O GP de Abu Dhabi começou com uma dúvida: até onde Sebastian Vettel conseguiria escalar largando dos boxes? Por um lado, tinha em mãos um carro preparado para ultrapassar. Por outro, estava em uma pista famosa no passado por não dar muitas chances de recuperação. “Sem dúvida Vettel vai fazer uma corrida espetacular, mas não é uma pista normal”, lembrava Reginaldo Leme, na Globo. “Vai demorar para ele chegar. Alonso apostava no título confiando em sua famosa sorte. Acho que se livra de Button na primeira curva.” O comentarista Luciano Burti acredita que “Vettel marcará pontos e, com as modificações que fizeram em seus carros, bons pontos.”
Na Sky, Martin Brundle vê uma grande chance de Vettel provar que aqueles que duvidam de seu talento estão errados. “As pessoas pedem que não analisemos o piloto quando é a equipe que tem culpa, mas não dá para separá-los. Essa pode ser a corrida que vai fazer a fama de Sebastian, é uma grande oportunidade. Acho que ele vai passar os carros mais lentos rapidamente e imagino que os pilotos da Toro Rosso foram avisados para não o atrapalharem.”
O cobertor de aquecimento de pneus preso no carro de Pedro de la Rosa antes da volta de apresentação é um mau presságio para os espanhóis. “Má sorte para Pedro e também para Fernando, porque é um obstáculo a menos para Vettel”, lamenta o narrador Antonio Lobato.
O comentarista Marc Gené segue na mesma linha quando vê vários pilotos ficando pelo caminho na primeira volta. “Todos estes são rivais que Vettel não vai ter que passar. Mas que primeira volta espetacular de Fernando! Agora os dois que estão à frente dele são os mais difíceis de passar: Maldonado pela velocidade de reta e Raikkonen porque vai dificultar.”
O desempenho do espanhol é destacado por todos. “Alonso eletrizante na primeira volta, mostrando grande velocidade de reta da Ferrari”, lembra o narrador britânico David Croft. Depois de ter de engolir seco a afirmação anterior de que “Raikkonen não é tudo isso de largada” e ver o finlandês ganhar duas posições na primeira curva, Galvão Bueno diz que Webber “além de não ajudar na largada, ainda permitiu que Alonso passasse” e não perdoa o “rei da lambança da primeira volta”, Romain Grosjean, envolvido em toque com Nico Rosberg. “Não sei até quando a Lotus Renault vai ter paciência, mesmo ele sendo francês. Francês que nasceu na Suíça, mas com licença para correr da França.” A equipe de Enstone pode não ser mais gerida pelos franceses há dois anos, mas o repórter da Sky Ted Kravitz garante que “há caras fechadas na Lotus depois que Grosjean não deixou espaço para outro piloto na primeira volta novamente”. Grosjean, contudo, não teve culpa para Lobato. “Fazia tempo que não víamos uma confusão dele. Dessa vez estava na frente.”
Logo em suas primeiras voltas de recuperação, Vettel se toca com Bruno Senna e perde parte da asa dianteira. “O piloto até desacostuma largar atrás, é difícil andar no meio do pelotão”, justifica Galvão. “Bruno não tem culpa nenhuma”, completa Burti, que ganha o apoio de Brundle: “Seb mereceu essa” porque forçou demais. Mas Lobato não concorda. “Você está tentando se recuperar e vem Bruno Senna e lhe arranca parte da asa. Mas, por um golpe de sorte, isso não te afeta.”
De fato, Brundle e Gené se surpreendem por o dano na asa não atrapalhar tanto o desempenho do alemão. “Dá para ajustar com o diferencial, dá para mexer de dentro de carro, mas se o carro estiver saindo muito de frente, vai acabar com seus pneus”, explica o inglês.“A asa está bem danificada, com certeza está atrapalhando. Eles vão trocar quando ele parar”, aposta o espanhol.
No replay da largada, Galvão aproveita para ‘desmistificar’ Nico Hulkenberg, que ficou pelo caminho na primeira volta. “As pessoas exageram, colocaram o Hulkenberg na Ferrari e ele nem é tudo isso. Vivemos em uma era em que todo mundo quer ser pai da notícia, não importa se sabe de alguma coisa.”
As elucubrações são interrompidas pelo acidente de Rosberg e Karthikeyan. “Foi daquelas que assustam tanto que ele saiu rapidinho. Vettel agradece. Fiquei com a sensação que estava vazando óleo. Estava muito mais lento que o normal”, vê Galvão. “Rosberg foi pego de surpresa. Não é nem um ponto de freada, não teve tempo de reagir”, acredita Burti, ainda que Reginaldo afirme que “daria tempo dele ter feito outra tomada”, argumento refutado pelo narrador e o comentarista. “Repito que não é ponto de freada”, diz Burti.
“É uma curva cega, mas tenho certeza de que não é culpa do Karthikeyan”, acredita Brundle, mais preocupado com a estratégia. “É muito cedo para parar, falta muita corrida para terminar”, diz, endossado em um primeiro momento por Kravitz, para quem, “com mais cinco ou dez voltas daria para colocar o duro e ir até o final”. Quando a Red Bull decide, após novo dano na asa de Vettel por um desentendimento com Ricciardo, pará-lo e colocar os macios, o repórter volta atrás. “Ele deve conseguir ir até o final com esses pneus.”
“Por que não arriscar?”, questiona Brundle.“Eles não têm nada a perder nessa situação. Essa é a grande chance de Vettel, porque seus pneus estarão mais aquecidos do que daqueles que estavam atrás do Safety Car e, ainda por cima, estão mais novos”. Gené também acha que a tática não é a ideal, mas pode dar certo. “Duvido que seja estrategicamente correto, é pela asa, porque terão de fazer muitas voltas com os macios. Mas não é uma má estratégia porque não para mais e vai se reagrupar ao final do pelotão”. Reginaldo acredita que “vale o risco, porque quando ficar sem pneus, já estará em uma boa posição.”
Os britânicos se divertiram com Vettel atropelando a placa do DRS para evitar a traseira de Ricciardo. “Não seria a primeira vez que uma Red Bull iria encher a traseira de um Toro Rosso em um Safety Car”, lembra Croft, referindo-se ao GP do Japão de 2007. “Mundo pequeno, não?”, se diverte Brundle.
Na relargada, Vettel vai para cima de Grosjean e acaba o ultrapassando por fora da pista. “Campeão do mundo é assim mesmo, se faz passando por fora da estrada”, apoia Galvão. Mas isso não é permitido pela FIA. “Essa manobra foi feita com os quatro pneus na pista?”, questiona Brundle. “Ele precisa ficar calmo, mas não parece estar.”
Os espanhóis não percebem a manobra e Lobato quer “ver o que está acontecendo lá na frente porque Webber pode usar o DRS em cima de Fernando”. Depois do replay, percebem o ocorrido e o narrador vai à loucura, mesmo após o alemão devolver a posição. É Gené que diminui o fato. “Não vão fazer nada.”
Todos tinham até esquecido de Hamilton na ponta quando o inglês estaciona sua McLaren. “Ê, Alonso”, Reginaldo vê sorte do espanhol. “Que desgraça para Hamilton e agora Alonso está no pódio. E Raikkonen finalmente com grandes condições de ganhar a corrida”, resume Lobato, ainda que os espanhóis já estejam preocupados com a pouca distância de Vettel para a ponta. “Se todos pararem agora, ele toma a liderança”, observa Gené. Antes disso, Lobato reclamava da facilidade com que o alemão passara por Vergne – “ordem de equipe também vale de um time para outro?”
Na Globo, a discussão é sobre o que mudou no retorno de Raikkonen. “Ele voltou mais falante. Ele tinha um comportamento difícil na época da Ferrari. O Felipe diz que, em um dia, conversaram mais do que em todo o tempo juntos na Ferrari”, conta Galvão. Mas a conversa via rádio faz duvidar que Kimi seja outro. “Deixe-me em paz, eu sei o que estou fazendo”, diz a seu engenheiro. “Ele não gosta que fale no rádio, é muito autêntico”, define Gené. “O engenheiro devia falar: ‘então vamos tomar um café e já voltamos’”, defende Lobato. “Imagina como era falar para o Kimi fazer a lição de casa ou escovar o dente quando ele era pequeno”, ri Brundle.
Na pista, Alonso passa Maldonado. “Ninguém acredita porque ninguém sabia que estávamos tão perto!”, exclama o narrador, que ganha o apoio de Galvão. “A expressão da equipe é de surpresa, do tipo ‘como esse cara consegue fazer isso?’”
Mas logo fica claro que o venezuelano tem problemas e é Webber quem tenta passá-lo, sem sucesso. Os dois se tocam. “Não tentaria fechar Maldonado a não ser que tivesse o ultrapassado. Maldonado fez o que tinha de fazer e Mark esperava que ele tirasse o pé, o que não fez”, explica Brundle. “Maldonado é Maldonado. Daqui a pouco vai ter investigação”, a primeira reação de Galvão é culpar o piloto da Williams. “Ele estava na trajetória”, defende Burti, e o narrador e Reginaldo acabam concordando. Para o comentarista, inclusive, é mais uma prova de que “desde o sábado à tarde está tudo dando certo para o Alonso.”
Os espanhóis não concordam, lamentam a sorte que Vettel vem tendo na prova, e comentam sobre o incidente com atraso, pois estavam nos comerciais. “Acho que foi muito otimismo de Webber, porque Maldonado não poderia ter desaparecido”, diz Lobato.
Webber repetiria a dose voltas depois, agora com Massa. “O pior é que agora Mark está muito longe para dar a posição de volta. Acho que ele vai receber um drive through, pelo menos por um dos incidentes”, acredita Brundle. “Isso é ruim porque perde a posição para Vettel. Que erro!”, Lobato se revolta com o brasileiro. “Da forma que Webber voltou, assustou Felipe”, Reginaldo defende o compatriota. “Teve de diminuir para não dar no meio dele. Será que ele escapa das duas investigações?”, questiona Galvão. Quando o australiano sai impune, o narrador diz que os comissários “estão muito bonzinhos. Webber, que não é disso, abriu a caixa de ferramentas hoje.”
O momento das paradas dos líderes se aproxima. “Raikkonen precisa aproveitar agora que está com o pneu macio, com o qual é melhor que a Ferrari. Talvez Alonso possa tentar algo com a estratégia”, acredita Kravitz, mas Croft brinca. “Estratégia não é uma palavra que Alonso gosta de ouvir nesta pista.”
Porém, o espanhol está muito longe do líder e seus compatriotas estão mais preocupados com Vettel. Gené vai do otimismo ao pessimismo em questão de minutos. “É bom sinal que Felipe esteja reclamando dos pneus porque ele fez 25 voltas e Vettel vai ter que fazer umas 40”, diz, para logo depois fazer as contas e emendar. “O que posso garantir é que Vettel será pelo menos quarto. Fernando vai ter que correr muito para chegar à frente dele.”
Kravitz não acredita que Vettel consegue ir até o final. “Os especialistas dos pneus dizem que o pneu médio pode fazer 40 voltas. Seriam 42 com o macio… vai ser difícil”. A opinião é compartilhada por Galvão, mas refutada por Burti. Já Reginaldo espera ver em Vettel “uma característica que já vi em Alonso, Senna, Prost, Piquet e outros campeões: vai ter que economizar pneu sem perder velocidade.”
Gené acredita que é possível que Vettel não pare e está certo de que “Fernando vai chegar nele”, mas Lobato nem quer pensar nisso. “Imagine os dois líderes se pegando”. Os espanhóis se preocupam com Button, que vem em zona de DRS atrás da Ferrari. “O que cremos é que a McLaren tem a sétima marcha mais curta e Fernando pode se defender com isso”. O narrador reclama das (não) ordens de equipe da Red Bull. “O que me irrita é como eles são mentirosos. Claro que Webber tem que deixar passar, estão lutando pelo mundial!”
Lobato reconhece que Vettel “está fazendo uma corridaça, não há dúvida”, ainda que o comentarista Jacobo Vega insista que “todas as coisas estranhas que estão acontecendo ajudem Vettel.”
Quando o desânimo bate entre os espanhóis, Lobato comemora o pit stop de Vettel como se fosse um gol. “Box, box, box para Vettel!” E Gené explica a decisão. “É claro, se é para trocar, não podem esperar. Eles perceberam que Fernando iria alcançá-lo”. Burti não se conforma: “não faz sentido, para que trocar pneu? Foram conservadores, porque era possível” e Galvão explica que “não há milagre no esporte.”
A alegria dos espanhóis dura até Perez armar uma confusão que causa o Safety Car. “Madre de Diós, que desastre! Tudo saiu perfeito para Vettel”, Lobato se desespera. “Acho que o nome do meio de Vettel é sorte. Quebra duas vezes a asa dianteira e nada acontece, dois SC o ajudam, seus rivais parecem se auto-destruir no meio do caminho e o carro de Hamilton quebra”, acredita Brundle, enquanto Croft se surpreende. “Quando eu falei que ninguém nunca tinha vencido largando em último, só joguei no ar. Não achei que poderia acontecer.”
Sobre o acidente em si, Lobato se limita a dizer que “havia muita gente perigosa junto”. Afinal, tem outras prioridades. Para Galvão, “dessa vez o Grosjean caprichou”, apontando logo para o primeiro suspeito, mas Burti vê que o problema “foi como o Perez voltou para a pista”. E o narrador se rende. “Perez é outro complicado.”
A pausa serve para que os britânicos respirem. “Se você não estiver na ponta do sofá com essa corrida, não vai estar com mais nenhuma”, diz Croft. “Melhor corrida do ano junto de Valência. Não são geralmente as primeiras das listas de melhores, mas na Fórmula 1 você nunca sabe de nada”, reflete Brundle.
Os espanhóis não relaxam. “As coisas não estão boas. Fernando está perto de Raikkonen, mas teve muita dificuldade para aquecer os pneus no primeiro SC”, vê Lobato. “Além disso, Vettel tem uma sétima marcha muito longa. No momento, acho que Vettel tem mais possibilidades do que Fernando de terminar em segundo. Mas Fernando também pode ganhar, é difícil, mas pode”, completa Gené, mas o narrador não aprova. “Calma, calma, primeiro vamos pensar que tudo pode ficar como está”. Lobato chega a imaginar se Alonso não está próximo de Button de propósito para que Button tenha a DRS ativada para se defender de Vettel. “Se Button sai de sua zona de DRS, não vai conseguir se defender de Vettel.”
Após algumas voltas de entusiasmo, com Galvão dizendo que “a sorte que era do Alonso virou para o Vettel”, os brasileiros passam a duvidar que o alemão chegará em terceiro, com Reginaldo inclusive acreditando que o piloto pode “jogar fora o campeonato” se não tiver mais cuidado. “Não há reta suficiente para passar e quem se defende coloca por dentro. O único que achou que era super-homem e quis passar por fora foi Webber e bateu duas vezes”. Seria justamente por ali que o bicampeão daria o bote.
Sempre pessimista, Gené diz que Vettel “vai acabar passando”, ao que o narrador responde com um longo suspiro e um “gracias”. Lobato até oferece um “monumento para Button em Maranello se segurar Vettel e pilhas de pizzas e paellas”, mas o inglês não consegue se segurar na frente. “Vettel veio de muito longe. Foi uma pilotagem muito boa dos dois”, destaca Brundle. O “cavalheirismo” de Button também é destacado por Burti. “É um tipo de ultrapassagem que Vettel faz muito bem, é um dos pilotos que costuma ultrapassar por fora”, reconhece Gené.
Resta acreditar que Alonso possa chegar em Raikkonen, ainda que até Lobato reconheça que seria necessária “alguma mágica”. No final, o que tinha tudo para ser um domingo de lucro para Alonso termina com três pontos de ganho. “Eu achava que Fernando seria terceiro e Vettel, sexto ou sétimo, mas todos os SC o beneficiaram”, lamenta Gené. “Mas com a classificação normal, hoje Vettel ganharia e Fernando seria terceiro. Se dermos um carro para Fernando poder classificar bem… porque no final o carro foi bem. Para mim, o melhor piloto da corrida foi Fernando porque a corrida de Raikkonen foi fácil e Vettel foi muito beneficiado. Fernando se arriscou muito porque o carro não estava bom nesse circuito”, avalia o comentarista, que ganha apoio dos brasileiros. “Se Alonso ganhar, 90% é dele e 10% da Ferrari. Deve estar exausto porque novamente tirou leite de pedra”, diz Burti.
Mas quem rouba a cena no final é o vencedor Raikkonen. “Não acho que haverá uma vitória tão popular neste ano. Eu estava na última vitória da Lotus”, lembra Brundle, ainda que Croft lembre que “aquela era uma equipe bem diferente”. Para os brasileiros, pouco importa. “Volta a vencer a Lotus, que fez parte da nossa vida, a grande Lotus de Colin Chapman”, diz Galvão, enquanto Reginaldo lembra Ayrton Senna.
Discussões sobre o DNA da Lotus à parte, o jeitão do vencedor chama a atenção de todos. Para Galvão, “é um novo Raikkonen. Dois braços erguidos eu nunca vi!”, brinca o narrador, enquanto Brundle resume: “Essa corrida era do Hamilton, mas eles tiveram problemas. Raikkonen teve ritmo o tempo todo, e nem precisou da ajuda do engenheiro: ele sabia o que tinha de fazer.”