim, se gera confiança suficiente para que ele ataque as curvas ao invés de perder tempo corrigindo dianteira e/ou traseira.

Os pilotos levam, então, seu diagnóstico aos engenheiros que, munidos também dos dados de um sem-número de sensores de telemetria, definem a direção do trabalho. E da mesma forma que Massa, Raikkonen já disse que sua Lotus é um passo adiante em relação ao bom carro de 2012, Button se mostrou feliz e Perez ficou impressionado com a diferença dessa McLaren para sua Sauber do ano passado. Do lado dos tricampeões da Red Bull, Webber reclamou de instabilidade na traseira, mas lembrou que o início de 2012 foi ainda pior. Nesse cenário de primeiras impressões, pior para Hamilton, que reconheceu que sua Mercedes “tem muito trabalho adiante.” Se é o jeito britânico de dizer que o carro “é um desastre”, só saberemos dia 17 de março, no GP de abertura da temporada na Austrália.

Coluna publicada no jornal Correio Popular

Quem precisa de testes?

Mesmo usando o termo tsunami para definir o impacto das mudanças nas regras a partir de 2014, o diretor técnico da Lotus, James Allison fez comentários interessantes a respeito da importância dos testes de pré-temporada. Para o engenheiro, ainda que a revolução seja extensa, isso não aumenta a necessidade dos carros andarem na pista.

Já que a aerodinâmica em si não é o foco, como foi em 2009, a grande preocupação das equipes é testar todo o sistema de transmissão. Porém, Allison confia que os simuladores são suficientemente avançados para dar conta do recado:

“Os dinamômetros são muito bons para indicar sobre a confiabilidade dos motores e os simuladores são muito bons em tornar as caixas de câmbio confiáveis. E essa é a maior parte da nova transmissão. Então o ponto crucial será produzir um carro que tenha refrigeração suficiente. Esse será o desafio de 2014.”

Desafio que parece muito mais ligado a computadores, túneis de vento e simuladores do que ao treino em pista – claro que contando que seus computadores, túnel de vento e simuladores funcionem a contento… Assim, não é de se estranhar que seja sempre a Ferrari, que investiu pesado por anos na estrutura para testes “reais” e paga caro até hoje por ter negligenciado as áreas que se tornariam vitais, quem mais chia. Ainda que a justificativa dos italianos de que a F-1 é a única modalidade em que não se treina possa parecer lógica à primeira vista, ela não condiz com o momento da categoria. Se a F-1 tem batido recordes de confiabilidade a cada ano e os carros seguem desenvolvendo-se “virtualmente” de forma satisfatória, por que treinar mais?

A história é diferente quando se fala em pilotos novatos ou que estão nas categorias de acesso buscando uma vaga. É óbvio que, de 2009 para cá, eles estão tendo de aprender muita coisa na marra.

Para resolver isso, o mais plausível economicamente seria usar uma estrutura já montada, testando, por exemplo, nas segundas e terças após determinados GPs. Mas até aí entra a incapacidade das equipes se unirem de fato para decidir algo. Como sempre, cada um defende seus interesses e o esporte que se dane.

Mas não é exatamente com os novatos que a Ferrari se preocupa e, ao que tudo indica, a questão dos treinos estará na pauta das discussões por alguns anos a fio. Mas o que fazer quando os pilotos são os únicos que precisam treinar, uma vez que os carros, nem mesmo após uma revolução nas regras, já não têm essa necessidade tão latente de entrar na pista?

O “Novo tabaco” e a renovação do produto F-1

Na McLaren, era a Malboro. Na Williams, a Camel. Na Lotus, a John Player Special. E quem acompanhou a F-1 dos anos 1970 até a primeira década deste milênio, quando os europeus foram os primeiros a querer distanciar o esporte do cigarro, certamente tinha dificuldade em ver a categoria sem um fumacinha sequer – pelo menos oficialmente, pois a Ferrari segue apoiada pela Malboro e a Lotus, que mesmo não tendo nada a ver com Colin Chapman e companhia, só adotou o preto e dourado pela fácil associação às cores do patrocinador dos anos 70 e 80.

Na época em que o cigarro era forte na F-1, já sabia-se que era prejudicial à saúde, pois os produtos passaram a receber restrições a partir da década de 1960. Porém, ainda era algo vendido como símbolo de poder e sensualidade.

Hoje, em meio a marcas ligadas à comunicação, relógios e roupas caras, o grid foi invadido  pelas bebidas energéticas. Após a compra da Jaguar pela Red Bull em 2005, e mais fortemente nas últimas duas temporadas, elas estão se tornando o novo tabaco.

E também vêm com algumas restrições, ainda que não tão fortes quanto o cigarro. E é difícil dizer, hoje, se mais estudos comprovarão no futuro que estas bebidas têm níveis de cafeína e taurina intoleráveis, com ocorre segundo a legislação de países como Noruega e Dinamarca e, até 10 anos atrás, na França.

Não é novidade que a F-1 nunca ligou muito para a origem de seu dinheiro, mesmo quando foi financiada por regimes autoritários e não é agora que a categoria vai ficar certinha porque uma ou outra lei mais rígida não aprova determinado produto. A parte que interessa nesse novo tabaco tem a ver com o público alvo de Red Bull, Monster, TNT e Burn, que ‘alinharão’ no grid no GP da Austrália. As bebidas energéticas são normalmente associadas aos jovens e às modalidades radicais. E não é segredo que o público da F-1 vem envelhecendo nos últimos anos e até possibilidades como a diminuição da duração das corridas e formas de interação ainda pouco exploradas na internet estão sendo estudadas para aumentar o interesse dos jovens.

O que, portanto, atrai essas marcas ao grid? Será que trata-se apenas de uma questão de “Maria vai com as outras” depois do sucesso da Red Bull ou elas estariam tentando aumentar a abrangência de seu público? Seria sua presença parte da estratégia da própria F-1? O fato é que, assim como o tabaco ajudou a trazer o glamour que rendeu tanto à categoria, as bebidas bem que poderiam ser um instrumento para sua renovação enquanto produto.

A ausência de Alonso em Jerez e o treino de base

Alonso e sua 'bici': de roupa da seleção espanhola e tudo o que tem direito

A decisão de Fernando Alonso ficar de fora da primeira bateria de testes da pré-temporada surpreendeu muita gente. Afinal, é de se esperar que, com a redução dos testes, os pilotos queiram andar o máximo possível antes da primeira corrida.

A justificativa também causou estranheza: “Se não fizer isso agora, não vou chegar com força total na última etapa”, disse Alonso. E ele deu a entender que se refere, tanto ao plano físico, quanto ao mental. Sobre o que passa na cabeça do espanhol é difícil avaliar, mas vale tentar entender a parte física dos motivos da ausência do bicampeão em Jerez. Ficar sem treinar dois dias para testar o carro vai fazer tanta diferença na preparação? Para compreender como isso funciona, é preciso entender as bases do treinamento esportivo e a importância do treinamento de base. Como tenho mais de 8 anos de experiência nessa área, escrevendo artigos sobre corrida de rua e musculação, vou tentar explicar alguns conceitos.

O treinamento de base é fundamental para amadores e profissionais e consiste em um período – que pode durar até três meses, dependendo da resposta do organismo – em que os volumes de treinamento são prioridade. Ou seja, os treinos são mais longos e menos intensos e específicos. Assim, cria-se um lastro, tanto na parte cardiovascular, quanto na músculo-esquelética, que permitirá que, mesmo diminuindo o ritmo dos treinos nos meses subsequentes, a condição física geral não se abale tanto.

Prevendo que viagens e compromissos atrapalharão a constância dos treinos durante a temporada, todos os pilotos costumam fazer um intenso trabalho de base. Depois, ao longo do ano, continuam com fortalecimento e aeróbios, porém com menos volume e de forma mais específica (por exemplo: treinando o pescoço de acordo com o sentido da volta em determinado circuito, e/ou o cardiovascular de forma mais intensa para circuitos no calor ou muito travados).

Outro conceito importante é compreender que o treinamento físico tem três pilares: treino, alimentação e descanso. Se um deles for comprometido, o treino também será.

Imagine um treino cardiovascular pesado – o próprio Alonso inclusive, tem nos informado sobre suas rodagens de mais de 3h de bike, sendo que trabalha geralmente em dois períodos – seguido por 100 voltas em um F-1, que é um tipo de exercício específico, submetendo o corpo a forças, especialmente o pescoço, que não podem ser 100% reproduzidas fora do carro. O resultado disso é fadiga, que compromete o treino por mais dias do que aqueles em que o piloto estará na pista. Dá para concluir, portanto, que a participação nos testes afeta no mínimo quatro dias de uma preparação que já não é tão longa quanto deveria, pois os pilotos não têm tempo de fazer mais do que 40, 50 dias de treinamento de base.

Mas então por que mais pilotos não fazem o mesmo? Obviamente, o ideal é que a programação dos treinos não interfira nos testes, mas parece ter havido algum atraso com Alonso. É possível que o piloto tenha tido uma lesão que tenha atrapalhado o início do período de base. Lesões, aliás, são comuns ao espanhol, que ao final da temporada passada comemorava ter passado o ano inteiro sem se machucar, ainda mais depois de ter brigado por boa parte de 2011 com uma tendinite no joelho. É possível que seja uma precaução após a detecção de algum desequilíbrio no sistema músculo-esquelético. É possível que o corpo do piloto, aos 31 anos, já não responda da mesma forma aos treinamentos após anos a fio sendo levado ao limite.

O fato é que a justificativa oficial faz sentido. Se o piloto sente que não teve tempo suficiente para fazer seu treino de base, isso vai aparecer no final da temporada, pois não terá lastro suficiente. E, convenhamos, os primeiros dias de testes só servem para checar detalhadamente cada sistema do carro e colocá-lo na pista para comprovar a durabilidade das peças. De fato, é melhor do que perder o fôlego em uma hipotética decisão de campeonato.

E, para quem está longe de competições, mas gosta de correr, pedalar, fazer alguma atividade física regularmente – e com toda razão! – fica a dica: cada vez que voltar depois de um período de inatividade, vale a pena treinar com mais volume e dar mais atenção ao fortalecimento muscular e à flexibilidade antes de pegar pesado pra valer. Além do rendimento melhorar, o risco de lesões é reduzido. E o corpo vai te agradecer lá na frente.

As estrelas: Button, Raikkonen, Vettel, Alonso e Hamilton

Fico imaginando o que seria do campeonato de 2013 se Jenson Button, o tecnicamente mais limitado do time das estrelas atuais da F-1, tivesse ligeiramente o melhor carro, cenário possível dada a forma com que a McLaren terminou o ano. A temporada das oportunidades, ano passado, mostrou o valor da adaptabilidade destas estrelas e não há motivos para acreditar que será diferente neste ano – ainda que se espere uma intensidade menor do que na primeira metade de 2012 devido à estabilidade das regras em relação ao difusor.

Jenson Button
Frome, Inglaterra, 19.01.1980
230 GPs
Em 2012: 5º, 188 pontos
O que levar para 2013:  ritmo de corrida
O que esquecer: apagões de performance

Mas, para levar vantagem, Button teria de resolver de vez seus problemas de acerto e as surpresas que foram comuns em seu 2012 – por várias vezes, o piloto dizia não saber aonde sua aderência havia parado para justificar apagões de desempenho, atestando sua pouca adaptabilidade.

Sebastian Vettel
Heppenheim, Alemanha, 03.07.1987
107 GPs
Em 2012: 1º, 281 pontos
O que levar para 2013: classificações e racecraft
O que esquecer: quedas de performance quando carro não está 100% na mão

As classificações devem ser especialmente apertadas agora que o DRS só pode ser aberto nas mesmas zonas da corrida, já que, pela regra anterior, carros com mais pressão aerodinâmica permitiam o acionamento do artifício por mais tempo, gerando ganho de tempo. Se isso, como esperado, atingir a Red Bull, será uma grande oportunidade de Sebastian Vettel provar a inegável evolução em seu racecraft que, combinada às costumeiras excelentes classificações, o tornam sério candidato ao tetra.

Fernando Alonso
Oviedo, Espanha, 29.07.1981
198 GPs
Em 2012: 2º, 278 pontos
O que levar para 2013:  leitura de corrida
O que esquecer: classificações do final do ano
Kimi Raikkonen
Espoo, Finlândia, 17.10.1979
177 GPs
Em 2012: 3º, 207 pontos
O que levar para 2013:  atuações em corrida
O que esquecer: classificações inconstantes do início do ano

Mas o alemão vai enfrentar séria concorrência. Os grandes especialistas em dosar agressividade e cabeça, aqueles que raramente terminam uma corrida abaixo da posição em que largaram, Fernando Alonso e Kimi Raikkonen, têm tudo para continuar sendo figurinhas fáceis entre os primeiros. O quanto poderão incomodar o alemão, no entanto, depende de seus carros. Os dois receberam boas notícias: a Ferrari vinha sofrendo em classificação justamente por seu DRS e a Lotus demonstrou lidar melhor com a degradação termal, que a Pirelli promete aumentar em 2013, que os rivais diretos.

Lewis Hamilton
Stevenage, Inglaterra, 07.01.1985
110 GPs
Em 2012: 4º, 190 pontos
O que levar para 2013:  temporada com poucos erros
O que esquecer: da certeza da luta por vitórias que tinha na McLaren

E Lewis Hamilton? Há quem diga que vai lutar por vitórias e chegar aos pódios com frequência, há quem jure que vai camelar no meio do pelotão. O piloto, já sabemos: vai brilhar em classificações, dar shows com manobras ousadas nas corridas, e por vezes vai nos deixar olhando para a TV incrédulos perguntando ‘por que diabos você fez isso, Lewis?’ Já fazer previsões sobre o carro é mais complicado. É difícil imaginar uma Mercedes superando qualquer uma das equipes dos astros pensando em onde estavam em 2012 e considerando o regulamento continuista, mas eles vêm se estruturando de maneira séria para chegar lá. No geral, no último ano antes do sacode de 2014, resta esperar que a proximidade entre os carros dê bastante espaço para as estrelas brilharem.

Confira todos os posts sobre o quem é quem nesta temporada.

Por um fio: Massa, Webber, Grosjean e Di Resta

É curiosa a lista dos pilotos que precisarão mostrar mais trabalho do que em 2012 para manter seus empregos para a próxima temporada: de Romain Grosjean, novato que errou demais da conta, a um dos mais experientes do grid – e sempre na corda bamba, sabe-se lá se por opção própria – Mark Webber.

Felipe Massa
São Paulo, Brasil, 25.04.1981
174 GPs
Em 2012: 7º, 122 pontos
O que levar para 2013:  finais de semana impecáveis da segunda metade de 2012
O que esquecer: espiral de queda de confiança após maus resultados

No meio disso, Felipe Massa diz ter reencontrado na felicidade de pilotar a velocidade que só apareceu em lampejos nos últimos três anos. De fato, o salto gritante de qualidade do brasileiro a partir do GP da Bélgica não teve nenhuma razão técnica. Talvez a maior previsibilidade dos pneus Pirelli ao longo do ano tenha ajudado, pois diminui a vantagem daqueles que se adaptam mais rapidamente, mas só isso não conta toda a história. Seja como for, o normal é que, ao longo da temporada, Massa seja superado pela constância de Alonso. Porém, mais finais de semana como mostrou ser capaz de ter na segunda metade de 2012 abrem uma nova perspectiva para sua carreira. E, convenhamos: há sete meses, isso parecia impossível.

Paul Di Resta
Uphall, Escócia, 16.04.1986
39 GPs
Em 2012: 14º, 46 pontos
O que levar para 2013:  habilidade em se manter longe de confusão
O que esquecer: quedas de performance ao longo da temporada

Paul Di Resta chegou com a pompa de ter derrotado o ex-companheiro de equipe Vettel na F-3 Euroseries e não decepcionou em seu primeiro ano, especialmente nas corridas finais de 2011. A impressão, portanto, era de que o escocês engrenaria. Porém, apesar de ficar longe de acidentes no embolado meio do pelotão, parece faltar uma pitada de sal ao escocês, que teve uma queda de rendimento acentuada após seu companheiro de 2012, Hulkenberg, começar a brilhar. Fora das pistas, um ponto de interrogação no futuro de Di Resta tem a ver com sua relação com a Mercedes: fora a Force India – que, especula-se, ensaia usar motores Ferrari em 2014 – as outras duas equipes atuais da montadora (a oficial e a McLaren) têm contratos de mais de um ano com seus pilotos.

Romain Grosjean
Genebra, Suíça, 17.04.1986
26 GPs
Em 2012: 8º, 96 pontos
O que levar para 2013:  velocidade em classificações
O que esquecer: afobação nas primeiras voltas

Grosjean mesmo admitiu não esperar que o desafio da F-1 fosse tão grande. Se a inconsistência e os erros bobos em largadas – o mais espetacular certamente foi na Bélgica, mas o de Suzuka beirou o ridículo – o fizeram balançar ao final do ano mesmo com o dinheiro francês dando uma força, é justo dizer que sua velocidade foi importante para que ganhasse uma terceira chance. Afinal, dizem que é mais fácil um piloto rápido tornar-se consistente do que um piloto consistente tornar-se rápido, não? Mas agora acabou a fase de “bixo”: o carro deve ser bom, o companheiro não incomoda, o chefe aposta nele e Grosjean tem tudo a seu favor para brilhar em 2013.

Mark Webber
Queanbeyan, Austrália, 27.08.1976
198 GPs
Em 2012: 6º, 179 pontos
O que levar para 2013:  performances como em Silverstone
O que esquecer: apagões durante a temporada

Quem parece que não gosta deste tipo de situação é Mark Webber. Aliás, a teoria dos ingleses para os comuns ataques vindos de Helmut Marko esbarra na necessidade que o australiano parece ter de ser tido como azarão, no melhor estilo Rocky. Psicologia à parte, o problema de Webber é semelhante ao de Massa: como seu companheiro consegue se virar em uma gama mais ampla de condições, tanto do carro, quanto externas, ele pode vencer algumas batalhas, mas dificilmente levará a guerra. E Webber mesmo já adiantou: se não for para correr na turma da frente, prefere promover suas corridas de aventura na Tasmânia.

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Quero ser grande: Rosberg, Hulkenberg, Vergne e Ricciardo

Há sempre aquele grupo de pilotos que está perto, mas não exatamente onde gostaria. Às vezes, nunca teve o carro para aparecer; teve companheiros cujo desempenho gerava dúvidas ou ainda a falta de vagas nas equipes maiores criou a ideia de estagnação da carreira.

Nico Rosberg
Wiesbaden, Alemanha, 27.06.1985
128 GPs
Em 2012: 9º, 93 pontos
O que levar para 2013: consistência nas corridas
O que esquecer: apagões em classificações

Um pouco de cada ingrediente faz com que 2013 seja uma temporada de provação para quatro pilotos no grid. Nico Rosberg chegou em 2006, badalado por títulos em todas as categorias de base, mas nunca fez o bastante em uma Williams em má fase para justificar o interesse de equipes grandes. Teve sua chance de mostrar serviço andando ao lado de Michael Schumacher, mas há quem acertadamente questione o tamanho do desafio frente a um quarentão que não conseguiu recuperar a forma dos sete títulos após três anos parado.

Mesmo assim, Nico superou, mas não trucidou Michael, indicativo de está mais para um Button do que um Vettel, por exemplo. Agora, terá de mostrar frente a Hamilton, de quem costumeiramente perdia quando eram companheiros no kart, se tem valor – e agressividade, algo que parece lhe faltar em momentos decisivos – suficiente para escalar entre os grandes.

Nico Hulkenberg
Emmerich am Rhein, Alemanha, 19.08.1987
39 GPs
Em 2012: 11º, 63 pontos
O que levar para 2013:  habilidade de se manter livre de confusões
O que esquecer: início do ano em marcha lenta

Se Rosberg vem numa fase de estagnação, o outro Nico chega à Sauber credenciado pelas boas performances da segunda metade do ano passado e com ares de líder da equipe. Aos 25 anos, o piloto teve um caminho tortuoso até agora na F-1, muito em função de não contar com patrocinadores do porte de rivais diretos, como Perez e Maldonado. Por isso, foi preterido na Williams e ficou um ano parado, o que lhe atrapalhou no início de 2012. Porém, as desculpas devem ficar para trás em 2013, ano da afirmação do alemão, que demonstrou ser competente em classificação e, mais importante, parece saber dosar agressividade e cuidado durante as corridas e raramente se mete em confusão.

Jean-Eric Vergne
Pontoise, França, 25.04.1990
20 GPs
Em 2012: 17º, 16 pontos
O que levar para 2013: cuidado com os pneus
O que esquecer: péssimas classificações
Daniel Ricciardo
Perth, Austrália, 1º.07.1989
31 GPs
Em 2012: 18º, 10 pontos
O que levar para 2013:  boas classificações
O que esquecer: falta de consistência em corridas

Após seu primeiro ano na F-1, Daniel Ricciardo e Jean-Eric Vergne parecem ser pilotos complementares: o australiano classifica bem e o francês, ganha vantagem nas corridas. Em outras palavras, nenhum dos dois dá pinta de estar suficientemente preparado para ocupar o eventual lugar de Mark Webber. Mas há de se notar que os pilotos do programa de desenvolvimento da Red Bull vêm direto da World Series e acabam chegando com pouca experiência. Se até mesmo um piloto especial como Vettel teve a oportunidade de testar bastante antes de correr na F-1, é de se imaginar que ambos merecem mais tempo. Mas a empresa já mostrou com Buemi e Alguersuari, que tinham características semelhantes, que a paciência não é seu forte.

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Mais que dinheiro: Maldonado, Perez e Pic

“Dinheiro não compra resultados”, twittou Sergio Perez recentemente. De fato, desclassificar um piloto apenas pelo apoio financeiro que ele traz não faz muito sentido em um mundo em que cifras e habilidade cada vez mais caminham juntos. Ou será que Alonso chegaria à F-1 sem o apoio da Telefonica? Ou Vettel sem a Red Bull? Ou Hamilton sem a McLaren?

É esse caminho que especialmente Pastor Maldonado e Sergio Perez e, em menor escala, Chales Pic, esperam trilhar nesta temporada.

Pastor Maldonado
Maracay, Venezuela, 10.03.1985
39 GPs
Em 2012:  15º, 45 pontos
O que levar para 2013:  performances em classificação
O que esquecer: falta de consistência nas corridas

Vencedor de GP e habitué do Q3 com a boa Williams em 2012, Maldonado precisa encontrar a consistência que lhe faltou nas corridas e pensar duas vezes antes de jogar seu carro na disputa de qualquer posição para se efetivar como líder da equipe. Acredita-se que seu contrato vá até o final de 2015, mas não se sabe como a saúde frágil de Chavez e as incertezas que rondam seu regime na Venezuela podem afetar o cumprimento do acordo.

Sergio Perez
Guadalajara, México, 26.01.1990
39 GPs
Em 2012: 10º, 66 pontos
O que levar para 2013:  estratégias ousadas e cuidado com os pneus
O que esquecer: inconsistência nas classificações

Pelo menos até que a Vodafone confirme sua esperada saída e abra espaço para outra gigante das comunicações, a Telmex, Sergio Perez pode dizer que sua ida à McLaren é resultado direto do desempenho mostrado na Sauber. É fato que o mexicano impressionou desde sua estreia, na Austrália em 2011, quando foi o único a fazer uma parada quando muitos precisaram de três, mas a consistência necessária para ser piloto de equipe top ainda não apareceu, principalmente em classificações. Além disso, não era segredo na Sauber que seu temperamento não é dos mais fáceis e que faltava espírito de equipe. Nada que o amadurecimento do piloto de 23 anos não possa corrigir. Resta saber se a engessada McLaren é o lugar ideal para isso.

Charles Pic
Montélimar, França, 15.02.1990
20 GPs
Em 2012:  21º, sem pontos
O que levar para 2013: boas performances em classificações
O que esquecer: inconsistência nas corridas

Os próprios jornalistas franceses reconhecem ver em Charles Pic um riquinho excêntrico que busca se distanciar da fama de milionário. Não que o piloto tenha mostrado muitos resultados para tanto antes de chegar à F-1, mas é bem verdade que Pic foi o piloto que mais deu trabalho a Glock nos três anos de Marussia. Se isso tem mais a ver com o crescimento da equipe como um todo, igualando as condições entre os pilotos, o francês terá chance de mostrar agora na Caterham. Mas vale lembrar que não seria nada mal para o piloto que seu novo time, que o contratou em grande parte buscando vantagens com a Renault, preferisse alguém com mais experiência como seu companheiro.

Confira mais sobre o Quem é Quem da temporada 2013 da F-1.

Os estreantes de 2013: Razia, Gutierrez, Bottas, Van der Garde e Chilton

Muito se fala na influência do dinheiro na revelação de jovens talentos para a Fórmula 1 nos últimos anos, resposta direta à crise e ao retorno das equipes independentes, esmagadas pelas montadoras na primeira década de 2000. No entanto, faz sentido pensar que o dinheiro vai para os mais capazes e é isso que os estreantes na categoria em 2013 querem provar.

Luiz Razia
4 de abril de 1989, Barreiras, Brasil
Estreia em 2013
Por que Razia: pelo comprometimento e crescimento mostrado ano passado
Credenciais: vice-campeão da GP2 em 2012, mostrou grande inteligência no cuidado com os pneus

Razia é o primeiro a admitir que cometeu alguns erros na carreira, indo para a GP2 imaturo demais e correndo o risco de cair em descrédito por não estar pronto para dar o próximo passo. A temporada de 2012, no entanto, foi decisiva para o baiano de 23 anos, que mostrou grande profissionalismo e aproveitou bem a oportunidade que teve de viver em Milton Keynes e trabalhar dentro da fábrica da Red Bull. Na pista, tornou-se um especialista em economizar pneus e, um a um, ir superando os rivais nas voltas finais para lutar pelo título da GP2. Com esse crescimento e apoio financeiro, tornou-se um pacote interessante.

Talvez não tanto quanto o próprio Razia esperava, é verdade. Mesmo não condenando as vagas nas nanicas, o piloto sonhava com um cockpit mais competitivo. Porém, se a Marussia não é o melhor lugar do mundo para começar na F-1, também é fato que Razia não poderia esperar mais um ano para dar esse passo e, ao lado de outro estreante, tem plenas condições de bater o companheiro e deixar uma boa impressão, se não para o público em geral, que sempre o verá se classificando lá para o final do pelotão, para quem importa, no paddock.

Esteban Gutierrez
5 de agosto de 1991, Monterrey, México
Estreia em 2013
Por que Gutierrez: chega como promessa após ser eleito o piloto que cuidou melhor dos Pirelli em 2012
Credenciais: campeão da GP3 em 2010 e terceiro na GP2 em 2012

Esteban Gutierrez tem, por enquanto, uma carreira com altos e baixos. Ganhou tudo no kart no México, tornou-se o mais jovem piloto do país a vencer um campeonato internacional, aos 17 anos, quando dominou de maneira impressionante a Fórmula BMW Europeia. Correndo pela tradicional ART Grand Prix dali em diante, não foi bem na F-3 Euroseries, mas sagrou-se campeão no ano de estreia na GP3. Demorou para engrenar na GP2, sendo terceiro colocado em sua segunda temporada, atrás de Luiz Razia e Davide Valsecchi, ambos no quarto ano na categoria.  Foi eleito pela Pirelli o piloto que cuidou melhor dos pneus em 2012.

Aos 21 anos, o mexicano garantiu uma ótima porta de entrada na F-1, beneficiado pelo investimento forte da Telmex. Na Sauber, tem um time com tradição em lapidar jovens talentos e que mostrou a maior evolução no último ano e chegou a ser copiado pelas grandes.

Valtteri Bottas
28 de agosto de 1989, Nastola, Finlândia
Estreia em 2013
Por que Bottas: nunca terminou um campeonato abaixo do terceiro lugar na base e tem experiência efetiva de 3 anos como pilotos de testes na F-1
Credenciais: campeão da GP3 em 2011

Depois de Nico Hulkenberg e Pastor Maldonado, a Williams faz sua terceira aposta em um piloto sem experiência na F-1 em quatro anos ao promover Valtteri Bottas. O finlandês foi campeão da F-Renault 2.0 no segundo ano, foi por duas temporadas terceiro colocado na F-3 Euroseries correndo pela mesma ART de Gutierrez – quando foram companheiros marcou mais que o dobro de pontos que o mexicano, com ambos em seu ano de estreia – e conquistou o título da GP3.

O ponto positivo de Bottas é a experiência com F-1, superior à maioria dos estreantes dos últimos anos – entre aqueles que queimaram a etapa da GP2, é o mais bem preparado desde Vettel em termos de quilometragem. Por outro lado, o finlandês pode estar ‘enferrujado’ por ter ficado um ano sem correr e demorar alguns GPs para engrenar, como aconteceu com Hulkenberg ano passado. De qualquer maneira, estreia por uma equipe que já conhece e que vem em evolução.

Max Chilton
21 de abril de 1991, Reigate, Inglaterra
Estreia em 2013
Por que Chilton: por enquanto, mais pelo dinheiro do que por resultados
Credenciais: mostrou evolução na terceira temporada de GP2, em que foi quarto colocado.

O terceiro estreante é Max Chilton, que luta contra o estigma de pagante. O britânico é filho de um empresário milionário do setor de gerenciamento de riscos e dono da equipe Carlin, que fechou parceria com a Marussia na GP2 em 2012. Em seu terceiro ano na categoria de acesso à F-1, Chilton foi quarto no campeonato e venceu duas provas. No entanto, sua carreira até aqui indica que está alguns passos abaixo de seus colegas estreantes de 2013.

Guiedo van der Garde
25 de abril de 1985, Rhenen, Holanda
Estreia em 2013
Por que Van der Garde: apesar de estreante, é rodado na F-1
Credenciais: campeão da World Series de 2008 e top 10 na GP2 de 2009 para cá

Parecia que Van der Garde seria a eterna promessa que nunca chegaria ao posto de titular na F-1. Afinal, desde 2007 figurava como piloto de testes aqui e ali, mas seus resultados na GP2, onde estava desde 2009, não convenciam o suficiente. Pilotando pela Caterham também na categoria de acesso, o holandês participou de seis sessões de treinos livres na F-1 em 2012. Patrocinado pela marca de roupas McGregor, trata-se de um piloto consideravelmente rodado para um estreante, que o time conhece e lhe é rentável.

Com Van der Garde e Pic, a Caterham, a exemplo da Marussia, desistiu do modelo de ter um pagante e um assalariado mais experiente, o que ceifou as vagas de Kovalainen e Glock. De fato, pode-se dizer que a estratégia não rendeu frutos muitos visíveis após três anos e nenhum ponto para ambos os times. Veremos o que o novo paradigma vai trazer.

As 5 melhores corridas da era Pirelli

É normal que corridas com reviravoltas, ora trazidas com a chuva, ora com oportunidades geradas pelo Safety Car, sejam emocionantes e inesquecíveis. Provas como em Abu Dhabi e Brasil em 2012 ou Canadá em 2011 estão certamente entre as mais movimentadas dos últimos 20 anos na F-1. Mas a grande valia da Pirelli nestas duas temporadas em que atendeu aos anseios de fornecer pneus menos duráveis foi trazer grandes disputas a GPs “normais”. Sem Safety Car ou água e quebrando a cabeça dos estrategistas, eis minha lista das cinco melhores provas da Pirelli nestes dois anos. Esqueci alguma?

1º GP do Canadá de 2012

Qual não deve ter sido a surpresa de Lewis Hamilton quando ouviu do engenheiro, tentando manter a fleuma britânica: “Continue forçando, acreditamos ser possível que eles não parem.” Era uma referência a Alonso e Vettel que, ao contrário do que esperava a McLaren, não haviam coberto o segundo pit do inglês. E Hamilton sentou a bota. Percebendo o erro, a Red Bull parou Vettel, mas era tarde demais, pois o alemão só escalou até a quarta posição. Alonso arriscou ir até o final e fechou em quinto. Enquanto isso, fazendo uma estratégia inversa em relação aos compostos usados pelos líderes, Perez e Grosjean escalaram o pelotão para terminar em segundo e terceiro.

2º GP de Mônaco de 2011

Costuma-se apontar as ultrapassagens como grande exemplo do tipo de emoção que a Pirelli ajudou a devolver à Fórmula 1. Porém, elas são resultado de algo ainda mais marcante: a abertura do leque de estratégias. E um grande exemplo disso foi o GP de Mônaco de 2011. Mesmo em um ano dominado por Sebastian Vettel, a Red Bull se colocou em posição de risco e, ajudada por uma bandeira vermelha providencial, acabou saindo vitoriosa nas ruas de Mônaco. Mas não dá para esquecer as emocionantes voltas em que Vettel, que se segurava com uma parada, Alonso, após duas trocas, e Button, voando na tática de três pit stops, andavam pelo sinuoso circuito como se fossem um só.

3º GP da China de 2012

Pilotos adotando estratégias diferentes, de três ou duas paradas, fizeram com que o GP da China chegasse ao seu final com boa parte do top 10 indefinida. Nada que tenha atrapalhado o vencedor Nico Rosberg, que dominou a prova, mas a mão de obra foi grande para pontuar. “Teve uma hora em que éramos oito na reta”, contava Button após chegar em segundo, em corrida na qual Felipe Massa e Kimi Raikkonen andaram entre os primeiros até sofrerem com o desgaste excessivo nas voltas finais. Enquanto isso, na mesma estratégia, Vettel pulou de 15º a 5º. Para se ter uma ideia, 12s7 separaram do terceiro ao décimo, após duelo incrível nas últimas voltas.

4º GP da China de 2011

Formula1 2011 Chinese Grand Prix Official Race…

Na terceira corrida da Pirelli após o retorno, Lewis Hamilton abriu definitivamente a porta para um tipo de estratégia que andava esquecido nos tempos de ultrapassagens difíceis: parar mais vezes que os adversários e confiar no ritmo mais rápido para batê-los. Apesar de muitas vezes as simulações apontarem que esse é o caminho mais rápido, é fundamental que o piloto se livre rapidamente do tráfego, como fez Hamilton em Xangai naquela tarde em que, por pouco, não largou por um vazamento. Tudo começou a funcionar no sábado, quando Lewis, percebendo que não brigaria pela pole, poupou um jogo de pneus macios. Vale lembrar que o inglês superou, na pista, Rosberg e Button que estavam na mesma estratégia que ele, além de Massa e Vettel, com pneus mais desgastados – sempre fora da zona de ultrapassagem. Prova de que a Pirelli é mais efetiva para tornar as corridas emocionantes do que qualquer outro aparato de regulamento complicado.

5º GP do Japão de 2011

F1 2011 Japanese Race Edit Official [HD]

Na frente, Vettel, Alonso e Button fizeram uma guerra estratégica vencida por quem conseguiu equilibrar melhor a economia de pneus x velocidade. Curiosamente, Vettel acabou selando seu bicampeonato mundial em uma das poucas provas em que não conseguiu impor a vantagem obtida na classificação. No final das contas, dois segundos separaram os três primeiros – e isso, sem a necessidade de chuva ou de Safety Car. Como se não bastasse, Hamilton, Webber e Massa travaram outra batalha à parte por grande parte da prova, mostrando que, naquela tarde japonesa, não havia muito entre Red Bull, McLaren e Ferrari. Só a tocada de cada um com os pneus.

Pirelli, ano 3

Se o início da temporada 2012 foi o mais competitivo da história, é bem verdade que dois conjuntos – Red Bull e McLaren – se destacaram do resto do pelotão na metade final do ano e colocaram ordem na casa. E muito desta trajetória do campeonato passado teve a ver com a dificuldade em fazer os pneus funcionarem.

O diretor esportivo da Pirelli, Paul Hembery, adiantou que não espera tanta dificuldade neste ano, mesmo que a empresa tenha alterado todos os compostos, tornando-os mais macios, mais rápidos, mais diferentes entre si e buscando provas com duas a três paradas. O britânico disse, ainda, que a tentativa de jogar mais pimenta por parte da fornecedora será adotando escolhas mais agressivas nos compostos levados a cada prova.

De fato, usar pneus ou macios demais para determinada pista, ou dois compostos com rendimento bastante diferente entre si são boas táticas para aproximar o grid. Isso porque cria estratégias alternativas desde a classificação, em que alguns pilotos podem optar por comprometer o sábado e buscar vantagem ao ter um jogo de pneus novos a mais no domingo. Nas últimas corridas de 2012, como havia um composto obviamente superior e durável, esse tipo tipo de tática, que possibilitou, por exemplo, dois pódios de Sergio Perez, se perdeu.

Mas a lógica diz que não há nada que a Pirelli possa fazer para gerar um nível de incerteza como o do início de 2012. Afinal, além dos pneus, os times grandes estavam tentando se entender com o comportamento do carro após a adoção de regras que limitaram bastante a ação do escapamento soprado no difusor. E, à medida que conseguiram reproduzir ao máximo o efeito que fez da Red Bull de 2011 imbatível, automaticamente as corridas se tornaram mais previsíveis.

Ainda assim, até no final do ano a performance relativa dos carros mudava dependendo da interação carro/circuito. E os pneus têm a ver com isso. O grande problema com os Pirelli é fazer os pneus dianteiros funcionarem, aquecendo-os de dentro para fora. Para piorar, os traseiros entram na temperatura adequada rapidamente, a dificuldade é encontrar o equilíbrio. O que normalmente acontece é que, com os pneus frios, a tendência é o carro sair de frente e, se esse comportamento se mantiver assim, apenas a superfície do pneu vai se aquecer e ele se degradará rapidamente. Por isso, vemos os pilotos freando tão fortemente antes das largadas, para tentar fazer com que uma altíssima temperatura do freio aqueça o pneu dianteiro por dentro.

Para 2012, como a Pirelli aumentou a aderência, os problemas de aquecimento devem ser minimizados. Outra mudança é que, com o fortalecimento da lateral do pneu, a desvantagem de frear e virar ao mesmo tempo deve ser menor, o que combina mais com o estilo de alguns pilotos. Por outro lado, espera-se mais degradação termal, ou seja, desgaste por excesso de temperatura. Na busca do meio termo entre performance e loteria, pelo menos no papel, parece um bom caminho.

Quatro vagas e uma chance de ouro

A experiência não anda muito popular no fundão

Enquanto a maioria se preocupa em montar o cronograma para os testes coletivos, três equipes ainda não definiram a dupla de pilotos para 2013. O motivo da demora, claro, é a eterna busca pela combinação do melhor piloto com o maior apoio financeiro possíveis. E essa definição ganha ainda mais importância quando se está perto de uma grande revolução técnica que, ao mesmo tempo em que representa uma grande chance para as equipes médias e pequenas darem um salto de produção e valoriza os pilotos mais experientes, gera a necessidade de investimento extra.

Não por acaso, as três equipes em situação financeira mais complicada seguem indefinidas. Caterham e, especialmente, Marussia, são as duas que menos recebem dinheiro do bolo que os times dividem da venda dos direitos comerciais da categoria. E a Force India basicamente serve como outdoor ambulante das empresas de seu dono, Vijay Mallya – e os negócios, principalmente da Kingfisher Airlines, que teve sua licença cassada, vão de mal a pior.

Mas isso não quer dizer que o piloto com a maior mala de dinheiro levará a vaga. Como uma posição a mais no mundial de construtores pode render de 3,4 a 17,6 milhões de dólares (a complicada conta da divisão foi explicada neste post) é importante que o recruta não seja um zero à esquerda. Ainda mais em um ano em que os gastos serão maiores no desenvolvimento de um novo projeto para 2014 – sem contar nos novos motores, que devem custar consideravelmente mais do que os cerca de 12 milhões de dólares atuais.

Isso faz com que a decisão sobre a dupla de pilotos dos times médios e pequenos seja ainda mais delicada, como explica Cyril Abiteboul, chefe da Caterham, que só fechou com o pagante e jovem Charles Pic até o momento:

“Uma opção é alguém com quem Pic possa aprender e usar como base para o que queremos de ambos os pilotos. Outra opção, mais radical, é aceitar o fato de que 2013 é um ano de transição em que continuaremos a construir a equipe antes de um período de maior estabilidade em 2014, quando muitas coisas no pacote mudarão.”

Com a dispensa de Glock, parece que a Marussia optou por esse radicalismo. Se desistiu da continuidade de um piloto experiente – e assalariado – provavelmente será para lucrar com ambas as vagas. Há, no mercado, pilotos endinheirados e com certa experiência, de Bruno Senna a Adrian Sutil, passando por Vitaly Petrov, que podem cair como uma luva nesse tipo de situação. Mas e o medo de não obter os resultados que o carro permite e, com isso, perder dinheiro vindo dos construtores?

A opção mais segura seria ter um piloto com bastante experiência e outro com certo talento e bolso cheio, como já discutimos aqui. Por outro lado, o exemplo recente da Williams, que engrenou basicamente com o bom direcionamento do dinheiro vindo de pagantes, é tentador. E a saída, não apenas de Glock, como de Kovalainen e Kobayashi, outros exemplos de pilotos assalariados, comprova isso.

É muito difícil que alguém repita o exemplo da Red Bull na última grande mudança de regras, em 2009, e passe de média a dominadora, até por não haver no pelotão estrutura e investimento semelhantes. Mas é preciso pensar bem no passo final antes da chance de ouro de tirar o pé da lama que as médias terão em 2014.

O fator Kimi e as apostas da Lotus

É fácil levantar agora a plaquinha do “eu já sabia”. Difícil era saber o que esperar de Kimi Raikkonen, dentro e fora das pistas, há pouco mais de um ano, quando a Lotus anunciou a contratação do finlandês. Em termos de pilotagem, o campeão de 2007 não vinha sendo nos últimos anos de Ferrari nem sombra do piloto que mereceu muito mais do que ganhou na McLaren e ainda por cima passara dois anos longe dos monopostos. Em termos comerciais, Kimi sempre deixou claro que não se pode esperar dele a mais aberta e clássica das abordagens. Primeiramente, era necessário apostar em sua readaptação. E, ao invés de forçar Raikkonen a ser quem não é, lucrar justamente com sua imagem de anti-garoto-propaganda.

No final das contas, ficou claro que, para ambos os fatores, a Lotus não poderia ser um ambiente melhor para o retorno do Iceman. E, do lado do piloto, isso também foi uma aposta e tanto. A equipe parecia perdida após o acidente de Robert Kubica em 2011 e a aposta pelo escapamento frontal – outra decisão arriscada, por sinal – e poucos previam que eles encontrassem o caminho e mantivessem o ritmo do desenvolvimento.

Parte das dúvidas era relacionada ao dinheiro, pois sabia-se que a Genii havia se comprometido a um pagamento a longo prazo pelo espólio da Renault e contava com o apoio da Lotus Cars, empresa que, sob a batuta do ambicioso Dany Bahar, andava com mais projetos do que recursos em caixa. Em pouco tempo, o turco foi limado da empresa malaia e a Lotus parou de investir na equipe. Em um acordo comercialmente bom para ambas as partes, o nome ficou.

O resumo da obra é que, se a abordagem mais conservadora no campo técnico em 2012 deu resultados na pista e o risco com Raikkonen acabou saindo melhor que a encomenda, as apostas comerciais ainda engatinham. A equipe sofre sérios problemas financeiros e, especula-se que deva perto de 80 milhões de euros. Não coincidentemente, surgem boatos de uma possível venda, ainda que faça sentido a posição oficial da Genii de que deseja apenas se desfazer de parte das ações.

Afinal, se Raikkonen demonstrou seu valor dentro da pista, também provou ser uma peça útil em termos comerciais. A postura da Lotus, ao deixar o finlandês à vontade, acabou provando ser a mais acertada tanto para gerar marketing positivo, quanto para fazê-lo render na pista logo de cara e se encaixou na imagem jovial que o ex-time de Flavio Briatore sempre cultivou. Kimi já chegou junto de patrocinadores menores no início de 2012, mas a intenção da equipe, a longo prazo, é usá-lo para atrair marcas mais despojadas, como a do energético Burn, da Coca-Cola. Faz bem mais sentido do que ver Kimi posando com roupas Hugo Boss.

Resta a corda não estourar antes que a estratégia der resultado também financeiro para não comprometer os investimentos no carro. Olhando neste início de 2013, parece uma façanha, mas, em se tratando do que se mostrou ser uma poderosa parceria, é melhor não duvidar de Raikkonen e da Lotus.

Chegou a hora da Mercedes?

A briga pelo título pode estar longe de ser uma meta, mas ninguém promete gerar tanto interesse neste início de ano quanto Lewis Hamilton e sua Mercedes. São várias as incertezas que cercam a equipe alemã. São várias, também, as explicações para os insucessos nestes três anos. O que resta saber é o quanto dos erros anteriores o time conseguirá reparar – e em quanto tempo.

A contratação de Hamilton tem toda pinta de obra arquitetada por Ecclestone para agradar a chefia da montadora alemã, cansada de colocar dinheiro em algo que não dá resultado. E a chegada do inglês não representa apenas uma resposta do comprometimento esportivo da equipe para a empresa: trata-se do piloto mais identificado com a cultura norte-americana do grid e com todo interesse do mundo em se promover na terra da namorada famosa e dos amigos rappers. Tudo alinhado com uma montadora que viu, em 2012, o aumento de 11,8% nas vendas nos EUA ser a grande alavanca para um de seus maiores lucros da história, mesmo com a sensível queda na própria Alemanha (-0,4%) e em boa parte da Europa ocidental.

A questão do investimento x retorno é particularmente importante no caso da Mercedes porque quando a Brawn foi comprada, a expectativa era de que o investimento não seria tão alto, uma vez que Norbert Haug e companhia acreditavam que o acordo para restrição de gastos (o RRA, em inglês) seria mais do que um trato entre cavalheiros, obrigando Ferrari, McLaren e Red Bull a enxugarem suas estruturas. Para entender a importância disso no caso da Mercedes temos de lembrar que a Brawn, em seu único ano de existência, usou um carro concebido com o orçamento gigantesco da Honda, mas teve de reduzir drasticamente seus gastos após a derrocada dos japoneses. O preço desta estagnação técnica, somada à falta de efetividade do RRA, é pago até hoje.

Um exemplo disso é o túnel de vento, que apenas ano passado foi atualizado para um modelo com escala de 60%, o máximo permitido pelo regulamento. Esta, inclusive, foi uma das justificativas para a péssima campanha do segundo semestre de 2012. De fato, o desenvolvimento do W03 pareceu estagnado após um início promissor – nas primeiras 10 provas, a posição média de classificação do melhor Mercedes foi 3,8, despencando para 9,2 na segunda parte do campeonato.

Outro problema foi a insistência em trabalhar com o DRS passivo em detrimento do melhor aproveitamento dos gases do escapamento. Ainda que a adoção de um sistema mais eficiente para o direcionamento dos gases para o difusor possa fazer o W04 ganhar muito terreno, a equipe continuará atrás das rivais diretas nesse quesito. Quem vai resolver essa questão do foco dos recursos também não é claro em uma equipe que contratou Bob Bell, Geoff Willis, Aldo Costa e Mark Elliot nos últimos anos.

Na teoria, ter um astro como Hamilton pode atrair investimentos e colocar os problemas estruturais no passado. Mas será que só isso reduziria a ampla distância para Red Bull e companhia? Será que a chegada do polêmico – e pouco efetivo nos tempos de Jaguar – Niki Lauda para fazer a ponte política entre a fábrica na Inglaterra e os acionistas alemães não trará mais um cacique em terra de pouco índio? E o próprio Hamilton, finalmente vai assumir o papel de líder no desenvolvimento de uma equipe ou continuará sob as asas dos engenheiros como nos tempos da McLaren?

Com a casa em seu quarto ano de reorganização, é de se esperar uma melhora considerável em relação ao fim de 2012. Porém, seria surpreendente ver a Mercedes como candidata costumeira às vitórias. O mais provável é que, lá pelo meio do ano, ouviremos Ross Brawn salientar as vantagens de focar no projeto de 2014. E esperar que a mudança considerável nas regras seja o empurrão que faltava para uma nova Brawn florescer.

Button tem faca e o queijo na mão na McLaren

A Red Bull tem Vettel, a Ferrari tem Alonso, a Lotus tem Raikkonen, a Mercedes tem Hamilton e a McLaren… Jenson Button. Ninguém o coloca no mesmo nível dos demais em condições iguais, mas o inglês já demonstrou que, quando tem o carro na mão, é capaz de bater todos eles. E é por isso que anda cheio de confiança antes de sua primeira temporada como líder em Woking.

Desde setembro, tanto ele, quanto a equipe, sabem quais serão os pilotos de 2013. Tempo suficiente para que o inglês tenha sido bastante ouvido em seus pitacos. É verdade que Button não pede nada demais: sua pilotagem funciona apenas com um carro absolutamente neutro, algo que, por sinal, não desagradaria em nada Sergio Perez que, quanto menos correções tiver de fazer com o volante, mais pode mostrar de seus encantos com os pneus. Nos três anos com Hamilton, a necessidade de neutralidade também existia, mas se o desenvolvimento levasse o carro a ficar mais nervoso, Lewis conseguia se virar. Agora, o foco da equipe é único.

Outra grande notícia para Button é que o problema de aquecimento de pneus – a McLaren demorou muito para compreender como lidar com os compostos de 2012 da Pirelli, com temperaturas ótimas de operação diferentes para traseira e dianteira – foi contornado no final do ano passado. Isso foi particularmente prejudicial para suas classificações e o levou a algumas corridas abaixo da crítica, como no Bahrein e no Canadá. Após uma mudança na direção do acerto e novidades introduzidas no carro para corrigir o problema, o inglês pulou de classificar-se em 16º na Inglaterra a lutar pela vitória duas semanas depois, na Alemanha.

É por essas e outras que fica difícil prever o que pode acontecer com Button agora que conseguiu, digamos, ganhar a equipe para si e tirar aquele que possivelmente é o piloto mais rápido em uma volta lançada do caminho. Ao mesmo tempo em que, com o carro na mão, pode ser imbatível, um upgrade que altere o comportamento do carro pode colocar tudo a perder. Também é questionada sua capacidade de encontrar soluções para seus corriqueiros problemas de acerto.

Politicamente, o piloto de 33 anos, que deu suas escorregadas no passado, hoje se mostra preparado para encarnar o papel de líder. E ele não se cansa de repetir isso, relembrando Perez por meio da mídia de sua inexperiência e da diferença de estar em uma equipe grande. A dinâmica entre os dois, inclusive, promete ser um dos temas espinhosos da temporada.

Fica claro que este momento, em que tem a equipe para si e o companheiro ainda em desenvolvimento, é decisivo na carreira do campeão de 2009. Ainda mais correndo pela equipe que atravessa seu melhor momento técnico desde o título de 2008: a McLaren foi quem mais vezes largou na pole em 2012 e só não venceu sete das últimas 10 etapas do ano por quebras. Além dos apagões com os pneus, são elas que Button quer ver longe nesta temporada para mostrar que merece este posto tão privilegiado.

Concorrência para os pagantes

O Brasil tem a chance real de começar a temporada 2013 com apenas um piloto no grid da Fórmula 1. Nenhuma novidade para um país em que as categorias de base de monopostos não conseguem sobreviver. Porém, a F-1 está recheada de exemplos de pilotos na mesma situação, mas ajudados pela iniciativa privada. Afinal, com o apoio financeiro, é possível ir até onde pode-se ganhar experiência.

O exemplo mais próximo de um Perez, um Maldonado ou mesmo um Bottas por aqui é Felipe Nasr, que vai para seu segundo ano de GP2 vindo de títulos na Alemanha e na contando com o contínuo apoio de empresas brasileiras, especialmente o Banco do Brasil.

Nasr, que saiu do Brasil aos 16 anos direto do kart, espera ter como grande rival pelo título um inglês fruto de uma interessante fábrica de jovens talentos. James Calado é um dos filhos pródigos do Racing Steps Foundation, entidade que, desde 2007, busca jovens talentos no automobilismo e no motociclismo no Reino Unido.

A fundação, privada e sem fins lucrativos, é mantida por um empresário do ramo de commodities, Graham Sharp, fanático por automobilismo e conhecido por suas obras de caridade. John Surtees, único campeão mundial das motos e da F-1, é o embaixador e olheiro. A seriedade da empreitada atraiu o apoio de equipes de tradição das categorias de base, como a Carlin e a ART, garantindo que os pilotos escolhidos tenham boa estrutura para se desenvolver. Outra preocupação é com a formação escolar dos meninos, uma vez que a Racing Steps trabalha com promessas desde o kart.

Para 2013, por enquanto foram anunciados quatro pilotos. Além de Calado, que faz seu segundo ano na GP2, o campeão da F-3 International, Jack Harvey, vai para a GP3. Campeão da Formula Renault NEC e vencedor do prêmio McLaren Autosport BRDC, Jake Dennis subirá para a Eurocup Formula Renault 2.0. Já John McPhee estará na Moto3.

O primeiro “graduado” da iniciativa, criada em 2007, é Oliver Turvey, hoje piloto de testes da McLaren. Mas tudo indica que Calado, estreante do ano na GP2 ano passado, será o primeiro grande fruto do Racing Steps. Curiosamente, o inglês foi vice campeão de dois pilotos que hoje estão na F-1 (de Vergne na F-3 Britânica em 2010 e de Bottas na GP3 em 2011). Em ambas as categorias, fez apenas um ano antes de seguir adiante e agora terá, na GP2, um teste com as vantagens e pressões de ser badalado como candidato ao título em sua segunda temporada.

Trata-se de uma história semelhante à de Lewis Hamilton que, se dependesse apenas do paitrocínio mesmo nos tempos de kart, estaria hoje no sofá de casa. Calado é outro menino de família humilde para os padrões britânicos e, sem o Racing Steps, muito provavelmente seria limado do automobilismo mesmo antes que pudesse mostrar serviço. A diferença em relação aos tempos de Hamilton é que a gastança de empresas ligadas à F-1, com exceção da Red Bull, com programas de desenvolvimento é coisa do passado, diminuindo a possibilidade de jovens que não tenham apoio de grandes empresas de seus países.

É nessa lacuna que o Racing Steps entra: ao invés de concorrer na “compra” de vagas, o programa busca preparar os pilotos para que eles gerem interesse de boas equipes e, assim, possam mostrar serviço para ir adiante. É a prova, que poderia muito bem ser copiada por aqui para que o exemplo de Nasr não fosse único, de que não é só de caminhões de dinheiro que se vive no automobilismo.

A era dos simuladores – parte 2

No post de ontem, expliquei a complexidade dos simuladores usados na F-1 e como eles não podem ser comparados aos jogos de videogame, mesmo com toda a tecnologia presente nos modelos atuais. Porém, a Nissan vem promovendo campeonatos virtuais que fazem de gamers pilotos de verdade. E, no que era inicialmente uma experiência mais voltada ao marketing, acabou encontrando o que parece ser um modelo de piloto do futuro.

Jann Mardenborough é o mais promissor dos vencedores do GT Academy e levanta a questão do quão preparados estão os viciados em jogos online para disputar uma categoria automobilística de “carne e osso”. O galês de 21 anos terá sua primeira experiência em um campeonato de monopostos neste ano, na Nova Zelândia, após ser vice-campeão britânico de GT3.

Mas seria possível tornar-se um piloto treinando no simulador? Tecnicamente, o problema seria a falta de noção de velocidade e a consequente sensação de compressão corporal, ou seja, o lado físico da pilotagem. “O simulador é ótimo, muito realista, mas não temos a força G”, explica Lewis Hamilton. “Contudo, todos os pilotos aprendem circuitos muito rapidamente porque fazemos isso desde a infância.”

Mas, além dos traçados, o que dá para aprender? Noção de espaço, de freada, correções de volante e todos os itens que compõem o chamado racecraft, ou seja, a habilidade de gerir uma corrida contra outros competidores, são fatores ensinados pelos jogos mais realistas, como o Gran Turismo, por exemplo, que levou Mardenborough ao programa da Nissan.

Por outro lado, a lógica diz que a tradução direta entre simulação e realidade por ser mais complicada. Como serão as reações do piloto virtual quando vir o risco de perto e não puder apertar “restart”? E a sensibilidade da interação entre asfalto e pneus, a sensação de aderência, que ainda não consegue ser totalmente reproduzida?

Isso nos leva a outra questão: o quanto de um piloto é talento nato e o quanto é treinado nas categorias de base? Não seriam todas essas questões da sensibilidade, da adaptabilidade e da superioridade em relação ao perigo algo que nasce com aqueles escolhidos? Ao menos no caso mais famoso de Mardenborough, trata-se de um jovem com quatro anos de experiência no kart na infância, que teve de abandonar o esporte por falta de dinheiro. Portanto, não é 100% gamer e já era visto como um grande talento na infância.

Há Lucas Ordoñez, espanhol que fez boa transição do GT as corridas de verdade, sem passagens anteriores por outras categorias. Mas não chegou tão pronto quanto o britânico. Ainda assim, são exemplos que abrem uma possibilidade interessante: dar a chance no automobilismo a quem não tem dinheiro para disputar categorias de base.

Um grande piloto é aquele que se adapta mais facilmente às diferentes condições e, por que não, transitar com tranquilidade do virtual ao real pode ser uma grande demonstração disso. Só fica difícil imaginar a possibilidade de queimar todas as etapas até chegar na F-1, pois, quanto mais rápidos os “brinquedos reais”, maior a ação justamente das forças que não estão presentes na simulação – e não há treino melhor para lidar com isso do que sentar no carro. Mas, para quem nasceu com jeito para a coisa, mais iniciativas como a da Nissan podem ser o empurrão que faltava na conta bancária para pular alguns anos de preparação na pista e tornar realidade o sonho de se tornar piloto.

A era dos simuladores – parte 1

Foi a preocupação com os gastos dos testes de pista que deu o empurrão que faltava à era dos simuladores na Fórmula 1. Hoje, é tão preciso o trabalho feito fora dos circuitos que a margem de erro do acerto do carro, de asas ao mapeamento de motor, é menor que 1%, mesmo antes de entrar na pista.

Isso é algo que deve ficar claro quando falamos em simuladores na F-1: eles nada têm a ver com joguinhos de videogame e não servem para treinar os pilotos – no máximo, ajudam a relembrar os traçados. “Se o jogo fosse 100% real, seria tão difícil que quase ninguém conseguiria sair do lugar”, explicou Bruno Senna, que teve de se preparar via Playstation para o GP dos Estados Unidos de 2012.

Para se ter uma ideia da precisão, as equipes chegaram ao Texas sabendo detalhes como o consumo de combustível por volta, velocidades e marchas em cada curva e até qual o tipo de configuração aerodinâmica mais adequado. Isso, em uma pista em que apenas havia sido feita uma apresentação, com a Lotus.

Os dados da pista são coletados com antecedência. “Quando vamos para um circuito novo, por meio de fotos de satélite e plantas fazemos um modelo do circuito e cada equipe tem o seu programa de simulação que é capaz de reproduzir exatamente a volta de um piloto”, explica o engenheiro brasileiro Ricardo Penteado, chefe de motores da Renault na equipe Lotus. “Há um catálogo gigantesco com todas as peças do carro. Você monta o seu carro nesse programa de simulação e cada peça do carro está modelizada, então você sabe qual é a influência de cada peça no conjunto final do carro. Quando você lança isso no simulador, ele analisa qual o máximo de aderência, qual o máximo de torque de motor que ele vai poder passar para a roda – o que vai resultar na posição do pedal do piloto.”

Assim, os pilotos não usam os simuladores apenas para aprender o traçado, mas também trabalham com um acerto bastante semelhante ao que usarão na pista. Porém, eles mesmos reconhecem que a tecnologia não dá conta de tudo. “Quando chegamos, buscamos saber qual o nível de aderência que teremos e observamos como são as zebras”, revelou Felipe Massa.

Nesse contexto, dá para interpretar as recentes declarações de Kimi Raikkonen, para quem o novo simulador da Lotus não fará muita diferença, como o padrão Kimi de não cultivar expectativas. Porém, se o finlandês, cuja capacidade de aprender pistas novas é particularmente impressionante, não se animar em ir a Enstone dar umas voltas para acertar o carro e prever o comportamento com peças novas, o piloto de testes o fará. E certamente a equipe ganha com isso. Sempre haverá aqueles que se sentem mais confortáveis testando o máximo possível – como Fernando Alonso, que deu 300 voltas na pista texana antes de pisar em Austin – e aqueles que preferem descansar para chegar às provas com baterias recarregadas. Questão de estilo. Mas podem ter certeza que o simulador não ficou parado.

Mas seria possível tornar-se um piloto treinando apenas no simulador? Esse assunto fica para amanhã.

Bernie e a sucessão

Nem a idade avançada parece arrefecer o incrível gosto de Bernie Ecclestone por tirar vantagem em seus negócios. O homem que, desde os anos 1970, parece sempre estar um passo adiante dos demais dirigentes da F-1, não dá sinais de que queira largar o osso, mesmo aos 82 anos – não acredito em prisão pelo caso Gribkowsky, sendo uma gorda multa mais adequada para um réu que não terá muito tempo de cumprir a pena; porém, ainda não se sabe qual a atitude que a empresa da qual é CEO, a CVC, agirá caso seja considerado culpado.

Se Ecclestone não demonstra vontade de estar de saída, é bem verdade que a recíproca é verdadeira. Para entender seu papel no circo, é preciso remontar a seu passado. O menino que, na época da Segunda Guerra Mundial, trocava o lanche dado na escola por mercadoria, foi um piloto frustrado, um empresário de piloto marcado por perdas trágicas, mas nunca escondeu que sentia prazer mesmo em fazer o melhor negócio possível para si. E encontrou na F-1 amadora de 40 anos atrás, cheia de apaixonados mais por carros do que por dinheiro, um palco fácil para desfilar seus dotes.

Achava que as equipes ganhavam pouco dos organizadores de provas e propôs cuidar disso em nome dos chefes de equipe, que não eram muito afeitos ao mundo dos negócios. Fez o mesmo com toda a questão logística, percebendo que seria possível economizar caso todos transportassem carros e equipamentos juntos. Fez o mesmo com os direitos televisivos. Fez o mesmo com a parte promocional. Não é exagero dizer que a F-1 partiu de uma brincadeira de entusiastas ao evento milionário, com números comparáveis a Jogos Olímpicos e Copas do Mundo de Futebol, muito devido a ele.

O que foi uma grande solução nos últimos 30 a 40 anos, hoje é um grande problema. Ecclestone é um centralizador, cuida pessoalmente dos negócios capitais da categoria, nunca apontou um sucessor. Por outro lado, as equipes demonstraram – como já haviam feito nos anos 1980 – que não conseguem sequer entrar em acordo entre si com o racha da FOTA ao final do ano passado, a saída de Red Bull, Ferrari e suas “crias”. E, entre seus chefes, ninguém desponta como um líder nato para ocupar esse papel.

Se o substituto de Ecclestone não parece vir do mundo da F-1, o mais provável é que a categoria fique nas mãos de alguém ligado ao mundo dos negócios com certa vivência em automobilismo, como o ex-piloto e atualmente CEO de uma empresa de marketing do setor Zak Brown, por exemplo. Ou, ligado ao marketing esportivo, como o CEO da Premier League Richard Scudamore. Assim, seria de se esperar o mesmo estilo empreendedor e pouco afeito a valores históricos que marca a era Ecclestone.

Mas que ninguém duvide que Bernie já tem tudo arquitetado, como quando dava lances propositalmente baixos para comprar lojas inteiras de carros usados na Londres do pós-guerra, impressionando o vendedor, que nunca havia somado o valor dos carros. Há muito tempo o mundo da F-1 já aprendeu que subestimar o baixinho é o pior dos negócios.

Quem levou a melhor?

A temporada 2012 marcou o fim de um cenário dos mais incomuns: os quatro times de ponta com as mesmas duplas de pilotos por três anos consecutivos. E, com um universo de 58 corridas, trata-se de um momento oportuno para tentar desvendar quem se deu melhor em cima do colega de box.

Na leitura dos números, aproveito para lembrar que os placares de classificação não consideram eventuais punições e os de corrida contabilizam apenas provas completadas por ambos os pilotos. O nome antes de cada placar indica quem levou a melhor. Aproveitei para destacar alguns números que me chamaram a atenção.

Vettel x Webber

2010 2011 2012
Classificação VET 12 x 7 VET 16 x 3 VET 11 x 9
Corrida VET 10 x 5 VET 15 x 2 VET 11 x 6
Vitórias VET 5 x 4 VET 11 x 1 VET 5 x 2
Poles VET 10 x 5 VET 15 x 3 VET 6 x 2
Pontos VET 256 x 242 (51%) VET 392 x 258 (60%) VET 281 x 179 (61%)

Se o duelo aparentemente apertado de 2010 teve muito a ver com os mais de 60 pontos perdidos por Vettel devido a quebras, a lavada de 2011 também foge à regra – lembrando que a dupla da Red Bull entra no quinto ano de parceria em 2013.

Os dados do ano passado, porém, mostram algo interessante: tanto Vettel, quanto Webber, são conhecidos por classificar muito bem, certo? A diferença a favor do alemão é justamente que ele não é só isso. Enquanto más largadas e ritmo inconsistente marcam a carreira de Webber, Vettel vai caminhando para se tornar um piloto completo. Assim, mesmo em seu “pior” ano em termos de classificação, conseguiu a maior margem percentual em pontuação em relação ao companheiro neste ano. Maior, até, que no passeio de 2011.

Hamilton x Button

2010 2011 2012
Classificação HAM 14 x 5 HAM 13 x 6 HAM 17 x 3
Corrida HAM 9 x 3 7 x 7 HAM 9 x 4
Vitórias HAM 3 x 2 3 x 3 HAM 4 x 3
Poles HAM 1 x 0 HAM 1 x 0 HAM 7 x 1
Pontos HAM 240 x 214 (52%) BUT 270 x 227 (54%) HAM 190 x 188 (50%)

Era de se esperar que o único duelo que colocou dois campeões do mundo frente a frente nestes três anos fosse o mais equilibrado. Porém, a balança só pendeu para Button em 2011, ano marcado por diversos erros de Hamilton. Muito da superioridade de Lewis tem a ver com as classificações, nas quais foi bastante superior ao companheiro.

Por outro lado, é curioso observar que, embora tenha ampla vantagem em posições de chegada em 2010 e 2012, Hamilton não consegue transformar isso em pontos, fazendo com que, no total dos três anos, Button o supere nesse quesito. Tudo bem que as quebras de 2012 quando estava na liderança pesaram contra nesta temporada, mas não é uma tendência que vem de hoje. Será que ter ficado com o “come queito” Button como líder após a saída do virtuoso Hamilton não foi um negócio tão ruim para a McLaren?

Alonso x Massa

2010 2011 2012
Classificação ALO 15 x 4 ALO 15 x 4 ALO 17 x 3
Corrida ALO 13 x 3 ALO 13 x 2 ALO 17 x 0
Vitórias ALO 5 x 0 ALO 1 x 0 ALO 3 x 0
Poles ALO 2 x 0 ALO 0 x 0 ALO 2 x 0
Pontos ALO 252 x 144 (63%) ALO 257 x 118 (68%) ALO 278 x 122 (69%)

Em classificação, Massa não tem um desempenho tão aquém em relação a Alonso comparando os números de Button contra Hamilton, mas o abismo entre as performances dos dois é bem maior porque o brasileiro não consegue recuperar o terreno perdido em corridas, nas quais o companheiro é especialista.

A impressão é de que, quando está seguro com o carro, Massa consegue andar pelo menos no ritmo de Alonso; o problema é que a grande característica do espanhol é sua consistência, ou seja, quando o brasileiro não está em um bom final de semana, o prejuízo é grande. Causa ou consequência, é difícil culpar a Ferrari pelos claros jogos de equipe, que afetam alguns comparativos em corrida e na pontuação: eles sabem com quem, dia sim, dia também, podem contar.

Schumacher x Rosberg

2010 2011 2012
Classificação ROS 14 x 5 ROS 16 x 3 10 x 10
Corrida ROS 12 x 2 ROS 7 x 6 MSC 7 x 3
Vitórias 0 x 0 0 x 0 ROS 1 x 0
Poles 0 x 0 0 x 0 ROS 1 x 0
Pontos ROS 142 x 72 (66%) ROS 89 x 76 (53%) ROS 93 x 49 (65%)

Ainda que muita gente esperasse um Michael Schumacher, no mínimo, mais competitivo nestes três anos de sua volta, ao menos dá para dizer que o alemão não ficou estacionado na mediocridade no período em que foi companheiro de Nico Rosberg. As performances relativas do heptacampeão frente ao compatriota foram melhorando a cada ano, com destaque para os resultados em corrida nesta temporada. A pontuação só não reflete isso porque todas as cinco falhas mecânicas da Mercedes no ano ocorreram no carro de Schumacher.

É difícil saber o que era de se esperar de Schumacher voltando em uma equipe bem menos estruturada do que a Ferrari em seus dias de glória, com novas regras que mudaram a cara da competição, mais velho e após três anos parado. Tão difícil quanto entender o calibre da competição que enfrentou com Rosberg, que terá contra Hamilton a partir de 2013 – e com a promessa de outros três anos de parceria – seu maior desafio da carreira.

Aquecendo os motores

Muita gente gosta desta história de resolução de ano novo mas, se a Fórmula 1 tivesse a sua, qual seria? É difícil imaginar em que a temporada 2013 possa ser melhor do que a do ano passado e seu sem-número de destaques, da alta qualidade de pilotagem especialmente de Vettel, Alonso, Raikkonen e Hamilton, passando pelo crescimento das equipes médias e a montanha-russa, por vezes inexplicável, de performances principalmente no início do ano.

Por um lado, como as regras permanecem basicamente estáveis, é de se esperar que o equilíbrio atual permaneça, permitindo que equipes que há anos estavam longe das primeiras posições possam lutar, no mínimo, por pódios. É claro que, ao longo da temporada, os melhores conjuntos – e dificilmente não serão os mesmos suspeitos de sempre, pela continuidade dos modelos anteriores – tendem a se sobressair.

Ainda assim, o pelotão da frente também traz suas incógnitas, com a McLaren e suas más execuções de finais de semana, a Ferrari e seus problemas aerodinâmicos, a Lotus buscando a consolidação do terreno ganho em 2012 e a Red Bull provando que os ajustes nas regras – principalmente em relação aos testes mais rigorosos para as asas e à restrição no uso da DRS – não tirarão a vantagem técnica cujas fundações foram firmadas ainda em 2009.

Mas, pelo menos neste início de temporada, ninguém promete chamar mais a atenção do que a Mercedes, que atraiu um dos melhores pilotos mesmo ainda devendo no quesito técnico. O quanto Hamilton poderá aportar ao time alemão é uma das grandes questões de 2013.

Tudo isso em meio a novos ajustes nos pneus, repetindo a receita que deu certo para tornar 2012 inesquecível: carros com desempenho próximo e variáveis difíceis de dominar, trazendo à tona o melhor de equipes e pilotos.

Falando neles, há expectativas para todos os lados. Perez estará sob os holofotes na McLaren, ao lado de um Button que busca provar ser um líder do mesmo nível das grandes estrelas dos rivais diretos. Hulkenberg é outro que ganhou moral em 2012 e busca seguir em ritmo ascendente rumo a um time grande. Há os que têm de se provar para garantir sua permanência, como Felipe Massa, Romain Grosjean ou Paul Di Resta e quem, como Alonso e Raikkonen, chegou muito perto da perfeição em 2012 e vive o desafio de manter o padrão.

São muitos os assuntos para tentarmos entender antes da hora da verdade em pouco mais de dois meses. Encerro o recomeço explicando o sumiço repentino: não tive muita chance de me programar antes da minha cirurgia para corrigir a miopia – marcada na correria e que, aliás, recomendo a todos os reféns de óculos e lentes de contato. Confesso que escrevo estas linhas com a visão ainda um pouco embaçada, mas pelo menos já dá para prometer um novo olhar para a temporada 2013!

Até breve

Tinha uma série de posts planejados para discutirmos sobre as lutas entre companheiros de equipe em 2012, entre outros. Porém, aproveitando os últimos dias em que vale, pelo regulamento deste ano, o termo “força maior”, me recorro a ele para justificar a ausência no blog por alguns dias.

Deixo vocês com uma poesia sobre nosso tema favorito.

http://www.youtube.com/watch?v=YxuY6zArsFY

Qual foi o carro mais rápido do ano em 2012?

Muitos torcem o nariz quando se diz que o carro da Ferrari não foi competitivo ao longo da temporada, mas difícil é achar um final de semana em que o F2012 tenha sido o melhor do grid. Talvez tenha chegado mais perto em Monza, quando Alonso teve seu único problema de confiabilidade do ano, na classificação.

A Ferrari começou lutando para entrar no Q3, para ser o quinto carro do grid. Após compreender os erros iniciais e conseguir usar suas ideias, principalmente na área do escapamento, originais, o carro se tornou competitivo entre junho e julho. Depois, o desenvolvimento lento fez com que o rendimento caísse novamente em relação principalmente a McLaren e Red Bull, mas também em comparação à Lotus.

Essa não seria a história de um carro que faz um campeão. Ainda assim, Alonso lutou pelo campeonato até o final. O mérito do espanhol foi saber aproveitar-se de uma característica importante do F2012: trabalhar os pneus de forma que eles permanecessem em sua zona de temperatura correta e, assim, colocou-se em posição de lucrar em um ano atípico, em que era comum ver até seis equipes com menos de 1% de variação de tempo de volta entre elas.

Outro ponto importante, que explica tanto o campeonato de Alonso, quanto do próprio Sebastian Vettel, que foi campeão tendo um carro mais rápido em termos de velocidade pura em 7 das 20 etapas (35%): a equipe mais veloz do ano, a McLaren, quebrou e errou muito, especialmente em pit stops, e jogou pontos que Alonso, Vettel e Raikkonen agradeceram.

Equipe % média de déficit para o carro mais rápido (2012)  % média de  déficit para o carro mais rápido (2011)  Variação
McLaren 0.18 0.5 -0.32
Red Bull 0.38 0.01 +0.37
Lotus 0.68 2.2 -1.52
Ferrari 0.75 0.83 -0.08
Mercedes 0.87 1.5 -0.63
Williams 0.96 2.76 -1.8
Sauber 1.15 2.75 -1.6
Force India 1.16 2.51 -1.35
Toro Rosso 1.82 3.06 -1.24
Caterham 3.49 5.18 -1.69
Marussia 4.83 6.85 -2.02
HRT 5.73 7.86 -2.13
Red Bull Ferrari McLaren Lotus
Vitórias 7 3 7 1
Pódios 14 15 13 10
Voltas mais rápidas 7 0 3 3
Poles 8 2 8 0
Primeiras filas 14 3 16 1

A McLaren também passou por um problema sério em meados da temporada, tendo dificuldade em fazer funcionar pneus cuja zona de temperatura era diferente na dianteira e na traseira. Mesmo depois que conseguiram colocar a traseira no chão, após os updates de Alemanha/Hungria, ainda tiveram quedas inexplicáveis de performance.

Também faltou explicação no início de ano da Red Bull, que sofreu com as restrições no sopro do escapamento no difusor. Vettel chegou a correr com as especificações da pré-temporada para tentar entender por que não conseguia andar nem no ritmo de Webber e o time começou a se encontrar com o grande update de Valência e, depois, com o passo gigante de Cingapura.

Essas constantes mudanças na relação de forças mostram o quão próximo esteve o grid neste ano, algo também provocado pelo crescimento das equipes médias, num ritmo superior às grandes. Afinal, as donas de orçamentos menores nunca tiveram escapamentos soprados tão desenvolvidos como as grandes e certamente sentiram menos sua falta.

Falando em médias, é curioso ver no gráfico como a Williams foi a melhor em termos de ritmo em comparação a Sauber e Force India. Porém, chegou atrás delas no campeonato, a exemplo do que ocorreu com a McLaren em relação a Red Bull e Ferrari na ponta.

Os gráficos, compilados no site F1Fanatic, têm como base a volta mais rápida de cada carro em cada final de semana. Tentei observar as tendências aos domingos por meio das voltas mais rápidas, mas, tendo em vista que a Ferrari ficou em média 0.913 longe da melhor volta numericamente – e sabemos que a realidade não é essa – fica claro que não se trata de um parâmetro válido.

Revolução de 2014 segue a pleno vapor

Bicos baixos e aerofólios menores voltarão em 2014

Há alguns meses, a declaração de Adrian Newey de que a aerodinâmica se tornaria muito menos importante na Fórmula 1 a partir das mudanças nas regras de 2014 fez muita gente sonhar com uma nova revolução como a que desbancou Ferrari e McLaren em 2009. Porém, uma decisão recente da FIA falava em “reverter as mudanças que seriam feitas na carenagem para diminuir o downforce e o arrasto para a especificação de 2012”. Estaria a entidade voltando atrás?

Parece que não. O projeto do motor V6 turbo, mesmo com as críticas de Ecclestone e Montezemolo, segue adiante, o que já provocará uma série de adaptações. E, falando especificamente da aerodinâmica, as novas regras continuariam mexendo em dois aspectos fundamentais hoje: O fluxo de ar na asa dianteira e (sempre eles!) os escapamentos.

A partir do momento em que a Brawn descobriu que era possível ganhar muito do que fora perdido em termos de pressão aerodinâmica com as regras de 2009 usando o ar que passava no difusor, todos os grandes carros passaram a tentar isso de alguma maneira. A Red Bull criou a engenhosa solução de usar os gases do escapamento para este papel, o que foi teoricamente proibido neste ano (por meio de novas regras para posicionamento dos escapes e mapeamento de motor), mas obtido, mesmo que em menor escala, com o efeito Coanda – que usa a curvatura da carenagem para direcionar o ar do escapamento para baixo, gerando pressão aerodinâmica.

Novas regulamentações, que afastam ainda mais a saída do escapamento da parte traseira do carro, farão com que seja impossível reproduzir o efeito Coanda em 2014, em mais uma tentativa de evitar ganho aerodinâmico nesta área. Será que agora a moda acaba de vez?

Nas asas dianteiras, a mudança mais clara será no fim da era dos bicos altos, por questões de segurança (devido ao risco em colisões frontais). Pela regra atual, a altura máxima do bico é de 550mm em relação ao assoalho, o que vai cair drasticamente para 185mm. Outra mudança será nas asas dianteiras, que vão perder 150mm. Isso fará com que elas terminem mais “para dentro” que os pneus, o que dificulta a condução do fluxo de ar. Ainda mais porque as end-plates, estruturas das extremidades das asas, serão restritas. Como a asa representa o primeiro contato com o ar, dá para entender por que qualquer mudança nesta área afeta todo o carro.

Quando a FIA fala em “retornar a 2012”, na verdade desiste apenas de uma nova revolução. A ideia inicial era aumentar ao máximo a eficiência desses carros, torná-los mais “verdes”, mas o projeto esbarrou, tanto nos custos, quanto nas simulações, que apontavam bólidos mais que 5s mais lentos que em 2010, superando o que fora estipulado como margem mínima pela entidade. Ainda assim, são medidas significativas, que deverão, junto dos novos motores, alterar a relação de forças entre as equipes.

Qual o piloto que mais ultrapassou em 2012?

Próximos até nisso: Vettel passou mais carros no geral; Alonso, dentro do top 10

Apesar de muito mais emoção na disputa pelo campeonato, temporada 2012 teve menos ultrapassagens do que a anterior, que detém o recorde absoluto desde 1982, quando dados confiáveis passaram a ser computados: foram 1135 manobras neste ano (média de 56,75), contra 1152 (60,63 em média) em 2011.

Em comparação com a realidade anterior, porém, os números são excepcionais. Primeira temporada com a volta das nanicas, que tinham praticamente sumido na época das montadoras, 2010 teve 547 (28,79 de média) ultrapassagens no total. Em 2009, foram 244 (14,35 por prova).

Confira os números das ultrapassagens por GP e por piloto em 2012:

Provas Ultrapassagens
Austrália 41
Malásia 76
China 90
Bahrein 72
Espanha 51
Mônaco 12
Canadá 47
Valência 79
Grã-Bretanha 48
Alemanha 64
Hungria 16
Bélgica 61
Itália 59
Cingapura 62
Japão 39
Coreia 33
Índia 31
Abu Dhabi 51
EUA 59
Brasil 144

Ultrapassagens por piloto

Piloto Ultrapassagens total Ultrapassagens Top 10
Vettel 74 43
Webber 74 37
Button 45 26
Hamilton 56 36
Alonso 45 45
Massa 65 32
Schumacher 63 22
Rosberg 52 25
Raikkonen 48 38
D’Ambrosio 2 0
Grosjean 58 27
Di Resta 48 16
Hulkenberg 53 19
Kobayashi 68 28
Perez 60 29
Ricciardo 61 13
Vergne 67 8
Maldonado 44 17
Senna 48 9
Kovalainen 44 1
Petrov 38 1
De la Rosa 6 0
Karthikeyan 1 0
Glock 12 2
Pic 14 1

Como no total de ultrapassagens, os dados do Clip the Apex não computam as posições ganhas na primeira volta, segue o saldo dos pilotos no ano:

Saldo de posições ganhas na primeira volta

Piloto Posições ganhas
Glock +47
Kovalainen +41
Karthikeyan +35
Alonso +30
Pic +28
De la Rosa +25
Hulkenberg +23
Massa +20
Vergne +17
Petrov +16
Raikkonen +14
Perez +14
Button +4
Hamilton +2
D’Ambrosio 0
Ricciardo -2
Maldonado -2
Rosberg -3
Senna -3
Schumacher -8
Di Resta -8
Vettel -14
Kobayashi -21
Webber -23
Grosjean -47

Há quem possa apontar a DRS ou os pneus Pirelli como artificialidades que mascaram estes números, mas fica a análise que a Mercedes fez ano passado como prova que a arte da ultrapassagem na F-1 é bem mais complexa do que isso.

O que fica claro é que os exemplos, principalmente de Valência e Abu Dhabi, pistas estigmatizadas como as rainhas do marasmo nas corridas e que foram palco de duas das melhores provas do ano, indicam que a nova safra de traçados, com suas longas retas + setor de curvas de baixa + setor de curvas de alta, casa bem com o atual regulamento. E também com as diretrizes atuais de beneficiar o show e tornar o esporte mais atrativo, ainda que isso comprometa de certa forma seus princípios.

Nada disso mudou a natureza da F-1: o melhor conjunto carro/piloto/equipe continua triunfando, os pilotos mais completos seguem se sobressaindo. A busca pelo show só dá ainda mais emoção a uma era de ouro em termos de pilotagem.

Decisão do título não chegaria ao Brasil com a pontuação antiga

Atendendo a pedidos, eis a pontuação final deste campeonato pelo sistema utilizado de 2003 a 2009, com 10, 8, 6, 5, 4, 3, 2, 1 pontos distribuídos do 1º ao 8º lugares. Numericamente, pouca coisa muda entre as duas formas, aumentando-se apenas a diferença entre a primeira e a segunda colocações, além do crescimento sensível entre o quarto e o terceiro lugares. Por isso, pilotos que venceram mais se destacam, assim como aqueles que foram para o pódio mais vezes que os rivais diretos.

Além disso, nono e décimo lugares não rendem pontos, algo que faz diferença principalmente para Senna e Ricciardo em relação à tabela oficial.

Vemos que, pela diferença no número de vitórias (5 a 3), Vettel ganharia o campeonato de forma bem mais folgada com o sistema antigo. A decisão, aliás, nem chegaria ao Brasil, pois o alemão teria 14 pontos de vantagem em relação a Alonso (112 a 98) antes da etapa final.

Piloto Antiga Atual
1º Vettel 115 281
2º Alonso 106 278
3º Raikkonen 82 207
4º Hamilton 84 190
5º Button 76 188
6º Webber 71 179
7º Massa 47 122
8º Grosjean 37 96
9º Rosberg 36 93
10º Perez 26 66
11º Hulkenberg 21 63
12º Kobayashi 15 60
13º Schumacher 17 49
14º Di Resta 15 46
15º Maldonado 16 45
16º Senna 8 31
17º Vergne 4 16
18º Ricciardo 0 10

Vale a pena correr por uma nanica?

Não é por acaso que a suposta vaga na Lotus – que provavelmente depende da venda ou não de ao menos parte da equipe – e o lugar na Force India andam tão concorridos: é difícil encontrar quem ganhou espaço após uma temporada na Caterham, Marussia e na finada HRT.

Nada menos que 15 pilotos atuaram pelas nanicas nos três anos de existência destas equipes que chegaram à F-1 com a promessa furada de um teto orçamentário. A lista é grande e tem, desde aqueles com bons resultados em categorias de base e que seriam candidatos naturais a qualquer vaga, até quem obviamente chegou com o dinheiro, passando por quem está na descendente da carreira.

Karun Chandhok, Bruno Senna, Sakon Yamamoto, Christian Klien, Narain Karthikeyan, Daniel Ricciardo, Vitantonio Liuzzi, Pedro de la Rosa, Timo Glock, Lucas Di Grassi, Jerome D’Ambrosio, Charles Pic, Heikki Kovalainen, Jarno Trulli e Vitaly Petrov. Deles, apenas Senna, por um caminho pouco ortodoxo (teve contratos fechados tardiamente, claramente influenciados em grande medida pelo dinheiro, além da sorte de ter se tornado titular em 2011 na hoje Lotus) e Ricciardo, que andou no cockpit da HRT “alugado” pela Red Bull e sempre soube que acabaria na Toro Rosso, saíram de uma nanica para a titularidade em um time melhor.

Por outro lado, pilotos de testes de equipes médias e com contratos bem amarrados para se tornarem titulares, como Nico Hulkenberg, Valtteri Bottas e Esteban Gutierrez, conseguiram vagas melhores.

Será que é melhor hoje ficar sem andar do que assinar com uma nanica? Perguntei isso a Luiz Razia, que descarta uma quinta temporada na GP2 após chegar muito perto do título em 2012, e ele acredita que não. Para o piloto, a falta de exemplos de nomes que ascenderam a equipes melhores vindos de das nanicas é, ou por falta de dinheiro, ou porque suas carreiras já estavam em uma descendente natural.

De fato, os únicos jovens dessa enorme lista eram Senna, Ricciardo e todos os que foram companheiros de Glock na hoje Marussia. E, entre eles, Pic foi o que mais se destacou em relação ao alemão e conseguiu uma pequena “promoção”, indo para a Caterham com o apoio da Renault.

Só é difícil ver o quanto o fato de simplesmente andar em uma nanica ajuda na questão financeira. Mesmo quem acompanha a categoria muitas vezes questiona a valia de termos estes times no grid. E me lembro de, em Interlagos, acompanhar a produção de uma matéria por parte de um grande veículo brasileiro sobre essas equipes e era curioso como os repórteres, acostumados a cobrir outros esportes, abordavam o tema. Um colega perguntou a Pic algo como “você não fica frustrado em não ter marcado nenhum ponto?”. O francês olhou com cara de interrogação, pois sabe que, se isso acontecesse com a Marussia, seria o equivalente a um título.

Mas a grande mídia e o grande público não sabem disso. E quem fecha as cotas de patrocínio no final do ano também não. É claro que dá para entender um piloto querendo mostrar serviço e se adaptando à vaga que conseguir mas, a longo prazo, não tem sido uma aposta das mais certeiras.

Dispensas de dezembro

Histórias como a de Hulkenberg são raridade

Que ninguém ache que a Fórmula 1 é lugar de caridade: nenhuma equipe está preocupada com o futuro de um piloto quando o dispensa. Mas não dá para negar que a demora para a definição tem atrapalhado o andamento da carreira de muitos jovens talentos.

Há quem possa pensar: mas esse Jaime Alguersuari nunca mostrou serviço! E o Adrian Sutil, então! Mas lembrando que Sebastian Vettel, por exemplo, cometeu erros como o que tirou Jenson Button do GP da Bélgica em sua segunda temporada como piloto de time grande ou que Lewis Hamilton teve performances abaixo da crítica já campeão do mundo em 2011 – apenas para dar dois exemplos de jovens que mostraram serviço logo de cara – é de se imaginar o que alguns nomes que ficaram pelo caminho poderiam ter feito.

Computando apenas os últimos dois anos, a lista é grande: Nico Hulkenberg, Adrian Sutil, Bruno Senna, Sebastien Buemi, Jaime Alguersuari e, por que não, Rubens Barrichello são alguns pilotos que foram dispensados após o final da temporada. Eles tinham níveis de experiência e resultados diversos. Nenhum deles conseguiu uma vaga como titular na categoria no ano seguinte.

Deles, só Hulkenberg e Senna voltaram ao grid – o primeiro, porque amarrou um contrato de piloto de testes que lhe garantiria uma promoção no ano seguinte; o segundo, por ter entrado na linha de sucessão após o improvável acidente de Kubica e a substituição de Heidfeld.

Dá para entender por que uma equipe média ou pequena demora para definir seus pilotos: é uma pura questão de barganha. Como as vagas são definidas em uma balança entre patrocínio e potencial de resultados (e mais dinheiro), os times vão esperando as ofertas aumentarem. Se o piloto titular não conseguir cobri-la, é trocado. Que o diga o próprio Senna, pela terceira vez (se considerarmos que o então vice-campeão da GP2 colocou todas as fichas na Honda em 2009 e perdeu), e Kobayashi, que aparenta estar em situação bastante complicada para o ano que vem.

Essa dura realidade acaba ceifando carreiras. Se somarmos a isso a falta de testes e a necessidade de convencer investidores a colocar um dinheiro que, convenhamos, tem retorno direto muito improvável, pelo menos nos primeiros anos, não tem sido nada fácil ser novato na Fórmula 1.

Vettel e Hamilton são dois dos últimos exemplos de pilotos formados na era dos testes. Mesmo assim, não deixaram de se desenvolver quando já estavam em times de ponta – a exemplo do que vai acontecer com Perez ano que vem. Será que não estamos esperando demais de quem está chegando agora?

Entenda como é o sistema de luzes dos pit stops

Alguns leitores questionaram o exagero do “alonsocentrismo” na transmissão da Antena 3 após uma temporada inteira acompanhando os posts em que reúno momentos-chave das corridas na ótica de três TVs diferentes. Estariam Lobato e companhia incorrendo no mesmo erro que vimos no Brasil, sucessivamente tentando atrair audiência apenas pelo sucesso de um piloto nacional?

“Se, em 2002, havia 800 mil pessoas vendo a F-1, no ano em que Fernando se aposentar, não serão 800 mil”, disse o comentarista Jacobo Vega ao blog. Se, por um lado, narrações e comentários durante as corridas são completamente parciais, a aposta dos espanhóis para cativar uma audiência que siga acompanhando o esporte mesmo sem um compatriota vencendo corridas ocorre nos programas prévios, de pelo menos uma hora, antes das corridas – no total, a emissora apresentou mais de 200h ao vivo de F-1 no ano.

Falei tudo isso para chegar no que interessa: uma destas matérias do programa prévio, em que Lobato e Marc Gené explicam e engenhoso sistema de pit stop que a Ferrari criou, sofreu para aprimorar e que hoje é copiado por grande parte dos rivais.

[youtube http://www.youtube.com/watch?v=e8eNxqQeAnE]

É impressionante como o sistema que simplesmente dispensava o pirulito evoluiu para uma sequência de luzes complexa, que tenta minimizar ao máximo o efeito de alguma falha humana. Notem como é importante para um pit stop rápido, mais do que o treinamento em si, que os equipamentos usados funcionem de maneira mais eficiente possível.

São estes equipamentos que explicam o grande número de falhas da McLaren no início do ano, que se converteram em alguns dos mais rápidos da história do meio para o final da temporada: era justamente o macaco dianteiro da Ferrari que o time de Woking tinha dificuldade em copiar.

A precisão do piloto também é fundamental. Às vezes, quando apenas um piloto da equipe tem uma sequência maior de paradas lentas, é mais inteligente suspeitar que ele não está fazendo sua parte do que acreditar em alguma falha proposital da equipe.

GP do Brasil por brasileiros, britânicos e espanhóis: “Drama em Interlagos”

A garoa que começou a cair minutos antes da largada para a decisão do campeonato era o prenúncio de um final histórico para um campeonato igualmente marcante. Prevendo que a água continuaria caindo e até chegando a imaginar um início com Safety Car, o destaque na Globo era para a pimenta que a chuva colocava na prova. “Era tudo o que Alonso queria. Pode ser até melhor para o Alonso do que uma chuva constante. Pode complicar para o Vettel e também para o Hamilton na pole”, prevê Reginaldo Leme.

Mas a água sequer é suficiente para obrigar os pilotos a largar com os pneus intermediários e Gary Anderson, na BBC, acha “que vai continuar seco”, pois não vê “as nuvens piorando”.

Os ex-pilotos e comentaristas David Coulthard e Marc Gené se focam na dificuldade em estar no cockpit em um momento como esse. “Acredito que todos largam com pneus de seco, porque seria arriscar demais e o tempo de parada é curto. O que me preocupa é a avaliação de aderência na primeira curva. Esses pingos tiram a confiança. Não poderia ser uma corrida mais complicada para os postulantes ao título. É muito fácil cometer um erro”, avalia o espanhol. “Os pneus não vão estar tão aquecidos – até porque é um circuito curto, sem muitos lugares para aquecer os pneus – e você chega na curva sem saber qual a aderência. É uma condição em que a pole não é uma posição muito boa. É de se esperar uma primeira volta difícil”, lembra o escocês.

Antes das luzes vermelhas se apagarem, o narrador espanhol Antonio Lobato dá o tom, após narrar um vídeo com homenagem prévia a Alonso, não importando o resultado da prova. “Não sei como estão vocês, mas a tensão é máxima.”

E ela só aumenta na largada. “Vettel lento, olha Massa, já em segundo! Oh, temos uma corrida em nossas mãos”, narra Ben Edwards, na BBC.  “Sobrou para Sebastian Vettel! Vamos olhar com cuidado onde foi. Ele vai ser obrigado a fazer uma corrida de recuperação”, diz Galvão Bueno, enquanto o narrador inglês chama a atenção para o “drama no Brasil”, pois “Vettel foi acertado e ainda não sabemos quanto estrago ele teve.”

Os espanhóis, logo nos primeiros metros, destacam que Vettel está “muito cuidadoso” e lembram da largada de Lewis Hamilton justamente na decisão de 2007. Mas, enquanto o inglês apenas escapou na Curva do Sol, o alemão vê o grid inteiro passar raspando em sua Red Bull. “Vettel rodou, está vendo todo mundo ao contrário! Olha que pode ter Safety Car”, avisa Lobato. “Se tiver Safety Car, será muita sorte. O assoalho está danificado, mas não muito”, Gené quase lamenta.

No momento em que Lobato pede calma a Alonso, já que Vettel “deve estar fora da corrida”, o espanhol faz uma ultrapassagem dupla sobre Webber e Massa e o narrador vai à loucura. “Não acredito! Espetacular, Fernando!”

Para britânicos e brasileiros, no entanto, a manobra gera menos comoção. “Que trabalho Massa fez para ajudar Alonso”, destaca Edwards. A preocupação é com a situação do título de Vettel. “Falta muita corrida, mas parece que o futuro do campeonato depende de Webber”, aposta Coulthard. Porém, vendo o replay da largada, Gené observa que “Webber não fez nenhum favor a Vettel” nos primeiros metros e Coulthard define ironicamente a batida de Vettel e Senna. “Senna foi pelo lado de dentro esperando que a Red Bulll desaparecesse, mas isso não aconteceu.”

Ainda que Galvão veja “a famosa sorte de Alonso” nas largadas, Lobato considera “um milagre que Vettel esteja na pista. Senna bateu e arrematou depois”. É a mesma linha de Luciano Burti, para quem “a pancada foi muito forte. Se conseguir ir até o final, vai ser um milagre.”

O comentarista salienta a dificuldade em decidir qual o melhor pneu quando a chuva aperta, mas não o suficiente para tornar simples a escolha pelos intermediários. “Essa é a parte mais decisiva e tensa para pilotos e equipes porque, se apertar um pouco mais, você coloca intermediários ou espera para ver se a chuva para?”

Depois de reconhecer o trabalho de Massa para proteger Alonso “até que o rendimento de seu carro melhore”, Lobato diz que Vettel só decidiu entrar nos pits “para copiar” o espanhol. “Não pode ficar na pista tentando algo diferente.”

Duas voltas depois, contudo, Jenson Button diz pelo rádio que parou de chover. “Eu estou vendo chuva”, retruca Lobato, mas Coulthard lembra que o inglês “é o mestre neste tipo de situação”. Logo depois, Anderson surge do pitlane para opinar que ficar na pista “pode ser a decisão certa.”

Os brasileiros, por sua vez, apostam que a água não vai parar de cair. “A vovó do Rubinho sempre está certa. A chuva nunca vem do aeroporto”, lembra Galvão. “Acho que essa história é mundialmente conhecida porque o Adrian Newey veio me perguntar no grid o que minha vó achava”, completa o próprio Barrichello, em tarde de comentarista da Globo. Seus colegas de cabine, Burti e Reginaldo, não entram em acordo: o primeiro vê tempos melhores de quem está com os slicks, e o segundo acredita que, pelo spray levantado, não dá para seguir sem pneus de chuva.

Gené observa que “a pista muda a cada volta. Mas, se ficar assim, o pneu intermediário vai acabar mais cedo” e os espanhóis começam a se desesperar. “Precisamos que aconteça alguma coisa. Fernando está em quarto, a 17s do terceiro. Assim, não seremos campeões nunca. Mas não se rendam. Tudo ainda é possível.”

Nem mesmo a informação da repórter Nira Juanco de que “estão me dizendo que viram, na Sky, uma ultrapassagem de Vettel em bandeira amarela. Estão analisando lá”, anima o narrador, para quem “não é a Sky que tem de analisar, são os comissários. E não apareceu nada ainda.”

Quando veem Webber abrindo para Vettel, apenas são irônicos. “O que o Webber falou outro dia na coletiva de imprensa”, diz Lobato. A manobra também é notada por Reginaldo. “Isso com todo o discurso do Webber de que não ia abrir para ninguém.”

Logo antes do Safety Car entrar, os espanhóis vão para o comercial. “Fernando estava reclamando via rádio, mas estava claro que havia muitos destroços. Agora, sua diferença com os líderes diminui muito, mas também Vettel fica mais perto da ponta”, resume Lobato.

Quando o espanhol pediu a intervenção, Edwards riu. “Ele não está inventando, podemos ver isso com nossos olhos”, diz Coulthard.

Na Globo, Galvão pedia os conselhos de Barrichello, famoso pelas boas decisões na chuva, sobre o que fazer, pois a pista parecia secar. “Geralmente, é a equipe que te chama para mudar de pneu de chuva para seco. Quando é o contrário, você é quem decide”. Quando ouve as reclamações de Alonso, o narrador pede que “entre alguém para dar um chute naquilo ali”.

O Safety Car ajuda narradores e comentaristas a dar uma respirada depois de tanta ação nas primeiras voltas. Dá até para analisar o estrago no carro de Vettel. “Seria um problema se tivesse pegado no radiador, mas está bem longe. Deve ter uma perda de performance, mas em torno de um ou dois décimos”, acredita Anderson.

Já Gené chama a atenção ao fato de que “Não ouvimos a Ferrari tranquilizando Fernando pelo rádio, ao contrário do que está acontecendo com Vettel. Ele que avisa a equipe para que estejam preparados. A maturidade está fazendo diferença. Vettel se recuperou muito bem, mas na largada deu para perceber que não estava acostumado a essa posição, como Fernando está” e Lobato destaca a corrida de Hulkenberg ainda que “a ponta não interesse”.

Na relargada, quem rouba a cena é Kobayashi, com quem, para Coulthard, Vettel precisa ter cuidado porque ele está lutando por sua carreira”. Reginaldo também cita o fato de que o japonês pode ficar fora do grid mesmo com boas atuações. “Também, chegam com caminhão de dinheiro que até o Rubinho tá apontando aqui que não tem lugar para ele”, explica Galvão.

Burti acha que a Ferrari vai ter de trocar o pneu de novo por estar com médios. “Eles deveriam estar andando mais rápido agora, mas não estão”. Essa também é a preocupação de Gené, que não sabe dizer se quem está com os duros parará de novo. Para os britânicos, a grande questão é a chuva. “O irmão do Massa estava esperando algum sol, veio de bermuda. Nem os locais conseguem entender esse clima”, brinca Coulthard. Quando Edwards vê Hulkenberg escapando e perdendo a liderança para Hamilton, conclui que os pilotos “precisam colocar um jogo de pneus novos agora, mas se pararem, a chuva pode vir e eles terão de parar de novo!”

Assim, os britânicos se surpreendem quando Vettel coloca pneus de seco. “É uma decisão corajosa da Red Bull. Eu só seguiria o que Alonso fizesse. Pelo lado da Ferrari, eles teriam de tentar algo diferente, mas não sei o que.”

Galvão acredita que colocar pneus de seco é o menos arriscado, mas Burti discorda e segue na linha de Coulthard. “Eu acho que ele até está arriscando porque se chove mais vai ter de voltar. Esperaria até ver a decisão que o Alonso toma.”

Os espanhóis também acreditam que vai ficar seco, mesmo que estejam rezando para que chova. E muito. “O positivo é que Alonso está mais rápido que Vettel, mas o negativo é que os ponteiros estão escapando. Na posição em que ele está agora, Fernando precisaria ganhar a corrida. Quem não estava convidado é Hulkenberg, que está atrapalhando Fernando”, resume Gené. “Hulkenberg está fazendo a corrida de sua vida. Precisamos de alguma outra coisa. Onde está a chuva que prometeram?”, Lobato se desespera. “Vamos ao comercial e espero que, quando voltarmos, a chuva esteja caindo sobre nós. Essa meteorologia diz que está chovendo quando caem quatro gotas. Precisamos de muito mais do que quatro gotas.”

O narrador chega a comemorar timidamente os problemas de rádio de Vettel, “mas precisaríamos que ele tivesse problemas maiores”. Quando Rosberg é o primeiro a parar para colocar pneus intermediários, Lobato chama a estratégia de “suicida”.

As elucubrações são interrompidas pela excursão de Kimi Raikkonen no traçado antigo de Interlagos. “Para onde Kimi está indo? Deve ser para algum outro lugar em SP. Que passeio!”, ri Edwards. “Dá para ver que ele veio do rali”, observa Coulthard quando vê o finlandês voltando pela grama. “Raikkonen está perdido! Deve ter pensado ‘não conheço essa curva, onde será que eu estou?’”, brinca Lobato, enquanto Barrichello destaca o cavalinho de pau “heroico” do piloto da Lotus.

Momentos depois, em disputa pela liderança, Hulkenberg espalha e tira Hamilton da corrida – ou, para Lobato e Galvão, tira ambos. “Ele estava do lado molhado, foi pelo lado de dentro porque tinha esse direito, mas perdeu o carro”, Coulthard isenta o alemão de culpa, assim como Barrichello.

Após a terceira parada de Vettel, o comentarista espanhol Jacobo Vega começou uma campanha para que Alonso aguentasse na pista para “ficar com estratégia contrária à do rival”. Porém, quando vê o espanhol quase perdendo o carro, muda de ideia. “Por Deus, por Deus! Estamos no limite da aderência!”, berra Lobato.

O piloto troca os pneus e volta atrás de Massa, mas, para Lobato, “isso não é um problema. Assim como Webber não seria um problema para Vettel.”

Os brasileiros se alarmam quando Vettel volta para os boxes para colocar intermediários. “Bateu o desespero na Red Bull”, aponta Galvão. “O erro estratégico que custou o campeonato de Alonso em 2010 pode ter acontecido com o Vettel”, completa Reginaldo.

Galvão decreta: “Acabou a calma do Vettel”. E os brasileiros fazem as contas do que Vettel precisa para ser campeão. “São dois alemães à frente, se houvesse patriotismo…”, diz Reginaldo. Já Burti lembra que, se for necessário, Webber encosta. “Não é só na Ferrari que tem jogo de equipe”. Enquanto isso, os britânicos por várias vezes lembram que o carro de Vettel tem danos, mas que não sabem a extensão deles.

Porém, nenhuma tentativa de colocar emoção nas voltas finais vinga e Vettel se sagra tricampeão por três pontos. “Alonso mais uma vez pilotou muito bem e quase fez o que precisava fazer. Vettel também foi muito bem. Esses caras estão sob uma pressão tão grande! Mesmo sendo um pouco atrapalhado hoje, Vettel conseguiu se recuperar bem. Seja quem ganhasse o campeonato nesta tarde, merecia. Alonso pilotou muito bem, Hamilton merecia muito mais, Button mais uma vez mostrou que é sensacional nestas condições… muita coisa aconteceu neste ano”, resumiu Coulthard.

Galvão Bueno não esqueceu do vencedor Button. “Anote o nome dele para o ano que vem. Não tem Hamilton e eles vão trabalhar só para ele e a equipe vem em grande fase”. Sobre o título, frisou que “Alonso é grande guerreiro. Lutou o ano inteiro com o carro e chegou em segundo em circunstâncias terríveis hoje”. Mas o grande destaque foi para Massa, que “mostrou sua recuperação na segunda parte do ano, se preparando para ano que vem” e chorou no pódio “mais do que quando acordou no hospital. Não é de chorar. Para ele chorar assim, mostra a importância desse momento de recuperação.”

Assim como os brasileiros, Lobato também valorizou seu compatriota. “Mesmo que não seja campeão, Fernando tem de ter certeza de que estamos todos orgulhosos do que ele fez. Essas são corridas de carros, e isso dilui um pouco o talento. Muito obrigado por tudo, Fernando. Não podemos esquecer que foi um milagre chegar aqui e que estamos todos agradecidos por Fernando nunca ter se rendido até a última corrida. Não fique tão sério, porque quando o carro melhorar, você vai passar por cima deles. Chegará esse momento. Ele lutou com armas menos potentes do que seus rivais, mas os colocou nas cordas até o final.”

E, se Interlagos “resumiu o ano com seus dramas”, como explicou Edwards, “Vettel sobreviveu a tudo nesta tarde para ser tricampeão. Alonso não poderia fazer muito mais”. Um belo desenho de uma final que nenhum roteirista poderia reproduzir.

Dois caminhos. Um campeonato maluco. Três pontos

Quando a temporada 2012 começou, me perguntaram o que eu esperava deste ano: “uma disputa pelo título como a de 2010 e corridas como em 2011”, disse. Todos, inclusive eu, caíram na risada. Parecia pedir demais. Mas não foi.

O épico GP do Brasil foi uma representação fiel da temporada mais emocionante – pelo menos da minha – história da Fórmula 1: equipes médias andando no meio das grandes, uma mistura de grandes e terríveis momentos de pilotagem, carros no limite com os pneus errados e muita indefinição na estratégia por parte das equipes.

Porém, se a temporada de 2012 começou e terminou como um grande tiro no escuro, premiou dois conjuntos que, com estratégias diferentes, souberam iluminar seus caminhos. Fernando Alonso e a Ferrari apostaram em uma campanha praticamente sem erros e batendo forte na tecla de que “os pontos são dados aos domingos”. Era na corrida que o carro vermelho se sobressaía, se não em ritmo puro na maior parte das corridas, aproveitando cada oportunidade, como largadas e pit stops. Alonso dominou grande parte da fase das incertezas do campeonato, quando todos chegavam a uma nova pista sem saber o que fazer, porque compreendeu o momento certo de atacar – e foi preciso em suas batalhas.

É claro que sempre seria uma estratégia arriscada. E as vezes em que pagou caro por ter um carro que não permitiu classificar-se adiante da terceira fila em 15 das 20 etapas – em Spa, de forma inocente, em Suzuka, um pouco menos – foram decisivas para que o título lhe escapasse.

E escapou quando as incertezas cessaram. Cessaram porque a abordagem do conjunto Red Bull e Vettel jogou lógica na disputa. Lutando com um carro que não agradava o piloto, a equipe procurou resolver especificamente os problemas de instabilidade de traseira e, quando o fez, o alemão deu conta do recado.

O fato de a balança ter pendido para o lado de Vettel juntamente da diminuição das incertezas a cada semana fez muitos se inclinarem a tirar o mérito do hoje tricampeão do mundo. Se Alonso foi impecável em maximizar suas oportunidades quando conjuntos melhores falharam, Vettel não deu chances para os oportunistas de plantão quando teve sua chance.

Não esqueci do post das transmissões. Espero conseguir publicar no final de semana ou, no máximo na segunda-feira.

Também gostaria de saber de vocês sobre o que querem discutir nestes três meses sem corridas. Mandem suas sugestões!