“Não quero ser apenas o maior piloto da história da Mercedes”. A frase pode soar um tanto quanto arrogante, mas foi solta por Lewis Hamilton durante uma entrevista em que conversamos muito sobre seu envolvimento em questões ambientais. Essa é apenas a última das empreitadas do inglês, que talvez não tenha idade para isso, mas muito provavelmente seja o piloto mais millennial do grid. Mesmo próximo de chegar nos números de Michael Schumacher e se tornar o mais vencedor da história, seu título máximo parece ser encontrar um propósito.
Enquanto tem vida fácil nas pistas, Hamilton usa a Fórmula 1 como plataforma para dar publicidade a seus outros projetos e visibilidade a questões que ele considera importantes. Os desafios que vêm com isso ficaram claros para o inglês durante os últimos dois anos, quando essa tendência se intensificou: quanto mais ele entra no estilo de vida do mundo da moda, marcando presença no maior número possível de desfiles e festas, maior a cobrança nas pistas, algo com que ele lidou bem até agora. E, quanto mais ele fala em sustentabilidade, mais é questionado se não está no esporte errado.
As mais ou menos 6h30 em que os carros de Fórmula 1 podem ficar na pista – na prática, algo em torno de 4h descontando o tempo em que ficam parados nos boxes – usando o motor mais termoeficiente do mundo representam pouco em termos de poluição, mas desde os quilômetros e mais quilômetros de viagens de avião até os pneus que só duram algumas voltas, é fácil dizer que Hamilton deveria primeiro deixar as pistas para depois começar a falar em sustentabilidade. Mas ele sabe que esse seria o jeito fácil de fazer: o mais difícil é mudar o mundo da Fórmula 1 ao mesmo tempo em que usa-o para influenciar as pessoas.
E é aí que mora o aspecto humano mais interessante dessa história. Hamilton gosta de dizer que o desafio para se manter na ponta dentro das pistas está cada vez maior, mas o que vimos nesta temporada foi ele pontuando mais do que qualquer um inclusive depois que a Mercedes teve sua hegemonia quebrada no GP da Áustria. Nem precisou ser tão brilhante como de costume nas classificações para ganhar com sobras.
Talvez o faça novamente ano que vem. Não surpreende, então, que ele busque desafios fora das pistas.
Porém, à medida que as metas de Hamilton vão ficando mais ambiciosas, vale a reflexão de como isso vai refletir quando ele, de fato, for ameaçado nas pistas. Fica a questão, ainda, se ele vai se importar o suficiente depois tatear o “mundão”, bem longe do círculo do automobilismo em que foi inserido desde a infância – embora muitos tenham tentado evitar que esse fosse o mundo dele. Afinal, de que importa ser o melhor piloto da história da Mercedes, ou mesmo da história da F-1, quando ele pode se tornar o piloto que mudou os rumos da categoria?
Sebastian Vettel agora está por tanto tempo na Ferrari quanto Fernando Alonso esteve em Maranello. Ganhou mais, fez mais poles e pódios, mas nunca esteve tão próximo do título quanto o espanhol, em duas oportunidades – 2010 e 2012. É justo dizer também que Vettel pegou a Ferrari mais longe do melhor carro do grid do que Alonso, mas o time, com praticamente todas as peças diferentes da época do espanhol, trabalhou muito melhor para se recuperar de 2015 para cá. E viu seu piloto número 1 errar muito mais.
Não é por acaso que Vettel termina a temporada 2019 muito mais questionado do que começou a de 2015. E olha que, no ano anterior, as performances ruins em comparação com o então companheiro Daniel Ricciardo já tinham servido de alerta.
Vettel tem como sua grande força a administração do ritmo de corrida. O que a equipe precisa que ele faça, ele entrega, unindo velocidade e cuidado com os pneus. E isso era algo que podíamos ver muito mais quando ele conseguia controlar as corridas da ponta, na época da Red Bull.
Isso tem a ver, é claro, com a falta de ritmo de corrida da Ferrari, mas também com o efeito Charles Leclerc: o monegasco foi mais rápido que o tetracampeão aos sábados neste ano, então quando a Ferrari teve a chance de controlar o ritmo da ponta, não foi com ele. Junte-se a isso o fato do racecraft não ser exatamente o ponto mais forte de Seb, e suas fraquezas ficaram mais expostas.
Mas por que Vettel sofreu tando para andar no ritmo de Leclerc neste ano? Pego emprestado um trecho de um texto em que falo sobre o abismo entre Webber e Vettel, de outubro de 2013, pouco antes do alemão conquistar seu tetracampeonato.
“Por que Webber não consegue? Note que os problemas do australiano sempre aumentam quando a Red Bull encontra formas de driblar as restrições do regulamento e usa os gases do escapamento para melhorar a aerodinâmica (temporada 2011 e segundas metades de 2012 e 2013). O piloto não consegue se adaptar a um carro que se comporta de forma contraintuitiva, ao contrário de Vettel.”
Aqueles carros da Red Bull do início da década tinham a traseira muito presa, tanto pelo uso dos gases do escapamento para gerar pressão aerodinâmica, quanto pelas próprias características do motor Renault, que tinha uma dirigibilidade melhor que a dos rivais. E esses dois pontos foram eliminados com o regulamento de 2014.
Não que Vettel não tenha tido ótimas performances desde então, como no GP da Malásia de 2015 (um belo exemplo de uma prova em que ele usou sua melhor qualidade) e neste ano, na Alemanha, numa corrida de recuperação na chuva. Mas, desde que as traseiras dos carros ficaram naturalmente mais soltas, ele vem tendo mais dificuldades que rivais diretos para se adaptar.
Engana-se quem pensa que ele jogou a toalha. A segunda metade deste ano foi uma prova do quanto Vettel está disposto a trabalhar para virar o jogo. Ele e a Ferrari. A confiança dele com o carro foi aumentando na parte final da temporada e isso só não se materializou em resultados porque o carro não foi tão forte – segundo ele, porque os circuitos não permitiam, mas também é possível que seja pelo motor ter “perdido” potência. Resta saber qual será o limite para ele, especialmente sabendo que, em 2021, os carros estarão ainda mais longe em termos de comportamento de sua época dourada da Red Bull.
Era mesmo inevitável. Quando Webber, Button, Alonso, a turma que nasceu no começo dos anos 80, começou a se despedir da Fórmula 1, obviamente abriu espaço para uma nova turma. Seria a ordem natural das coisas não fosse por um detalhe: quem está assumindo esse espaço nasceu mais de 15 anos depois da geração anterior. E, rapidamente, fala-se em aposentadoria de Sebastian Vettel, Nico Hulkenberg sai da F-1, Daniel Ricciardo se vê sem espaço e sai de uma equipe grande, Fernando Alonso tenta voltar mas não encontra espaço e aí por diante.
Vettel sofre com Leclerc, Hulkenberg foi substituído por Ocon, Ricciardo quis se ver longe de Verstappen e Alonso não faz falta à McLaren porque Carlos Sainz e Lando Norris estão dando (muita) conta do recado.
Não é uma geração especialmente diferente em termos de pilotagem, mas sim na velocidade com que as coisas aconteceram em suas carreiras. E o motivo disso tem nome e sobrenome: Max Verstappen mostrou que não é necessário fazer todas as etapas das categorias de base para chegar preparado à Fórmula 1. E isso interessa àqueles que gerenciam carreiras e programas de desenvolvimento porque torna todo o processo mais barato.
Mas, ao mesmo tempo, gera uma pressão enorme que nem todos conseguem suportar. Antonio Giovinazzi e Pierre Gasly são dois bons exemplos disso: são rápidos na pista, mas mais lentos na adaptação que alguns de seus pares. E isso é quase um crime dentro da geração Verstappen.
No outro lado do espectro, Leclerc, Norris e Albon se adaptaram rapidamente, mas também erram acima da média. São eles mesmos que dizem que esta é sua lição de casa para a próxima temporada – e Lando e Alex mesmo admitem que precisam errar mesmo ao mesmo tempo em que devem ser mais agressivos, o inglês nas disputas na pista, e o tailandês no trabalho com os engenheiros, forçando mais a equipe a trabalhar para ele.
Dentro da mesma geração ainda temos Russell, que correu sozinho em sua temporada de estreia – e deve fazê-lo de novo em 2020. Ocon, que estará de volta tendo deixado algumas dúvidas no paddock antes de perder a vaga de titular. E Sainz, que já se mostrou tão veloz quanto Verstappen no passado, e hoje também prima pela consistência, especialmente aos domingos.
Na verdade, talvez ele e Max sejam exceções, mas todos esses pilotos parecem ter algo em comum: são muito fortes em classificação, área bastante exigente na Fórmula 1 devido ao formato aliado aos pneus e aos sistemas de recuperação de energia.
Fora das pistas, é uma geração que também deixa sua marca ao ter um cuidado todo especial com suas mídias sociais, contratando profissionais para fazê-las. Gostam de uma festa e não escondem isso – ainda que muita gente na Red Bull ache que Gasly gosta um pouco demais delas – mas também passam horas acertando seus carros virtuais e disputando corridas. Esse, inclusive, é um fator importante para a queima de etapas e a chegada precoce à Fórmula 1, o que indica que estamos vendo não uma coincidência, mas uma tendência que veio para ficar. E Hamilton talvez tenha que repensar logo logo sua promessa de aposentar quando perder uma corrida para alguém que nasceu nos anos 2000.
É a hora de tirar as dúvidas e saciar as curiosidades vocês no F1 on demand dessa semana, em que são os assinantes do projeto No Paddock da F1 com a Ju é que mandam:
Jessica Oliveira: Ju, te acompanhando um pouco mais de perto agora e vendo outros repórteres ao longo dos anos na Fórmula 1, acabo me perguntando o quão tarde vocês ficam no autódromo. Porque a corrida acaba por volta das 17:00 no horário europeu, e queria saber se existe horário limite que o repórter pode fica no mediacentre e como é para vocês após as corridas? São curiosidades dos bastidores.
Há limites de horários todos os dias, menos no domingo, em que o media centre tem que ficar aberto até o último jornalista sair. Geralmente, é algum japonês, já que eles trabalham com o fuso bastante complicado.
Todos os quatro dias de trabalho no circuito, de quinta a sábado, são de pelo menos 10h por dia para nós freelancers, que temos que atender a vários clientes. Já o pessoal dos tabloides ingleses, por exemplo, basicamente vão na coletiva do Hamilton, fazem uma matéria sobre ele e alguma coisa menor para o digital e vão embora bem mais cedo. E o pessoal de TV depende: quem faz a cabo geralmente não precisa ficar produzindo coisa para depois, faz o ao vivo e está liberado. Já os repórteres da Globo, por exemplo, têm de ter os textos aprovados antes de gravar, e isso pode virar uma novela dependendo do fuso.
Para mim, chego perto do horário do início das sessões porque geralmente estou com “vantagem” no fuso em relação ao Brasil. E fico por umas 10-12h. No dia da corrida, chego pelo menos 4h antes da largada e saio, no mínimo 5h depois da bandeirada. Isso se não tem alguma investigação que exige mudanças em todo o material já produzido, o que não é incomum. Mas o que tento fazer é deixar o material de segunda já pronto, uma vez que é o dia em que volto para casa. Alguma coisinha, contudo, sempre sobra para o avião.
Cleber Balieiro: Tenho a impressão de que a questão do desgaste dos pneus da Ferrari tem se tornado mais crítica – é isto mesmo?
Eu fiz uma pergunta nessa linha para o Vettel depois do GP de Abu Dhabi e ele nem me deixou terminar. “Eu discordo”, ele repetia. Disse que foram as pistas do início da segunda metade da temporada que deram a impressão de que a Ferrari tinha melhorado mais do que ela efetivamente tinha conseguido. Curiosamente, ele destacou o GP da Rússia como um ponto fora da curva, em que o time conseguiu um bom desempenho onde não esperava ir tão bem.
Mas que o final da temporada ferrarista foi confuso, isso foi. Por mais que Binotto jure que eles estavam experimentando com o nível de downforce dos EUA até o fim, esse período coincidiu com a chegada da diretiva técnica acerca do motor, que certamente foi a grande arma ferrarista, especialmente aos sábados.
Li sobre possibilidade de Vettel na Red Bull. Seria possível?
Escrevi sobre uma sensação que tive em Abu Dhabi, mas não tenho nenhuma informação, de fato, nesse sentido. Desde que saiu da Red Bull, Vettel mantém uma boa relação com Horner e com Newey, que gosta muito dele. E, por mais que ele tenha crescido especialmente aos domingos a partir de Singapura, o mais natural é que a Ferrari vire a equipe de Leclerc. A vontade política é forte e as performances dele sustentam isso. Assim, se a vontade dele for realmente ficar na F1, tentar uma volta nesse “relacionamento antigo” é uma saída que vale a pena.
E por que digo “se a vontade dele for realmente ficar”? É porque lembro da entrevista que ele deu em Austin logo depois das regras de 2021 terem sido anunciadas. Ele disse que queria estudar com calma, mas de supetão basicamente reclamou de tudo o que foi decidido.
Um carro de Fórmula 1 nunca é feito especificamente para uma pista ou um tipo de situação. No sábado, Lewis Hamilton explicava, por exemplo, que a Mercedes focou tanto em melhorar o carro para as corridas, depois de sempre sofrer quando estava no tráfego nos anos anteriores que o carro decaiu bastante na classificação. Mas existe algo na filosofia do carro alemão nos últimos seis anos que se casa perfeitamente com o circuito de Abu Dhabi.
Agora já são seis vitórias, vindas de seis vezes em que os dois carros prateados também fizeram os melhores tempos na classificação. A vantagem, como nos anos anteriores, veio principalmente no travado terceiro setor. A Mercedes é boa em curvas de baixa e no cuidado com os pneus e, no asfalto abrasivo de Yas Marina, são dois trunfos importantes.
Com Valtteri Bottas fora da luta pela vitória pela punição pela troca de motor, Hamilton passeou em sua última corrida com o carro que lhe ajudou a conquistar o hexa, alheio ao alto consumo de pneus que complicou a vida das Ferrari, cujo carro escorregava muito principalmente no tal terceiro setor.
Na largada, as duas Red Bull pareceram sofrer com o aquecimento dos pneus médios com os quais escolheram largar: Verstappen foi superado por Leclerc e Albon sofreu para permanecer à frente das duas McLaren. Único no top 5 que escolheu largar com os macios, por estar se sentindo melhor com o composto que dá mais aderência nas entradas de curva, Sebastian Vettel não conseguiu aproveitar a aderência superior para ganhar posições, e as primeiras colocações ficaram com Hamilton (já claramente muito superior), Leclerc, Verstappen, Vettel e Albon.
A Pirelli previa que seria uma corrida feita facilmente com uma parada para quem largasse com o médio, mas não para o macio. Ou seja, seria mais uma daquelas em que o 11º colocado no grid – Perez – seria premiado na batalha do meio do pelotão, como de fato aconteceu (ainda que ele tivesse que esperar até a última volta para passar Norris, se arrastando após fazer só uma parada).
O fato das duas McLaren e das duas Renault (os quatro carros mais lentos que tiveram que largar com o macio porque estavam no top 10) estarem travando o pelotão poderia ter ajudado e muito Valtteri Bottas a chegar no pódio que ele almejava (mesmo reconhecendo que um pódio sem champanhe não era lá essas coisas para ele), mas uma pane no sistema que controla os dados da FIA que controlam quem pode ativar o DRS fez com que a asa móvel fosse desabilitada por 16 voltas, bem no momento mais crucial para Bottas deixar o pelotão para trás. Após a bandeirada, o diretor de provas Michael Masi não quis falar de quem foi a culpa, mas a forte presença de gente da FOM na sala (algo que eu só tinha visto quando deu aquele outro rolo da corrida ter terminado uma volta antes devido a uma falha do painel, no Japão) deu um belo indicativo de quem cuida do tal sistema.
Além de dificultar a vida de Bottas, a falha do DRS também fez com que as duas McLaren e Ricciardo, que anteciparam suas paradas, ficassem presos atrás da Haas de Grosjean, facilitando a vida de Hulkenberg – e mesmo assim ele terminaria a prova fora dos pontos.
Voltando à disputa da frente, quando a janela de pitstops abriu a Ferrari tinha o seguinte problema: Leclerc, mesmo com os médios, e Vettel, que tinha conseguido fazer mais voltas do que se imaginava com os macios, estavam reclamando do desgaste. E o monegasco não tinha conseguido abrir em relação a Verstappen. Temendo que a Red Bull fizesse um undercut, a decisão foi parar os dois na mesma volta. E um problema para trocar o traseiro esquerdo de Vettel lhe custou 1s5. Foi o suficiente para a Red Bull tentar reagir e chamar Albon, mas ele não ganhou tempo o suficiente para voltar à frente de Vettel.
Hamilton, Verstappen e Bottas continuaram na pista, com missões diferentes: Bottas tinha que esperar até ter o equivalente a um pit stop de vantagem para o pelotão B; Verstappen tinha que abrir também um pitstop de diferença para Leclerc e Hamilton tinha que esperar Verstappen parar.
Só o holandês não conseguiu, e acabou voltando 5s atrás da Ferrari, embora com muito mais ritmo. Com o DRS funcionando novamente, não teve dificuldade para passar o monegasco e retomar o segundo lugar. Bottas, com pneus mais novos e toda a potência do motor, vinha sendo 1s por volta mais rápido quando passou Albon.
Pouco antes disso, Vettel tinha ido para o box para sua segunda parada, na volta 38. A tentativa era, já imaginando que seria superado na pista, como Leclerc tinha acabado de ser, tentar algo diferente. E foi um pedido do alemão.
O mesmo estava acontecendo no outro cockpit, algo curioso três corrida depois que Leclerc prometeu ser mais assertivo no rádio quanto à estratégia, após aceitar passivamente a tática de duas paradas que o tirou da vitória no México. O monegasco insistiu muito para que o parassem até ser atendido. Curiosamente, foi mais uma parada dupla da Ferrari, e de novo Vettel perdeu mais tempo que Leclerc.
Quem também pediu para mudar de estratégia foi Carlos Sainz, que com isso chegou na frente das duas Renault na briga particular entre os que largaram com o macio no top 10. Já Norris teve um ritmo tão bom que quase bateu os dois mais bem colocados que largaram com os médios na luta da F1 B – sofreu a ultrapassagem de Perez na última volta, mas superou Kvyat.
Lá na frente, Hamilton se despediu de 2019 com uma vitória absoluta, com Verstappen em segundo e Leclerc em terceiro, segurando-se para não ser superado por Bottas mesmo com pneus mais novos, evidenciando uma tarde dura para a Ferrari. Vettel ainda conseguiu superar Albon mesmo com um pitstop a mais e o tailandês fechou o top 6 de uma corrida até mais movimentada que o normal em Abu Dhabi, mas sem surpresas.
O último GP do ano começou com Valtteri Bottas mandando indiretas na entrevista coletiva, dias depois de sua mulher, Emilia, ter pedido o divórcio. Foi uma entrevista cheia de “eu tenho que ser uma pessoa melhor, assim como um piloto melhor”, então dava para ter uma boa ideia do que aconteceu, né? Pelo menos sabe-se que ele tinha um contrato pré-nupcial, então ficou mais o prejuízo moral do que o financeiro. Mas que doeu, doeu.
O terceiro filho de Sebastian Vettel – o primeiro menino – nasceu às vésperas do GP, e fez o alemão chegar só na madrugada da quinta para sexta, horas antes do primeiro treino livre. Curiosamente, Vettel veio com o pai para a corrida. No final das contas, ele escapou das perguntas sobre o incidente do Brasil, pelo qual, a julgar pelas declarações de Leclerc e Binotto, foi considerado culpado dentro da equipe. Por todo o final de semana, não parecia muito presente, o que não tem sido exatamente incomum.
Aproveitando a deixa, fui pedir para Kimi Raikkonen conselhos para o pai de menino de primeira viagem, já que ele recentemente revelou que não acharia que ficaria tão nervoso ao ver o filho correr. “Primeiro, ele não está correndo, é só um hobby!”, disse Kimi, rindo. Parece que ele está falando em voz alta para ver se acredita. (Aliás, falando em GP Brasil, Toto Wolff me garantiu que a mesa da casa dele ficou intacta mesmo com os dois pilotos fora do pódio)
Nos bastidores de Abu Dhabi, corre a informação de que as equipes estão pressionando a Pirelli para não adotar os pneus que eles fizeram para 2020 e que estão sendo testados nesta semana. Isso porque, quando os protótipos foram usados nos treinos livres no GP dos EUA, os pilotos reclamaram muito de falta de aderência. Do lado da Pirelli, a justificativa era de que os carros não estavam ajustados aos novos compostos e, para o teste, a pressão será diminuída em 1.5 psi, o que é significativo, porque, nos demais testes, eles conseguiram resultados melhores nessa configuração. Mas não deixa de ser irônico que as equipes queiram manter os pneus que deram tanta dor de cabeça no começo do ano. Lembremos que eles até votaram em junho para voltar aos compostos de 2018!
Em mais um round para ver quem fica com o GP do Brasil a partir de 2021, JR Pereira, promotor do Rio, e Alan Adler, que entrou na jogada de Interlagos devido à resistência da Liberty em relação ao promotor atual, estavam perambulando pelo paddock em Abu Dhabi. Flavio e Eduardo Bolsonaro, por motivos diferentes, também estavam por lá. Flavio foi mesmo com a missão de acalmar a Liberty acerca dos temores em relação às questões ambientais que permeiam a construção do circuito no Rio – e inclusive foi munido de camisetas da seleção brasileira com os nomes de Chase Carey e Lewis Hamilton – e Eduardo estava em visita oficial aos Emirados Árabes.
Conversei com Sergio Sette Camara logo depois da pole position dele em Abu Dhabi, e novamente após o final de uma etapa em que venceu no sábado e foi terceiro no domingo, de longe seu melhor na categoria. E a mentalidade dele me pareceu bem clara – e correta: ou ficar na F2 só se for equipe que permita lutar por vitórias (e me parece que não há mais vagas desse tipo) ou ir com a superlicença garantida para outro campeonato mais forte e usar exemplos como Hartley, Wehrlein e até mesmo Albon para manter vivo o sonho da F-1 ou mesmo da F-E. Por conta disso, ele está com negociações avançadas com a Indy.
Mas isso significa que o Brasil ficará sem piloto na F-1 e na F-2? Pedro Piquet está perto de ser anunciado na equipe júnior da Sauber, pela qual ele testa nesta semana em Abu Dhabi. Outro que chega da F-3 para o grid da F-2 é o campeão Robert Shwartzman, que vai ser companheiro de Mick Schumacher na Prema. Sobre isso, ouvi a frase mais engraçada do fim de semana no mais experiente jornalista do paddock, um suíço, muito próximo a Michael. “Ele vai destruir o Mick, isso é um absurdo”. Sim, ele estava falando sério. E, sim também, Shwartzman foi campeão num grid forte na F-3 com Armstrong, Vips e outros, e seria uma surpresa se ele não superasse Mick até com facilidade ao longo da temporada. A não ser que a politicagem que sempre foi forte na F-2 falar mais alto.
Um Lewis Hamilton irrepreensível, compensando com juros e correção o erro das últimas voltas do GP do Brasil – foi ele mesmo quem disse que fazia questão de ser perfeito em Abu Dhabi depois do toque com Alex Albon. Ao seu lado no pódio, seus dois herdeiros mais óbvios, com Max Verstappen na frente, outro retrato da temporada. Ainda que Charles Leclerc tenha impressionado muitos que talvez não tinham prestado tanta atenção ao seu grande ano de estreia, ele ainda parece errar um pouco mais que Max, embora sua curva de aprendizado pareça ser mais inclinada. Com Hamilton fazendo questão de dizer durante todo o final de semana que estava se sentindo “com 22 anos”, não coincidentemente a mesma idade de Max e Charles, é justo dizer que o pódio foi o reflexo não só desta temporada da F-1, mas foi também um aperitivo para o ano que vem.
A etapa que colocou um ponto final em uma temporada que todos que trabalham no esporte concordam que foi longa demais deixou também outros “sinais”. Mesmo em um circuito que, em teoria, não favorece seu carro, a McLaren pontuou com os dois carros, com a maior experiência de Carlos Sainz aparecendo quando o espanhol viu que o pneu duro estava durando menos que o esperado e pediu para parar de novo. Ele já estava atrás de Lando Norris naquele momento, e chegou atrás, mas pelo menos conseguiu usar a aderência extra do pneu novo para superar as Renault. Foi impressionante a evolução da McLaren neste ano e muito disso teve a ver com a maneira aberta como Sainz e Norris trabalharam. E os poucos erros que eles cometeram na pista – ainda que o próprio Norris estivesse lamentando o que ele sentiu que foi falta de agressividade na pista, e prometendo uma nova versão de si para o ano que vem.
A corrida teve também uma não-corrida de Sebastian Vettel, para “coroar” uma não-temporada. Ele mesmo admite que não teve um bom ano e fiquei em dúvida neste fim de semana se não está ensaiando um retorno à Red Bull, vendo que perdeu, definitivamente, terreno na Ferrari.
Pelo menos teremos muitas especulações para fazer durante o que se chama na F-1 de férias de inverno – menos para Daniel Ricciardo, que estava jogando na cara de todos que voltará para a Austrália, onde será verão, como no Brasil: Lewis Hamilton deu mil e uma voltas quando foi perguntado se havia sentado para conversar com a Ferrari, e não negou. Deixou claro que seu futuro depende muito do que Toto Wolff vai fazer. Não é segredo que se estabeleceu uma espécie de simbiose entre os dois e, como Michael Schumacher já ensinou no passado, não se muda de equipe sozinho.
Hummus pra que te quero é o lema de Abu Dhabi, não muito diferente do Bahrein. A pasta de grão de bico e a carne de cordeiro são os carros-chefes – e a mistura dos dois, na foto, foi a melhor versão de hummus que já comi. E olha que foram vários nas minhas andanças pelo Oriente Médio…
Tenho que admitir, contudo, que não experimentei ainda nenhum dos pratos típicos de Abu Dhabi. Na verdade, é um pouco difícil escolher lugares para comer por lá. Na cidade, diferentemente das proximidades da pista, os estabelecimentos são muitas vezes tão simples que você fica meio sem saber se arrisca ou não, e não é raro acabarmos comendo em hotéis ou na pista mesmo, onde ganhamos um voucher diário para pegar um prato de comida (então minha tática é pegar uma salada ou sanduíche na sala de imprensa para comer à noite e almoçar na Mercedes, como forma de economizar também).
Aliás, falando em economizar, o melhor mesmo em Abu Dhabi é ficar no chá: como em todo país muçulmano, não é em todo restaurante que se encontra álcool e, nos Emirados, quando encontrar a bebida certamente terá preços proibitivos. Lembro de ter visto cerveja sendo vendida a 16 euros nas proximidades do circuito. Um copo, tá?
Feito o parênteses, tudo isso então significa que eu não experimentei pratos que tive de consultar o Google para conhecer. Aí está o top 5 da culinária local: harees, outra pasta, feita de trigo, frango e sal; machboos, arroz com carne temperado com especiarias como açafrão; safrona, uma sopa de carne com legumes, e madrooba, um tipo de peixe. Comer peixes e frutos do mar em Abu Dhabi – como também na vizinha Dubai – é uma ótima pedida sempre. Mar é o que não falta ao redor!
Todas essas comidas são bastante simples, mas o que marca a culinária árabe são os temperos: cominho, noz-moscada, açafrão, cardamomo, são todos temperos muito densos e que deixam a comida com um tom meio de terra, talvez para combinar com o cenário desértico ao redor. E sempre, claro, as refeições são acompanhadas de pão árabe, delicioso.
A exemplo do Japão, também gosto de ir no supermercado em Abu Dhabi para me perder nos temperos de lá – e nos pistaches também! Mas tenho que focar para ficar longe das sobremesas, divinas, apesar de extremamente doces. Há uns dois anos comprei halva no supermercado, pensando em levar para minha família no Brasil experimentar. Mas cometi o erro de abrir. E até hoje estão esperando a tal halva lá em casa.
Trata-se de um doce – muuuuito doce – com base de mel e gergelim, que pode ter vários acompanhamentos – no caso, comprei com pistache, um dos meus sabores preferidos na face da terra, e os culpo por ter acabado com um doce que não era pequeno em cinco dias (talvez quatro) sozinha. Falando em doce, além da clássica baklava, lokma é outra gordice boa de se comer naquela região, uma massinha doce frita, sobre a qual eu já falei no Turistando de Marrakesh no começo do ano. Era de lokma o cheiro que senti na rua e automaticamente associei à Jordânia, onde tinha conhecido a sobremesa.
Doces e hummus à parte, acaba não sendo uma etapa gastronômica para acabar a temporada até porque as atividades de pista começam mais tarde por lá e saímos quando a cidade está querendo mais é dormir.
Julianne Cerasoli entrevista Daniel Ricciardo, com perguntas dos fãs. São mais de 20 minutos de momentos hilários. E uma ou outra resposta mais séria. É aqui que ele revela seu amor pelo brigadeiro.
Na primeira parte do especial tratei das variáveis que estão na cabeça dos estrategistas quando eles tomam decisões que, muitas vezes, ficamos sem entender logo de cara. Afinal, escolher o número de paradas e os compostos de pneu depende de inúmeros fatores, e é comum diferentes equipes terem leituras distintas.
À primeira análise, escolher o número de paradas e o composto a ser utilizado em cada uma delas é fundamental quando se fala em estratégias, mas não é tudo. Nesta segunda parte, o foco é em como o ritmo é decisivo para a estratégia, e em como decidir a hora exata para fazer a parada.
Como o ritmo vira estratégia?
Lewis Hamilton começou a perceber que Max Verstappen tinha largado no GP Brasil determinado a fazer duas paradas logo no início da corrida. Ele avisou seu engenheiro: “Ele está forçando, eu quero ir também.” Por que Hamilton não decide aumentar o ritmo sozinho? Por que os pilotos dependem tanto dos engenheiros? Não é por falta de talento deles, mas sim pela forma como o ritmo de corrida atua diretamente na estratégia.
Mas por que isso não existia antigamente? É simplesmente pela falta de informações. Hoje, as equipes controlam tudo, dos traços de GPS, para determinar onde estão os demais carros, à temperatura dos pneus. Ou seja, eles têm a imagem do todo e os pilotos sabem disso. Sabem, também, que sua melhor chance é confiar em quem tem essa imagem do todo.
Voltando à história do GP Brasil. Pelo ritmo de Verstappen no início da prova, a Mercedes tinha motivos para acreditar que ele faria duas paradas. E por que a Red Bull decidiu isso de antemão? Porque sabiam de sua vantagem nas retas, o que daria mais chances de Max fazer ultrapassagens caso isso fosse necessário – e também por saberem que, no Brasil, as manobras são possíveis nas zonas de DRS.
Há, também, o cenário totalmente contrário. Em algumas pistas, principalmente as de rua, as ultrapassagens são tão difíceis que, na linguagem dos estrategistas, a posição de pista é soberana. Ou seja, mesmo se, no papel, for mais rápido fazer duas paradas, a melhor opção é adotar um ritmo mais conservador e fazer uma parada a menor. Essa tática tem ainda outras vantagens, e por isso é muito usada: quando é necessário um delta grande entre dois carros para se fazer uma ultrapassagem, como em Austin, por exemplo, vale adotar um ritmo mais lento para fazer com que o rival fique no ar turbulento e acabe antes com seus pneus, ainda que isso gere um foco de tensão que vamos discutir um pouco mais adiante…
O exemplo máximo dessa tática de segurar o ritmo na temporada foi o GP de Singapura. A missão do pole Leclerc, numa pista em que as ultrapassagens são raridade, era adotar o ritmo mais lento possível para que o pelotão ficasse tão compacto que ninguém tentaria o undercut, pois voltaria no trânsito. O que aconteceu para a tática não dar certo para Leclerc (para a Ferrari, saiu melhor que a encomenda) foi bem documentado na época, mas teve mais a ver com a execução do que com a tática em si.
De olho no SC
Um dos dados aos quais os estrategistas ficam de olho é na taxa de probabilidade de Safety Car de cada pista. Em Singapura, por exemplo, ela é de 100%, pois nunca uma corrida passou em branco por lá. Isso faz com as táticas fiquem mais abertas, e abre a chance, especialmente para quem larga mais atrás, de já sair com um composto mais duro, por exemplo, e ficar na pista justamente esperando o SC.
Isso porque os engenheiros têm todos os números, e sabem quando é mais provável que o SC apareça – em algumas pistas mais travadas, é nas primeiras voltas (quando a avaliação prévia é saber se seria possível colocar o composto mais duro disponível e ir até o final); em outras, quando os pneus começam a se degradar, os carros ficam mais difíceis de pilotar e carros se encontram na pista em estratégias diferentes.
Como decidir a hora de parar
A resposta mais óbvia seria: quando os pneus acabarem. Mas não é tão simples assim. O primeiro dado importante é o que está acontecendo na pista 20, 22s atrás do carro, já que ele não pode voltar com o pneu novo, e tendo a chance de usar o rendimento da borracha nova, no trânsito.
Antes da corrida, os estrategistas fazem as simulações das maneiras mais velozes de se terminar a corrida – e na hora da prova, cruzam isso com a posição de pista dos pilotos. Vamos supor que você está em primeiro e consegue deixar pelo menos 5s para o segundo colocado no final de cada stint. Isso quer dizer que você vai fazer a estratégia otimizada, pois só dependerá de você.
Mas o que vimos nas últimas corridas foram os times mexendo na estratégia para tentar ganhar posições ou se defenderem, e aí que as provas ficam interessantes. Como a Mercedes chamou Hamilton cedo no México, e confiou que ele se viraria quando atacado no final por Vettel. Ali, o time inglês temia um undercut da Ferrari, e por isso arriscou. Vettel vinha próximo de Hamilton na pista e, se parasse antes do inglês, muito provavelmente voltaria à frente. Por isso, chamou Lewis antes do previsto. A Ferrari viu a jogada e, já sabendo que Vettel não ganharia a posição naquele momento, esperou para chamar Seb na esperança de que a borracha mais nova o ajudasse no final.
É mais comum o undercut ser melhor que o overcut, ou seja, numa luta direta por posição, as duas equipes vão monitorar se há espaço para voltar sem trânsito e parar o quanto antes assim que está aberta a janela de pit stops (pré-determinada por cada time com base na tática mais rápida para terminar a corrida), ou para tentar ganhar a posição, ou para defendê-la.
O pior cenário, é claro, é quando são companheiros de equipe que estão disputando posição. Cada equipe tem uma abordagem diferente para isso. Na Mercedes, eles costumam dividir as estratégias, o que por vezes dá vantagem para quem está atrás, enquanto na Ferrari parece haver uma divisão entre as equipes de cada piloto, com pouca informação sendo compartilhada. De qualquer forma, é algo que sempre traz polêmica.
Lá nos idos de 1975, em uma semana como esta, Graham Hill voltava com outros quatro integrantes de sua equipe, a Embassy Hill, de um teste em Paul Ricard e seguia a caminho de uma festa em Londres sob intensa neblina. Devido à falta de visibilidade, Hill não percebeu que voava muito perto das árvores quando passava por um campo de golfe. Bateu em uma delas e o avião pegou fogo. Nenhum dos cinco sobreviveu.
Foi assim que acabou a trajetória, aos 46 anos, daquele que é o único até hoje a ter conquistado a Tríplice Coroa, além de dois títulos na F-1.
Conhecido pelo estilo empreendedor e desbravador, e pelo ótimo senso de humor, Hill demorou para se tornar piloto. Na verdade, tirou sua carteira de motorista aos 24 anos e dizia que seu primeiro carro, de tão ruim, foi importante para que ele desenvolvesse uma característica importante nas corridas: saber antecipar o que viria adiante.
Seu primeiro esporte, na verdade, foi o remo, algo que permaneceu como sua marca registrada no desenho do capacete, depois copiado pelo filho Damon. As corridas surgiram na sua vida devido ao trabalho na parte mecânica. Cursando a escola técnica, tornou-se aprendiz de engenheiro e chegou a servir à marinha britânica como engenheiro. Já fora da carreira militar, embora tivesse mais interesse em motos, resolveu entrar em uma corrida de F3 e, a partir daí, passou a apostar no automobilismo.
Na Lotus, contudo, começou como mecânico, mas logo tornou-se piloto, estreando na F1 no GP de Mônaco de 1958. O Principado, inclusive, seria como uma segunda casa para Hill, vencedor por 5 vezes em Monte Carlo e conhecido como o Mr. Mônaco. Sempre foi tido mais como um piloto que trabalhava duro do que um virtuoso.
O britânico trocaria a Lotus pela BRM e seria campeão com o time em 62, mas voltaria ainda na década de 1960, dominada pelo outro piloto do time, Jim Clark. Após a morte do escocês, no início de 68, coube a Hill desenvolver o Lotus 49 e chegar ao segundo título.
Os bons tempos, contudo, não durariam muito. No GP da Espanha de 1969, Hill sofreu grave acidente e quebrou as pernas. A partir dali, não teve mais resultados muito expressivos na F-1, ainda que tenha conquistado a vitória nas 24h de Le Mans em 1972. As 500 Milhas de Indianápolis, por sua vez, ele tinha vencido em 66, em época que ficou conhecida como a invasão britânica pela quantidade de pilotos do país que se espalhava pelas vitórias também fora da Europa.
Apesar de ter começado na F-1 relativamente tarde, já perto dos 30 anos, Hill teve a carreira mais longa de sua geração: a marca de 176 GPs disputados só seria batida nos anos 1980, já com mais corridas no calendário e a família Hill foi a primeira a ter dois campeões do mundo.
No F1 on demand dessa semana, tiro as dúvidas do Marcelo Kanno, que é um dos Credenciados no projeto do Catarse No Paddock da F1 com a Ju.
Pierre Gasly sabe o motivo da diferença de desempenho que ele teve na Red Bull, e agora que ele voltou para a Toro Rosso? Me parece que ele vem fazendo boas corridas ultimamente, ele entendeu qual diferença nos carros ajuda/atrapalha ele (ou foi só “cabeça” mesmo)? Ele vai ter ou teve a oportunidade de sentar com os engenheiros da Red Bull novamente para discutir isso?
Ele diz que, por diversos motivos, estava usando 80% do seu potencial na Red Bull. Sei que ele teve problemas com o engenheiro de pista e que havia problemas dentro da equipe de engenheiros que trabalhavam diretamente com ele, então quando ele diz que aprendeu o quanto a F1 é um esporte de equipe, provavelmente está se referindo a isso. E do lado dele o que se questiona no paddock é o nível de foco. Pierre gosta das suas baladas, de se divertir com os amigos, e há quem avalie que ele estava exagerando.
Alguma novidade sobre alguns dos rumores/assuntos como por exemplo: Situação do Pietro na Haas e do Sette Camara na Mclaren, Haas está a venda mesmo, Vietnam vai acontecer mesmo ano que vem…
Pietro deve fechar com a Haas nos próximos dias, e vou falar com o Serginho sobre futuro quando encontrá-lo em Abu Dhabi. Essas conversas de venda da Haas deram uma acalmada depois da divulgação do regulamento de 2021, mas Gene é um cara com faro para negócio e, se aparecer um interessado, vende. Sobre o Vietnã, me pergunte em janeiro, quando alguns membros da F1 vão para lá acompanhar a situação de perto. Mas agora passou a época das chuvas e a obra está andando.
Curiosidade 1: Como os “VIPs” conseguem passes de paddock para as corridas? Eles pagam, ou só pedem para a F1/FIA/equipes e conseguem? Por exemplo, se o Rubinho quer ir numa corrida, ele tem passe livre para entrar no paddock, ou tem que pedir pra alguém? E alguma outra celebridade, são as equipes / F1 que convidam?
Eles podem ou ser convidados por equipes/patrocinadores, como também podem pedir. O exemplo que você citou do Rubinho: provavelmente ele pediu direto para a F1, já que não estava em nenhuma equipe. O Matthew McConaughey, que entrevistei em Austin, estava a convite da Mercedes. Fica escrito na credencial: Mercedes guest, F1 guest, e assim vai. Para os ‘reles mortais’, é possível pagar. Dei uma olhada em quanto fica para o GP de Abu Dhabi na semana que vem e, quem tiver 30 mil reais sobrando pode ter acesso de um dia ao paddock e passar o resto do final de semana no paddock club. Pelo menos a comida e bebida são ‘de graça’.
Curiosidade 2: Como você consegue os passes de imprensa para ter acesso ao paddock, sendo freelancer? A FIA/F1 pede que tipos de comprovação do seu trabalho, se você não tiver uma emissora por trás (sei que você tem a BandNews FM, mas e se não tivesse, conseguiria cobrir a F1 sendo totalmente independente, só com conteúdo na internet?)
Minha credencial é pelo UOL Esporte. Você tem de mostrar os números de audiência/cliques para comprovar que o meio que representa é relevante. Há casos de freelancers que têm só seu nome na credencial, mas isso acontece com gente já com muito tempo de “casa”. Os meninos do Projeto Motor, por exemplo, conseguem credencial. É só comprovar os números de tráfego.
Tão logo acabou o GP do Brasil, Ross Brawn afirmou que a corrida do último domingo era um caso a ser estudado. Quer tirar exemplos para, quem sabe, mudar alguma regra para que provas como a que vimos em Interlagos sejam mais comuns. Ora, um fator que ajudou a abrir a primeira parte da corrida, fazendo inclusive time grande errar foi a diferença de temperatura da chuvosa sexta para o ensolarado domingo, de 24C para 48C na pista. O que fazer então, controlar o clima? Não é de hoje (ou de domingo) que está claro que diminuir os dados das equipes antes da corrida ajuda, mas eles insistiram em manter os treinos livres como estão para 2021, apenas fazendo com que o parc fermé comece mais cedo (ou seja, mudanças fundamentais não poderão ser feitas depois que começa o FP3).
Essa falta de conhecimento sobre quanto os compostos durariam no calor e qual deles seria a melhor opção pautou a primeira parte da corrida, que foi emocionante, mas que tinha tudo para se estabilizar.
A corrida começou quente, com Hamilton passando Vettel por fora, Leclerc deixando para trás Norris e Ricciardo, que potencialmente poderiam complicar sua vida, chegando em 10 voltas aos sexto lugar, e Sainz pulando de 20º para 15º em quatro voltas. A evolução rápida de Leclerc deveria ter chamado a atenção para o rendimento do pneu médio, mas nem todas as equipes entenderam o recado.
Embora a Pirelli insistisse que, com as temperaturas mais altas, o duro poderia entrar em ação, a opção para este ano tinha sido levar a Interlagos os três compostos mais duros (C1, C2 e C3) e, por isso, embora durável, ele era lento demais. O jeito, então, seria fazer duas paradas.
Lá na frente, a Mercedes logo entendeu que essa era a única chance de vencer a corrida com Hamilton, que vinha tirando, pouco a pouco, a vantagem de Verstappen na ponta. O melhor trato com os pneus era o único trunfo que a Mercedes tinha neste final de semana, algo que tem a ver com a altitude, como também é o resultado da maneira como a Honda lidou com seus motores durante o ano: o fato dos motores Honda, trocados pela última vez na Rússia, estarem mais frescos, além de já lidarem melhor trabalhando com menos oxigênio no ar, fez a diferença.
Mesmo assim, Lewis Hamilton construiu uma chance de ouro: na volta 20, tinha chegado perto o suficiente, a menos de 2s, de Max Verstappen, que começava a ter dificuldades com os pneus. Era a hora de tentar o undercut. O inglês fez sua parada e voou na volta de retorno dos boxes. Mas ele precisava de mais do que isso: sabendo da vantagem de potência do motor Honda em Interlagos, era fundamental que ele escapasse da zona de DRS, caso contrário não conseguiria responder. Para isso, tinha que desligar a função de recarga automática das baterias na segunda volta após a parada, quando já tinha Max na sua cola (já que o undercut tinha funcionado e Verstappen, mesmo respondendo à parada de Hamilton na volta seguinte, tinha voltado atrás) para tentar abrir pelo menos 1s.
Mas a tática não deu certo. Hamilton chegou a fugir do DRS no primeiro ponto de ativação, na reta principal, mas já tinha acabado com suas baterias. Teria que sobreviver uma volta para carregá-las de novo. Max não lhe deu esse luxo, e o passou com mais de 30km/h de vantagem do DRS na reta oposta + a diferença da energia híbrida.
Com um ritmo inferior (na volta 20, Sebastian Vettel já estava a mais de 7s do líder), restou à Ferrari tentar deixar em aberto se adotaria a tática de uma parada, chamando o alemão só na volta 25 e colocando-o com os médios, enquanto Hamilton e Verstappen tinham se comprometido a fazer duas paradas, com os macios. Sua função era se manter a menos de 22s dos líderes e fazer com que eles tivessem que ultrapassá-lo na pista no final. Porém, parecia uma missão quase impossível.
Na volta 43, a Mercedes encontrou outro vão na pista para, novamente, tentar o undercut com Hamilton em cima de Verstappen. Mas, sabendo o que tinha acontecido da primeira vez, a Red Bull sequer pensou em antecipar a parada de Max para se defender. E, de fato, não funcionou. Verstappen parou na volta seguinte e se manteve na ponta.
Bottas estava sofrendo com o equilíbrio do carro e a Mercedes cometeu o erro de colocá-lo no lento composto duro, algo que teve de corrigir 15 voltas depois. Curiosamente, a Ferrari cometeria o mesmo erro com Leclerc três voltas depois, mas deixaria por isso mesmo. A parada a mais o colocou atrás do monegasco e seu motor, que já dava sinais de estar no fim da vida útil desde a classificação, quando ele era muito mais lento que os demais nas retas, abriu o bico. O finlandês parou o carro num lugar seguro, mas ele ficou travado num buraco e os fiscais não conseguiram retirá-lo sem o trator – Ross, taí uma receita infalível! – e o SC teve de ser chamado.
Faltavam 20 voltas para o final, Vettel já tinha desistido da tática de uma parada, o carro mais rápido do fim de semana estava na frente e só cinco pilotos estavam na mesma volta. Tinha tudo para ser um fim de corrida processional até o SC provocado por Bottas. E tudo o que aconteceu dali em diante foi definido por este momento, já que alguns pilotos aproveitaram para parar, outros não, gerando diferenças entre compostos, e a regra que permite que os carros recuperem uma volta colocaria o meio do pelotão de volta na briga.
Sabendo que Hamilton pararia caso Verstappen seguisse reto, a Red Bull chamou o holandês, decisão difícil de tomar para quem está na ponta, mas muito mais fácil numa pista como Interlagos do que em Mônaco, para dar um exemplo extremo. Lewis fez o inverso do rival, como era de se esperar, e passou a pedir toda potência do mundo para a relargada, sabendo que seria atacado.
Mais atrás, Sainz estava em nono antes do SC, num misto das ultrapassagens que fez e da adoção da tática de uma parada, que ele seria o único a conseguir executar. Começaria a parte mais impressionante da sua corrida, conseguindo se segurar como pelotão compactado e pneus mais velhos. Mas ele contou com a sorte também, pois estava “protegido” por Raikkonen e Giovinazzi, que também não pararam e estavam logo atrás. Mais à frente, Albon não parou, depois passou Vettel, que também ficou na pista, e pulou para terceiro, deixando o alemão na mira de Leclerc, que tinha borracha nova.
O que aconteceu na briga das Ferrari ficou bem documentado. Com os dois fora, Gasly, que tivera um ótimo ritmo o tempo todo, mantendo-se em sétimo correndo sozinho por toda a corrida, agora aproveitava que três carros dos grandes tinham saído de sua frente e era o quarto. Com sua parada a menos, Sainz era quinto, seguido pelas duas Alfa. No final das contas, todos os que decidiram não parar no SC de Bottas se deram bem. Menos Hamilton, que seria engolido por Verstappen, por fora. Como muitas vezes aconteceu com o inglês contra seus adversários, não importaria a tática, o carro mais rápido do dia ganharia.
O hexacampeão ainda tentou uma última cartada, pedindo para fazer o pitstop no SC seguinte, causado pelas Ferrari, na volta 66. Voltando em quarto, ele teria 5 voltas para recuperar o terreno perdido, e partiu para o tudo ou nada, passando Gasly, mas errando na dose com Albon. Com o toque entre ambos, o francês agradeceu e conquistou o primeiro pódio, com o segundo lugar. Hamilton ainda conseguiu continuar e cruzou em terceiro, mas foi punido pelo toque e Sainz acabou comemorando, também, seu primeiro pódio.
Em última análise, foram os detalhes da era híbrida que fizeram Interlagos vibrar como nos velhos tempos: o “apagão” de Hamilton e, principalmente, o desgaste de motores que têm de fazer pelo menos sete corridas para amortizar parte dos gastos com uma unidade de potência cara demais.
Não sou uma pessoa que se emociona facilmente. Na Fórmula 1, lembrava de ter segurado as lágrimas só duas vezes. Uma na primeira vez que tive acesso ao grid, em Interlagos, em 2012,
e vi meus amigos, aqueles que tinha conhecido justamente lá na arquibancada A, acenando de volta para mim. Na outra foi quando encerramos, eu e o Ico, a transmissão do GP de Abu Dhabi de 2016, em que ele, um irmão para mim, fez seu discurso de despedida e de “passada de bastão” para mim na Band.
Então sei lá o que deu em mim no último domingo, no que foi meu 100º GP cobrindo a F-1 in loco. Um misto da energia positiva que recebi de todo mundo que se apertou lá no nosso encontro da sexta, e por todo fim de semana, e da ajuda que tive de algumas das boas almas do paddock que são o que vale a pena rodar o mundo e que confiaram em mim para fazer outras boas almas brilharem. A homenagem ao Ayrton me tocou demais, assim como ver a Bia e a Aninha levantando a galera no grid.
Na manhã de domingo tinha ido até onde o MP4/4 estava – infelizmente, bem longe do paddock a contragosto da Liberty Media, e é por detalhes como este que eles levam tão a sério a proposta do Rio mesmo com as questões que pairam sob a construção do autódromo por lá – e, na volta, passei pelo local onde estavam expostos vários capacetes e troféus de Ayrton. Na caminhada de volta ao paddock, ouço o Tema da Vitória com narração do Galvão ao fundo. Sabe a famosa saudade do que a gente não viveu? Imaginei como seria estar me preparando para entrar no ar com ele no grid.
Fui correndo acompanhar o carro da mureta, com as arquibancadas cantando o olê olê olê olá, Senna, Senna. E vejo primeiro Caio Collet, com seus 17 anos, fazendo o mesmo. Caminho um pouco mais e avisto um senhor baixinho, em cima de um banquinho, olhos marejados fixos na pista mesmo quando o carro estava do outro lado. Era Josef Leberer, treinador de Senna de 1988 a 1994 e hoje na Alfa Romeo. Não há ninguém no paddock hoje em dia que tenha tido uma conexão mais forte com Ayrton do que ele. Só dei um abraço nele e o deixei viver seu momento.
Logo depois seria a hora de entrar com a Ana Luiza Kalil e a Bia Rosenburg no grid, numa história que começou ano passado. Foi a Bia que entrou em contato comigo ano passado, se não me engano, para eu tentar fazer com que o Daniel Ricciardo ficasse sabendo da história da Aninha, que tinha participado de um concurso que ele estava fazendo desafiando seus fãs a fazerem shoeys.
As duas tinham participado: Bia comemorando sua formatura (num vídeo que eu já tinha mostrado ao Daniel e que ele tinha amado) e a Aninha, o sucesso do seu transplante, parte do tratamento de um câncer raro em adultos.
Por sorte, eu tinha uma exclusiva marcada com o Ricciardo, e comentei com ele que a doença tinha voltado e a Aninha está tendo de passar pela quimio outra vez. Na hora eu nem sabia o que esperar dele. Ele quis saber se ela viria ao GP e pediu para conhecê-la.
Tive a ideia de não falar diretamente com ela. Faria uma surpresa com a ajuda da Bia, mas no fundo queria tentar levar as duas para o paddock, sabendo que ambas adorariam conhecê-lo. Naquele momento achei que conseguiria o passe por algumas horas, na sexta, com a própria Renault.
Mas acabei comentando da história com o produtor da F1, Jason Swales, que na hora disse que eles mesmos cuidariam dos passes. A história rapidamente chegou a Sean Bratches, que aprovou, inclusive, a ida ao grid. Tudo isso seria feito sem câmeras, a pedido de Ricciardo.
Quando fui buscá-las no portão, a Bia só sabia sabia que a Aninha conheceria o Daniel. Vocês tinham que ver a cara delas quando falei que as duas tinham VIPs para os três dias!
Durante o primeiro tour, passei para perguntar algo ao assessor da Racing Point, Will Hingis, e ele logo ofereceu dar acesso a nós três para o box da equipe durante o primeiro treino livre. Fomos logo depois do tal encontro com o Ricciardo, um fofo como de costume.
Elas viraram celebridades instantaneamente no paddock, mas nem sabiam o que estava por vir. Domingo de manhã, receberam a notícia de que iriam ao grid. Fiz questão que elas fossem comigo, não ia perder essa, e qual foi minha surpresa quando vi a arquibancada A toda acenando para elas, logo depois de terem ouvido a história pelos auto-falantes? Sim, depois teve toda aquela corrida sensacional, mas para mim tudo já tinha valido a pena.
Sei que essa coluna geralmente é mais recheada de informações dos bastidores do que de histórias. E eles estão mais quentes do que nunca na questão do futuro do GP Brasil. Esta é uma semana decisiva para uma decisão que tem diversas vertentes. Tem dinheiro, política, velhas e novas táticas de mostrar qual o projeto mais robusto e muitas dúvidas não só sobre onde será o GP, mas quem o mostrará – e se o mostrar – na TV. Já vou avisando que os drops de Abu Dhabi devem ser quentes…
Campeonato decidido, um traçado que permite ultrapassagens, condições de pista muito diferentes entre a sexta-feira de treinos livres e o domingo, e motores chegando no final da temporada já no limite, e um Safety Car que veio na hora certa para recompactar o grid quando só cinco carros estavam na mesma volta. Desta vez, nem precisou chover em Interlagos para termos muito provavelmente a corrida mais aberta da temporada. E que teve a
o mesmo tempo manobras espetaculares e campeões do mundo exagerando na dose.
Não foi à toa que Max Verstappen estava com um sorriso de orelha a orelha quando saiu do carro. Não é todo dia que se ganha uma corrida ultrapassando Lewis Hamilton em duas oportunidades, uma por dentro e, outra, que ele elegeu como sua manobra favorita, por fora. Além de seu talento, ele contou também com dois fatores ao seu favor: um motor Honda muito menos rodado do que os dos rivais, e a decisão da estrategista Hannah Schmitz, que representou a Red Bull no pódio depois de ter bancado a parada de Max nos boxes no primeiro Safety Car, o que naquele momento tirou-lhe posição de pista, mas que no final das contas lhe deu a vitória.
(Aliás, o parênteses é necessário: já vinha sendo uma corrida com ultrapassagens e pilotos com estratégias diferentes, mas a única questão realmente em aberto quando o motor de Bottas abriu o bico era se Vettel conseguiria fazer a estratégia de uma parada funcionar, mas mesmo isso parecia, a cada volta, mais improvável. O SC, que acabou acontecendo porque o carro de Bottas ficou travado num buraco, não só reagrupou o pelotão como também a regra dos pilotos descontarem a volta que levaram colocou caras como Gasly e Sainz de volta na corrida).
Mas Verstappen não era, de longe, o mais feliz após a bandeirada. Pierre Gasly admitiu que nenhum champanhe francês chegou perto do sabor especial que ele sentiu no pódio em Interlagos, ainda mais com todo o calor da galera que invadiu a pista. No final das contas, parece que Marko acertou mesmo primeiro em fazer a inversão entre ele e Albon no meio do ano, e agora em manter os
dois onde estão. Foi a saída de inesperada Ricciardo que atrapalhou os planos de sucessão na Red Bull, e agora um piloto que é veloz, mas que sempre precisou de mais tempo para se desenvolver está fazendo um ótimo trabalho na Toro Rosso, e o outro, mais calmo e constante, terá condições de, finalmente, ter um pouco de continuidade na carreira depois da loucura que sua carreira se tornou nos últimos anos.
Esse é o consolo de Albon: seus pódios e vitórias são uma questão de tempo. Por ora, foi atingido numa manobra pra lá de otimista e até meio fora de comum de Lewis Hamilton, que logo admitiu o erro e sequer quis se defender para os comissários.
Desconheço como foi todo esse processo entre ele saber que estava sendo investigado e pedir para o representante da Mercedes comunicar a FIA que se considerava culpado pelo toque. Mas se tudo tivesse sido mais ágil poderíamos ter tido uma festa ainda maior no pódio: sério candidato a um dos três melhores pilotos da temporada, Carlos Sainz mais uma vez mostrou que é o verdadeiro “smooth operator” do grid, indo de último a terceiro e o único a conseguir fazer apenas uma parada numa prova com dois SCs no final, ou seja, em que os pilotos com pneus mais desgastados estavam bastante expostos.
Gasly e Sainz só tiveram a chance de estrear no pódio porque a Ferrari viveu outro momento de autodestruição. Leclerc vinha com pneus mais novos, mas Vettel estava até conseguindo responder em termos de ritmo, até que levou a ultrapassagem no S do Senna. Ele teria o DRS na Reta Oposta, e grandes chances de dar o troco. Mas primeiro surpreendeu escolhendo o lado de fora, mesmo com Leclerc ficando no meio da pista, e depois tentou diminuir o espaço do companheiro, numa cena muito parecida com o GP da Turquia de 2010. Como as Red Bull naquela ocasião, parecia que as Ferrari foram atraídas magneticamente.
Com isso, e com a quebra do motor de Bottas, que só deixou claro como a Mercedes está no limite nesse quesito, e indicando que isso pode explicar em boa parte por que eles estão mais lentos nas retas que a Ferrari e agora também que a Honda, no lucro após todas as punições ao longo do ano, tivemos o primeiro pódio da era híbrida sem um representante do time alemão e do italiano. Um aperitivo de como a Fórmula 1 pode ser bacana numa questão de detalhes.
Sobrou a brincadeira de Sebastian Vettel para cima de Max Verstappen, dizendo que agora é o motor da Red Bull que está gerando desconfiança. O motor Honda, na verdade, já demonstrou lidar bem com a altitude, e Verstappen parece estar começando a desenvolver uma relação especial com esse tal circuito de Interlagos. Ele disse que gosta das cambagens da curva, que fazem a pista parecer uma montanha-russa.
Fazendo um parênteses, o holandês fez questão de dizer que essa é a terceira, e não a segunda pole nele. Fica o registro.
Mas será que a Red Bull tem ritmo de corrida para vencer essa corrida? Os treinos livres mostraram um certo equilíbrio, mas uma Mercedes um pouco melhor. Os dois carros prateados largam na segunda fila, e uma das lições de casa de Lewis Hamilton era estudar as largadas dos últimos anos para ver como ele pode se posicionar. Não é muito fácil escolher o lado em Interlagos: fazer o lado de fora do primeiro S e ficar por dentro no segundo ou o contrário?
A largada deve ser um ponto importante da prova porque, estrategicamente, deve ser seguido um roteiro de cuidar do pneu o máximo possível no primeiro stint para conseguir fazer só uma parada. Não é por acaso que Vettel citou que “vai ser preciso escapar à tentação de parar umas quatro voltas cedo demais.” Ele se refere à grande possibilidade de estar em posição de fazer um undercut em Verstappen, antecipando sua parada para tentar voltar à frente. Mas se a Ferrari exagerar na dose vai faltar pneu para o fim e, em Interlagos, dá para ultrapassar.
Outra variável estratégica deve ser o composto duro. Ele não foi muito usado nos treinos livres, mas deve estar muito mais quente no domingo em comparação com a sexta e, como o composto duro trabalha numa faixa de temperatura mais alta, ele pode se tornar uma boa opção, pois fica mais rápido. Os times grandes vão torcer para algum time médio colocar os duros logo no começo da corrida para ver se ele será, mesmo, uma boa.
Deve haver também muitos pilotos no miolo do grid largando com o médio para tentar usar o macio só com menos peso na parte final da prova. Foi essa a tática da Ferrari para Charles Leclerc porque o monegasco já sabia que perderia 10 posições no grid pela troca do motor que quebrou nos treinos livres em Austin. Mesmo assim, ele não esperava largar em 14º e estava decepcionado com o erro no Q3. Para a sorte nossa, vai querer compensar no domingo.
Quem sou eu para falar sobre a culinária brasileira para vocês, mas a ideia aqui é diferente. Mesmo no GP Brasil, eu saio com a mesma turma do restante da temporada na maioria dos dias, e são todos gringos. E sempre vão em uma churrascaria pelo menos uma noite, na qual eu desisti de acompanhar depois de uma conta absurdamente cara acho que em 2012. Acho que ficou uns 200 reais por cabeça porque o pessoal se empolgou na caipirinha doce que o restaurante servia. E eu tinha comido basicamente salada, coração de frango e alguns poucos pedaços de carne. Na época eu comia carne normalmente, hoje parei porque sinto que não me faz bem, mas não é muito a minha me empanturrar de carne à noite. Nem pagar 200 reais para isso.
Mas, aos poucos, eles também foram cansando da rotina de churrascaria todo dia – até porque hoje em dia reclamam do quão cara é São Paulo. Mas não são muitos gringos que abraçam a culinária local.
Ano passado, como fazia tempo que não voltava ao Brasil, estava salivando por mandioca e carne seca. Quando meus amigos viram aquela carne tão vermelha, não acreditavam que não era crua e nem quiseram provar. Azar deles, que preferiram a segurança de um bife com batata frita.
Mas há quem arrisque, sim, algo além da famosa carne brasileira – aliás, os gringos acham que vivemos em churrascarias ou comemos carne em todas as refeições. Certa vez levei um sueco em um restaurante de comida mineira. Nunca vi alguém comer couve no alho com tanto gosto!
Mas incursões como esta são raras. Os gringos aprenderam rapidamente que São Paulo tem grande presença de descendentes de italianos – acho que ter visto Fittipaldi, Senna, Barrichello, Massa, Di Grassi nas pistas e a Cerasoli, o Motta, o Oricchio, etc fora deles tenha ajudado nessa percepção! – e de japoneses – o que eles descobrindo frequentando o karaokê da Liberdade – e sabem que podem comer boa comida japonesa e italiana por aqui. Quer dizer, boa comida italiana e uma versão meio livre da japonesa. A mania brasileira de colocar cream cheese em tudo incomoda.
Embora a grande maioria goste do café brasileiro, a não ser um americano que veio reclamar para mim do quão forte é o café Pilão, e se impressionou quando eu falei que ele nem era tão forte assim, o café da manhã brasileiro é polêmico entre os gringos. Eles acham que brasileiro só come bolo de manhã, pois é o que geralmente encontram nos hoteis. Não é muito comum ao redor do mundo comer doce de manhã, o café da manhã é geralmente uma refeição salgada, a não ser no Brasil e na Itália (pelo que eu lembro de cabeça dos lugares onde eu fui).
E todo ano a caipirinha faz vítimas – geralmente na segunda-feira eu sou uma delas. “Ah, a caipirinha me derrubou, a caipirinha é muito perigosa, muito forte, é a pior ressaca do mundo”, dizem eles. Sim, é uma bebida forte, mas não ajuda o fato dos gringos tomarem como se fosse água. Uma vez estávamos saindo de um bar que tinha comanda e um amigo pediu para eu confirmar a dele. Não lembro o número exato, mas tinha mais de 10 caipirinhas naquela comanda, e os drinks naquele lugar eram bem fortes. Perguntei a ele se era possível que ele tinha bebido tanto. E ele, com a camisa aberta, suado e lutando para ficar em pé disse que “era provável”.
Outra história com a bebida foi na corrida do ano passado, quando um amigo que vinha pela primeira vez ao Brasil estava sofrendo para decorar o nome do que ele, sem ter a mínima noção do que estava falando, chamava de caiputinha. Depois de tentar ensinar e ele continuar com a versão dele, achei melhor me oferecer para fazer os pedidos para ele pelo resto da noite. No dia seguinte, acordo com uma mensagem dele. “Por que absolutamente tudo está doendo?”. A caipirinha tinha feito mais uma vítima.
Minha grande diversão após as corridas é tentar decifrar as estratégias das equipes. Isso porque, quando você vai atrás das explicações, sempre aprende algo novo e entende um pouco mais do nível de detalhamento com que um time de F-1 trabalha. Como vimos tantas vezes nesta temporada, a diferença entre um erro e um acerto na estratégia pode jogar no lixo todo o trabalho de um final de semana, de meses desenvolvendo o carro. E as decisões têm de ser tomadas com muita pressão e pouco tempo. E envolvem inúmeras variáveis.
Mas o que está na cabeça dos estrategistas? Vou dividir algumas explicações em dois capítulos. Neste primeiro, o foco será no número de paradas e nos compostos escolhidos. Mas, primeiro, vamos com um breve glossário de estratégia:
Stint: quantidade de voltas nas quais um mesmo jogo de pneus é usado.
Undercut: quando um piloto antecipa sua parada em relação ao rival e usa a aderência superior do pneu novo para ganhar tempo. Assim, quando o rival faz seu pitstop, acaba voltando atrás.
Overcut: quando um piloto fica na pista mesmo depois que o rival que vai à frente para. A tentativa é usar o ar limpo para andar mais rápido e voltar na frente quando fizer a parada. Costuma funcionar apenas quando há diferenças consideráveis entre a performance dos carros e quando o rival tem problemas de aquecimento e/ou pega tráfego no retorno dos boxes, já que a tendência é quem tem pneu mais novo ter vantagem.
Janela de Safety Car: Cálculo de tempo (de geralmente 10 a 12s) entre um piloto e outro, significando que, se houver um SC ou um VSC, é possível parar e ainda voltar à frente.
Delta: Diferença de performance entre diferentes compostos para uma volta lançada.
Como funcionam as regras:
As equipes têm liberdade para selecionar a quantidade de cada composto que levarão à corrida, e isso pode gerar diferenças no domingo. Cada piloto sempre terá 6 jogos para a classificação e a corrida, e geralmente usará pelo menos três jogos de macios na classificação. Para os ponteiros, portanto, dificilmente eles terão macios novos para a corrida, o que diminui a possibilidade deles fazerem duas paradas nas corridas.
Como decidir com que pneus largar?
Essa decisão começa no sábado para as equipes grandes. Nos treinos livres, uma das avaliações é a diferença de performance entre os compostos. Caso o pneu macio estiver sofrendo com muita degradação e o delta em relação ao médio não for muito alto – na média, não passar de 1s – os grandes podem tentar fazer o Q2 com este composto para evitar usar o macio na corrida (uma vez que quem passar para o Q3 tem de largar com o pneu usado para fazer o melhor tempo no Q2). Neste caso, o mais comum é que a tentativa com o médio seja a primeira e os carros saiam com macios na segunda, para garantir que ficarão entre os 10 primeiros no caso de melhora significativa dos demais. Se essa melhora não acontecer, os pilotos abortam a volta.
Mas a decisão de largar com o médio não tem a ver somente com sua performance em uma volta: em circuitos nos quais há muitos metros até a primeira freada, é arriscado largar com este composto, que precisa de mais calor para entrar em sua janela de temperatura – e, assim, gerará menos aderência – nos primeiros metros. De nada vale ter uma estratégia que, no papel, é mais rápida, se perder posições na largada.
Como definir o número de paradas
Essa matemática é teoricamente simples: os treinos livres de sexta-feira mostram os padrões de degradação dos três compostos. Com isso, os times conseguem prever por quantas voltas ficar com cada jogo e com qual combinação de compostos é mais rápido terminar a corrida, contabilizando também a perda de tempo no pitstop.
Mas essa conta define somente o que é melhor para um carro sozinho na pista e, muitas vezes, fazer duas paradas pode ser benéfico no papel. Contudo, isso significaria ficar atrás de outros carros, o que é geralmente pior, mas totalmente determinante de certas pistas de difícil ultrapassagem. Dois exemplos clássicos são Mônaco e Singapura. É sempre muito limítrofe fazer somente uma parada em Mônaco, pois isso exige muita administração de ritmo (e a atuação do ritmo na estratégia estará na segunda parte da “aula” de estratégia) mas, como se diz na F1, a “posição de pista é a rainha” em pistas de rua, até porque o limite de velocidade no pitlane é menor.
Não que as equipes sempre larguem sabendo o número de paradas. Como os pneus Pirelli são muito sensíveis à temperatura, pequenas alterações da sexta-feira para o domingo já podem mudar completamente o cenário para os estrategistas, e um pneu pode ter mais ou menos degradação, graining, etc. Neste tipo de cenário mais aberto, os estrategistas estarão sempre de olho em pilotos que estão em táticas diferentes – por exemplo, quem largou do fundo do pelotão com os duros – para determinar não só o número de paradas, como principalmente o próximo item…
Como escolher o composto
Pelas regras da F-1, é preciso usar dois tipos de composto na corrida. Nos treinos de sexta-feira, as equipes conseguem ter uma boa ideia de quais serão usados: na maioria dos casos, o duro fica de lado; em outras, é o macio que se degrada demais (o que gera aqueles cenários em que os grandes fazem o Q2 com os médios), e acertam seus carros com base nisso, uma vez que o comportamento muda bastante dependendo do composto.
Mas, principalmente pelas questões de temperatura citadas acima, é possível que toda a preparação venha por água abaixo. Por exemplo: se faz mais calor no domingo, o composto duro, que trabalha numa zona mais alta de temperatura, tende a funcionar melhor. Aí entra a avaliação feita com base na observação do ritmo dos rivais com o mesmo composto para se decidir se é mesmo melhor mudar o plano original.
No caso de dúvida tanto do número de paradas, quanto dos compostos, o melhor é sempre deixar a estratégia em aberto, ou seja, não repetir, no segundo stint, o mesmo composto do primeiro, pois isso implica que haverá uma segunda parada. Entretanto, essa opção de manter o composto mais macio pode ser tentadora se houver a possibilidade de fazer um undercut. Mas isso é assunto para o próximo Por Dentro da F-1.
Não sei se é daquelas peças que a memória prega na gente, mas, quando penso naquele GP da Austrália de 25 anos atrás, a primeira imagem que me vem à mente é de um Schumacher atrás do alambrado com um sorriso amarelo no rosto. Teria sido amarelo mesmo ou escolhi guardar isso na memória dessa forma? O fato é que, por pouco menos de dez anos, parecia que todo título de F-1 seria resolvido com um piloto tirando o outro da pista, o que foi ótimo e horroroso para o esporte ao mesmo tempo. E aconteceu pela terceira vez em seis anos naquela decisão entre o alemão e Damon Hill.
Mesmo tendo começado o ano (com uma ajudinha do controle de tração ilegal da Benetton) disparado na frente (ele ganhou seis das primeiras sete), Schumacher chegava à última corrida do ano apenas um ponto à frente de Hill, depois de um campeonato em que aconteceu um pouco de tudo. Depois da morte de Senna, na terceira etapa, muita coisa mudou no regulamento e a Williams também foi melhorando um carro que não tinha nascido bem, uma vez que o time era o mais desenvolvido no uso da eletrônica e grande parte dela tinha ficado pelo caminho no final de 1993. Além disso, a temporada tinha sido cheia de polêmicas, com direito a duas desclassificações de Schumacher – uma por excesso de desgaste na placa de madeira que fica no assoalho, o que significa que o carro não respeitava a altura mínima, e outra por ignorar uma bandeira preta. Para piorar, Schumacher ainda foi excluído de duas provas na parte decisiva do campeonato devido ao problema com a altura.
Hill ganhou essas quatro corridas em que Schumacher não pontuou, e com isso tirou quase toda a vantagem construída no começo do ano.
Relatada como “uma daquelas raras corridas que te pegam pela garganta”, o GP da Austrália foi movimentado em sua primeira parte. Nigel Mansell largara na ponta, depois de superar Schumacher por apenas 18s – o alemão foi parar no muro tentando bater o tempo do Leão – e Hill largou em terceiro.
Mansell perdeu a liderança nos primeiros metros e ainda rodou pouco depois, caindo para quinto, enquanto os dois rivais travavam sua batalha particular na frente. Ambos estavam na estratégia de três paradas para reabastecer, então o ritmo era alucinante. Hill não deixava Schumacher escapar por mais de 1s5, e volta e meia fazia voltas mais rápidas, mostrando que tinha ritmo para atacar mais adiante na corrida.
A diferença chegou a ficar em 0s4 depois que Schumacher foi atrapalhado por um retardatário, mas Hill não conseguiu se aproveitar. Na volta 32, subiu para 2s3 (a maior da corrida até então), mas Frentzen segurou Schumacher, a distância voltou a diminuir, aumentou novamente quando foi a vez de Hill passar a Sauber e caiu mais uma vez na volta seguinte: 1s9.
Foi quando Schumacher cometeu um erro e saiu da pista, batendo no muro. O alemão tentou, então, voltar para a pista exatamente quando Hill estava passando. O inglês fez a trajetória normal, talvez imaginando que Schumacher abriria por estar com o carro danificado, mas o líder do campeonato virou bruscamente como se Hill não estivesse ali (ou talvez justamente porque Hill estava ali) e os dois bateram. Schumi ficou por lá mesmo – e daí a tal lembrança do sorriso amarelo atrás do muro – enquanto seu rival se arrastou até os pits, mas abandonou com a suspensão quebrada.
Aos 25 anos e 10 meses, em recorde que seria quebrado por Alonso e por Vettel anos depois, Schumacher se tornava o mais jovem campeão do mundo da história desde Emerson Fittipaldi em 1972.
A corrida acabou caindo no colo de Mansell, que tinha passado toda a prova em meio a batalhas com Barrichello, Hakkinen e Berger. Ele e o austríaco se alternaram na liderança por terem estratégias diferentes, e parecia que o ferrarista levaria a melhor, sobrevivendo a forte pressão, até a volta 64, quando Berger cometeu um erro. Mansell ainda sofreria a pressão do rival até o final, mas celebraria sua última vitória na carreira, ajudando a Williams a conquistar o Mundial de Construtores.
Já seu companheiro evitou atacar Schumacher diretamente e preferiu ver o lado positivo. Ele nunca foi considerado páreo para o rival, e até por isso ficou feliz de tê-lo induzido ao erro. “Agora que acabou tenho um sentimento de vazio muito forte. Mas eu dei trabalho a ele. Ele certamente estava sentindo a pressão quando saiu da pista. Ir para a decisão contra Schumacher com um ponto a menos sempre te coloca em uma posição em que tem tudo a perder.”
O GP dos Estados Unidos de 1990 não parecia ter os ingredientes para se tornar um clássico, mas dois nomes mudaram a história da prova disputada em um circuito com traçado sem nenhum atrativo em Phoenix (que, não coincidentemente, só recebeu a F-1 por três vezes, entre 1989 e 1991).
Um deles era Ayrton Senna, que não estava para brincadeira e isso não era por acaso. O brasileiro vinha em guerra aberta com o então presidente da FISA, Jean-Marie Balestre, devido à condução da decisão do título do ano anterior, no Japão. Duramente criticado por Senna, o chefão ameaçou tirar a superlicença do piloto da McLaren caso ele não se desculpasse. E isso não aconteceu. Mas Ron Dennis tinha um plano: inscreveu Jonathan Palmer como titular e colocou Senna como seu substituto. Quando Balestre tentou impedir o brasileiro de correr, Dennis ameaçou processá-lo. E ficou por isso mesmo.
O outro nome daquele domingo seria Jean Alesi. Mais do que isso, a Fórmula 1 deixou o Arizona crente que tinha visto a primeira grande performance de um piloto que viria a ser campeão do mundo. O francês de origem italiana já tinha impressionado antes, ao chegar em quarto logo em sua estreia, que aconteceu no meio do campeonato, substituindo Michele Alboreto, ao mesmo tempo em que ele ainda disputava a F3000. 1990 seria sua primeira temporada completa, e não poderia ter começado melhor.
Como pano de fundo, os relatos da época destacavam as arquibancadas vazias e eram críticos à política caça-nível que Bernie Ecclestone adotou, trocando Watkins Glen por Phoenix em 89. A prova não “pegou” e logo saiu do calendário, gerando um hiato do GP dos Estados Unidos que duraria até o retorno a Indianápolis em 2000 – e sabemos como isso acabou.
Voltando à pista, o grid acabou ficando bagunçado pois não havia muita aderência no circuito de rua e os pilotos que usavam o pneu Pirelli saíram beneficiados. Isso fez com que a Minardi conseguisse ficar na primeira fila, com Pierluigi Martini, Andrea de Cesaris colocasse a Dallara em terceiro no grid e o jovem que viria a ser a grande estrela do dia, Jean Alesi, se classificasse em quarto com a Tyrrell. A pole ficou com Gerhard Berger, de McLaren com pneus Goodyear, e seu companheiro Senna teve problemas elétricos e largou em quinto.
Embora tivesse dito nas entrevistas antes da corrida que lhe faltava motivação para correr por toda a confusão com Balestre, Senna mostrou no domingo que estava “mordido”, e não deixaria Alesi levar aquela corrida.
O francês de 25 anos fez uma largada incrível e pulou de quarto para primeiro. Como a expectativa era de que o pneu Pirelli se desgastasse mais rapidamente, ninguém esperava ver o que se seguiu nas voltas seguintes: Alesi foi obtendo uma boa margem na frente enquanto Senna ia abrindo caminho no meio do pelotão.
Não demorou para faixas pretas aparecerem no pneu da Tyrrell, mas mesmo assim Alesi foi se segurando por 34 voltas, até Senna chegar e iniciar uma disputa que se tornou épica. O francês vendeu muito caro a liderança, e a batalha que se seguiu nas duas voltas seguintes foi um show de ataque e defesa.
No final, deu a lógica e Senna venceu até com facilidade, mas quem comemorou mais efusivamente foi Alesi, segundo colocado. Bastante agressivo e bom na chuva, o francês teria outras corridas fortes, como o GP de Mônaco naquele mesmo 1990, e seria adorado pelos italianos na passagem pela Ferrari, entre 1991 e 1995. Mas sua trajetória foi mais de brilharecos que consistência, e ele encerrou a carreira em 2001 com apenas uma vitória – no GP do Canadá de 1995 – no bolso.
Hora dos Credenciados do Projeto No Paddock da F1 com a Ju tiraram as suas dúvidas. Essas foram as que sobraram quando eu fiz uma live com eles no grupo fechado do Facebook direto da fila interminável do check-in no aeroporto da Cidade do México.
Henrique Gianetti: Com tanta mudança para 2021, você acha que as equipes vão colocar menos esforço para desenvolver os carros de 2020 já que pouco deste ano vai ser aproveitado nos anos seguintes? Lembro 2013 que foi o último antes da mudança de motor, Vettel e Red Bull ganharam muito mais fácil que os anos anteriores, como se fosse continuação do ano anterior.
Essa é uma pergunta muito interessante porque está diretamente relacionada a algo que metade das equipes do grid questionaram muito durante esse processo decisório das novas regras. O projeto do carro do ano seguinte na Fórmula 1 geralmente começa assim que a temporada inicial se inicia. É lógico que, no começo, os recursos no desenvolvimento das ideias do carro seguinte são muito pequenos, e depois vão aumentando ao longo do ano.
Quando os times entram em uma temporada já sabendo que o carro mudará completamente, como será no caso de 2020, a porcentagem inicial de atenção para o modelo seguinte já começa o ano aumentada.
E por que isso gerou discussão entre as equipes? Quando se tem mais recursos, é mais fácil cobrir o desenvolvimento dos dois carros ao mesmo tempo. Ah, mas não vai ter o teto orçamentário? Sim, mas só a partir de 2021, ou seja, as equipes grandes vão gastar rios de dinheiro para ter carros com muito mais chance de serem melhores.
Para o consolo das médias, metade do grid gasta menos que o teto atualmente por falta mesmo de recursos, então na operação delas não faz muita diferença. O teto, diga-se de passagem, é considerado alto (ele é de 175 milhões de dólares na teoria, mas calcula-se em 250mi na prática, incluindo todos os custos que ficam de fora da conta pela regra). Para quem ter orçamento no nível da Racing Point em diante, eles queriam chegar a 100-120 milhões no máximo. Mas a ideia é que haja uma retração paulatina ao longo dos anos.
Respondendo à pergunta: foca em 2020 ou 2021? Para os grandes, tanto faz. Para os demais, tudo vai depender de como a temporada começar, lembrando que a posição no campeonato continua sendo determinante na distribuição do dinheiro
Marcos Barni: A McLaren está começando a vir para frente ou foi o circuito que era favorável?
A McLaren já é consistentemente a quarta força do grid há algum tempo, mas eles tiveram uma série de azares em várias corridas depois da volta da pausa de agosto mas, na grande maioria das vezes em que tiveram corridas sem percalços, demonstraram um ritmo forte, vide as quinta e sexta colocações de Sainz na Rússia e no Japão.
Um problema curioso que a McLaren vem tendo, contudo, não tem nada a ver com ela. Como consegue colocar os dois carros no Q3, mas não tem tanto ritmo assim para classificar com o pneu médio, os dois pilotos ficam em muita desvantagem em corridas como as últimas duas, nas quais largar com o pneu macio era muita desvantagem. Foi por isso que eles acabaram perdendo para pilotos que saíram de fora do top 10 (Perez no México e Ricciardo nos EUA).
Falando nisso, achei curiosa a declaração do Pierre Gasly para mim no último sábado. Perguntei justamente dessa desvantagem (porque ele também foi ao Q3 nestas duas corridas) e ele me disse “pelo menos acho que vão mudar isso para o ano que vem”. Bom, para isso ocorrer, é preciso de unanimidade. E os grandes têm sempre barrado o fim dessa regra de largar com o pneu do Q2 em todas as vezes que ela foi votada nos últimos anos.
O GP dos Estados Unidos coroou o campeão Lewis Hamilton mais uma vez como era esperado. Mas as confirmações pararam por aí. A Ferrari, que tinha vencido a corrida ano passado, viu os rivais de tão longe quanto no final de julho em Budapeste. E foi a Red Bull quem chegou mais perto – e que poderia ter dado muito mais trabalho às Mercedes. Por fim, foi Valtteri Bottas quem fez a pole e venceu. Mas como explicar tudo isso?
Hamilton saiu da classificação sem entender por que o carro ficou imprevisível de uma hora para a outra no Q3. No final das contas, ele tinha batido na tampa do modulador de equilíbrio de freio, que ficava voltando à configuração que jogava o freio para trás, mesmo depois que Lewis tentava jogá-lo para frente. Foi algo que a equipe só notou depois.
Assim, a briga pela pole ficou restrita a Bottas, Verstappen e Vettel, até porque Charles Leclerc teria que usar um motor antigo depois da quebra no FP3. E, por menos de um décimo, deu Bottas.
Logo saberíamos que, dos três, só dois teriam ritmo para vencer, ainda que a tarefa de Verstappen fosse muito difícil pela vantagem que a Mercedes já aparentava ter nos treinos livres.
Isso porque tão logo as luzes se apagaram, a Ferrari já estava fora de combate. Como de costume em Austin, o lado do pole gera muito mais aderência, dando vantagem a Verstappen e Hamilton na briga com Vettel e Leclerc. E os dois sofreriam com um carro que saía muito de frente, como no início da temporada, mas desta vez sem aviso. O caso de Vettel parecia pior, já que a tendência do comportamento piorar virando à direita era o sinal de que algo estrutural estava errado. E logo a suspensão se foi.
No caso de Leclerc, o comportamento do carro não era muito diferente, especialmente de tanque cheio. Era clara a falta de estabilidade da Ferrari, mas o péssimo ritmo, que fez o ferrarista correr praticamente sozinho para chegar em quarto, deixou muita gente em dúvida se eles não perderam também rendimento do motor em Austin. Mas Binotto assegurou que nem a falta de velocidade de reta tem a ver com potência. Disse que eles testaram uma configuração diferente, focando mais nas curvas, e ficaram satisfeitos na classificação, mas completamente perdidos na corrida.
Mais atrás, Albon se chocou com Sainz e teria que escalar o pelotão por duas vezes para chegar em quinto. E, na briga pelo “melhor do resto”, Ricciardo faria outra bela corrida de administração de pneus, depois de passar Norris na volta 8. A McLaren tentou um undercut, mas a Renault não mudou seu plano de uma parada e o time inglês acabou percebendo que Norris não conseguiria ir até o final com uma parada apenas, e reagiu a tempo de converter sua tática em duas paradas.
Não que a McLaren ou a Renault foram para a corrida com a certeza de qual seria a melhor estratégia. Era uma dúvida que todos tinham, devido ao aumento das temperaturas da sexta para o domingo. É curioso lembrar que o cenário em termos de aumento significativo de temperatura era o mesmo no México e nos EUA, mas o calor do domingo significava coisas diferentes devido às características da pista e do asfalto: no México, mais calor significou que o pneu funcionou melhor que o esperado, pois evitou o graining. E nos EUA, levou ao superaquecimento e a uma prova que começou, na mente dos engenheiros, como de uma parada, mas acabou sendo mais rápida com duas.
Lá na frente, a Red Bull acabou tomando a decisão para a Mercedes, quando chamou Verstappen aos boxes muito cedo, na volta 13. Mesmo com os pneus duros, a outlap dele foi tão forte que os alemães tiveram que responder com o líder Bottas. Àquela altura, Hamilton já tinha decidido que faria só uma parada e, por isso, estava gerenciando o ritmo. Com as paradas dos dois que vinham a sua frente, Hamilton assumiu a liderança.
O inglês pararia na volta 24. Nesse momento, a equipe sabia que tinha a dobradinha, porque o ritmo da Red Bull tinha caído muito com os pneus duros. E o que eles viam em termos de degradação apontava para uma vantagem para a tática de duas paradas. Até foi curioso que as mensagens para Lewis não eram tão incisivas quanto em outras corridas quando ele dizia que não tinha certeza se o plano daria certo.
Para a Mercedes, agora era uma questão de parar Bottas logo depois de Verstappen, o que eles fizeram na volta 35, e torcer para que seus pilotos não fizessem nada estúpido, porque eles certamente se encontrariam na pista. Para Hamilton, era necessário salvar um pouco de rendimento para o fim e, para Bottas a tarefa era tirar 14s ao mesmo tempo em que garantia que teria pelo menos 1s5 de vantagem ainda nos pneus quando chegasse em Hamilton, já que é esse o cálculo de diferença para que um carro possa passar o outro na pista de Austin.
Bottas chegou com seis voltas para o final e passou Hamilton com cinco, de maneira decidida. Para o agora hexacampeão, que tentou de todo o jeito transformar o detalhe bobo da classificação numa vitória épica, não lhe restavam mais armas.
No final das contas, foi uma boa forma de Bottas selar seu vice, melhorando significativamente em relação ao ano passado, quando foi quinto, e de Hamilton comemorar mais um título. A briga fica agora entre Leclerc, Verstappen e Vettel. Mais do que saber quem vai ao FIA gala receber o troféu, pelas acusações de Max após a corrida em Austin sobre a queda de potência do motor Ferrari, vamos descobrir também quem tem razão numa discussão que é chave para 2020.
Toto Wolff estava irritadíssimo no paddock em Austin. Ele se sente traído por Mattia Binotto pelo fato da Ferrari não ter usado o poder de veto para as regras de 2021. Agora, parece que vai ser mesmo um efeito cascata, e o que mudou, mudou. Como não há sinais de que o poder de veto da Ferrari vá cair, a Scuderia está mais uma vez dando as cartas, uma vez que, para mudar qualquer coisa no regulamento de 2021 a partir de agora, tem que ser por unanimidade.
Mas a aprovação das regras trouxe um problema para a Ferrari: a paz que estava instaurada entre as equipes grandes para que elas conseguissem barrar (como fizeram com sucesso) grande parte das mudanças que estavam sendo programadas já não precisa mais existir. Depois do GP do Japão, a Red Bull enviou um questionamento à FIA sobre a possibilidade de se aumentar o fluxo de combustível nos intervalos (calculados em milissegundos) entre as medições que controlam os 100l/hora.
Adivinha quem estaria fazendo isso, na opinião da Honda? A Ferrari, claro, e isso explicaria porque a vantagem dela era tão grande em acelerações. E explica essa declaração do Verstappen para mim em Suzuka, e todas as outras do último domingo.
As equipes fazem esse tipo de “consulta” para tentar acabar com vantagens que os rivais possam ter. Eles basicamente perguntam à FIA se podem fazer algo que acreditam que um rival está fazendo. Isso gera diretivas técnicas, como a que foi distribuída em Austin. A partir da distribuição da diretiva, quem continuar fazendo seja lá o que tenha sido considerado ilegal corre risco de protesto e desclassificação.
Do lado da Ferrari, Binotto garantiu que o motor de Austin era igual ao do México. Porém, vale a ressalva de que a FIA não checou especificamente o fluxo ferrarista. O que a diretiva técnica diz é que aquilo que a Red Bull perguntou se podia, não pode.
Não sei como está a situação aí no Brasil, mas a concentração de scooters (acho que ainda são conhecidos como patinetes aí, certo?) nas ruas de cidades grandes nos EUA é impressionante. Isso porque eles são um sistema de transporte por aqui, como aquelas bicicletas que você pode pegar na rua pagando muito pouco. A diferença é que anda-se de patinete na calçada, e não na rua ou em ciclovias, e isso gera alguns acidentes às vezes. Que o diga o membro da equipe da Sky Italia que acabou caindo do seu patinete e fazendo um corte na cabeça. Ficou de molho.
Mas o rei do patinete na Fórmula 1 foi justamente quem mais celebrou no final de semana. Lewis Hamilton foi do inferno ao céu em 24h, e tenho um exemplo numérico para dar. Sua entrevista no sábado no grupo que divido com Globo e mais dois canais de TV foi de menos de 2min. E no domingo, passou de 8. A comemoração, pelo jeito, foi com tequila, já que ele disse que tinha ganhado algumas no México e guardado para celebrar. Como já não tem mais 20 e poucos anos, como alguns de seus rivais, pode demorar alguns dias para se recuperar…
Um GP mais com a cara de Lewis Hamilton, impossível. Tem que ter um pouco de drama, como a classificação ruim (algo sintomático em um ano no qual, ao contrário de toda a sua carreira, Hamilton não brilhou tanto aos sábados); um pouco de família (na verdade, teve até tio caribenho que nunca tinha vindo para nenhuma corrida); celebridades (o ator texano Matthew McConaughey disse, inclusive, que Lewis é convidado em seu rancho na hora que ele quiser) e, para este sexto título, não podia faltar uma bela dose de administração de pneus.
Sim, porque a Mercedes é um excelente carro, sem dúvida, mas Hamilton também fez a diferença aos domingos para conquistar seu sexto título. Adaptou-se mais rápido que os outros a cada condição, com pneus cuja janela de funcionamento não permite titubeios.
Em Austin, ele nem sabia como tinha deixado as duas Ferrari para trás tão facilmente logo nas primeiras curvas. E depois percebeu que, mesmo seguindo Verstappen razoavelmente de perto, seus pneus estavam em condições melhores do que os dele. Pôde fazer uma parada a menos e chegou a sonhar com a vitória, mas acabou vendo um Bottas muito mais forte no final passá-lo como se fosse um retardatário. Nada mal para quem largou em quinto. Muito mais do que ele precisava para selar o título.
Mas Max Verstappen não podia deixar de puxar um pouco do protagonismo para si. O holandês aproveitou as entrevistas pós-corrida para zombar da falta de ritmo das Ferrari, creditando-a à diretiva técnica distribuída pela FIA que, para a Red Bull, desvenda o mistério do motor ferrarista. É fato que a vantagem nas retas foi menor na classificação que vinha sendo nas últimas corridas mas, especialmente se lembrarmos que a vantagem ferrarista era maior na classificação do que na corrida, é muito pouco provável que Leclerc tenha ficado tão atrás (52s) por conta do motor. Os dois pilotos relataram uma dianteira muito instável, o que provavelmente jogou Vettel na zebra que o tirou da corrida.
O carro da Ferrari tem uma janela de funcionamento menor que os demais. E claramente estava fora dela em Austin.
No mais, três corridas a serem destacadas: no segundo final de semana seguido em que cuida dos pneus como poucos, Daniel Ricciardo foi o melhor do resto. Em seu 100o GP, Carlos Sainz foi muito veloz na classificação, levou um toque de Albon e ainda conseguiu se recuperar. E Perez se recuperou muito bem de um erro bobo na sexta-feira para colocar a Racing Point no top 10.
A quarta vitória de Bottas no ano também o confirma como o vice-campeão da temporada. Foi seu melhor ano na F-1 até aqui, mas sem a consistência suficiente para atacar Hamilton. Resta a briga pelo terceiro posto, entre Leclerc, Vettel e Verstappen. Na aposta do holandês, não deve ser um feito tão difícil assim…
Alheio às desconfianças de Max, Hamilton vira e mexe encaixava em suas respostas que não está pronto para parar, que ama o que faz. E não parece ser para chegar em Schumacher ou em quaisquer outros números. É para ter esses dias de Lewis Hamilton.
Essa semana tem mais perguntas dos Credenciados no projeto do Catarse No Paddock da F1 com a Ju. Confira no linkcomo participar também dos próximos!
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Kleber Jorge: Essas ficam para o On Demand. A Liberty Media está com algum plano ‘B’ na mesa caso as obras em Zandvoort e Hanói não fiquem prontas a tempo? Ou esse cenário já está descartado?
Falei com o Jos Verstappen semana passada e ele ainda acredita que a prova não vai rolar. Existe a questão da construção da via de acesso, que enfrenta restrições de ambientalistas, e também melhorias na pista. Ele disse que eles não podem começar a construir nada ainda, pois não há autorização, e o inverno na Holanda costuma ser muito chuvoso. Já sobre o Vietnã, agora a temporada das chuvas está acabando e parece que a obra está andando melhor.
E tem alguma novidade sobre aquele boato da equipe espanhola chegando para 2021 e que traria o Pascal Werhlein?
Não ouvi mais nada sobre o assunto
Ney pergunta: Russell e Latifi na Williams no ano que vem?
Russell está confirmado e até onde eu sei Latifi já tem contrato para o ano que vem com a condição de conseguir a superlicença. Falta apenas uma rodada dupla para a temporada acabar e a pior posição possível para ele na F2 é um quinto lugar – e isso já lhe daria a superlicença. Então não entendo o porquê da demora, ainda que tenha sido o padrão da Williams nos últimos anos.
Tenho minhas dúvidas, contudo, se seria o melhor caminho para a equipe. Latifi não é nada disso, e a Williams já percebeu recentemente que ter um pai bilionário não significa injetar bilhões na equipe (e nem tantos milhões assim). Bilionários, afinal, não chegam a esse nível gastando dinheiro a rodo, e sim reconhecendo bons investimentos, como Stroll fez na Racing Point, a equipe mais eficiente do grid nos últimos anos.
Vou aproveitar três temas trazidos pela Ana Luiza Kalil que acabei não respondendo depois do GP do Japão, mas que são assuntos que continuam dando pano pra manga:
Sobre o ajuste de freios eletrônico da Renault:
No paddock no México, rivais da Renault me diziam que tinha “saído barato” para a equipe, provavelmente porque todos os times estão em meio à renegociação de contratos. E ouvi também que deveria ser algo desenvolvido ao longo da temporada. Mas o que Abiteboul disse é que o sistema está no carro há mais tempo.
Todavia, o mais interessante é que a punição veio no código esportivo e não no técnico. Ou seja, eles foram julgados culpados pelo artigo que diz que “o piloto deve pilotar sozinho e sem ajudas”. É um artigo super amplo, e há vários sistemas no carro que poderiam ser considerados ajudas, como o brake by wire, por exemplo. E Abiteboul pediu para que a F1 “modernize” seu regulamento por conta disso. Uma bela virada de mesa, isso sim.
2 – Quanto à suspeita de irregularidade do motor da Ferrari, eu entendi pelo que você falou na live que não houve protesto formal por parte da Red Bull e da Mercedes, apenas comentários no Paddock, mas seria a mesma questão de suspeita de irregularidade do ano passado que formalmente não deu em nada, apesar de o rendimento da Ferrari ter caído na segunda metade do campeonato?
Como não se sabe exatamente o que eles estão fazendo, é difícil cravar, mas deve ser algo que eles começaram a explorar ano passado, a FIA mandou cortar, mas eles conseguiram driblar de novo. Parece ser daqueles casos em que é mais algo que fere o espírito das regras do que o texto em si. Mas lembre-se que houve muitas mudanças na federação neste ano, e se comenta no paddock que virou um samba do crioulo doido e eles estão fazendo vista grossa para muita coisa (e não só na Ferrari). É importante colocar sob perspectiva o momento que a categoria vive, com as equipes sem contrato para além de 2020. Sei que vivo batendo nessa tecla, mas isso as coloca com a faca e o queijo na mão.
3 – Saiu uma nota falando que o contrato da Petrobras com a McLaren foi rescindido, mas acredito que não seja verdade pelo valor de contrato informado na nota. Queria mais detalhes sobre esta questão.
Nem o contrato da Philip Morris com a Ferrari é tão caro quando o que o governo diz que o acordo da Petrobras com a McLaren é. Várias fontes apontam que o contrato de patrocínio em si começou em 10 milhões de libras em 2018 e foi corrigido até chegar a por volta de 11,5 milhões agora. Seriam 6 anos de contrato, até 2023, então vamos considerar que seriam uns 70 milhões de libras no total. O governo fala em 163 milhões de libras, mas “esquece” de citar que também se trata de um contrato de desenvolvimento de tecnologia. Há, inclusive, óleo brasileiro sendo usado na McLaren desde o fim do ano passado, e isso custa dinheiro. Mas conversei com gente no paddock que duvida dessa cifra. “Até mesmo se eles estiverem contando logística, absolutamente tudo, o valor não bate.”
Outra imprecisão é colocar as coisas como se fosse “uma economia de 163 milhões”. Bom, 21,5 já foram gastos com publicidade e mais outros tantos milhões com o desenvolvimento de combustível e lubrificantes. E é claro que, numa rescisão dessas, também é preciso desembolsar uma grana. Infelizmente, é uma política muito comum no Brasil, “ambidestra” inclusive, de não querer dar continuidade a projetos para não se vincular a uma administração anterior.
Seja como for, falei com o chefe da McLaren no México e ele disse com todas as letras que o contrato não tinha sido terminado, até porque a marca seguia estampada no carro. Mas também ouvi que seria uma questão de dias para que isso acontecesse. É algo que o governo vem tentando fazer desde o início do ano e parece estar perto de se concretizar.
A Ferrari ficou mais presa ao seu planejamento – mais uma vez dando sinais de que suas simulações deixam a desejar em relação aos demais – e esqueceu de ver o que, de fato, estava acontecendo na corrida. A Scuderia reagiu à parada da Red Bull, com Alex Albon, que vinha em terceiro na corrida. O time austríaco optou por colocar pneus macios no carro do tailandês para tentar o undercut, mas cegou-se à possibilidade (que já estava muito clara para a Mercedes) de abrir a possibilidade de fazer só uma parada.
Ou seja, crente de que a Ferrari responderia com Vettel, eles colocaram os pneus médios em Albon comprometendo-o a fazer duas paradas, mesmo vendo o ótimo ritmo de Verstappen com o composto duro. As equipes entraram na corrida dispostas a evitar o duro achando que ele seria lento demais, e Max estava provando o contrário. Caso Albon tivesse colocado o duro naquele momento, estaria na luta pelo menos de um pódio.
Já a Ferrari, acreditando que era necessário ir até a volta 30 com o primeiro jogo de pneus, nem cogitou colocar Leclerc no pneu duro, também comprometendo-se a fazer duas paradas. Do lado do monegasco, houve a mea culpa de admitir que “perguntaram sobre o estado dos pneus e eu respondi”, dando a entender que ele, Leclerc, sentiu que julgou mal a situação da borracha naquele momento. Não coincidentemente, foram os dois pilotos menos experientes do top 5 que caíram na armadilha das duas paradas.
Como a Ferrari decidiu defender a tentativa de undercut da Red Bull com o líder, isso automaticamente jogou Sebastian Vettel para uma tática de uma parada, uma vez que ele perderia a posição para Albon se parasse duas voltas depois.
A cara giro, ficava claro que o calor estava ajudando a proteger os pneus do graining da sexta-feira, e Vettel estava em posição de ganhar a corrida. A não ser por um problema: Hamilton vinha se aproximando, mesmo com um carro danificado pelo toque com Verstappen na primeira curva, e começava a ter a chance de tentar um undercut. A Mercedes, então, esperou que se abrisse um espaço para o inglês voltar sem trânsito e parou, na volta 23, e retornou à pista tão rápido que, mesmo se Vettel respondesse na volta seguinte, voltaria atrás – ouvimos no rádio como se Vettel não tivesse parado porque não quis, mas a decisão foi tomada no final das contas pela equipe também sabendo que a posição de pista estava perdida.
Aí entram as diferentes simulações das equipes. A Ferrari não acreditava que Hamilton poderia chegar até o final com o pneu duro em boas condições, e manteve Vettel na pista pelo máximo de voltas possível para ele ter a chance de atacar o inglês no final. Já a leitura da Mercedes era de que a janela para uma parada tinha se aberto na volta 19, e por isso pediu ao inglês que forçasse o ritmo. Na volta 22, ele ficou a menos de 2s de Vettel, e no final do giro seguinte, parou nos boxes.
Era um pouco cedo, sim, mas era a única chance da Mercedes ganhar a corrida. Caso Vettel parasse antes de Hamilton, ele voltaria na frente e ganharia a corrida. Depois, foi só uma questão de fazer Hamilton acreditar que dava para ir até o final mesmo com um carro cujo equilíbrio não era o mesmo por conta dos danos no assoalho, que tiravam a estabilidade da traseira nas freadas. Mas o time alemão sabia que poderia confiar em seu piloto para fazer isso. No final das contas, foi uma grande vitória tanto do piloto, quanto da equipe.
Vettel acabou parando 13 voltas depois, respondendo ao pit stop de Bottas, que naquele momento era segundo. Leclerc voltou à liderança, mas apenas por seis voltas, até fazer sua inevitável segunda parada, pois teria que usar os dois compostos. Caso tivesse colocado os duros naquela primeira parada, muito provavelmente teria ganhado a corrida, já que Verstappen veio passando o pelotão inteiro com um mesmo jogo de duros, que sobreviveu por 66 voltas.
No final das contas, fica a informação que Mario Isola já tinha passado na sexta-feira, de que o fator limitante do pneu duro era de desgaste, e não degradação. Ou seja, a perda de performance seria repentina, mas apenas no final do stint. Por conta disso, os pneus 13 voltas mais novos de Vettel não seriam suficientes para ele ser significativamente mais rápido que Hamilton, e o inglês venceria pela 83ª vez na carreira.
Na briga do segundo pelotão, uma equipe que soube ler bem a situação de pista levou a vantagem: a Racing Point chamou Sergio Perez aos boxes na volta 20 e colocou os pneus duros, provavelmente deixando a tática aberta para ver o que aconteceria no final da prova – o que a Ferrari tinha que ter feito com Leclerc. E a Renault apostou que as temperaturas mais altas favoreceriam o pneu duro e colocou Ricciardo neste composto desde o início da prova. Ele faria mais de 50 voltas sem trocar pneus e, com isso, foi superando seus oponentes para ir de 13º a oitavo. Moral da história? Não foi uma corrida fácil de ler, mas alguns estrategistas – e pilotos – justificaram seus salários no México.
Começamos a ouvir na sexta que “fulano teve que voltar para o hotel”, “ciclano não está bem”. A comida mexicana é famosa por gerar intoxicações em turistas, mas o que aconteceu no paddock foi algo muito mais amplo do que nas etapas anteriores. A suspeita foi a festa de recepção que o circuito organizou na quinta-feira, mas também ouvi de gente que não comeu no evento e que, mesmo assim, teve que ficar no hotel. Eu nunca tive problemas no México, mesmo sem tomar qualquer tipo de precaução, mas desta vez teve até piloto sofrendo: Pierre Gasly chegou mal no sábado e ainda teve de ouvir de Helmut Marko que, se a situação piorasse, era só ele “correr de fraldas”.
Mas nem o temor de ter uma intoxicação afastou o pessoal da barraquinha de tacos ou de churros, coisas que só temos no México, que acaba sendo o melhor e o pior paddock da temporada, uma vez que convida os VIPs a encher a cara.
Um dos assuntos nas rodinhas era o ativismo de Lewis Hamilton em relação ao meio ambiente. O inglês chegou ao México sabendo que seria questionado sobre isso, e muito mais preparado do que na entrevista que fiz com ele em Suzuka exatamente sobre esse assunto, e confesso que isso me deixou em dúvida do quão verdadeiro ele está sendo a respeito. Mas é importante um esportista, como pessoa pública, levantar essa bandeira. Foi esse o mote da matéria de Ben Hunt para o The Sun, um dos maiores jornais da Inglaterra. Estava chegando no paddock com ele em um dos dias e me impressionou o número de pessoas que vieram criticá-lo por ter ficado do lado de Hamilton.
O piloto, inclusive, foi agradecer ao jornalista pela matéria, algo raro, principalmente envolvendo Hamilton e sua tensa relação com os jornais ingleses. Para vocês terem uma ideia, é 1000 vezes mais fácil eu conseguir uma exclusiva com ele do que o The Sun, por exemplo.
O futuro de Robert Kubica parece estar ligado à Haas, como piloto de testes. O time quer investir em simulação e pode ter mais de um piloto nesta função ano que vem.
Surpreendeu ouvir de Cyril Abiteboul que a primeira versão do contrato para 2021 foi enviado pela Liberty Media na semana passada. Ao que parece, é a situação também das outras equipes, e acredito que tenha a ver com a publicação das regras nesta quinta-feira. Basicamente, elas serão publicadas porque é o limite em termos de prazo, mas é esperado que mudanças ainda aconteçam nos próximos meses. Muita coisa foi mexida nas últimas semanas e, ainda assim, várias equipes estão descontentes.
Perguntei a Cyril também sobre a revisão do investimento na F1 admitido pela montadora. Ele disse que é difícil mesmo convencer a Renault a ficar sem a chance de inovar. Pela resposta já dá para entender que tipo de pressão está sendo feita na Liberty no momento.
Muita gente me perguntou sobre a situação do GP do Brasil depois que publiquei a história de que as negociações estavam reabertas. Houve quem entendeu que agora é uma questão de tempo para São Paulo fechar, mas a situação não é essa. O Rio entregou uma proposta bastante robusta em maio e agora a Liberty quer saber se São Paulo tem condições de cobrir isso. No momento, não tem.
A proposta do Rio é pagar pelo menos 35 milhões de dólares por ano, dinheiro que vem de impostos, uma vez que a cidade tem uma lei que vem da época da Olimpíada que permite o uso de dinheiro público para eventos esportivos e de entretenimento de grande porte. Foi uma lei, inclusive, que visava tirar grandes eventos de SP. Carey quer o mesmo valor dos paulistanos, além da garantia de que Tamas não estará mais envolvido na promoção do evento. E na reunião que citei na matéria, acredito que ele tinha tido pela primeira vez a total clareza disso.
Então, pela ótica da Liberty, o Rio continua sendo uma opção melhor. Mas é claro que a pista primeiro precisa ser construída e, enquanto isso, eles vão negociando com São Paulo para ter mais cartas na mesa. Do lado do Rio, o estudo de impacto ambiental foi concluído e eles devem esperar as chuvas do verão para entrar no terreno. Chase não tem pressa, disse que pode esperar pelo menos até junho de 2020, pois pretende ter o calendário fechado mais cedo ano que vem. E até lá vai dar para ter um cenário melhor em relação à obra.
Os carros da Fórmula 1 foram mais uma vez batidos pela altitude do GP do México, e o que poderia ter sido uma corrida com um final muito interessante, com quatro carros com três estratégias diferentes, acabou virando uma procissão, já que os pilotos perdiam muita aderência quando estavam a 1s5 do adversário.
As cartas que valeram, no final das contas, tinham sido jogadas bem antes de tudo isso. A Mercedes arriscou chamar Hamilton para o box na volta 23 e colocá-lo na estratégia de uma parada, contrariando o que a própria Mercedes pensava a respeito da estratégia antes da largada – Bottas disse que eles estavam projetando duas ou até três paradas antes dos termômetros subirem no domingo e diminuírem o graining sentido na sexta-feira.
Vettel não quis responder já na volta seguinte e aceitou o undercut, acreditando que seria muito difícil Hamilton levar aqueles pneus até o final. E olha que ele nem sabia que a lateral do assoalho do carro do inglês estava comprometida pelo toque com Max Verstappen logo na primeira curva.
No final das contas, o pneu duro durou uma eternidade – no caso de Max Verstappen, 66 voltas! – e Vettel estava errado. Como a outra Ferrari já tinha saído de combate pela opção de seguir com o plano A sem enxergar bem a corrida, e Verstappen apertou o botão de autodestruição na classificação, o caminho estava livre para Hamilton vencer a última corrida que ele imaginaria ganhar na temporada.
Ao pole position Leclerc, faltou a experiência para pelo menos questionar o que os outros estavam fazendo antes de responder que os pneus estavam acabando, abrindo o caminho para a Ferrari adotar a estratégia de duas paradas. São momentos como este que tornam a vida da Scuderia difícil, pois Vettel teve muitos altos e baixos nos últimos anos e Leclerc ainda precisa amadurecer.
Outros destaques da corrida foram o piloto da casa, Sergio Perez, se aproveitando de ter largado na melhor posição possível no grid no meio do pelotão, o 11º lugar, ou seja, o primeiro entre aqueles que não precisam largar com o pneu do Q2. Essa é uma regra sem sentido atualmente, pois só acentua a vantagem dos grandes. E é justamente por essa vantagem que as votações para mudar a regra nunca passam.
Daniel Ricciardo fez uma estratégia completamente diferente, aguentando o máximo de voltas possível com os pneus duros. Foi uma bela corrida de administração do australiano, que pulou de 13º no grid para oitavo na bandeirada.
Mas Ricciardo foi um dos pilotos que ficaram presos atrás de rivais, sem pressão aerodinâmica e com motor e freios superaquecendo. Não tem jeito, essa é uma sina que vem dos 2200m de altitude da Cidade do México e, embora haja o que as equipes possam fazer, simplesmente não vale a pena desenvolver um pacote só para uma prova. Parece, então, que vamos ter de nos acostumar com um espetáculo melhor fora do que dentro da pista no México.
Escrevo estas linhas sem saber o que aconteceu depois que Max Verstappen foi chamado aos comissários a se explicar por não ter tirado o pé sob bandeira amarela na última volta da classificação, quando o carro de Valtteri Bottas estava na barreira de proteção. Seria bom, também, a FIA explicar por que não deu bandeira vermelha depois de um acidente em que a integridade da barreira estava comprometida – e também por que ela estava posicionada de tal forma que Bottas a pegou de lado no segundo impacto. Enfim, o nível especialmente da comunicação da FIA caiu muito neste ano e este sábado foi apenas mais um exemplo.
Mesmo se Verstappen não mantiver a surpreendente pole, a corrida se desenha de forma interessante. A grande prioridade dos pilotos será não ficar preso atrás de um rival, já que a altitude traz grandes problemas para a refrigeração do motor e dos freios. Então a largada deve ser agressiva e, com a falta de aderência também causada pela altitude no México, aliada ao fato dos 6 primeiros largarem com o pneu médio, promete dar muita emoção aos primeiros metros da prova.
Daí em diante, será um mergulho mais ou menos no desconhecido. A Pirelli trouxe pneus mais duros neste ano para o México de olho em evitar o graining, mas não teve muito sucesso. Todo mundo saiu reclamando muito na sexta-feira e acabou não tendo muito tempo de checar se as mudanças de acerto feitas após os treinos livres deram resultado, já que a pista estava úmida no treino livre disputado na manhã deste sábado.
Não por acaso, quando perguntei a Vettel se ele achava que alguém que larga com os médios tentaria fazer uma parada, ele disse que eles só vão descobrir na corrida. “Acho que depois de umas 10 voltas vai dar para termos uma ideia de quanto os pneus estão durando.” É possível, portanto, que alguém divida as estratégias entre os companheiros (um tenta parar só uma vez, outro cumpre a “cartilha” da Pirelli e para duas.
O que não é provável é que os 6 primeiros coloquem os pneus macios. São eles os que sofrem mais com o graining e, por conta disso, até Carlos Sainz tentou fazer o Q2 com os médios. A McLaren julga que a sorte deles é ter as Toro Rosso logo atrás. São eles que vão sofrer, com os macios no começo da corrida, o ataque de quem larga de 11º para trás.
Voltando para a parte da frente, todo mundo saiu da classificação achando que poderia ter feito a pole, não fosse um detalhe aqui e ali. Como, no México, os carros escorregam muito, só mesmo Verstappen fez uma volta limpa, ajudado pela aderência mecânica superior da Red Bull e pela menor necessidade de arrefecimento do motor Honda. Por conta disso, a Red Bull não precisa abrir tanto a carenagem, o que ajuda na eficiência aerodinâmica.
Falando sobre as especificidades deste circuito, tivemos uma aula com os engenheiros da Ferrari na sexta em que eles dividiram alguns dados interessantes: há 60% de diferença em termos de downforce entre a asa da Itália e de Singapura. E, no México, mesmo usando a asa de Singapura, o carro produz tanto downforce quanto na Itália!
Isso explica por que a classificação foi tão difícil e por que as corridas no México costumam deixar a desejar, pois é preciso muita administração de pneus, uma vez que um carro que desliza é um carro que desgasta mais os pneus. Junte-se a isso a questão do arrefecimento e fica fácil entender por que o GP do México costuma ser mais sobre defesa do que ataque. Veremos se a máxima se confirma neste domingo.
Estava pensando aqui com meus botões por que tenho a impressão de que México e Budapeste são os dois GPs em que eu como melhor na temporada. Os dois têm algo em comum: são em cidades baratas, então eu posso ir em restaurantes melhores. Mas tem um fator que desempata o jogo a favor do México: a comida de chefs em restaurantes mais chiques é absolutamente sensacional. Mas o restaurante sujinho da esquina não fica muito atrás.
Eu simplesmente não consigo lembrar de comer algo ruim no México. E isso inclui insetos! Tanto, que só tirei essa foto aí depois de ter começado o prato de chapulines…
Pena que eu não me lembro dos pratos dos restaurantes que fazem uma culinária mais experimental. Geralmente pedimos sugestões para os chefs, misturamos tudo na mesa e vamos provando um pouco de cada. Só posso dizer que absolutamente tudo o que eu comi no Huset e na Casa Awolly era espetacular. Os dois restaurantes ficam no bairro Roma Norte, que é muito bom para se hospedar também. E ano passado já vi que o empresário do Alonso estava no Awolly e eles disseram que o lugar está ficando famoso no paddock, então logo os pilotos vão começar a ir lá também. O que não é exatamente boa notícia porque ele é bem pequeno!
Na linha mais popular, não é por acaso que a Casa de Toño está sempre com fila na porta. O menu não é grande, mas as quesadilas e flautas, dois dos pratos mais tradicionais do México, estão lá com seus variados recheios e são deliciosos. A comida no Mercado de Coyoacán também é altamente recomendável.
A cozinha mexicana tem ainda enchilladas, chiles rellenos, guacamole, pozole… enfim, muito mais do que tacos – não aqueles duros dos EUA, os verdadeiros! Pimenta, abacate, tomate, feijão, milho e abóbora são ingredientes básicos dessa culinária bastante colorida.
A comida é tão boa que eu não lembro de comer muitas sobremesas. A não ser no paddock que, ano passado, tinha barraquinhas de comidas típicas, incluindo churros (que na verdade é espanhol) e um sorvete de tequila. Como não amar o México?
Churrasco à Texana
Não é fácil comer nos EUA, costumo dizer que as porções por lá não são humanas. E como faz se você foi criada para não deixar nada no prato? A sorte é que o GP dos Estados Unidos é perto do México e há muita comida mexicana, ou Tex-mex, por lá para salvar.
Ano passado descobri um restaurante chamado Guero’s que tem tacos al pastor até melhores que os originais mexicanos. Ele fica na South Congress, avenida que tem muitas boas opções de comida. E muitos food trucks também, já que eles são uma febre em Austin, que pode ser no conservador Texas, mas é um oásis com uma cultura bem boêmia, liberal e forte presença de empresas de tecnologia, o que atraiu uma juventude moderninha para lá.
Mas tem uma comida texana à qual tenho que me render: o brisket. Trata-se de um corte de peito de carne preparada lentamente como churrasco, por 4 a 7h. Já disse por aqui que parei de comer carne de vaca no fim do ano passado, menos talvez abra uma exceção. Culpa do tal brisket, que é tão macio que desfaz na boca. E o melhor que eu comi até hoje foi no restaurante EastSide Tavern, ainda que o mais famoso – pelo menos para nós da F1 – seja o Cooper’s Old Time Pit Bar-B-Que. Se quiser encontrar gente da F1 no domingo à noite, lá é uma boa. Ano passado tinha uma mesa gigante com todo o pessoal da Honda. Sim, até os japoneses se renderam ao brisket!
É sempre assim: saio dos circuitos cerca de 5h depois do final da corrida e fico impressionada com o que vejo pelo caminho: as garagens já estão praticamente desmontadas e colocadas em grandes caixas nas quais tudo se encaixa milimetricamente. E todo mundo coloca a mão na massa, incluindo quem trabalha servindo café e coisas do tipo. Claro que os engenheiros e chefes ficam de fora – provavelmente, a esta altura, eles e os pilotos já estão pegando seus voos. Costuma-se levar de 6 a 8h para desmontar tudo, dependendo do espaço disponível no paddock e da facilidade de acesso dos caminhões à pista. E o paddock da China, bastante amplo, é tido como o melhor.
Mas isso é só a ponta do iceberg da loucura que é a logística da Fórmula 1, que permite façanhas como desmontar o circo em Melbourne e montá-lo novamente em Manama, a mais de 12.000km de distância, em três dias.
Dependendo da corrida, os equipamentos são mandados por meio de caminhões ou por uma combinação de avião mais navios. Começando pela parte mais simples, são cerca de 300 caminhões que viajam para as etapas europeias (menos Baku, que fica geograficamente na Europa mas é considerada uma corrida “flyaway”, na linguagem da F-1, ou seja, para onde o equipamento voa ao invés de ir por terra).
Por via aérea, os equipamentos das diferentes equipes se “encontram” em dois pontos: no aeroporto de East Midlands, no centro da Inglaterra, e em Munique (para onde são enviadas as caixas de Ferrari, Toro Rosso e Alfa). A DHL é quem fica encarregada de fazer esse transporte para as corridas, mas isso sai caro: a estimativa é de que cada time transporte 50 toneladas de equipamentos por ano, ao custo de 8 milhões de dólares.
Mas acho que a parte mais interessante é o transporte marítimo. Basicamente, as equipes compram cinco equipamentos iguais e enviam quatro para as primeiras quatro etapas com antecedência e a quinta para o Canandá. Depois, o que estava em Melbourne vai para Singapura, a carga de Xangai vai a Suzuka, de Manama vai para Sochi, de Baku, para Austin e do Canadá, para o México. Depois, de Singapura, a carga vai para o Brasil e, de Sochi, para Abu Dhabi.
Ou seja, é por conta desse transporte marítimo que é possível fazer dobradinhas como Austrália e Bahrein, Singapura e Rússia (ou Japão) e Azerbaijão e Canadá, ainda que essa última não seja muito bem vista pelas equipes. Porém, foi feita uma inversão importante para o ano que vem em relação a quando isso aconteceu, em 2016: fazendo Baku primeiro, ganha-se 8h para o transporte devido à diferença de fuso entre o Azerbaijão e Montreal.
Isso só faz sentido porque é um meio de transporte mais barato para encomendas ao mesmo tempo pesadas e não muito caras – ou seja, quando compensa comprar cinco peças diferentes do que voar com a mesma o ano todo.
Já nas caixas que são transportadas por via aérea e terrestre estarão todo o equipamento de montagem dos boxes, computadores, peças, cabos, e o carro é desmontado ao máximo e colocado no contêiner acolchoado para evitar danos. O transporte de motores, combustível e lubrificantes, além dos pneus, fica a cargo dos fornecedores. Aliás, o fato da Pirelli transportar seus pneus, que vêm da Turquia, em caminhões não climatizados é tido como um dos motivos para a falta de consistência de seu pneu, mas isso é outra história…
Caso as corridas não sejam em dois finais de semana seguidos, o equipamento volta para a fábrica, onde tudo é checado para a corrida seguinte. Mas pode acontecer de uma peça ficar pronta de última hora e as equipes terem de mandar alguém para o outro lado do mundo só para carregar a tal peça na sua bagagem. Isso é mais comum do que se imagina e, no voo de volta do Japão, cruzei com um cara de 20 anos que tinha feito isso: ele trabalha no estoque da Red Bull e entrou numa lista de espera para ser um desses “entregadores de luxo”. A equipe pagou a viagem e hotel do outro lado do mundo só para ele levar a peça.
Outra coisa que também acontece é, quando um motor quebra, ele é imediatamente levado para a fábrica para ser analisado. No caso da Honda, por exemplo, isso significa mandá-lo para Sakura, no Japão.
Tudo isso porque as equipes avaliam que o custo do transporte é compensado pelos benefícios de uma análise rápida – ou pelos 0s00001 que a tal peça nova vai dar.
Por outro lado, os times estão constantemente tentando levar menos coisas para as corridas para economizar. E por conta disso às vezes ouvimos algumas histórias até meio bizarras no paddock. O time de comunicação da Mercedes foi questionado por conta de sua impressora. Pediram que eles não levassem mais e que comprassem uma a cada GP! Não é por acaso que muita gente anda questionando se a categoria não poderia pelo menos tomar passos mínimos em relação à sustentabilidade.
Já questionei, inclusive, a chefia da FOM sobre isso, mas claramente não há muito entusiasmo em pensar no tema. O que eles gostam mesmo é de mostrar os números: ao longo de uma temporada, cada equipe transporta 600 toneladas de equipamentos por via aérea e 500 toneladas pelo mar. E os seis 747 viajam por 132 mil quilômetros, ou seja, dão a volta ao redor do mundo mais de três vezes.
No último “capítulo” da sessão Nostalgia, relembramos a primeira vez em que Niki Lauda voltou ao circuito de Nurburgring depois do acidente que quase o matou em 1976. O austríaco saiu de lá com um quarto lugar e, mesmo vendo seu rival na disputa pelo título e companheiro de McLaren, Alain Prost, vencer, manteve-se em vantagem na tabela para a prova final, em Portugal. Tudo isso, há 35 anos.
A prova marcava o retorno de Portugal ao calendário 24 anos depois da corrida disputada no Porto ter desaparecido do campeonato. E o circuito do Estoril não estava totalmente pronto quando a F-1 chegou por lá, em função das fortes chuvas nos dias anteriores à prova.
A situação do campeonato era a seguinte: com quatro pontos e meio entre Lauda e Prost, o francês precisava vencer a corrida e torcer para o companheiro não passar de terceiro para ser campeão. Se Prost fosse segundo, também levaria seu primeiro título caso Lauda não pontuasse, uma vez que os pontos eram dados aos seis primeiros na época.
Parecia tudo sob controle para Lauda, que tinha feito uma campanha muito regular, vencendo cinco corridas contra seis de Prost até então – sempre que viu a bandeirada, ele foi no mínimo quarto. Mas a disputa chegou a tomar tons dramáticos quando o austríaco se classificou apenas em 11º, enquanto o companheiro sairia em segundo, atrás do pole position Nelson Piquet – o brasileiro faria nove poles naquela temporada, em 16 corridas.
Largar atrás de Prost não era raridade para Lauda. Na temporada, isso aconteceu em 15 corridas, e era algo explicado pelo piloto pela diferença de idade entre ele e Prost – ainda que eles tenham só seis anos de diferença. “O problema”, dizia ele. “É que você freia com sua cabeça, não seu pé. E sem perceber começa a frear a um metro do muro, e não um milímetro.” Seja como for, é interessante ver Prost tendo tamanha vantagem em classificações, uma vez que ele se notabilizou por focar mais na corrida – e levaria desvantagem constantemente em relação a Ayrton Senna no final daquela década.
Senna, inclusive, surpreendeu ao colocar a Toleman em terceiro no grid naquele dia, em um presságio do domínio que teria na corrida portuguesa do ano seguinte, em sua primeira vitória.
Prost chegou a largar melhor do que Piquet, mas foi superado pelos pilotos que vinham atrás e terminou a primeira volta em terceiro. Na nona volta, contudo, já tinha tomado a ponta, enquanto o progresso de Lauda mais atrás era bem mais lento: ele só conseguira chegar até a nona posição até aquele momento.
A escalada de Lauda não foi das mais rápidas mas, um a um, ele ia passando seus rivais, até superar Senna na volta 33 de 70 e chegar ao terceiro posto. Para ser campeão, como Prost fazia uma corrida solitária na liderança, ele teria que passar Nigel Mansell, mas a tarefa não parecia ser fácil.
Até 20 voltas para o final, Prost seria campeão, mas na volta 51 Mansell rodou devido a um problema nos freios. Lauda não estava perto o suficiente e não conseguiu superar o inglês. Contudo, os problemas pioraram e Mansell rodou de novo na volta seguinte, e só então Lauda finalmente o passou e chegou no resultado de que precisava para selar a conquista do terceiro título.
Mansell acabou abandonando, bastante irritado com sua equipe: era sua última corrida pela Lotus antes de sua primeira ida à Williams, e seu chefe Peter Warr decidiu que ele não teria os freios que escolhera.
Melhor para Lauda, que se tornou o campeão com o maior número de anos entre títulos. Quando conquistou o bi, em 1977, tinha 28 anos e, ao celebrar o tri, chegara aos 35.
Os assinantes Credenciados do projeto do Catarse– a maioria deles, aliás, que já garantiu suas camisetas ou bonés autografados por seus pilotos favoritos! – perguntaram, e aqui vão as respostas. E, desta vez, o F1 on demand conta até com uma mãozinha lá da Holanda.
Cleber Humberto Balieiro: Oi Ju, voltei há pouco da Holanda e, numa pesquisa muito informal com os holandeses percebi que eles ou adoram o Verstappen ou simplesmente não gostam dele, alguns até falam mal do cara. Estranho, não?!?
Para me ajudar com essa resposta eu convidei o jornalista holandês Joe van Burik. Aqui a opinião dele:
“Primeiramente, os holandeses podem ser bem oportunistas em como eles apoiam um esportista. Quando ele ou ela vai bem, eles agem como um rebanho, mas também podem desaparecer assim que a performance cai.” Joe explicou que o apoio caiu, por exemplo, quando ele teve aquela sequência ruim no começo de 2018, e provavelmente está menor agora em comparação com julho, por exemplo.
“Em segundo lugar, a origem do Max. “Ele tem um passaporte holandês, mas é nascido e criado na Bélgica – ainda que bem perto da fronteira com a província de Limburg, no sul. Dito isso, as pessoas de Limburg tendem a ser um pouco diferentes em relação ao holandês comum, talvez tenham a cabeça menos aberta e sejam menos diretos.”
“Outro fator é que Max é do automobilismo, o que, mesmo com a história do GP da Holanda e de Zandvoort, nunca combinou com a cultura Calvinista, mesquinha e consciente em relação ao meio-ambiente que domina o debate público na Holanda. A prova disso são as questões ambientais que estão sendo levantadas a respeito da volta do GP. Isso mostra outro traço comum dos holandeses: muita gente aqui não quer que você tenha sucesso no que você faz, ainda que alguém vá querer levar os louros quando você chegar lá.”
Mesmo com todos esses fatores, Joe acredita que os ‘haters’ de Max são uma minoria no país. Pelo menos com o crescimento proeminente de publicações representadas na sala de imprensa e com toda a maré laranja invadindo cada vez mais provas, isso parece ser a realidade.
Kezo Manabe: A água da chuva que entra dentro do carro, como se faz?
Na verdade a água só entra no carro com ele parado, e por isso quando está chovendo na largada os times deixam um guarda-chuva no cockpit e, em casos mais extremos, montam uma tenda. Com o carro em movimento, a velocidade é tanta que muito pouca água entra, até porque ela vai seguir o fluxo aerodinâmico, assim como o ar.
Valdinar Gouveia: Teremos mudança novamente entre o driver 2 de Red Bull e Toro Rosso para 2020?
Vamos saber isso durante ou depois do GP do México, como Marko já avisou. Falando com o pessoal da Red Bull em off, eles estão bastante contentes com o trabalho e o feedback do Albon. Mas em situação de piloto na família Red Bull eu não coloco minha mão no fogo.
Kleber Jorge Com o impasse gigante que continua acerca das regras para 2021 há alguma chance de acabarem deixando do jeito que está?
Há algum ceticismo em relação a isso, mas no estágio que as coisas estão, as equipes e a FIA já fizeram muitas análises e simulações, então já não é mais uma questão de apresentar novas ideias, mas de chegar a um acordo. É diferente da situação dos motores V6, cuja estreia foi adiada porque o projeto era complexo demais e ainda estava muito verde. Uma data importante será dia 31 de outubro. Ainda é possível que tenhamos o regulamento publicado e que faltem só algumas pendências – como o que vai ser padronizado, por exemplo.
Será que Lewis Hamilton tinha mesmo que fazer sua segunda parada? A estratégia não teria sido uma forma da Mercedes aplicar ordens de equipe sem ter de pedir para seu campeão sair do caminho de Valtteri Bottas? Todos os números – principalmente o mais importante deles, a quantidade de borracha que faltava nos pneus do inglês, apontam que não. A única possibilidade seria tentar se segurar à frente de Sebastian Vettel e garantir a dobradinha mas, quando Hamilton parou, com 11 voltas para o fim, era mais provável que ele conseguisse usar a aderência dos pneus macios para tirar 5s e passar Vettel do que se segurar com pneus que cairiam do penhasco, na linguagem que se usa na F-1, e rapidamente se tornariam 3s por volta mais lentos. Naquele momento, ele tinha 15s de vantagem para o alemão, muito menos velocidade de reta e perderia, também, a vantagem nas curvas.
Em outras palavras, na volta 42, quando chamou Hamilton aos boxes, a Mercedes já tinha cometido dois erros com a estratégia do inglês por acreditar numa premissa que não era verdadeira e julgou que já tinha perdido a dobradinha mesmo tendo o carro mais rápido na corrida. A vitória de Bottas nunca esteve em questão.
Algo que parece ter atrapalhado o julgamento de muitos foi um gráfico que estreou justamente neste GP do Japão, mostrando a porcentagem de desgaste dos pneus. Ele tem de ser interpretado junto a algo com que nos acostumamos a ver desde a chegada dos pneus Pirelli, em 2011: a degradação destes pneus não é linear. Ou melhor, é linear até o ponto em que eles desabam do que se convencionou chamar de penhasco (a expressão usada na F1 é “to fall off the cliff”). Basicamente, usando a informação do gráfico, os engenheiros explicaram após a prova que um pneu vai de 100% a 70% na mesma velocidade que vai de 70 a cerca de 10%.
Também é a importante a informação de que os compostos C2 e C3 (médio e macios no Japão) têm performance e duração próximas. Em Suzuka, a diferença de performance era de 0s6 e a durabilidade, praticamente a mesma. Já o duro era 1s4 mais lento que o médio.
Mas por que o GP do Japão chegou a essa situação?
Ainda no grid, entrevistei Mario Isola sobre as mudanças nas condições de pista após toda a chuva que veio com o tufão e ele apontou que teríamos uma corrida de duas paradas devido ao desgaste maior em relação à sexta-feira. Red Bull e Ferrari também largaram com isso em mente, mas a Mercedes, confiante de que a melhor aerodinâmica de seu carro poderia compensar o desgaste, estava em dúvida, e planejava usar isso para dividir suas estratégias e conseguir a dobradinha. Já à Ferrari interessava usar a posição de pista para se defender, uma vez que eles sabiam que seu desgaste de pneus seria maior, mas sua vantagem nas retas era tanta que, mesmo com o DRS aberto, a Mercedes era só cerca de 2 km/h mais rápida.
As coisas pareceram começar bem para a Mercedes quando Vettel soltou a embreagem um pouco antes das luzes se apagaram e se atrapalhou na largada, e Charles Leclerc acabou com sua corrida nos primeiros metros, também com uma largada ruim e tocando-se com Max Verstappen, tendo de trocar o bico de seu carro (após longas discussões via rádio entre ele, a equipe, e a FIA, em mais um exemplo de falta de pulso no pitwall ferrarista). Com uma grande largada, Bottas pulou para primeiro, Vettel conseguiu se manter em segundo e Hamilton perdeu terreno depois de ser seguro por três voltas por Leclerc.
Mesmo assim, o inglês conseguiu recuperar o terreno ao longo do primeiro stint, enquanto Vettel ouvia que a Ferrari seguiria com o plano A de duas paradas. A janela para isso abriria na volta 14 e, na seguinte, a Mercedes teria a primeira oportunidade real de fazer o undercut, pois Hamilton estava a menos de um segundo de Vettel. Porém, enganados de que a estratégia de uma parada poderia ser melhor para seu carro, decidiram não chamá-lo. A Ferrari não deu sopa para o azar e Vettel entrou na volta 16. Bottas naquele momento era o único carro andando em 1min34 e claramente tinha sido instruído que faria duas paradas. Logo, foi chamado na volta seguinte para cobrir qualquer chance de undercut da Ferrari, ainda que ela fosse mínima: para a estratégia de Bottas, não tinha segredo, era só copiar o que Vettel fizesse. Porém, ainda em dúvida se seu carro poderia fazer só uma parada, a Mercedes optou por deixar a estratégia de Bottas em aberto e colocou pneus médios, enquanto a Ferrari se comprometeu com duas paradas colocando os macios. Vettel estava liberado para forçar o ritmo.
Depois de perder a chance de parar antes de Vettel e usar a aderência extra do pneu para voltar na frente, cabia a Hamilton tentar levar o pneu macio até seu limite. Mas isso não deu certo: duas voltas depois, Lewis já era 3s mais lento que Bottas, e ele acabou parando apenas quatro voltas depois, na 21ª. Levando em consideração que as estimativas iniciais apontavam que quem quisesse fazer só uma parada teria de levar o pneu até a volta 27, ali já estava claro que era um erro.
Isso até Lewis viu de dentro do cockpit, quando ouviu que tinha voltado 7s atrás de Vettel e 17s atrás do líder (lembrando que no momento em que a Mercedes perdeu a chance do undercut, ele estava a menos de 1s de Vettel e a 6s de Bottas) e disse: “Estou fora da corrida agora, né? Por que não me colocaram com o duro? E agora querem que eu force, né?”
Respondendo a Lewis: sim, ele teria que cuidar dos pneus por mais de 30 voltas ao mesmo tempo em que não poderia deixar a diferença para Bottas aumentar em 4s neste mesmo período. O pneu duro era lento demais. E o jeito era reverter a estratégia para duas paradas, ou seja, ele tinha que forçar.
Depois da corrida, Hamilton disse que, “com uma orientação melhor, eu poderia ter ido até o final com aqueles pneus”. Ou seja, se não tivessem instruído que ele forçasse e tivessem permanecido 100% na estratégia de uma parada. Mesmo assim, isso não lhe daria a vitória, só abriria a chance dele se segurar na frente de Vettel.
Mas a Mercedes pediu que ele diminuísse a distância para Vettel primeiro pensando em um undercut (a Ferrari tinha deixado a porta aberta para isso porque o alemão teria que colocar o composto médio), mas Hamilton não conseguiu chegar perto tão cedo e Vettel acabou parando quando o inglês ainda estava 5s atrás.
A última cartada seria esperar os primeiros sinais de que o pneu médio de Hamilton já não estava tão rápido para ele parar e tentar usar a diferença de vida da borracha para recuperar o prejuízo. Por isso, na primeira vez em que ele foi mais lento do que Bottas, foi chamado. Voltou naquele cenário do começo do texto, com 4s6 para Vettel e 11 voltas para o fim. Não era fácil, mas era possível a equipe recuperar-se de todos os erros e conseguir a dobradinha, mas Vettel usou muito bem as qualidades da Ferrari e se manteve à frente.
Outra briga estrategicamente interessante e que acabou tendo o mesmo fim foi entre Alex Albon e Carlos Sainz. Albon ficou preso atrás do espanhol por todo o primeiro stint, antecipou bastante sua primeira parada indicando que faria duas. Como já tinha perdido a posição pelo undercut, a McLaren decidiu ficar na pista e Sainz levou o pneu macio até a volta 26. Retornou à pista muito atrás, 24s, e cruzou a linha de chegada a 6s do tailandês porque ele parou mais uma vez. O exemplo da corrida de Sainz é a tal “orientação” que Hamilton queria da Mercedes. No caso do espanhol, não foi o suficiente para ganhar a posição em um dia no qual fazer duas paradas era mesmo a melhor estratégia.
O alívio foi grande quando, ainda na van que faz o transporte dos jornalistas do hotel para o circuito, ficamos fazendo na sexta de manhã que as atividades do sábado estavam canceladas devido ao tufão. FIA, FOM e equipes vinham monitorando a situação desde o início da semana, mas a decisão final tinha de vir do circuito junto às autoridades locais. E ela veio junto de um trabalho rápido e eficiente para desmontar o que correria risco devido ao vento e proteger os equipamentos.
No final das contas, o tufão não passou tão forte por Suzuka – eu estava em Yokkaichi, um pouco mais ao norte, e o vento foi bem pior mais no final da tarde, mas não o suficiente para derrubar árvores ou causar outros danos do tipo. Foi mais a leste desta região que ocorreram as mortes e mais estragos.
Isso, num país extremamente preparado para desastres naturais, para se ter ideia da força do fenômeno. Algo que parecia que algumas pessoas sentadas em seus escritórios não pareciam ter noção. Ouvi de alguns jornalistas de TV europeus que pediram que eles se deslocassem para tentar gravar com os pilotos durante o tufão.
Minha turma ficou jogando o Monopoly emprestado pela Mercedes – na verdade, eles emprestaram vários jogos, mas só a partida do Monopoly durou 6h… – e para quem se animou em achar para comprar, o jogo não está à venda.
Nos bastidores, houve uma votação entre as equipes sobre as regras propostas para 2021. Lembra que era para o texto sair em outubro? Não vai. Seis times barraram as novas regras, e é preciso que pelo menos 7 estejam a favor para levá-las adiante do jeito que estão. Sem surpresas, Mercedes, Ferrari e Red Bull comandaram o levante, trazendo consigo Toro Rosso, Haas e Racing Point.
À FIA e à FOM, resta abaixar a cabeça e deixar que os engenheiros apresentem as suas soluções. Diferentemente de quando Bernie Ecclestone enfiou guela abaixo o motor V6, a fim de garantir que a Mercedes continuasse no barco, hoje as equipes não têm contrato com a F-1 para além de 2020. E o trio de ferro só assina quando conseguir o que quer: manter-se na frente.
Mas as brigas de bastidores não param por aí: perguntei a Max Verstappen se ele achava que o campeonato do ano que vem seria mais competitivo. Ele disse que esperava que a Ferrari perdesse muito o terreno. Questionei se ele queria dizer que o time tem algo de ilegal em seu carro/motor e ele só sorriu e foi embora. Mercedes e Red Bull têm certeza de que alguma coisa não bate na evolução ferrarista.
E o mesmo acontece mais atrás no grid. A Racing Point protestou o carro da Renault devido a uma suposta irregularidade no equilíbrio de freio, que estaria sendo mexido por meio de configurações pré-estabelecidas eletronicamente. Se for comprovado que isso existe, podemos ter exclusão de resultados de uma equipe que vem levando uma facada atrás da outra.
Até por conta disso, houve no paddock quem levantou a hipótese do “assobio” ter vindo de alguém que quer derrubar Abiteboul – claramente alguém pouco amado lá dentro. Mas também há a possibilidade dos fotógrafos espiões terem feito seu trabalho.
Mas a Racing Point paga um fotógrafo só para espionar o carro dos outros? Sim, como a maioria das equipes. E não é pouca grana. Só dizem as más línguas que falta talento de CIA para o empregado pela Ferrari.
No meio dessa verdadeira selva, os promotores de SP foram à Londres levar uma proposta mais alinhada com o que a FOM está lhes pedindo: um contrato mais favorável à categoria e novas caras atrás da prova. Não foi dessa vez que saiu um acordo e o futuro do GP Brasil segue em aberto. Parece que a mesa de Chase Carey tem muitas demandas antes para resolver.
Quem destoou de um domingo com muitos erros foi Valtteri Bottas, se reencontrando com a vitória depois de seis meses. E pensar que, em abril, ele tinha vencido metade das provas disputadas até ali. Não só o gosto da vitória, como a sensação de estar no controle de uma corrida, estavam fazendo muita falta ao finlandês.
Voltando um pouco no tempo, na classificação, o carro que se deu melhor com o vento fechou a primeira fila, mas a vitória escapou das mãos da Ferrari quando os dois pilotos falharam nos primeiros metros: Vettel se atrapalhou com a embreagem e deu sorte de ter se movimentado dentro do limite tolerável do sensor de queima de largada, algo semelhante ao que aconteceu na Áustria com Valtteri Bottas. Ao seu lado, Leclerc também não largou bem e depois perdeu a dianteira na curva 2, atingindo Max Verstappen e efetivamente acabando com a corrida do holandês. Ele tentou seguir na pista com a asa se desmanchando, e no resumo da ópera acabou levando duas merecidas punições. Mas também é justo dizer que, depois disso, escalou o pelotão duas vezes e fez manobras agressivas numa pista em que erros são punidos com dureza.
Mas Vettel não estava totalmente fora do caminho e a Mercedes decidiu dividir suas estratégias para tentar a dobradinha. Caso tivesse mais informações, não o faria: com mais degradação que o esperado, fazer só uma parada era a estratégia mais lenta, vide o que aconteceu na disputa entre Alex Albon e Carlos Sainz (que fez outra excelente corrida) mais atrás.
Quando eles perceberam isso, já era tarde demais: Hamilton ficou lento na pista com pneus usados, parou antes do que precisava e depois foi instruído a atacar. Foi nesse momento em que sua corrida passou a ser por, no máximo, um pódio, já que seus pneus não aguentariam e a estratégia teria de ser revertida para duas paradas. Não é a primeira vez que James Vowles erra sob pressão.
E olha que não é uma pressão pelo campeonato. O sexto título por antecipação é um feito e tanto para a Mercedes, fruto de uma paixão pelo perfeccionismo. Mas, para nós, um pouco de imperfeição faz um bem danado.
A cara do Japão: comer, gostar, e não saber o que é
O melhor lugar para comer: o sushi de Yokkaichi (acho que essa até quem mora lá não sabe!)
O que evitar: Se pedir uma pizza no Japão, acabou a amizade
Pensei em fazer da terceira temporada do Turistando uma volta ao mundo culinária durante o último ano, e passei a colecionar fotos das minhas refeições. Achei que tinha feito um bom trabalho até ver a lista e perceber que, basicamente, só tinha pratos do Japão. Eu devo ter fotografado todas as refeições que comi nas duas semanas em que fiquei por lá ano passado. Não foi por acaso: eu amo o Japão e desconfio de quem não gosta.
Não que eu entenda qualquer coisa de comida japonesa. Na verdade, minha grande diversão é comer coisas que eu nem consigo decifrar o que são. Como já expliquei no texto sobre a comida da China, na Ásia é normal os menus terem muitas fotos, então você tem uma ideia vaga do que é, aponta e torce pelo melhor.
Uma coisa curiosa que acabou “aparecendo” na minha mesa foi um quiabo empanado. Achei curioso porque eu nunca tinha visto quiabo fora do Brasil, mas também acho que não me interessaria por um prato de okra, a estranha tradução de quiabo para o inglês! Outra surpresa que eu tive por lá foi encontrar um pé de caqui em uma trilha perto de Kyoto. Estava morrendo de fome, então foi providencial.
O que muita gente não sabe sobre o Japão é que dificilmente você vai encontrar, como no Brasil, um restaurante que sirva ao mesmo tempo sushi e tempura, por exemplo. Lá, você vai ter os especializados em sushi e sashimi, os de tempura, de udon, tonkatsu, yakitori, etc.
Outra lição importante é que o Japão é daqueles países em que os lugares menos pretensiosos geralmente são os melhores. Fui em lugares incríveis que nunca encontraria sozinha, com locais que conheci viajando ou nas ruas de Tóquio mesmo, como um bar de whiskey que ficava alguns andares abaixo do térreo – o celular até perdeu o sinal – e meu amigo, japonês, parecia estar falando códigos para passar de porta em porta. Quando chegamos, era um bar com uns 6 lugares no máximo e atendimento VIP.
Não que bares e restaurantes minúsculos sejam raridade. Ano passado eu e um colega da F1 fomos parar, às 3h da manhã, em um bar em que deviam caber umas duas pessoas dentro e o resto ficava em pé do lado de fora. Éramos os únicos não japoneses e viramos atração.
Em outro bar, também em Tóquio e também minúsculo, só tinha lugar no segundo andar e as escadas eram difíceis de subir, desconfortáveis. Até pensamos em trocar de bar, mas desistimos. Ainda bem, pois logo descobrimos que poderíamos abrir uma pequena “porta” no chão, que dava acesso direto ao barman! E eles tinham um sistema de cordas bem artesanal para fazer a bebida “subir”. Genial.
Mas Suzuka não é nem um pouco perto de Tokyo e, dependendo de onde você se hospeda, as opções não são tantas. Tanto, que muitas vezes o pessoal que se hospeda em Shiroko acaba indo em um restaurante espanhol! Acho isso um sacrilégio, mas confesso que já jantei por lá. Só não estiquei igual um colega que já passou dos 60 anos faz tempo e ainda tem energia para beber todas no restaurante espanhol e, segundo ele, ser “puxado” para um karaokê na acanhada Shiroko por Mika Hakkinen. Até as 5h da manhã.
Voltando à comida, o que gostamos de fazer em lugares onde a culinária é muito boa e diferente é pedir várias porções e dividir com todos na mesa. Sempre tem que ter gyosa e edamame, algum tipo de yakitori (frango ou outra carne no espeto, com molho adocicado), algo com tofu e com camarão ou outros frutos do mar.
Mas cadê o sushi? Lembra que contei no texto da itália que a pizza do Al Anbic tinha feito eu praticamente parar de comer pizzas em outros lugares, já que seria inútil tentar superá-la? O mesmo aconteceu com o sushi depois de ir a um restaurante em que cabem umas 15 pessoas apertadas em Yokkaichi, e cujo nome eu não faço ideia. Foi o Jayme Brito, produtor da Globo, quem me apresentou o lugar, onde ele vai pelo menos uma vez por GP com a turma da
emissora, claro, e uma turma de alemães – e nas últimas vezes o chefe da Racing Point Otmar se juntou à turma também, com direito a tratamento diferenciado: especialmente para ele, criado nos EUA, o sushiman faz california rolls. Eu sou mais os sashimis, já que a qualidade dos peixes é imbatível. E não precisa inventar muito: o bom e velho atum de lá é inesquecível. Mas também é só uma vez por GP: a conta ano passado para cinco pessoas ficou quase o mesmo que as quatro noites de hospedagem do meu hotel. E olha que a hospedagem do Japão é a mais cara da temporada!
Outra coisa imperdível no Japão são os supermercados. É impressionante o número de produtos que são muito difícil adivinhar do que se trata, ao mesmo tempo em que a variedade é incrível, o que também se aplica a mercados pequenos, com comida rápida. Lá eu vi um kit de bananas que iam de uma bem verde até outra pronta para comer, embaladas lado a lado para você comer uma por dia. E encontrei também um ovo, cozido, pronto para um lanche. E a imbatível “geladeira” quente, para chás e cafés.
Confesso que, desta vez que fiquei mais tempo no Japão ano passado, em alguns momentos cansei do adocicado da comida e da constante aventura que era escolher comida. Mas essa sensação sempre passava rápido!
Vira e mexe ouvimos um piloto pedir via rádio: “Preciso de mais potência!”. E logo o engenheiro passa uma combinação de configurações para que ele passe a usar. É o modo de motor que está sendo mudado, e talvez o mais famoso desta temporada seja o tal “modo 11” da Honda, usado por Max Verstappen para caçar, um a um, seus rivais na Áustria e chegar à vitória após uma ultrapassagem com duas voltas para o fim.
Depois daquela corrida, Verstappen quis acabar com o oba-oba em torno do tal modo 11 – especialmente os jornalistas japoneses estavam empolgados, pois era justamente a possibilidade de ter um modo mais poderoso por mais tempo que vinha faltando para a Honda aos domingos – e disse que ele estava longe de ser novidade. Mas sem dúvida foram as evoluções deste ano no gerenciamento de energia que permitiram um ataque tão forte.
Por que é necessário ter modos de motor?
Por que as equipes não podem usar o que ficou conhecido como “modo festa”, ou seja, a melhor configuração possível, utilizada apenas nas voltas mais importantes da classificação – para os grandes, somente no Q3 – o tempo todo? A resposta é simples: porque eles precisam terminar a temporada com 3 UPs (isso é um jeito simplificado de falar, na verdade o limite são três motores a combustão, turbos e MGU-H; e apenas dois MGU-K, bateria e centralina eletrônica).
Os modos de motor, portanto, são ao mesmo tempo fundamentais para as unidades de potência aguentarem por tanto tempo, e também um importante componente estratégico, que cada equipe usa de acordo com suas necessidades ao longo da temporada.
Voltando ao exemplo da Red Bull: eles sabiam, por exemplo, que não teriam chances de marcar mais pontos do que a Ferrari em Monza. Logo, puderam poupar seu motor, usando modos mais conservadores, na corrida. Já a Scuderia sabia que tinha grandes chances em casa e em Spa, e usou tudo o que podia. Mais equilibrada na temporada, a Mercedes não precisa arriscar tanto. Um carro forte em todas as pistas, portanto, vai ajudar inclusive a usar a UP da melhor forma possível e aumentar sua vida útil.
Quantos modos de motor existem?
Não há uma resposta para isso. Quando uma equipe recebe uma unidade de potência nova, ela vem com a recomendação de um número de quilômetros em que pode ser usada com potência máxima. Isso porque o uso do motor vai prejudicá-lo e, quanto mais agressivamente for esse uso, maior o dano. E o que os times querem é um motor com o mínimo de diferença possível entre sua primeira e sua última corrida.
Apesar destes limites serem os mesmos para todos os que usam os mesmos motores, é a equipe que decide como e quando vai utilizar cada um desses modos – e isso vai depender muito da situação em que ela se encontra na corrida e no campeonato. É justo dizer, por exemplo, que a Williams é a equipe com os motores mais “saudáveis” da F-1, já que raramente estão disputando com outro time e podem usar os modos de motor mais conservadores por mais tempo, evitando estourar o limite e ter de pagar por mais uma UP.
Mas existe outro motivo pelo qual o party mode não é usado o tempo todo na corrida: ele tira toda a energia possível das baterias para usá-la em uma volta, e obviamente, durante uma prova, você tem de equilibrar o que tira e o que carrega nas baterias. E talvez esteja aí a dica para o que a Ferrari vem conseguindo fazer nesta temporada, com seu modo de classificação ultrapoderoso, que não é replicado nas corridas justamente porque as baterias não conseguem ser recarregadas na mesma velocidade.
Existem basicamente três modos de motor: de treino livre, de classificação e de corrida. E dentro de cada um deles há os sub-modos, usados de acordo com a necessidade. Por exemplo: o sub-modo mais potente do treino livre será usado nas simulações de classificação (geralmente feitas na metade do FP2 e no final do FP3), o da classificação, obviamente, no Q3 para os grandes, e o da corrida em momentos-chave como a primeira volta e na volta de entrada e saída dos boxes no caso de se estar brigando por posição.
Por outro lado, quando os pilotos estão presos no tráfego, existe a preocupação (especialmente na Mercedes, mais sensível ao calor) com superaquecimento, então o modo de corrida mais pobre é utilizado. O mesmo acontece quando a corrida já está neutralizada. É por isso que, na era híbrida da F-1, é raro ver um piloto vencendo uma prova com mais de 15s de vantagem para o segundo. Isso simplesmente não compensa a longo prazo.
Mas o que é, afinal, um modo de motor?
Trata-se de uma combinação de configurações dos diferentes elementos que formam a unidade de potência. Há diversos níveis de combustível com os quais o motor a combustão trabalha, o que afeta a potência que ele produz, assim como o timing da ignição pode ser controlado eletronicamente. Do lado da energia híbrida, há diferentes interações entre a injeção máxima e a recuperação tanto do MGU-K, e especialmente do MGU-H.
Essas configurações são alteradas pelo piloto, por meio de botões giratórios que permitem diversas combinações. Elas, inclusive, podem variar de acordo com o circuito – e isso é importante nas pistas em que a potência fala mais alto, como Baku, Montreal, Monza e Spa.
Mas e se você quiser desrespeitar esse tal documento e usar o motor no máximo o tempo todo, pode? Claro – e a Red Bull fez isso em alguns momentos em que se viu com a chance de vencer, sabendo que não luta pelo campeonato e que já vai sofrer punições de qualquer maneira para permitir um desenvolvimento mais acelerado da Honda, ou seja, as punições fazem parte da estratégia de crescimento. Tirando esse caso específico, é uma opção sua, mas não vá reclamar com seu fornecedor se o produto quebrar antes sair da garantia…
Niki Lauda voltou à Fórmula 1 em 1982 depois de duas temporadas afastado. No final de 1979, ele tinha avisado sua então equipe, a Brabham, que não queria mais “pilotar em círculos” e tocaria seus negócios na aviação. Mas a “bronca” com as corridas não durou muito e ele retornou com a McLaren na temporada de 1982. Demoraria mais dois anos, contudo, para se reencontrar com o circuito em que quase perdeu a vida em 1976.
Nurburgring tinha sido excluído a calendário justamente depois do acidente de Lauda, que por muito pouco não se juntou à longa lista dos pilotos mortos na década de 70, mas voltaria em 1984 com um novo traçado, o mesmo que foi utilizado na F-1 até recentemente, antes da pista começar a ter sérios problemas financeiros. A versão em que Lauda teve o acidente, contudo, já era uma modernização, na época, em relação ao que ficou conhecido como o “inferno verde”, de quase 21km em meio à floresta com direito a curvas cegas e árvores ao invés de guard rails. A F-1 correu por lá até 1970.
Voltando a 84, Lauda não só estava de volta, como também disputando o campeonato com seu companheiro de McLaren, Alain Prost. Ao GP da Europa, o austríaco chegou com uma vantagem considerável – 63 pontos contra 52,5 de Prost (e, sim, esse campeonato seria decidido por esse meio ponto) – e, bem a seu estilo, sem se preocupar muito com o retorno a Nurburgring. Mas, em um fim de semana marcado pelo tempo ruim, ele não passou de oitavo na classificação, enquanto Prost largou em segundo, atrás do pole position Nelson Piquet.
O francês largou melhor e tomou a ponta, enquanto Lauda conseguiu escapar das batidas do meio do pelotão, inclusive de Ayrton Senna com Marc Surer. Mas ele perdeu uma posição, caindo para nono. Em quatro voltas e meia, todavia, ele estava em sexto, travado pela briga entre Alboreto e Warwick. Enquanto isso, Prost desaparecia na ponta.
A partir daí, a corrida não teve grandes emoções até o final. “Não foi uma corrida exatamente cheia de drama e empolgação e o público não podia fazer muito, a não ser sentar ou ficar em pé no concreto. Não há mais tendas ou acampamentos neste novo Nurburgring, apenas um estádio de concreto com carros tão distantes que parecem ser de brinquedo”, dizia um relato da época.
http://www.youtube.com/watch?v=9TgLVed90Ok
Problemas mecânicos dos rivais acabaram fazendo Lauda subir até a quarta colocação no final e, depois de segurar o austríaco por praticamente toda a corrida, Alboreto ainda superou Piquet para chegar em segundo com a Ferrari. O fim dessa disputa tem uma cena curiosa: ambos cruzaram a linha de chegada no limite de combustível. Pararam logo depois e se abraçaram como se estivessem se simpatizando um com a situação do outro. O quarto lugar pode ser visto como um resultado tímido de Lauda frente ao domínio total de seu companheiro, mas também é verdade que, naquele momento do campeonato, com duas corridas para o fim, o experiente austríaco já não queria mais correr tantos riscos. O resultado do GP da Europa fez com que ele precisasse apenas marcar o companheiro de perto na etapa final, em Portugal. Dito e feito: Prost venceu, mas Lauda chegou em segundo e garantiu o tri. Ele correria mais uma temporada – e mais uma vez em Nurburgring, chegando em quinto lugar em 1985 – antes de se aposentar definitivamente da F-1.
No F1 on demand, é você quem traz os temas, lembrando que esse é um dos mimos que só quem está no projeto do Catarse tem. Ainda não sabe como funciona? Acesse lá no www.catarse.me/nopaddock
Tive muitas perguntas dos apoiadores VIP do projeto do Catarse depois dos GPs de Singapura e Rússia – e Cleber, estou esperando uma ajuda lá da Holanda para responder a sua! E muita curiosidade em relação à Ferrari. Vamos às respostas?
Henrique Gianetti Esse avanço da Ferrari na reta final do campeonato me fez ficar curioso com a questão do foco das equipes no carro do ano e no carro do ano seguinte. A gente sabe que a Mercedes já colocou grande esforço no carro do ano que vem e aparentemente a Ferrari ainda segue com foco no carro deste ano, tanto que evoluiu muito no pós-férias. No entanto, parece um foco em vão em termos de campeonato já que não há mais chance nenhuma pra Ferrari este ano e pelo menos na teoria a Ferrari perde a chance de focar no próximo carro que poderia ser para ganhar o campeonato.
Como o regulamento permanece estável para o ano que vem, a Ferrari precisava concentrar forças em mudar a filosofia especialmente da parte dianteira – algo que também mexe com todo o assoalho, pois tudo precisa funcionar em conjunto – para ter qualquer chance em 2020. Então foi por isso que eles fizeram todo o esforço de compreender onde erraram agora. Em outras palavras, ao desenvolver esse carro, a Ferrari também está “focando” no ano que vem. Mas o último upgrade foi o de Singapura. A partir de agora só entra no carro o que poderá ficar em 2020.
É o caso de outras equipes também, como a Racing Point. Era importante para eles usar a temporada de 2019 para entender qual caminho seguir em 2020. Em menor medida, a Red Bull também entra nessa: eles ainda buscam saídas para o desequilíbrio do carro, que “teima” em ter a dianteira muito mais presa que a traseira dependendo do tipo de pista.
Já o caso da Mercedes é diferente. Eles acertaram logo de cara, e agora a tendência é darem passos mais lentos. Por outro lado, eles podem se dar ao luxo de pensar mais à frente, de criar algo para o ano que vem que vai fazer os outros quererem copiá-los. Mais uma vez.
Felipe Conte: Ju, quais são os boatos do paddock sobre o carro da Ferrari ter dado uma salto tão grande?
São duas áreas diferentes: há mais de um ano, a Ferrari tem o melhor motor da F-1, algo que não se vê tanto em velocidade máxima mas, sim, na aceleração e em quanto tempo eles conseguem estar perto do máximo. Isso faz com que eles ganhem até 1s da Mercedes em retas mais longas, uma eternidade. Fala-se que um sistema inteligente de arrefecimento melhora o fluxo de combustível, mas a verdade é que ninguém sabe.
O que é sabido é que a vantagem é mais da Ferrari em si e menos de seus clientes, o que indica um carro que gera menos arrasto. Do lado aerodinâmico, o time teve de mudar o conceito do bico e, consequentemente, do assoalho, para controlar a dianteira com a qual os pilotos sofriam desde o início do ano. Foi um longo caminho para conseguir isso sem acabar com o comportamento da parte traseira, mas juntando tudo o que eles mudaram no carro desde junho – com direito a uma copiada na Mercedes – eles finalmente conseguiram com o upgrade de Singapura. E o mais interessante é que a Rússia demonstrou que eles conseguiram isso sem adicionar tanto arrasto no carro, algo que a Mercedes não consegue.
Kezo Manabe e Ana Luiza Kalil querem saber do mercado: Hulk está fora? Teremos estreantes ano que vem? E para os brasileiros, sobra algum tipo de vaga?
O mercado parece estar mais inclinado à estabilidade após as novidades anunciadas em Spa. Helmut Marko já falou que os quatro pilotos ficam, e adiantou que Kvyat permanece na Toro Rosso. Isso coloca Gasly e Albon na briga direta pela vaga da Red Bull, algo que será decidido após o GP do México, segundo o austríaco me disse no grid em Singapura.
Giovinazzi vem numa crescente. Está sendo consistentemente mais rápido que Raikkonen e há evolução em seu maior problema, que eram as corridas. Ele disse que sentiu ficar sem correr e voltar de cara encarando o grid da F-1, mas o que era um discurso tímido de corridas atrás virou um “se eu continuar assim, ninguém tira meu lugar”.
E Hulk? Cada vez mais fala-se que ele sobra. Sua opção seria a Williams, mas ele deu a entender que não quer. E, se Nicholas Latifi confirmar sua superlicença, o time inglês tem milhões de motivos para promover a estreia do canadense.
Sobre os brasileiros, a melhor chance de Pietro Fittipaldi é seguir na Haas, ainda que o time negocie com Kubica para a vaga de piloto de testes. E para Sette Camara seria importante conseguir a superlicença neste ano para poder mostrar serviço também nessa vaga, uma vez que a McLaren segue confiante (e essa é a pergunta do Kleber Jorge) de que o contrato com a Petrobras é forte o bastante para que, mesmo que o governo brasileiro queira o rompimento, a conta fique mais cara do que continuar. Existe muita tranquilidade por parte da equipe de que o acordo é blindado.
Valdinar Gouveia: Algum piloto se manifesta para que o GP do Brasil fique em Interlagos pela sua importância e tradição no mundo do automobilismo mundial e nacional? Pois é um templo e deveria ser tombado. As autoridades aqui no Brasil já deveriam ter feito isso há muito tempo.
Não é algo que tem de vir dos pilotos, é São Paulo que tem de fazer uma proposta robusta para a Liberty Media. Basta ver o que aconteceu com a Alemanha. É caro para todos ir ao Brasil e, mesmo que não fosse, é inviável para um campeonato do tamanho da F-1 e que mexe tanto com a economia até mesmo de uma cidade como São Paulo ficar fazendo concessões. Mas sei que a prefeitura está se mexendo para manter a prova. Espero poder trazer novidades em breve.
Perguntei a Mario Isola, da Pirelli, ainda no grid do GP da Rússia: quando saberemos quem tomou a melhor decisão, se a Ferrari de largar com os pneus macios ou a Mercedes, com os médios? “Lá pela volta 15”, disse o italiano, com a expectativa de que o calor, maior que o esperado, prejudicasse a durabilidade do composto macio e colocasse os alemães na corrida.
Isso porque, como a chuva que era esperada para o sábado e que lavaria a borracha da pista não tinha caído, a opção da Mercedes pelos médios só podia ser explicada como uma tentativa de fazer algo diferente, sabendo que, no mano a mano, não seria páreo para a Ferrari mesmo em um circuito no qual se acostumou a dominar. Havia, contudo, no sol que apareceu domingo em Sochi, uma chance.
Mas, na volta 15, os pneus da Ferrari ainda estavam em boas condições, e os carros vermelhos estavam tão velozes como se previa. Isso, mesmo com toda a ebulição interna. Sabendo do poder do vácuo nesta temporada, especialmente na segunda prova com maior distância – 890m – entre a posição do pole e a primeira freada, o time tinha estabelecido entre seus pilotos que o papel de Vettel (que, em teoria e na prática, teria uma largada melhor que Hamilton por estar com pneus mais macios) nos primeiros metros seria impedir que o inglês pegasse o vácuo de Leclerc, lembrando que a Scuderia calculava que o poder do vácuo equivaleria a uma posição e meia no grid. E o monegasco não se defenderia, sabendo que a posição seria invertida mais tarde.
Mas Vettel entendeu que sua largada foi melhor e que isso lhe daria o direito de manter a dianteira, mesmo que ela tenha sido obtida com Leclerc sequer tentando a defesa. O alemão seguiu executando, com perfeição, seu plano nas voltas seguintes, dizendo que era arriscado efetuar a troca com Hamilton próximo e forçando o ritmo para que Leclerc, correndo na turbulência tão prejudicial para as corridas de Sochi desde sua entrada no calendário e deslizando nas curvas, acabasse com seus pneus mais cedo que ele. Dito e feito.
A Ferrari acabou invertendo as posições ao deixar Vettel mais tempo na pista do que Leclerc – ainda que Mattia Binotto tenha dito que a parada do monegasco foi antecipada por um pedido do mesmo, e a do alemão foi adiada para evitar o risco de exposição ao VSC – mas o fato é que isso foi bastante conveniente para colocar a ordem na casa. Mal sabiam os ferraristas que seriam eles que iriam causar o tal VSC que entregaria a prova de bandeja para a Mercedes.
Mas será que esta seria a única chance de vitória de Hamilton no último domingo? Os números sugerem que sim.
Perguntei a Hamilton se ele acha que teria chance de bater as Ferrari sem o VSC sob medida. Ele titubeou um pouco, disse que não lembrava exatamente da distância, mas achava que o engenheiro havia lhe dito que ele estava a 2s de Vettel. Não era bem assim. O “líder” já era Leclerc e Hamilton estava 19s na frente dele na pista, tendo de fazer um pit stop que lhe custaria 26s.
Como a Ferrari reagiu bem aos pneus médios – testemunho do próprio Leclerc, que inclusive parecia surpreso com isso – e degradação foi muito menor do que se esperava em ambos os compostos, a tática de overcut (sem o VSC causado por Vettel, Hamilton ficaria na pista por mais um menos 15 voltas e muito provavelmente perderia mais que os 7s que já tinha de desvantagem naquele momento por conta disso, já que estaria correndo com médios mais gastos contra a borracha nova das Ferrari) não seria suficiente para uma ultrapassagem no box.
A chance de Hamilton seria parar com 15 voltas para o fim (pelo menos era isso que a equipe lhe dizia via rádio, que a degradação era tão baixa que ele faria a volta alvo + 15), colocar os macios e partir para o ataque. Mas ele teria de tirar no mínimo 10s com um pneu que era 0s6 mais rápido por volta e encontrar uma maneira de passar um carro mais veloz de reta.
Houve, portanto, quem questionasse se foi a Ferrari quem perdeu a corrida ou a Mercedes quem venceu, mas os números são muito claros: a única chance da Mercedes vencer em Sochi era com um SC ou um VSC (ambos dão um “desconto” de 9 a 10s na parada), e foi a Ferrari quem o entregou de bandeja.
Quem também se deu bem com o VSC causado por Vettel foi Alex Albon, que se recuperou de um erro na classificação para chegar na posição em que provavelmente terminaria de qualquer maneira, mas com o alento de ter andado, no final da prova, no mesmo ritmo do “entediado”, nas suas próprias palavras, Max Verstappen.
A McLaren, por outro lado, acabou tendo de correr atrás do prejuízo, pois ambos os pilotos já tinham parado quando Vettel quebrou. Carlos Sainz conseguiu se manter como líder do “resto”, mas Norris se viu numa briga com Perez, o qual acabou não conseguindo superar, e Magnussen, que acabou em nono depois de seguir reto na briga com o mexicano e não voltar para a pista da forma indicada e ter 5s adicionados a seu tempo final. Nico Hulkenberg conseguiu salvar um ponto depois de voltar para a corrida com o VSC, depois de uma parada desastrosa no começo da prova.
Acabou sendo uma prova mais movimentada, por conta do VSC na hora certa para alguns e terrível para outros, e também pelos Red Bull fora de posição mas nem mesmo Albon, que foi do box ao sexto posto, lembrava de alguma manobra especial, em um circuito em que só nos acostumamos a ver ultrapassagens se há uma grande diferença de rendimento entre os carros.
O esvaziado paddock do GP da Rússia, muito em função da necessidade de vistos e pela dificuldade em encontrar boas rotas pós-dobradinha com Singapura, foi o escolhido para o esperado anúncio da volta da parceria da McLaren com a Mercedes. O acordo entra na lista dos poucos acertados para além de 2020, e dá ainda mais força política aos alemães na categoria em um momento crucial, que em os novos acordos estão sendo finalizados.
Mas o acordo também colocou uma pulga atrás da orelha de muitos no paddock. A Mercedes tem Toto Wolff sob contrato até o final de 2020, Hamilton também, renovou com Bottas e dispensou Ocon, optando por focar no curto prazo, e agora tem três clientes. Ao mesmo tempo, está entrando na F-E. Estariam contados os dias do time de Brackley em si?
Do outro lado, dava quase para tocar o clima pesado na Renault desde a quinta-feira. Com a Williams assinada com a Mercedes até 2025 e a Racing Point negociando a renovação, os alemães terão quatro times, contra apenas uma dos franceses. Esse é um duro golpe para um projeto que gastou rios de dinheiro mesmo sem nunca ter tido muita simpatia da liderança da montadora, que por sua vez passa por um momento delicado por conta da crise instaurada por Ghosn.
Junte a isso o fato de Daniel Ricciardo ter dito recentemente que não continuará na equipe em 2021 caso tenha outra temporada como esta e a grande aposta no paddock é de que os dias da Renault como equipe na F-1 estejam, novamente, contados, ou pelo menos o orçamento não seria o mesmo. Não dá para culpar a montadora, após ver o motor Honda superar o Renault em ritmo de corrida nesta temporada, mesmo com muito menos tempo trabalhando com a tecnologia dos V6 turbo híbridos.
É fato que a Renault tem um dos poucos contratos vigentes pós-2020, o de fornecimento de motores, válido até 2025. Mas como sempre vale a máxima de que, na Fórmula 1, contratos só existem para serem quebrados.
Agora é interessante ver as voltas que o mundo dá, com a McLaren rompendo com a Mercedes no final de 2014, tentando ser uma equipe de fábrica com a Honda, mas dando a seus “parceiros” uma missão quase impossível, de colocar em um espaço minúsculo uma unidade de potência que ainda engatinhava, e depois sucumbindo à Renault para, agora, voltar a ter o motor que, inclusive, não é mais o mais forte da F-1. Por um lado, há de admirar o tanto que o time cresceu mesmo com tantas mudanças – lembrando que eles também trocaram de fornecedor de combustível no meio do caminho e muito provavelmente o farão novamente em 2021 – e há de se questionar o porquê de tanta indefinição.
Falando em 2021, fala-se em disputar-se o GP da Rússia em São Petersburgo, uma vez que a pista de Sochi pode ser “operada” por adições ao parque olímpico, que se tornou (bem diferentemente do parque olímpico do Rio) um centro importante de eventos em uma região que é cartão-postal entre os russos. Há uma pista construída aos arredores da mais europeia das cidades russas e a mudança teria todo o apoio da Liberty Media, já que trata-se de uma cidade muito mais atrativa – e pertinho da fronteira com a Finlândia, que carrega um número importante de torcedores (e de dinheiro) para etapas como Rússia, Azerbaijão e Hungria.
O contrato do GP russo vai até 2025, e os apoiadores (quatro empresas privadas) fazem o que Putin ordenar. E sua vontade é de transferir o GP de Sochi.
Essa notícia vem logo na primeira vez que tivemos a oportunidade de aproveitar uma das instalações do parque olímpico, com o jogo entre o time local de hóquei no gelo contra o Dínamo Moscou sendo disputado na quinta-feira. Foi minha primeira vez vendo o esporte ao vivo, e a ação foi boa, mas a representação das mulheres, péssima: vestidas de cheerleaders até para limpar o gelo nos intervalos, enquanto os homens que faziam o mesmo vestiam roupas esportivas normais. Fiquei pensando nas meninas que viam o jogo e torciam empolgadas, segurando o bonequinho do mascote: como elas se sentirão representadas quando perceberem o que lhes resta no espetáculo de que tanto gostam?
Voltando à F1 e indo um pouco mais adiante no tempo, a conversa é de que o projeto de um segundo GP na China esteja encaminhado, na região de Sichuan, estreando em 2022. Existe um circuito novo por lá e grande interesse do governo local em promover a área. Fala-se, inclusive, que eles estariam dispostos a pagar tanto quanto Baku e os russos, e a Liberty não está em posição de negar tanta grana.
Com tinha adiantado em Singapura, a pedido dos times, o regulamento de 2021 passará por nova revisão. O carro já não é como aquelas imagens divulgadas há alguns meses, e as equipes estão muito resistentes em relação à padronização de peças. Cada vez mais, parece que aquela mudança que deveria acabar – ou pelo menos diminuir – a necessidade de se rever as decisões de tempos em tempos (algo que, já está mais que provado, só faz a vantagem dos grandes aumentar) vai ser muito menor do que se previa. Isso, é claro, abre brechas para estarmos falando, daqui uns dois anos, sobre as novas “grandes” mudanças de, digamos, 2023.
Perguntei aos diretores técnicos de Mercedes, Ferrari e Red Bull se eles realmente acham que os fãs se importam que os carros sejam diferentes. Eles disseram acreditar que sim, que as pessoas também acompanham o esporte porque sabem que a Ferrari, por exemplo, tem a chance de desenvolver algo diferente e dar o salto que deu ultimamente. Jogo a pergunta para vocês.
A Mercedes e Lewis Hamilton voltaram a ganhar depois de uma sequência de três conquistas consecutivas da Ferrari, e logo de quebra com uma dobradinha. Se eles tinham ou não ritmo para fazer isso em condições normais, é algo que vou detalhar ao longo da semana no post de estratégia. Até porque nem ganhando os líderes disparados do mundial são o assunto do momento. Desde que a Scuderia encaixou as peças de seu carro, que se tornou não apenas um “leão de reta”, mas também um carro mais equilibrado e que responde melhor a diferentes acertos, as decisões internas do time têm roubado a cena. E levado o time ao que parece ser o começo de uma guerra civil entre Vettel e Leclerc.
Voltemos à Bélgica: Leclerc foi o melhor por todo o fim de semana, mas precisou que Vettel segurasse Hamilton para vencer pela primeira vez. Certamente, o alemão não esqueceu disso.
No final de semana seguinte, o jogo estava mais equilibrado e a equipe deu a Leclerc o primeiro vácuo da classificação (e foi atendida) e a Vettel o segundo e decisivo. Todos lembram a confusão causada pelo fato de ninguém querer liderar o pelotão e ser o único a não ter o último vácuo, Leclerc disse que não seguiu a instrução porque Sainz e Hulkenberg atrapalhavam na frente, a Ferrari não aceitou muito bem a explicação, mas a vitória do monegasco fez “tudo ser perdoado”, como disse Mattia Binotto logo após a bandeirada. Aparentemente, Vettel não concordou com isso.
Mais duas semanas depois e Binotto novamente tem de colocar panos quentes na relação entre seus pilotos, desta vez porque Leclerc seguiu uma tática de segurar o pelotão para se defender do undercut dos rivais e acabou sofrendo o golpe do próprio companheiro. Desta vez, é a equipe que tem de se defender, dizendo que não esperava que a diferença entre Leclerc, de pneus usados, e Vettel, de novos, seria tão grande como os 3s9 que eles viram no final das contas. Sabe-se lá se Leclerc engoliu essa.
Chegamos à Rússia e a Ferrari insiste em seus combinados. Desta vez, para se protegerem do vácuo das Mercedes na crucial largada em Sochi – como a diferença entre dois carros precisa ser muito grande para ultrapassagens acontecerem por aqui e pelo fato deles largarem com pneus macios, contra os médios da Mercedes, era fundamental que terminassem a primeira volta com o 1-2 – a ideia era que Leclerc desse o vácuo a Vettel e não oferecesse resistência caso o alemão passasse. Até porque, caso isso acontecesse, as posições seriam invertidas.
Pois, bem. Vettel acreditou que não pegou a liderança na segunda curva só porque teve o vácuo, mas porque também fez uma largada melhor. Acreditou que estava conseguindo se manter na frente do companheiro porque tinha ritmo melhor. Ou acreditou em tudo isso e decidiu que era a hora de dar uma de “João sem braço”, como entendeu que Leclerc fez em Monza, e esperou pelo “tudo está perdoado” de Binotto na bandeirada.
Seja como for, Vettel decidiu que não devolveria a posição. E disse depois que sentia que tinha cumprido, mesmo assim, sua parte no trato.
Pela segunda corrida seguida, Leclerc não entendia o que estava acontecendo. Ele tentou seguir Vettel de perto nas três primeiras voltas esperando a troca, mas percebeu que era muito difícil fazer isso por causa da turbulência (o que, no final das contas, tinha sido o motivo pela qual a Ferrari fez o tal trato) e detonou seus pneus traseiros devido à falta de aderência. A equipe lhe dizia, a cada volta, que a troca aconteceria na próxima, enquanto tentava de tudo com Vettel, dizendo, por exemplo, que “Charles é o piloto mais rápido da pista”, quando na verdade não era. Depois de algumas voltas, Leclerc foi avisado de que a troca aconteceria depois. Ele, portanto, não precisava demonstrar mais ritmo para provocar o companheiro.
Seus pneus, claro, acabaram antes dos de Vettel, e a Ferrari antecipou sua parada, segundo Binotto, por conta disso. Ainda de acordo com o chefe, que não apareceu em nenhum momento no rádio para se certificar que seus pilotos mantivessem o combinado, a Ferrari decidiu deixar Vettel na pista não para que ele voltasse da parada atrás de Leclerc, mas para evitar que o time ficasse sujeito a um SC.
Essa é difícil de engolir uma vez que, se essa realmente fosse uma preocupação, pelo menos um dos carros teria largado com os médios, mas essa também é uma história para o post de estratégia.
Seja como for, Vettel acabou voltando atrás de Leclerc e as posições foram restabelecidas após as paradas, mas ficamos sem saber quais seriam as cenas dos próximos capítulos: o alemão teve uma falha de MGU-H, uma fuga de energia, e isso explica por que ele parou na pista e não 900m depois, nos boxes, o que teria mantido Leclerc na frente. O Safety Car que a Ferrari temia acabou sendo causado por ela mesma, as Mercedes aproveitaram para parar, e o resto é história.
Ninguém duvida que a Ferrari melhorou muito nos últimos meses. Mas as táticas que eles têm usado mostram que eles não têm a confiança de que podem ganhar por puro ritmo. Nada que nunca tenha sido feito na história da Fórmula 1 mas o que Binotto vem descobrindo amargamente é que não faz sentido ter combinado se não há comando. E até um piloto com 37 GPs nas costas já percebeu isso. Imagine um tetracampeão do mundo.
Este era um território Mercedes. O time alemão venceu todas as cinco edições do GP da Rússia, e ano passado até se deu ao luxo de inverter a posição de seus pilotos, temendo a “ameaça” Ferrari, que já tinha virado marola àquela altura. O cenário não poderia ser mais diferente agora.
Basicamente reconhecendo que será muito difícil bater as Ferrari nos primeiros metros da corrida, a Mercedes optou por largar com o composto médio. Isso significa que eles vão ter um pouco menos de aderência nos primeiros metros, mas podem ficar por mais tempo na pista durante a corrida. Já que eles não viam a possibilidade de superar a Ferrari na reta, vivendo cenário que já marcou os GPs da Itália e da Bélgica, e dificilmente conseguiriam um undercut, que não deve ter nem perto do poder de Singapura, a única saída era o overcut, justamente usar a aderência maior dos médios para fazer voltas rápidas quando Leclerc (e possivelmente Vettel, que poderá muito bem passar Hamilton na segunda curva caso tenha uma boa largada) pararem, para tentar voltar à frente. Não será uma missão fácil.
Mas por que o undercut não será tão eficaz? Primeiro, a diferença entre os compostos em Sochi é bem menor – são 0s6 entre duro e médio, e mais 0s6 entre médio e macio, enquanto na última prova, apenas entre o macio e médio, já tínhamos 1s2 – e, desta vez, não faz sentido para Leclerc segurar o pelotão como ele fez no último domingo, já que isso o deixaria exposto ao ataque dos rivais.
É fato que, na sexta-feira, houve graining leve nos macios, e isso se agravaria caso a previsão inicial, de que choveria o tempo todo no sábado, se confirmasse. Existe 40% de possibilidade de chuva para esta noite, o que ajudaria a Mercedes, mas essa porcentagem cai bastante para o horário da corrida – e, desde que cheguei na quarta, só vi chuva mesmo à noite.
No mais, será uma prova interessante para ver outras brigas: McLaren x Renault agora que foi divulgado que a parceria acaba no final do contrato, Giovinazzi mais uma vez andando bem, embora pressionado para manter seu assento, e Albon vindo de trás depois de um erro dele mesmo. Seu companheiro, Max, também tem algum terreno para percorrer, e vai fazer falta na briga lá na frente. Ainda assim, pelo menos a foto da largada finalmente ganhará cores na primeira fila em Sochi.
Final da volta 18 do GP de Singapura: Kevin Magnussen vai aos boxes e finalmente abre o espaço na pista para que os ponteiros parassem, algo que vinha sendo evitado ao máximo por Charles Leclerc, que usada o fato do circuito de rua só permitir ultrapassagens com grande diferença entre os carros para ditar um ritmo de tartaruga na primeira parte da prova.
Essa estratégia da Ferrari tem dois motivos: primeiro, eles sabem que parte de sua vantagem na classificação nas retas desaparece aos domingos, e têm lá suas dúvidas se têm ritmo para ganhar a corrida. Isso porque foi só no sábado que o time conseguiu tirar o melhor rendimento das peças que levou a Singapura, e não fez uma simulação de corrida significativa (o terceiro treino livre é quente demais para isso por lá, por ser realizado no fim da tarde) para entender qual é seu ritmo real. E eles também queriam levar o primeiro stint com os macios até o máximo que pudessem, temendo sofrer com desgaste no final.
Retornando à volta 18: a Ferrari sabe a parada de Magnussen dá espaço para os ponteiros fazerem sua troca de pneus e não voltarem no trânsito, e sabe que seus rivais vão reagir a isso. Decide chamar, na antepenúltima curva da 19ª volta, o seu segundo carro, de Vettel, o mais exposto a um possível undercut.
A Mercedes não vê a oportunidade – ou melhor, acredita que terá ritmo suficiente para o overcut, ou seja, ficar na pista por mais tempo que os rivais, e ignora a jogada. A Red Bull chama Verstappen na mesma volta de Vettel e, com essa manobra, tira a Mercedes do pódio pela primeira vez no ano.
Já a Ferrari chama Leclerc na volta seguinte e se surpreende quando vê o antes líder saindo atrás de Vettel. O que foi uma jogada de defesa acabou virando algo tão ofensivo que virou fogo amigo.
Surpreendi-me quando ouvi de Leclerc que ele não sabia da parada de Vettel ou que estaria disputando com ele na saída dos boxes. Fui perguntar a Binotto, que se surpreendeu pelo mesmo motivo (na verdade, disse que eles tinham avisado, e foi desmentido por Charles, que estava a seu lado). Não, a Ferrari não tentou inverter seus pilotos de propósito. Eles estavam tentando defender as posições dos dois, talvez duvidando do próprio ritmo, e não perceberam que algo muito diferente estava acontecendo em Singapura: Vettel estava a 3s5 de Leclerc quando parou e voltou 0s4 à frente. O undercut era muito mais poderoso do que se previa.
E não digo só da Ferrari. Se a Mercedes tivesse a mínima ideia disso, teria chamado Hamilton na volta 19. Mas a mensagem “faça o contrário do que o Leclerc fizer” veio no giro seguinte, ele seguiu na pista, e descobriu que não tinha mais o que tirar de seu jogo de pneus. Isso foi a diferença entre uma vitória (se ele parasse junto com Vettel, voltaria à frente das duas Ferrari) para um quarto lugar, então não é de se estranhar que o estrategista James Vowles estivesse se martirizando depois da corrida.
O erro tático da Mercedes acabou obrigando Bottas – que fora chamado aos boxes para cobrir Albon – a diminuir o ritmo para não superar o companheiro, algo que tem a ver com a regra interna da Mercedes de um piloto não poder fazer o undercut no outro. Mas também é justo dizer que, nesse ponto, eles já sabiam exatamente onde Hamilton voltaria, algo que, para a Ferrari, foi uma surpresa.
Mas por que parar uma volta antes do rival foi tão importante? Os pneus macios de Singapura eram o C5, os ultras do ano passado. E ano passado foi Hamilton quem segurou o ritmo no começo para evitar que se abrissem espaços para o undercut e foi ele mesmo quem parou primeiro. Mas isso foi na volta 12. O que Hamilton descobriu a ficar na pista em 2019 foi que, mesmo dosando o ritmo por 19 voltas, não sobrou nada do C5 para fazer o overcut funcionar.
Mas e Leclerc? A informação que faltou no domingo foi quando o monegasco foi avisado de que pararia no final da volta 20. Porque nada no ritmo dele indica que ele foi avisado até o fim da volta que o pitstop estava próximo, a não ser que os pneus deles também tivessem acabados.
Mas de onde veio esse ritmo da Ferrari e onde foi parar o da Red Bull que, em teoria, deveria ser quem desafiaria as Mercedes, sempre tão sensíveis às ondulações de Singapura? Começando pela segunda, foram as mesmas ondulações que pegaram eles desprevenidos. Aparentemente, o carro foi preparado baseado em um simulador que tinha dados imprecisos. E a Ferrari precisou de tempo para mudar totalmente o conceito da sua parte dianteira. As peças foram chegando aos poucos, desde o GP da França, e foi como se tudo tivesse se ajeitado da sexta para o sábado em Cingapura.
Isso, então, significa que Leclerc e Vettel estarão entre os protagonistas até o fim? As curvas de Singapura são de raio curto e mais lentas. Claro que é uma boa notícia para os italianos – e especialmente para Vettel – que o carro esteja mais estável e previsível, mas isso não quer dizer necessariamente que ele esteja mais rápido em uma pista como Suzuka, por exemplo. Este, sim, será um teste de fogo para a Ferrari.
Não repercutiu bem no paddock a renovação de Romain Grosjean na Haas e, não importa o que Guenther Steiner possa justificar, o grande motivo para a permanência do francês é o dinheiro que ele traz ao time. Embora Gene Haas tenha lenha para queimar, como todo bom milionário, ele faz de tudo para não colocar a mão no bolso, e inclusive a renovação de Kevin Magnussen ano passado foi condicionada a mais dinheiro de seus patrocinadores.
Isso também explica por que Nico Hulkenberg está a pé, já que ele não conseguiu encontrar patrocinadores na Alemanha. A sorte dele pode ser sua relação com Vasseur, chefe da Alfa, que foi quem bancou sua ida para a Renault. Mas a Ferrari tem que concordar com isso, já que a vaga de Giovinazzi é de indicação da Scuderia. Para a Alfa, poderia ser um bom plano de sucessão para a vaga de Kimi, que ainda tem um ano de contrato pela frente, mas terá 41 anos no final de 2020.
Mas a grande discussão no paddock em Singapura foram as mudanças que estão sendo estudadas para as próximas temporadas. A FOM e a FIA estão abertas a criar fórmulas diferentes para algumas corridas, e o que está sendo estudado no momento é a implementação de mini corridas para definir o grid aos sábados. Elas aconteceriam em três etapas no ano e o grid da mini corrida seria a classificação do campeonato invertida, ou seja, George Russell na pole e Lewis Hamilton no fundão. A questão da alocação de motores e pneus seria resolvida pelo fato da prova ter mais ou menos a mesma duração da classificação – fala-se em 100km. Essa corrida do sábado não valeria pontos para o campeonato, somente definiria o grid do domingo.
Existe a preocupação do formato ser complicado demais para explicar aos fãs, além de considerações sobre o parque fechado, por exemplo. Então no momento as equipes disseram à FIA que aceitam testar a ideia, mas deram à entidade uma lista de fatores para serem considerados.
Outra regra que está sendo considerada é impedir que as equipes testem os três compostos durante os treinos livres, para gerar mais imprevisibilidade na corrida. Houve uma discussão sobre a obrigatoriedade de usar três compostos na corrida – ou seja, de sempre termos dois pit stops – mas isso não foi adiante.
O que vai sair mesmo é o teto de gastos, de 175 milhões de dólares. Essa é uma boa notícia, mas não resolve a discrepância entre as equipes porque há muita coisa fora – como os salários dos funcionários e o gasto com marketing. Não surpreende, portanto, que Gene Haas esteja procurando compradores para sua equipe, já que ele não vê nenhuma mudança prática que realmente faça os grandes deixarem de ser muito melhores.
Fiquei sabendo que as peças padronizadas (odiadas pelas equipes) e os pneus de 18 polegadas vão tornar os carros 35kg mais pesados em 2021 e, com as restrições aerodinâmicas, espera-se que eles sejam 5 a 6s mais lentos que os atuais. Como bem apontou Otmar Szafnauer, milhões serão gastos para fazer um carro que não é muito mais rápido que um F-2.
Não por acaso, as equipes ainda não estão contentes com o regulamento de 2021, e estão falando inclusive em um desenvolvimento open source de peças como alternativa à padronização de peças, que está sendo adotada para fazer o teto orçamentário funcionar.
Mas o problema continua o mesmo de sempre, como falou Andrew Green, diretor técnico da Racing Point: “Algumas equipes estão defendendo suas pautas de maneira cômica”.
O script não poderia ser melhor: Ferrari e Mercedes tiveram problemas com o undercut invertendo a posição de seus pilotos, um dos piores cenários para uma equipe, e não poderiam ter lidado de forma mais diferente em relação a isso. Na Mercedes, depois do time ter optado por deixar Lewis Hamilton mais tempo na pista, apostando que os pneus dos rivais acabariam no final, Valtteri Bottas foi instruído a tirar o pé para evitar que o inglês voltasse atrás dele e minimizasse os danos do que provou ser um erro estratégico. A instrução foi atendida porque a Mercedes tem uma regra interna que impede que um piloto ultrapasse o outro numa situação de undercut.
Na Ferrari, exatamente o contrário aconteceu. Quando a Ferrari viu a Red Bull preparada e sabia que a lacuna na pista estava aberta para parar e voltar fora do trânsito, imediatamente chamou Sebastian Vettel para os boxes, na volta 19, para cobrir um bastante provável undercut da Red Bull. Afinal, Verstappen estava a apenas 2s do alemão e o ritmo de Charles Leclerc na ponta era propositalmente lento para que o pelotão ficasse junto, inibindo a tentatava de undercut da Mercedes em cima da Ferrari – ou seja, o plano era gerar trânsito para que o undercut não fosse eficaz.
Nesse momento, Vettel estava a 3s5 do líder Leclerc e a Ferrari simplesmente não imaginou que ele seria uma ameaça para o companheiro. Mas certamente não ajudou o fato de Leclerc não ter sido avisado que o alemão tinha parado, ou seja, ele continuou adotando a tática de compactar o pelotão no momento em que tinha de forçar o ritmo e se defender do undercut.
Por um lado, foi um erro da Ferrari, que eles estudaram reverter, pedindo a inversão de posições, mas a opção foi por não interferir e focar em garantir a dobradinha da equipe. Essa era a prioridade e, se Vettel não tivesse sido chamado naquele momento, certamente a dobradinha não aconteceria. Mas que foi tudo meio atrapalhado, e por motivos diferentes, na Mercedes e na Ferrari, isso foi.
Mas também foi importante para Sebastian Vettel. Ele gosta de Singapura, e agora gosta mais do carro, que está evoluindo e ficando mais previsível de se pilotar. A série de peças novas que eles começaram a trazer ainda em junho parece ter se encaixado, e isso explica por que eles não perderam tanto nas curvas em Singapura como nas corridas anteriores, ainda que Mattia Binotto tenha lembrado que os compostos mais macios funcionam melhor no carro italiano.
Voltando a Vettel, será interessante ver se a fase, agora, vai embora, até porque ele teve lampejos do velho Seb nos últimos dois anos, mesclados com apagões. Certamente não o ajuda ter ao seu lado um Leclerc mordido.
Já nós não temos o que reclamar. A temporada parece o carro da Ferrari, ganhou vida, e vamos para a Rússia, que geralmente é território Mercedes, com mais dúvidas do que certezas.
“O carro ganhou vida”. Foi assim que Charles Leclerc explicou como a Ferrari emergiu como a grande força neste sábado em Singapura, se recuperando de uma sexta-feira em que não teve o mesmo ritmo de Mercedes e Red Bull nem em simulação de classificação, nem de corrida. O monegasco disse que o time trouxe novidades para o carro e tudo o que foi sendo feito em termos de desenvolvimento se encaixou. De qualquer maneira, foi uma virada surpreendente: a tração e a agilidade nas trocas de direção não foi algo, nem de perto, visto em qualquer outra corrida na temporada até aqui.
Outro sinal de que o carro melhorou é o fato de Sebastian Vettel também ter sido rápido, e ter dito que estava confortável, finalmente, ao volante. Só não conseguiu transformar isso em uma volta rápida na hora da verdade.
Isso, nem Leclerc acreditava que estava fazendo. Nas duas vezes em que quase perdeu o carro na sua volta mais rápida, ele disse que olhava para a tela e não acreditava que estava sendo mais rápido mesmo assim. Na verdade, acabou descobrindo algo que outros ótimos pilotos já sabiam: é assim que que anda rápido em Singapura.
Foi assim, também, “pegando o carro pelas bolas”, como ele mesmo descreveu, que Hamilton conseguiu melhorar em meio segundo sua tentativa anterior e se colocou entre as Ferrari. Isso o deixa em uma posição frágil em termos de estratégia em uma pista na qual as ultrapassagens são difíceis – Leclerc pode ditar um ritmo mais lento para acabar com a arma do menor desgaste de pneus da Mercedes e, de quebra, deixar Hamilton exposto a um undercut de Vettel, por exemplo.
Mas quem também tem de ser levado em conta nessa briga é Max Verstappen. O ritmo de corrida da Red Bull deve ser muito melhor do que o da classificação – o modo festa do motor da Honda ainda deixa a desejar – e ele estava muito descontente com o quarto lugar no grid. Certamente vai para cima na largada, sua grande chance de chegar no pódio.
O problema para Max é que são poucos os metros entre o grid e a primeira curva – e, como ele descobriu há dois anos, pode ficar meio, digamos, apertado. Ele também está do lado “errado”: vimos várias vezes nas corridas de Singapura os pilotos que fazem a primeira curva por fora se darem melhor.
Em termos de estratégia, será uma corrida de apenas uma parada sob condições normais, largando com o macio e colocando o médio na segunda parte, mas também é possível andar bem com o duro. O único fator que pode mudar isso é um Safety Car, que apareceu em todas as corridas disputadas até hoje em Singapura. Mas mesmo parar no SC é arriscado, pois a posição de pista é a grande prioridade para os estrategistas em Singapura.
Para finalizar, será interessante ver como os pilotos vão se comportar com o uso da bandeira preta e branca e da maior leniência dos comissários. Já podem ir preparando a pipoca.
Singapura e Sochi é a dobradinha dos extremos em da temperatura ao cenário, dos cheiros aos pratos. De um dos grandes destinos gastronômicos da temporada para um lugar em que ser servido em menos de uma hora já é uma proeza. E se a comida chegar quente, então, é seu dia de sorte.
Mas vamos começar com coisa boa: Singapura e seu caldeirão de sabores agridoce do sudoeste asiático. O melhor de lá é que come-se bem em qualquer barraquinha na rua, o que é uma ótima notícia em uma cidade cara. Melhora ainda para quem trabalha na F-1 e sai da pista sempre depois da 1h da manhã devido aos horários diferentes desse GP.
É verdade, também, que minha experiência em Singapura é um bem condicionada a esses horários, mas mesmo assim ano passado lutei contra a tentação de ir no mesmo lugar que certamente estará aberto e pude conferir outros cantos.
Singapura para mim é sinônimo de food court, ou seja, várias bancas de comida ao redor de banquinhos e mesas simples, pratos com muitos vegetais e frutos do mar, regados a molhos de peixe, uns mais picantes, outros agridoces, e uma cerveja Tiger gelada. Quem precisa mais do que isso?
Assim como no Japão e na China, não é preciso se preocupar em decorar os nomes dos pratos, com a facilidade de que o inglês é uma das línguas oficiais de Singapura. Os menus vêm sempre com fotos ou as barraquinhas têm pratos de demonstração – o que também acontece no Japão. E funciona muito bem, porque os vegetais e os molhos deixam menus e bancas cheias de cores. É a definição de comer com os olhos.
O curioso desses lugares é que, embora seja muito quente, você não encontra saladas cruas, não me perguntem por quê. Até os vegetais – e são muitas opções, inclusive coisas que você não encontra em outras partes do mundo – são cozidos e levam consigo algum molho, muitas vezes de peixe ou soja.
É muito comum também ter arroz frito. Vários pratos incluem fritura, inclusive, muitas vezes com carnes e peixes empanados, mas nada vem pingando óleo. Curry também está presente em vários pratos, assim como há noodles para toda parte. Afinal, Singapura é no sudoeste asiático, mas tem grande presença indiana e chinesa.
A cidade-estado em si não tem uma culinária própria, sendo influenciada pelos vizinhos, mas um prato bastante popular no país é o char kway teow, noodles feitos de arroz, com molho de soja, camarões e broto de feijão. Parece gororoba, mas funciona. Mas acho que laksa tem mais cara de Singapura pelos ingredientes: é uma sopa de noodles ou arroz com frango, camarão ou peixe, com um molho apimentado com curry e leite de coco. É China encontrando Malásia e Índia, ou seja, é Singapura.
Ah, e apimentado nessa parte do mundo realmente quer dizer apimentado. Não é por acaso que o copo de Tiger está sempre do lado em caso de algum apuro…
Para quem gosta de comida asiática, Singapura é um prato cheio, da barraquinha que vende chicken satay, um espeto de frango com molho curry, tradicional da Indonésia e muito popular na Malásia, até um restaurante japonês de alto padrão no topo daquele hotel famoso com três torres e a piscina em cima, passando pela rede Din Tai Fung, de ótima comida chinesa e que gera filas enormes em sua filial em Londres, come-se muito bem.
Mas é melhor não ir se acostumando porque, logo em seguida, tem Sochi. Não tive problema algum com a comida russa em Moscou ou São Petersburgo, e achava que o pessoal da F-1 exagerava nas reclamações em relação ao palco do GP. Mas realmente não é fácil comer por lá.
Primeiro porque não há tantas opções e, com a cidade cheia, a qualidade do serviço despenca. Os russos já não são a simpatia em pessoa, então conseguir a atenção de um garçom vai ser apenas o primeiro desafio da noite. Depois que você conseguiu pedir a bebida, que demorou
uns 20 minutos para chegar, e fez o pedido da comida, pode colocar mais uma meia hora na conta. Os pratos da mesa não vão chegar juntos e muito provavelmente um deles vai estar frio. O lado bom é que você nem olha o menu de sobremesa porque já passou da hora de ir para a cama.
E o que se come em Sochi? Muitas sopas (cremosas e apimentadas), shish kabobs (espetinhos com alguma carne e vegetais), pelmeni (a gyoza dos russos), frutos do mar – mexilhões são famosos e o salmão costuma ser bom na Rússia – e um toque de cozinha da Geórgia, devido à proximidade. É de lá que vem o khachapuri, um pão recheado de queijo, como se fosse uma pizza. Ah, e tem batata, muita batata, inclusive em basicamente todas as saladas. Digamos que, entre Singapura e Japão, Rússia uma boa etapa para fazer as pazes com a balança.
Montreal, junho de 2019. Acredito que todos lembram bem, mas não custa contextualizar: Vettel cruza a linha de chegada em primeiro, mas termina em segundo porque tem 5s adicionados a seu tempo devido a uma punição por ter voltado à pista de maneira insegura após uma escapada numa briga com Lewis Hamilton, que vence a prova. Os torcedores vaiam; Vettel, inconformado, coloca a placa de primeiro colocado diante de seu carro; o pódio é um anticlímax total. Porém, embora parecessem totalmente antagonistas naquele momento, Vettel e Hamilton concordam: o texto das regras é rígido demais e não dá muita alternativa para os comissários.
Paul Ricard, duas semanas depois. Ricciardo é punido por exceder os limites da pista numa ultrapassagem sob Kimi Raikkonen em uma pista cujos tais limites são, na grande maioria dos casos, definidos só por uma linha branca. Sem asfalto mais abrasivo, sem grama, sem zebras altas, sem brita. E todos somos lembrados do porquê da necessidade das regras serem tão restritivas.
Da França em diante, nas reuniões de sexta-feira, alguns pilotos, como Max Verstappen e Kimi Raikkonen, pediram que apenas batidas fossem punidas. E todos, como sempre, cobraram consistência.
No meio de tudo isso está Michael Masi, australiano que foi alçado à condição de diretor de provas depois da morte repentina de Charlie Whiting às vésperas da etapa de abertura do campeonato, na Austrália. A primeira reação de Masi é admitir que “o melhor a fazer é acabar com todas essas regras e começar do zero”, mas ele se propõe a encontrar uma solução. Ou pelo menos uma tentativa. E ela estava lá mesmo dentro do regulamento e fez parte da vida dos pilotos desde o kart: a bandeira preto e branca, uma advertência ao piloto.
Em outras palavras: Masi encontrou, dentro do regulamento, uma maneira de atender aos pedidos dos pilotos.
Antes de chegar na tal bandeira, vale um parênteses importante: como é o processo do tal VAR da Fórmula 1 (e porque ele é muito mais demorado)?
Primeiro é preciso entender que as punições e as regras de driving code não estão interligadas, ou seja, não é sempre que voltar de forma perigosa à pista (no caso de Vettel no Canadá) vai gerar 5s. Primeiro, os comissários (lembrando que o comissário convidado, o ex-piloto, não tem peso maior no julgamento) verificam se o piloto violou algum dos artigos citados no artigo 27 do regulamento esportivo, que dita as regras sobre pilotagem. E depois podem escolher dentre uma gama de níveis de punição dependendo da gravidade. Nos últimos anos, Whiting se dedicou a criar um sistema informatizado que possibilita a consulta de decisões anteriores para lances parecidos e é possível pesquisar, por exemplo, todos os incidentes de um circuito, todos os que violam o artigo X, todos os incidentes do mesmo piloto, etc. O fato de não ser algo simples como ver se a bola entrou ou não, verificar um impedimento ou se a falta foi dentro da área explica por que o processo é mais demorado.
Mas o que está, de fato, escrito na regra?
Além das regras que falam em não andar exageradamente lento e pilotar sem ajudas, a parte mais importante é a seguinte: “Os pilotos têm de fazer todo esforço razoável para usar a pista em todos os momentos e não podem sair dela sem um motivo justificável. […] Se um carro sair da pista, o piloto pode voltar, mas isso só pode ser feito quando for seguro e sem ganhar vantagem duradoura.”
E há, no driving code, a regra que diz que, quando um rival tiver parte significativa (pode ser uma asa, não precisa estar lado a lado) em paralelo ao carro, ambos têm de deixar a distância de pelo menos um carro entre ele e a linha – algo que Leclerc descumpriu em Monza na briga com Hamilton.
Outro ponto importante vem mais à frente, no artigo 38: “A não ser que esteja claro para os comissários que um piloto teve culpa total ou predominante, não será aplicada nenhuma pena.”
Ou seja, a regra deixa aberta a interpretação do que é ganhar vantagem, até porque em algumas pistas, como em Monza, as zebras são tão altas que é difícil passar por elas e, ainda assim, ganhar a tal vantagem. Mas digamos que eles considerem que houve exagero de um piloto. Ele é culpado, como Leclerc. Aí seguimos para o passo seguinte:
Até antes do GP da Bélgica deste ano, os comissários entendiam que podiam escolher as penas desde a soma de 5s até o stop and go de 10s (que faz o piloto perder uma eternidade, já que tem de ser cumprido em 3 voltas e a equipe não pode fazer um pit stop, ao contrário do que acontece com a pena de tempo de 5 ou 10s).
Voltando ao Canadá, o que aconteceu foi o seguinte: os comissários entenderam que Vettel não tinha retornado à pista de maneira segura na leitura nua e crua das regras. Mesmo sabendo que ele não tinha o controle do carro – algo atestado até pelos rivais – não tinham saída. O texto estava lá e tinha de ser cumprido. Não por acaso, contudo, escolheram a menor pena possível.
Mas será que era mesmo a menor pena possível? Masi fuçou no regulamento e viu que não. A bandeira preta e branca vem para preencher a lacuna que o diretor de provas e os próprios pilotos viam entre os lances que seriam punidos pelo texto da regra, mas que podem ser vistos como lance de corrida. Passou a ser adotada a partir da Bélgica e explica por que os comissários consideraram Leclerc culpado, mas não deram punição efetiva.
“Faz uns 100 anos que existe essa bandeira, então vamos usá-la! É para isso que ela existe, acho que só agora acordaram para o fato que já temos isso”, reagiu Kimi Raikkonen. “Acho positivo porque em vários lances acho que é loucura dar uma pena logo de cara, porque é o que eles têm que fazer por causa das regras. Mas também temos as bandeiras que dão uma acordada no pessoal.”
Então agora quer dizer que o piloto sabe que tem um curinga nas mãos, e que pode jogar alguém para fora da pista uma vez e escapar de punição? Lembro que Raikkonen foi questionado logo em seguida sobre isso. Ele abriu os braços, deu um suspiro, e desenhou: “Depende do que você fizer. Se você fizer uma coisa completamente estúpida é claro que não vão dar só uma bandeira. Para coisas menores, ela está lá.”
Trocando em miúdos, não será toda vez que um piloto vai receber primeiro uma bandeira preta e branca – e os casos de Vettel e Stroll em Monza estão aí para provar. Seu uso foi apenas uma resposta pós-Canadá e dá mais um degrau de punição para os comissários usarem. É algo que legaliza o “segue o jogo” – que já tinha pautado a decisão que manteve a vitória de Verstappen na Áustria – e que os pilotos tanto vinham pedindo.
Um capítulo importante na história do bicampeonato de Emerson Fittipaldi completa 45 anos nesta semana. Foi no GP do Canadá de 1974, a penúltima etapa do campeonato daquele ano, que tinha uma briga entre Emerson, que chegou à corrida em terceiro, Jody Scheckter e Clay Regazzoni, e Niki Lauda estava tentando correr por fora em seu primeiro ano pela Ferrari. Os quatro estavam separados por 8 pontos. O austríaco vinha tendo ótimo desempenho nos treinos classificatórios, marcando nove poles em 11 corridas, mas não conseguia converter essas performances em pontos no campeonato.
Assim, ele chegou ao Canadá dependendo de um resultado forte para se manter na briga e ajudado por uma decisão da federação de lhe devolver o quinto lugar no GP da Grã-Bretanha, que estava sub judice. Curiosamente, não fez a pole – ela ficou com Fittipaldi, com Lauda em segundo, Scheckter em terceiro, e Regazzoni, que era o líder, só em quarto.
Mesmo sendo a penúltima etapa, o clima era de decisão, como mostram os relatos da época. “Houve momentos durante esta temporada em que alguns ficaram tentados a não darem o máximo de si constantemente, preferindo uma corrida tática para terminar em terceiro ou quarto torcendo para que seus rivais falhassem. Mas, desta vez, com o Mundial tão equilibrado, não era hora de tática ou de tirar o pé.”
A prova teve problemas organizacionais, embora não fosse a primeira vez que a F-1 corria em Mosport, em Toronto: o controle de circulação dos espectadores não era dos melhores, nem o treinamento dos fiscais, que tiveram que limpar a pista inúmeras vezes nas corridas de abertura devido aos vários acidentes nas categorias locais, e a largada foi atrasada em mais de uma hora.
Como foi normal durante aquela temporada, as Ferrari largaram forte: Lauda pulou para a ponta e Regazzoni subiu para terceiro, deixando Fittipaldi em um “sanduíche” vermelho. Logo Scheckter passou o líder do campeonato. Na volta 45, contudo, o sul-africano começou a ter problemas de freio e teve de abandonar.
O que aconteceu com Lauda, que dominava a prova, foi menos usual. John Watson tocou o muro com sua Brabham na saída de uma curva cega. O líder vinha logo atrás e ainda não havia bandeiras amarelas no local. Lauda escorregou nos detritos que estavam na pista e também bateu, deixando o caminho livre para Fittipaldi.
Com Scheckter e Lauda fora em um momento tão decisivo, a batalha na prova final acabou ficando entre Fittipaldi e Regazzoni, que chegaram à etapa dos EUA empatados com 52 pontos. Mas essa história já sabemos como acaba.
Cleber Humberto Balieiro: Sobre pilotos: Haas definida? Gasly e Kvyat serão mantidos?
Vira e mexe eu ouço a sobre a possibilidade da Haas trocar os dois pilotos, mas essa não é a postura do Guenther, que manter algum nível de estabilidade. A preocupação é grande na equipe que, depois de evoluir constantemente desde o início, se perdeu completamente nesta temporada – e sabe-se lá se vai se encontrar. Pelo que vi em Monza, Hulkenberg vai esperar para ver quem dá mais, já que há a possibilidade da Ferrari liberar a segunda vaga da Alfa Romeo. A Williams se interessou pelo alemão, mas digamos que não foi correspondida.
Na esfera Red Bull, nada garantido. Vi Pierre inclusive conversando com Fred Vasseur, da Alfa, que trabalhou com ele no passado. Na verdade, tanto para ele, quanto para Daniil, talvez o melhor fosse seguir o caminho de Sainz…
Pelo histórico das pistas creio que o período de “facilidade” da Ferrari acabou. Ferrari encara assim também?
Em teoria, sim, depende do desenvolvimento, claro. Talvez deem um pouco mais de trabalho na Rússia e em Abu Dhabi.
Felipe Hänsell O bom desempenho da McLaren em várias pistas somado ao desempenho dos motores Renault em Monza, expõe a deficiência aerodinâmica das Renault (equipe)?
Sim, a McLaren tem uma relação downforce x arrasto mais eficiente que a Renault, e também parece ser um carro mecanicamente superior. Mas nos resultados do time inglês tem muito da execução nas corridas, que pelo menos vinha sendo limpa até a troca de pneus que acabou com a corrida de Sainz em Monza. Acho que a diferença entre os carros não é tão grande quanto a diferença de pontos na tabela.
Nessa última corrida, Hamilton, Vettel, Leclerc e Verstappen (pilotos das três maiores equipes) cometeram erros e saíram da pista. Bottas errou o ponto de freada duas vezes na perseguição ao Leclerc nas últimas voltas. É justo criticar o finlandês mais do que os outros?
Algo que temos visto na comparação direta entre Hamilton e Bottas é como o inglês consegue se manter perto de um rival por muitas voltas sem perder tanto rendimento quanto o companheiro – na verdade, ele é melhor do que qualquer outro piloto nisso, mas a comparação mais justa é com quem tem o mesmo equipamento. Hamilton errou? Sim, mas com pneus sete voltas mais velhos e tendo ficado na cola de Leclerc o tempo todo. Bottas errou mais de uma vez tendo tido um stint mais limpo e com pneus mais novos. De qualquer maneira, ele está se medindo contra um dos melhores da história.
https://platform.twitter.com/widgets.js Itamar Pereira Olá! Percebi que os comissários andam bem tolerantes com relação às manobras dos pilotos quando se defendem. Já presenciamos isso algumas vezes após o GP do Canadá. Nesse fim de semana, o Leclerc mexeu mais de uma vez na frente do Hamilton e o forçou para fora da pista, não deixando o espaço para um carro. Será que essa tolerância não vai abrir um precedente para disputas que coloquem em risco os pilotos? Hamilton já avisou que, quando vencer o campeonato, vai mudar sua conduta, tendo em vista que não é mais necessário deixar espaço de um carro. No máximo, toma uma advertência.
O que o Michael Masi está fazendo foi um pedido dos pilotos na França: punição só quando houver acidente. Não podemos esquecer que estamos falando dos melhores do mundo. Não é porque as regras de um milímetro para cá e outro para lá dão uma advertência da primeira vez que eles vão começar a encher a traseira um do outro. Acredito que, se Masi achar que estão exagerando, voltará atrás – ele me parece um cara aberto a isso. Falarei mais sobre essa questão da aplicação das regras no post do Por Dentro da F-1 de quinta.
Ana Luiza Kalil Houve alguma repercussão no paddock em relação ao fato da volta do Bottas na classificação ter sido considerada mesmo com bandeira vermelha? Como você mesma comentou no post das estratégias no blog, abriu um precedente perigoso. E único comentário que vi nas redes sociais a respeito é que a volta foi considerada pq a Mercedes ainda não tinha avisado o Bottas sobre a bandeira vermelha, sendo que ela já aparecia nas telas e nas mãos dos fiscais…
Sim, inclusive o Norris twittou algo como “ah tá, então agora quando virmos a bandeira vermelha sabemos que podemos acelerar até a equipe avisar”, com um tom irônico. Considero isso muito mais grave do que a tal questão da advertência. Até porque não faz muito tempo que tivemos a morte de um piloto que não tirou o pé em bandeiras amarelas duplas (mesmo que uma série de fatores tenha feito com que o desfecho do acidente do Bianchi tenha sido aquele). É por isso que temos VSC, por exemplo: para neutralizar a corrida rapidamente. E os pilotos recebem alerta no volante e veem as bandeiras e painéis na pista. Acredito que todos no paddock acreditavam que o informe via rádio era só para garantir, não era o principal. Até porque é importante para a segurança que a corrida seja neutralizada ao mesmo tempo para todos. Sei que é uma questão de segundos, mas não faz sentido algum, e foi algo que só não gerou um barulho maior no paddock por toda a confusão da classificação em si.
Antes dos carros entrarem na pista, perguntei a Charles Leclerc se ele sequer precisaria da assistência que teve do companheiro Sebastian Vettel para vencer em Monza – da mesma forma que Vettel não precisaria dele, se invertesse uma tendência que agora já dura sete provas e largasse na frente – tamanha seria a vantagem da Ferrari em casa. Afinal, ao invés de todo um setor de curvas de média e alta velocidade, como era o caso da Spa, Monza temos menos curvas e mais retas, o que em tese esconderia ainda mais os problema do carro ferrarista.
Ele disse que não seria bem assim. E isso revela um pouco mais sobre o tipo de vantagem que a Ferrari tem em termos de velocidade de reta. É algo que tem a ver com o sistema de recuperação de energia e que, justamente pela falta de curvas, ficou limitado em Monza. Assim, a vantagem de velocidade continuava ali, mas por menos tempo, o que explica a briga pela pole muito mais apertada (sobre a qual falarei mais adiante).
Na largada e nas primeiras voltas, contudo, isso foi suficiente para Leclerc executar seu plano de se manter na ponta na largada e deixar Lewis Hamilton ou quem viesse atrás fora da zona de DRS (ainda que o DRS tenha um efeito menor, de cerca de 5km/h ao invés de 10-12kmh devido à configuração usada em Monza, que já é de pouco arrasto). Usando a potência extra na saída da Parabólica e recuperando-a no restante da volta, ele ia controlando a corrida na ponta.
Em termos de estratégia, como a degradação era baixa, a janela de pit stops era calculada em 10 voltas, começando na 18. Isso fazia com que a tática da Mercedes fosse até óbvia: um piloto tentaria o undercut (antecipar a parada para usar a aderência extra para voltar na frente depois que o rival também fizer o pit stop) e outro, o overcut (seguir na pista e tentar um ataque no fim com pneus mais novos). Mas as coisas começaram a se complicar com o bom ritmo das Renault, algo que impedia que se abrisse a distância necessária (em Monza, de pelo menos 23s) para que os ponteiros parassem e voltassem fora do trânsito.
Na volta 19, eles resolveram parar (com Hamilton, que reclamava de desgaste) mesmo assim. Mas a volta de entrada nos boxes de Leclerc foi mais rápida, o pit stop da Ferrari também foi mais veloz, e a tentativa de undercut da Mercedes foi frustrada. Mais do que isso, como ambos voltaram atrás das Renault, o monegasco também teve DRS para se defender.
Por outro lado, a Ferrari, lembrando o que tinha acontecido em Spa e já com as informações do carro de Vettel, que estava com os pneus duros naquele momento depois de sua rodada, colocou Leclerc também no composto mais duro, o que significava duas coisas: ele estaria protegido de uma queda de rendimento significativa no final, mas sofreria mais para aquecer os pneus.
Essa diferença de compostos significava que as voltas logo depois de sair dos boxes seriam a única chance real de Hamilton levar a vitória, uma vez que seriam os pneus dele, e não de Leclerc, que estariam em piores condições no final. Hamilton foi para cima e viu como o Leclerc pós-Áustria se defende. E como a FIA após a chuva de críticas dos próprios pilotos pós-Canadá se comporta.
O momento mais crítico entre os dois foi na volta 23, na freada da segunda variante, quando Hamilton estava lado a lado e teve de sair da pista para evitar a batida. Ali, a regra de que o piloto deve deixar um carro de distância não foi cumprida, mas a decisão desta vez foi por usar uma bandeira preta e branca, corriqueira no kart mas que foi recuperada no GP da Bélgica pelo diretor de provas Michael Masi. Como o australiano explicou após a prova, o “cartão amarelo” é um jeito de dizer “você infringiu as regras, queremos mostrar que vimos e não queremos que se repita”. Masi queria algo intermediário entre punir e deixar rolar, e encontrou algo que já existia nas regras.
A partir daí, começou um jogo técnico, em que Hamilton tentava fazer Leclerc gastar suas baterias para não ter o boost a mais para se defender na saída da Parabólica. Paralelamente a isso, pedia à equipe mais potência mas, diferentemente do que a Red Bull fez com Verstappen na Áustria, a Mercedes não permitiu o uso do modo de motor mais agressivo, ciente das quebras que o spec 3 teve desde sua introdução em Spa e, ao contrário da Red Bull, planejando manter esse motor vivo (e não precisar do quarto e, consequemente, de levar uma punição) até o fim da temporada.
Mas Leclerc foi vencendo o jogo de xadrez, enquanto os pneus de Hamilton acabavam. O inglês disse que seu plano era deixar Bottas passar, mas seus pneus “decidiram” fazer a inversão antes dele, e a escapada na primeira variante trocou o rival de Leclerc. Foi um refresco bem-vindo ao monegasco, uma vez que Bottas não mostrou a mesma capacidade de seguir o rival de perto sem errar. Foram algumas as vezes que o finlandês saiu da trajetória, corrigindo o carro e mostrando o alto nível da batalha das voltas anteriores.
E pensar que a história poderia ter sido bem diferente após a confusa classificação.
Hamilton saiu dizendo que poderia ter feito o melhor tempo, pois tirou o pé devido ao acidente de Raikkonen, que aconteceu logo a sua frente, e ainda assim ficou a 0s039 da pole de Leclerc, mesmo caso de Bottas, que também tirou o pé na Parabólica e ficou a 8 milésimos de Hamilton (ainda que a volta do finlandês, fechada sob bandeira vermelha, tenha aberto um precedente perigoso para o futuro).
Vettel foi outro que saiu da classificação acreditando que perdeu a pole pelos motivos errados. Gostou de sua primeira tentativa, mas argumentou que a diferença para o tempo de Leclerc, de 0s150, foi somente pela falta de vácuo.
Os números sustentam essa tese e explicam o que aconteceu naquela outlap em que ninguém queria puxar a fila. Como neste ano as asas são maiores, elas geram mais arrasto, ou seja, mais resistência ao ar. Por este motivo, o vácuo se tornou mais poderoso, chegando a 0s7 no caso de uma execução perfeita, mas dando pelo menos 0s4. No Q1, o melhor e o pior tempo, excluindo a Williams, tiveram 1s1 de diferença. No top 10, com os carros mais iguais, o vácuo perfeito daria a pole. E ninguém quis dar essa chance para ninguém.
E por que ninguém foi punido? Depois de um pedido de Hamilton na reunião de sexta-feira, foi estabelecido um tempo máximo de volta (o mesmo do VSC) para a volta de aquecimento de pneus. E ninguém foi mais lento do que isso (1min45). Logo, não havia regra para punir os pilotos, algo que os comissários recomendaram que a FIA resolvesse para questões futuras.
Outros detalhes da corrida: Albon acabou sendo o mais prejudicado pela bagunça do final da classificação, pois não tinha feito tempo. Na corrida, ele e Verstappen acabaram tendo azar com o VSC causado por Sainz – estavam lutando com as Toro Rosso e Perez, e por isso tinham tentado o undercut. Os rivais pararam durante o VSC, perdendo muito menos tempo, e complicaram de vez a corrida das Red Bull, que devem voltar fortes para o GP de Singapura.
Outro detalhe curioso foi a punição de Kimi Raikkonen. A Alfa simplesmente não se atentou que, mesmo saindo do pitlane, ele teria que largar com pneu do Q3, já que estava usando o mesmo chassi.
Falando em punição, houve quem questionou por que Sebastian Vettel levou um stop and go de 10s (maior punição antes da desclassificação) e Lance Stroll, só um drive through pelo lance no começo da prova. Vettel foi considerado culpado por duas coisas: voltar à pista de forma insegura e causar colisão. Ele disse que não conseguia ver, pelo ângulo em que estava, se alguém vinha atrás, mas não dá para negar que ele é culpado em ambas as “acusações”. E Stroll só foi “enquadrado” por voltar de forma perigosa à pista. Tem sido interessante ver o estilo do novo diretor de provas Michael Masi que, desde a bordoada do Canadá, ouviu as críticas de forma construtiva e está intervindo apenas em situações mais agudas.
O GP da Itália terminou com um mar vermelho gritando o nome de Charles Leclerc – e vendo a apresentação de dois dos DJs mais famosos do mundo, Dimitri Vegas & Like Mike acabar com uma embaraçosa queda de energia no pódio. Micos de lado, a festa já tinha começado alguns dias antes, em Milão, na celebração dos 90 anos da Ferrari. Vários pilotos que fizeram história em Maranello estavam presentes, mas não passou despercebido o fato de Fernando Alonso, presente em Monza, ter sido completamente ignorado. Serviu para calar aqueles que insistem em falar em um retorno do espanhol ao time italiano, uma conversa que nunca fez muito sentido dentro do paddock. Alonso justamente depois do GP da Itália de 2014 achou que tinha capital político suficiente para pressionar a chefia por resultados, e encontrou a porta de saída a sua frente. E depois quis convencer o paddock que foi ele quem quis sair.
O que Alonso não sabia é que a Ferrari já tinha um pré-contrato com Vettel. Fiquei sabendo que o alemão resolveu ir de trem de sua casa na Suíça para Monza, cansado de aeroportos. Não o culpo. Na verdade, embora eles não digam com o microfone ligado, cresce a impressão de que tanto o alemão, quando Hamilton e outros pilotos mais experientes não estão nada afim de estender o calendário e isso pode afetar sua decisão de continuar pós-2020. Na verdade, não sei de ninguém no paddock que se anime com um calendário mais longo.
Em seu quinto GP pela Ferrari em Monza, Vettel já estava dando uma de Kimi, evitando o paddock ao máximo, caminhando atrás dos caminhões. Já Leclerc passava pelo “povão” e era parado um sem-número de vezes para tirar fotos. Ganhou até dois seguranças para conseguir escapar da multidão de VIPs, sempre em grande número em Monza. Mas ele parecia curtir cada momento. Leclerc é daqueles que têm dificuldade em esconder as emoções, elas ficam estampadas no seu olhar. Em Monza, ao invés de se assustar, ele estava radiante.
Falando em ferraristas, Jody Scheckter andou com a Ferrari com a qual foi campeão em 79 mas, ao contrário do que possa parecer, isso não aconteceu pela vontade da Scuderia. O carro é de propriedade do piloto, que precisava que o motor fosse refeito para conseguir colocar o carro na pista. Não teve nenhuma ajuda de Maranello para fazer isso.
Embora houvesse uma grande preocupação com a segurança em um dos três GPs do ano em que sempre acontece algum tipo de problema – os outros sendo Brasil e Espanha – um jornalista teve a mochila furtada no meio do paddock. Ela estava ao seu lado, no chão, enquanto ele conversava com outros colegas e simplesmente sumiu.
Quem estava no paddock em Monza era JR Pereira, promotor do GP no Rio, observando o modelo de negócio do GP da Itália e negociando com a Liberty. Na Hungria, era Gabriel Rohonyi que estava fazendo o mesmo por São Paulo. Mas a Liberty tem outros (vários) problemas para cuidar no momento: havia uma comitiva indo de equipe em equipe, tentando fechar o regulamento de 2021 (incluindo um teto orçamentário que agora parece menos real do que há alguns meses). Basicamente, nenhuma equipe tem contrato para além de 2020.
É forte o burburinho de que Jean Todt não segue na presidência da FIA após o fim de seu mandato, no final do ano. Seria a única vitória da Liberty, que não aprova o francês. E, do lado dos donos da F1, Sean Bratches, que não tem aparecido em tantos GPs neste ano, é quem estaria de saída. E Chase Carey, perto da aposentadoria, só ficaria até o fim de 2020.
Outro problema no momento é o GP da Holanda. Jos Verstappen anda dizendo aos quatro cantos que não acredita que Zandvoort vai acontecer ano que vem. É necessária a construção de uma nova via de acesso, mas isso significa o corte de árvores. Então o processo está parado por questões ambientais.
A FOM promoveu uma brincadeira interessante em Monza, da qual participaram desde Ross Brawn até nós, meros jornalistas: todos tinham que descobrir quais eram os carros mesmo com todos pintados de branco. Brawn errou a maioria, pasmem, e quem ganhou foi um dos jornalistas do meu grupo mais próximo de amigos, Laurence Edmonson, da ESPN. Não fui participar porque a competição foi bem no ápice da confusão pós-classificação, mas pelo menos nosso “Lazza” representou bem a nova geração de jornalistas – sim, existe uma rixazinha geracional até na sala de imprensa!
É justo dizer que o paddock ficou dividido após um GP da Itália que coroou a primeira vitória da Ferrari desde 2010, e em que Charles Leclerc foi coroado ao vencer em casa logo em sua primeira tentativa com a Scuderia em Monza, ainda mais com o contraste em relação a Sebastian Vettel que, não apenas nunca conseguiu o feito, como também rodou sozinho na corrida. Mas a divisão não tinha nada a ver com isso. Parte acredita estar vendo o nascimento de uma lenda ferrarista. Parte está enxergando os primeiros sinais de que Leclerc não é bem o bom moço que aparenta.
É justo dizer, também, que a maioria de um lado é italiana, e a do outro é inglesa. O segundo grupo comprou a ideia de que Leclerc freou as Mercedes na classificação para ficar com a pole position, até porque ele sabia que teria que ceder o vácuo a Vettel em sua segunda tentativa. Vettel, inclusive, saiu da classificação reclamando porque achou que o companheiro demorou demais para passá-lo, deixando-o também sem tempo para abrir sua volta (e ameaçar sua pole).
São eles que também questionam a manobra de Leclerc na volta 23, espremendo Hamilton e recebendo uma advertência. “Estamos na Itália”, disse Hamilton quando perguntado se a falta de punição o tinha surpreendido. O inglês ainda continuaria dizendo que aprendeu muito “sobre o caráter” de Leclerc durante a briga e tinha sido “interessante”. Foi ele, também, quem colocou em dúvida a motivação da volta tão lenta na classificação.
Mas será? Quem estava segurando o ritmo na classificação eram Hulkenberg e Sainz, enquanto Leclerc parecia tentar passar Vettel para dar-lhe o vácuo, mas não tinha espaço. E é impossível dizer o que houve de deliberado ali. Na corrida, os pilotos há tempos pedem mais liberdade nas disputas mas, quando se veem atingidos por algo que está no texto da regra, são também os primeiros a pedir punições. O diretor de provas Michael Masi já tinha avisado antes da Bélgica que adotaria a bandeira branca e preta, que divide, sim, opiniões – porque agora os pilotos sabem que vão escapar da primeira vez – mas que definitivamente atende aos pedidos dos próprios pilotos.
Mas também tem um outro jeito de olhar tudo o que aconteceu neste fim de semana. Confesso que, quando Leclerc saiu do e um batalhão de fotógrafos e VIPs cercou o carro dele como uma avalanche, seguindo cada passo até o seu ritual pré-corrida de sentar ao lado do carro e esperar pelo hino, imaginei que ele não conseguiria. Mas um menino de 21 anos – que só aparenta a idade que tem logo depois que sai do carro e nas primeiras entrevistas, se segurando o mais rápido possível depois – executou uma corrida difícil, em que Ferrari e Mercedes tinham ritmo semelhante, mas ao carro vermelho sobrava velocidade no trecho final da reta e, à Mercedes, cuidado com os pneus. Sem a ajuda de Vettel, como ocorrera em Spa, e com um tal Hamilton nunca mais de 1s5 atrás, Leclerc usou a pole como “desempate” e caiu de vez nas graças dos tifosi.
Perguntei a Charles Leclerc como ele conseguiria se defender das Mercedes sem ter seu “escudeiro” Sebastian Vettel, diferentemente do que aconteceu em Spa. Isso porque o cenário é mais parecido ao da semana passada do que todos imaginavam antes do início do fim de semana: a Ferrari tem a vantagem em uma volta lançada, mas o ritmo de corrida da Mercedes é ligeiramente melhor
A diferença é que Sebastian Vettel não está largando em segundo, o que dificulta o plano da Ferrari de usar um carro para proteger o outro, algo que deu certo na semana passada. Leclerc revelou que seu plano é forçar o ritmo no começo para escapar do DRS, e depois ver o que, de fato, pode fazer em termos de ritmo e estratégia em comparação com as Mercedes.
Isso porque na verdade ninguém sabe com precisão onde está. Isso porque as simulações de corrida foram encurtadas na sexta-feira por conta da chuva, e a temperatura também estava ligeiramente mais baixa. Para jogar ainda mais pimenta, é esperada uma forte chuva para a manhã de domingo, que vai tirar toda a borracha da pista. Deve estar chovendo ainda quando a Fórmula 2 fizer sua prova, inclusive, mas a previsão é de que a água pare algumas horas antes da Fórmula 1.
A chuva seria bem-vinda para Leclerc (ou para quem estiver na frente na primeira curva), já que o spray é um grande problema em Monza – ainda mais com os pneus largos que a F-1 usa atualmente – mas há dias não existe a previsão de chuva para a tarde de domingo.
Em termos de estratégia, não será uma corrida cheia de alternativas. A previsão é de uma parada, perto da volta 20, e todos estão largando com o mesmo composto, o macio. O problema de Leclerc se as posições se mantiverem as mesmas na primeira curva é que a Mercedes poderá dividir as estratégias – com um piloto parando antes e tentando o undercut, e o outro seguindo na pista, buscando o overcut.
Além de uma corrida tensa na frente, devemos ter show de Max Verstappen, saindo de trás por adotar o spec 4 da Honda neste fim de semana. Ele, inclusive, se disse muito satisfeito com o aumento de potência que sentiu no novo motor.
No meio do pelotão, Renault e McLaren claramente têm um ritmo melhor que os rivais diretos, o que é um bom sinal para os franceses, cujo carro custumava ser muito mais draggy (gerar muito mais arrasto) que os carros laranjas.
Pilotos dos dois times, inclusive, foram personagens dos bizarros instantes finais da classificação do GP da Itália. Já se sabia que todos procurariam o vácuo na última tentativa, algo que sempre aconteceu em Monza (e em Spa) mas que, nesta temporada, se tornou mais importante devido às novas dimensões das asas. Calcula-se que o ganho seja de 0s4 o que, em uma pista em que a pole costuma ser decidida por centésimos, é uma eternidade.
Foi por isso que os pilotos ficaram jogando para não serem o primeiro da fila – e o único sem vácuo – e no fim das contas cruzaram a linha depois que o cronômetro estava zerado. Um anticlimax que já tinha sido previsto por Hamilton, que pediu na reunião de pilotos na sexta-feira que o delta de tempo que eles usam no período de Safety Car fosse considerado para determinar quem estivesse lento demais. Foi uma boa sugestão, mas não resolveu muito, pois Nico Hulkenberg e Carlos Sainz não só diminuíram o ritmo, como ficaram andando lado a lado, travando os demais enquanto, na Ferrari, Vettel também diminuía sabendo que o acordado era de que ele tivesse o último vácuo, e não Leclerc.
Escrevo quatro horas depois da classificação acabar, e ainda sem a confirmação do que vai acontecer. Acredito que Hulkenberg e Sainz deveriam ser punidos para que não se abra um precedente perigoso, inclusive, para as categorias de base – tiveram que dar bandeira vermelha na classificação da F-3 devido ao péssimo comportamento dos pilotos. Não é algo que vai se repetir muitas vezes, pois tem tudo a ver com as características da pista. Mas duvido que alguém queira ver uma classificação acabar desse jeito de novo.
No F1 on demand, os apoiadores Credenciados do projeto do No Paddock da F1 com a Ju podem mandar as suas perguntas ou encomendas de temas para eu correr atrás no paddock:
Kezo Manabe fez duas perguntas sobre a troca de Gasly por Albon na Red Bull: Qual foi o critério adotado pela escolha do Albon no lugar de Gasly e não o Kvyat? Albon está tranquilo ou já sente a pressão de ter fazer resultados! (ouvi numa mídia internacional que ele não queria ir)
Para compreender a situação dos pilotos da Red Bull-Toro Rosso, é preciso entender a mentalidade de Mateschitz ao ter duas equipes. Para a marca, é importante ter um certo perfil, é importante que esse perfil seja jovem e também conta quais mercados seus pilotos representam. É claro que Horner, Marko e companhia têm a missão de fazer com que a parte esportiva seja também levada em conta, mas é sempre importante lembrar que a empresa Red Bull usa a Fórmula 1 como ferramenta de marketing, como as outras, mas eles, ao contrário dos rivais, não vendem carros.
Feita a introdução, a decisão de subir Albon e não Kvyat se deu, oficialmente, pelo fato do russo “ser algo conhecido”, como disse Horner. Isso depois que o Marko afirmou que ele tinha “voltado completamente diferente” após a demissão, com uma nova atitude. Ou seja, não cola.
Parece-me que a Red Bull não confia em Kvyat, ou que ele não se encaixa à estratégia da marca. Ao mesmo tempo, o mercado do sudoeste asiático é imenso e isso não pode ser subestimado.
Certamente, Albon preferia ficar na Toro Rosso e ganhar experiência. Por outro, a carreira dele foi sempre assim: ele acabou sendo treinado a lidar com o que viesse adiante. Foi assim que ele apareceu nos testes sem nunca ter andado num F-1 antes e foi bem. Foi assim que ele saiu de 17º e terminou em quinto na primeira corrida pela Red Bull.
Será assim daqui até o fim do ano? Não foi nem com Verstappen.
Igor Rabelo Melo quer saber sobre o futuro do GP do Brasil, uma vez que Doria afirmou que anuncia em novembro a renovação com Interlagos.
Nas negociações deste ano, a Liberty Media mostrou que não se importa muito em deixar o calendário indefinido até a metade do ano seguinte, ou mesmo em ir renovando anualmente os acordos. É uma maneira diferente de lidar com isso em relação a Bernie Ecclestone, que queria contratos longos (nos quais a race fee ia aumentando exponencialmente, algo que os promotores querem evitar de qualquer jeito hoje).
Mas o que isso tem a ver com o Brasil? De um lado, temos um GP que, na visão da Liberty, representa a “velha política” de Ecclestone (nas mãos do promotor Tamas, com quem eles não querem negociar) e em um circuito que passa por um processo de privatização (os primeiros projetos começaram a ser revelados agora, então não podemos esperar que algo, de fato, aconteça em menos de dois anos).
De outro, temos uma concessão parada esperando a conclusão de um estudo ambiental, algo que já vem se arrastando por algum tempo. Os promotores da prova do Rio colocam a entrada no terreno em novembro como o prazo necessário para construir a pista para receber a corrida de 2021. Falando-se em Brasil, mas sem qualquer experiência nesta área, imagino que seja otimista.
Com todo esse cenário, se você fosse a Liberty Media, o que faria? A alternativa de São Paulo não é perfeita e pode não existir mais dependendo do que acontecerá com o processo de privatização (acho que a Liberty já percebeu que os políticos não são chegados em continuidade no Brasil, e tudo pode mudar de uma eleição para a outra). E a alternativa do Rio, no momento, inexiste, mas isso pode mudar a médio prazo. A melhor saída seria renovar por mais um ano com São Paulo e observar o que vai acontecer, até porque já está claro que o GP do Brasil virou um cenário de jogo político, e há pouca coisa tão volátil quanto a política brasileira nos últimos anos.
O cenário da sexta-feira era claro: a Ferrari tinha uma vantagem muito grande nas retas em uma volta lançada, parte por seu modo de classificação que ninguém sabe muito bem como funciona, parte pelo carro gerar menos arrasto que a Mercedes. Mas essa vantagem toda desaparecia nas simulações de corrida, tanto porque a vantagem em si do motor não é a mesma no modo de corrida, quanto pelo desequilíbrio do carro no segundo setor, que fazia Leclerc e Vettel superaquecerem os pneus. Por isso, mesmo fechando a primeira fila do grid, a Ferrari ia para a corrida se sentindo exposta.
Dois fatores mudaram da sexta para o domingo. A Ferrari fez mudanças no acerto do carro que diminuíram o desgaste, e as temperaturas caíram em 10ºC, ajudando Vettel e Leclerc a cuidarem especialmente do composto macio.
Esses fatores atenuaram o sofrimento ferrarista. Mas não seriam suficientes. Era preciso também jogar com a estratégia.
No começo da prova, com os pneus ainda em dia, mesmo com uma fritada na primeira curva, Vettel retomou a segunda posição com facilidade, mas logo Hamilton perceberia que a situação não era tão ruim quanto ele imaginava em relação a diferença de velocidade entre os dois carros. Era só esperar Vettel começar a ter dificuldade com os pneus e atacar.
A briga entre os dois ajudou Leclerc a abrir na ponta tanto no começo, quanto depois do Safety Car. Isso fez com que o monegasco pudesse testar todas as técnicas que vem aprimorando para melhorar seu ritmo de corrida, algo que se tornou seu foco depois de bater Vettel nas últimas seis classificações, mas muitas vezes perder essa vantagem no domingo.
Quando Kvyat abriu a janela de pit stops, ainda na volta 10, a Ferrari ficou com um dilema: Hamilton estava perto o suficiente para tentar um undercut, o que não só obrigaria o time a parar Vettel logo em seguida, como também Leclerc. E ambos os pilotos teriam um longo segundo stint pela frente e estariam expostos justamente à degradação de pneus mais acelerada do que no carro da Mercedes.
Do lado da Mercedes, o undercut só faria sentido se eles tivessem confiança de que ganhariam a posição de Vettel, algo que não era garantido porque o pneu médio demorava para aquecer e a diferença entre os compostos na longa volta de Spa era de pelo menos 1s (diferença essa, claro, diminuída pelo desgaste dos macios, mas quanto?). Além disso, seria jogar fora justamente a vantagem de cuidar melhor dos pneus que a Ferrari.
Mesmo sabendo disso, a Ferrari escolheu a opção mais óbvia para garantir a vitória da equipe. Manter a posição de pista de Vettel à frente de Hamilton após as paradas era o primordial para permitir a Leclerc dosar o ritmo e cuidar dos pneus.
Por isso, quando a Ferrari cobriu a possibilidade de undercut, chamando Vettel aos boxes na volta 15, as Mercedes não responderam. Hamilton, Bottas e Leclerc ficariam ao máximo na pista para se certificarem que teriam pneu até o fim.
Por ter parado primeiro e podendo forçar, sabendo que pararia uma segunda vez pelo menos para ter a volta mais rápida, Vettel acabou tomando a liderança quando todos fizeram seus pit stops, na volta 21, mas era uma liderança que não duraria muito: Leclerc voltou 1s mais rápido por volta e, para evitar qualquer desgaste de pneus desnecessário em uma briga que seria só uma questão de tempo, a Ferrari pediu para Vettel abrir.
O foco do alemão a partir de agora era frear Hamilton e deixar Leclerc escapar. As sete voltas que ele ficaria na frente de Hamilton até o inglês fazer a ultrapassagem foram fundamentais para a vitória de Leclerc, já que ele conseguiu abrir 7s sem forçar muito os pneus. Foi fundamental, também, o trabalho que o monegasco vem fazendo para evoluir no quesito, tentando controlar seu estilo de gera mais saídas de traseira em comparação com Vettel e, consequentemente, mais superaquecimento nos pneus traseiros.
Hamilton, como de costume, não desistiria até o fim: depois de passar Vettel, tirou quase toda a diferença, mas não começou a volta final perto o suficiente. Seria a primeira vitória de Charles Leclerc, uma vitória de ponta a ponta, mas muito mais difícil do que pode ter parecido de fora. Contra um carro que, em teoria, seria mais eficiente na corrida. E com toda a carga de ter perdido um amigo de infância menos de 24h antes.
O quinto lugar acabou ficando com Albon, que largou em 17º. Ele teve de fazer uma corrida paciente, com um motor velho (spec 2, ou seja, o motor pré-França) e pneus médios, esperando os pneus dos demais acabarem. Dali em diante o tailandês foi passando um a um, e não poderia ter feito mais.
O quinto lugar, é claro, veio também com sua dose de sorte pelo abandono, na última volta, de Norris. Ele largara em 11º e se viu em quinto após a confusão da primeira curva. Como os rivais mais próximos no início da prova eram as Haas, que seriam passadas por um a um, acabou “protegido” e podendo fazer seu próprio ritmo.
Enquanto isso, a Renault tentava uma estratégia suicida com Ricciardo, que teve que parar no SC da primeira volta e foi até o fim com o mesmo jogo de pneus. Perdeu muito mais tempo do que se tivesse parado de novo, algo que a Renault fez com Hulkenberg: um chegou em 14º e o outro, em oitavo.
Mas quem saiu de Spa mais decepcionada com a chance jogada fora foi a Alfa, que tinha tudo para pontuar bem pelo menos com Raikkonen, cuja corrida acabou com o toque da primeira volta com Verstappen, e poderia ter saído com dois pontinhos com Giovinazzi, se o italiano não tivesse errado na penúltima volta. Melhor para Sergio Perez, que sempre costuma aproveitar toda brecha que aparece.
Foi uma corrida interessante porque, dependendo do carro e da história da prova de cada um, o pneu aguentou até o fim ou abriu o bico. E são essas diferenças que fazem os carros se encontrarem na pista em situações diferentes, até a última volta da prova.