Estratégia do GP da Hungria e como a Ferrari não pôde vencer a pista de Hungaroring

A Ferrari tentou de tudo para reverter o prejuízo com o qual Sebastian Vettel acabou depois da classificação do GP da Hungria: dividiu estratégias duas vezes para tentar tirar dois carros da frente do alemão e permitir que ele usasse o caminho livre para imprimir seu ritmo superior ao de Lewis Hamilton. Mas pelas características da pista e falhas de execução, chegar em segundo foi o máximo possível.

Na classificação, Lewis Hamilton conseguiu talvez sua pole mais improvável do ano, em uma corrida em que, sob condições normais, largaria em quinto. Isso porque a Mercedes superaquecia os pneus traseiros, que não têm retas longas para “respirarem” em Hungaroring, mesmo em uma volta lançada. E isso acabou sendo benéfico com a pista molhada – além da sensibilidade acima da média do inglês para sentir onde está a aderência nestas circunstâncias.

Vettel largou com os pneus macios confiando na melhor saída da Ferrari, que evitaria que ele ficasse exposto aos rivais que vinham atrás, ao mesmo tempo em que teria a chance de, logo depois que os pilotos dos top 3 parassem, ter pista livre para fazer valer o melhor ritmo da Ferrari.

Paralelamente a isso, o plano da Scuderia envolvia usar Kimi Raikkonen para fazer o pit stop cedo e, com isso, atrair Valtteri Bottas. Assim, seriam dois carros a menos à frente de Vettel. Kimi acabou ficando encaixotado por Bottas na largada e perdeu a posição para Vettel logo no início da prova. Mas a tática de usá-lo para atrair Bottas funcionou e, na volta 15, o alemão passou a ter pista livre no momento em sua diferença em relação a Hamilton era de 8s6.

O inglês primeiramente apertou o ritmo e abriu mais 2s, mas não demorou para seus pneus começarem a sofrer. Quando ele parou, tinha 8s7.

Ali existia uma janela interessante para Vettel: os pneus macios não se desgastam tanto, e na verdade até demoravam algumas voltas para que os dianteiros entrassem na temperatura ideal. Tanto, que Hamilton não voltou andando tão mais rápido do que os ultramacios usados.

Mas Vettel não estava conseguindo adotar o ritmo esperado. Analisar após a bandeirada é bem mais fácil, mas se o alemão parasse na volta 33, antes de pegar uma sequência complicada de quatro retardatários, voltaria certamente à frente de Bottas e 6 ou 7s de Hamilton.

O problema é que a Ferrari não confiava que os ultramacios iriam durar mais da metade da prova, ainda mais com Vettel tendo de tirar a diferença na pista. Assim, tiveram que esperar correndo o risco da diferença para Bottas não ser mais suficiente. E, depois de uma combinação de duas voltas na casa de 1min24, enquanto o finlandês andava em 1min22, e um pit stop pouco menos 2s mais lento que o normal, a chance de brigar pela vitória se transformou na obrigação de conseguir um segundo lugar.

Quando Vettel se viu atrás de Bottas, mudou seu foco, como ele mesmo admitiu: logo percebeu que os pneus do finlandês ainda estavam aguentando e decidiu esperar para atacar no final. Quase deu azar do rival encher sua traseira, mal conseguindo parar sua Mercedes no lado sujo da pista e sem pneus, mas cumpriu sua meta.

No final das contas, mesmo com a má execução do domingo, o GP da Hungria deveria ter sido um passeio da Ferrari, que se complicou quando a chuva apareceu na classificação. Entretanto, o ponto mais interessante é que, quando analisamos a prova, é difícil achar um momento em que Mercedes e Ferrari se enfrentaram em iguais condições de ritmo, e isso está diretamente ligado ao fato de, com a chuva, o tipo de composto da largada ser liberado. Especialmente com três equipes tão melhores que não são penalizadas por fazer o Q2 com compostos mais duros, não seria a hora de rever essa regra?

Drops do GP da Hungria e a influência de Toto

Tive a chance de fazer em Hungaroring uma rara entrevista a Jo Bauer, delegado técnico da FIA, um alemão que não gosta muito de falar com a mídia. É a função dele e de sua equipe garantir que os carros estejam dentro da legalidade (aliás, aguardem artigo bem completo sobre isso na sessão de técnica na segunda metade do ano). Jo revelou algo interessante: “em meus 388 GPs, na Alemanha foi a primeira vez que não pesamos nenhum carro. Eles simplesmente estavam inundados por causa da chuva”.

 

A Mercedes convidou apenas as mulheres que trabalham na TV e no rádio para um jantar na quinta-feira em Budapeste. O grupo é cheio de histórias interessantes e mulheres fortes. Teve quem foi de aeromoça à TV, uma dinamarquesa que queria morar na Espanha e foi garçonete para ganhar dinheiro quando chegou no País hoje está há mais de uma década na F1. Outra planejava trabalhar alguns meses como produtora na categoria, e isso faz 16 anos. Já uma das pioneiras entre as mulheres na F-1 no início dos 90 se viu sem trabalho quando sua TV não renovou o contrato e agora é consultora na Mercedes.

 

A resenha foi longa, claro. Da dificuldade de encontrar alguém que entenda esse trabalho e ter um relacionamento sério a toda a boataria ridícula que os homens espalham sobre nós no paddock. Sobre como é complicado acertar todas as perguntas para 20 competidores com pouco tempo para reagir após as sessões, com gente falando no seu ouvido, e ainda mais a pressão extra que nós mesmas colocamos por sermos mulheres nesse mundo tão masculino.

 

O mercado de pilotos continuou em ebulição na Hungria (mas sem “aquele” boato de Alonso na Ferrari, que surgiu bem longe do paddock). Os olhos estão na Force India e as manobras estão nas mãos de Toto Wolff. O time não estava pagando a conta dos motores para a Mercedes, então o chefe interferiu, usando Esteban Ocon como moeda de troca e atraindo o dinheiro dos Stroll.

 

O francês fala como se já soubesse seu destino. Ouvi de fontes muito confiáveis que o negócio realmente está fechado com a Renault. Na tal manobra de Toto, falta conseguir colocar Sainz na McLaren.

 

Já sobre a questão Stroll/Force India, que fique bem claro que a ideia de seu pai é investir, nos moldes do negócio com a Williams. Até porque ele já estudou comprar o time e foi informado de que há várias dívidas escondidas. Nesse quadro, chamou a atenção a declaração de Sergio Perez de que “a situação é crítica, e vocês nem sabem quanto”. E logo percebemos o porquê: foi a empresa ligada a ele quem entrou com o processo, ainda que a Mercedes tenha grande interesse em resolver essa questão e também esteja por trás disso.

 

Mas a Force India, mesmo sem dinheiro, prova a cada etapa que sabe fazer e desenvolver um carro. E por isso não é só Stroll que está interessado. Os russos que financiam Mazepin também estão de olho na equipe.

 

O processo de falência tem suas consequências práticas, contudo. Pelas regras da F1, uma equipe nessa situação não recebe a premiação pela posição no campeonato. A não ser que haja um acordo de todas para revogar isso. E por enquanto não há. Renault, McLaren e Williams não assinaram documento para liberar o prêmio à Force India. São algumas dezenas de milhões de dólares, dependendo da posição final do time, que não inviabilizam sua continuidade, mas é um dinheiro a menos nas mãos dos novos donos.

Escudos e falhas

Se as três corridas durante a Copa do Mundo tinham sido boas para Sebastian Vettel, Lewis Hamilton devolveu com juros e correção monetária nos dois últimos finais de semana. Claro que o rival deu uma bela ajuda com o erro da Alemanha, mas o inglês só pôde aproveitar aquela chance porque tinha feito sua lição de casa.

Em Budapeste, a chuva acabou anulando a vantagem de ritmo da Ferrari, mas novamente a execução da prova por parte de Vettel e da equipe deixou a desejar, algo que o próprio alemão tinha claro tão logo saiu do carro. “É normal perder tempo com os retardatários nessa pista, mas acho que perdemos um pouco mais do que devíamos. E o pit stop não foi fantástico.”

Além disso, Vettel acabou destruindo seus pneus antes do que seria o ideal para fazer a estratégia de largar com o macio funcionar. O tal plano C que seu engenheiro apontou ao longo da prova seria atacar na parte final da prova com o ultramacio, mas quando ele teve de fazer a troca com 30 voltas para o fim e, ainda por cima, para lutar com Bottas, acabaram quaisquer chances de incomodar Hamilton na ponta.

Um exemplo claro do que poderia ter sido a prova de Vettel é a corrida de Ricciardo, que também largou com os macios e fez, sozinho, mais ultrapassagens que todos os pilotos conseguiram ano passado. E, mesmo andando em um ritmo alucinante, fez sua parada cinco voltas depois Vettel.

São por essas falhas aqui e ali que Vettel acabou vendo Hamilton abrir 24 pontos de vantagem. E até porque ele confia que pode “polir” suas performances, sua confiança está intacta. E, convenhamos, não seria surpresa o alemão levar as duas próximas.

Do lado de Hamilton, está difícil encontrar erros marcantes do inglês nesta temporada. E ele realmente precisa disso no momento, porque a Mercedes perdeu sua vantagem na classificação, fundamental para fazer seu carro funcionar na corrida. Não é a toa que Lewis vem falando tanto de uma tal força divina…

Força essa que encarnou em Valtteri Bottas n’este domingo. Ele pode não ter gostado da reação de Toto Wolff depois da prova, mas efetivamente foi um escudeiro fortíssimo na Hungria. Posicionou-se perfeitamente na largada para proteger o pole, adotou um ritmo mais lento para deixar Hamilton tranquilo só administrando os pneus, e impedindo que Vettel o ameaçasse. Depois, foi usado para defender a parada adiantada da Ferrari, fez duas voltas voadoras quando Vettel ia parar, ajudando na equação que travou o alemão atrás dele.

Tendo de ir até o final com pneus que tinham que fazer 55 voltas, seguiu com seu excelente trabalho até que ele não tinha nem condições de frear mais dentro da curva sem escorregar, o que gerou os toques com Vettel e Ricciardo no final.

Ricciardo que foi o nome da corrida. Para justificar isso é só dizer que ele pulou de 16º na primeira volta para quarto, em prova com poucos abandonos. Mas era Budapeste, circuito em que, ano passado, só foram feitas seis ultrapassagens.

E pensar que, depois de fazer uma corridaça, ele só falava nas entrevistas em ir embora para casa. E até ofereceu a Gasly – de brincadeira, na zona de entrevistas – que o francês pilotasse seu carro nos testes desta semana na Hungria. O piloto da Toro Rosso topou na hora, é claro.

A sensação de Ricciardo é compartilhada por quase todo mundo no paddock. Cinco corridas em seis semanas não foi fácil, e acredito que isso tenha a ver com os sobes e desces que tivemos nesse período. Mas se tem alguém realmente contente com essa pausa de agosto, é o homem do carro vermelho.

Confira o placar entre companheiros e as diferenças na classificação do GP da Hungria

 

Hamilton 7 a 5 Bottas
Vettel 10 a 2 Raikkonen
Verstappen 8 a 4 Ricciardo
Perez 4 a 8 Ocon
Hulkenberg 7 a 5 Sainz
Stroll 5 a 7 Sirotkin
Gasly 8 a 3 Hartley
Alonso 12 a 0 Vandoorne
Leclerc 9 a 3 Ericsson
Grosjean 3 a 9 Magnussen

Diferenças de hoje:

Hamilton x Bottas: 0s260

Vettel x Raikkonen: 0s024

Verstappen x Ricciardo: 5s264

Ocon x Perez: 0s058

Sainz x Hulkenberg: 5s442

Stroll x Sirotkin: 0s741

Alonso x Vandoorne: 0s574

Gasly x Hartley: 0s537

Magnussen x Grosjean: 0s735

Ericsson x Leclerc: 0s176

As diferenças são calculadas nas sessões em que o companheiro com classificação pior é eliminado e os placares contabilizam o resultado do treino, e não a posição de largada, que pode ser alterada devido a punições.

Drops do GP da Alemanha e a silly season a todo vapor

“Estamos esperando Toto dar o primeiro passo e daí as coisas vão se movimentar. A Alemanha é um bom lugar para fazer isso não?”, dizia Christian Horner há algumas semanas, ao lado do chefe da Mercedes. Como todos esperavam que a equipe alemã apenas confirmasse as renovações de Hamilton e Bottas, era difícil imaginar que isso impactaria seriamente o mercado. Mas o fato é que ele entrou em ebulição em Hockenheim.

 

O quadro é basicamente esse: só cinco pilotos têm contrato para 2019 no momento e, ainda que a estabilidade marque os grandes, há grande movimentação no restante do grid.

 

O nome de Charles Leclerc cada vez mais ligado à Ferrari e o discurso de Kimi tem me lembrado muito o de Felipe Massa quando o brasileiro já sabia que era praticamente carta fora do baralho (“Eu deixei claro o que eu queria e está nas mãos deles, quero uma resposta não só para mim, como também para minha família”). Vettel parece querer mantê-lo, diz para a Scuderia não ter pressa com Charles, mas há muita gente dentro da equipe que discorda disso.

 

Um deles era o presidente, Sergio Marchionne. Já na manhã de sábado circulava a notícia de que sua saída prematura por questões de saúde seria anunciada em breve e procurei saber se isso afetava negativamente a ida de Leclerc à Ferrari. Ouvi que sim e que não. De qualquer forma, é uma alívio para o time, que tinha alguém com poder mas sem conhecimento de automobilismo exercendo enorme pressão.

 

Mas e se Kimi não renova com a Ferrari, é o fim de sua carreira? O chefe da Sauber, Fred Vasseur, surpreendeu o paddock quando colocou Kimi Raikkonen em sua lista para 2019. A situação parece ser a seguinte: se o finlandês aceitar ganhar o mesmo que agora, pode mesmo ir para o time, com dinheiro indiretamente da própria Ferrari via Alfa Romeo, o que faz sentido porque toda a ideia por trás da parceria é tornar a Sauber efetivamente o time da Alfa e um grande nome seria ótimo para tanto.

 

Outra história que circulou em Hockenheim é de que Ocon estaria voltando à família Renault. Ele me parece impaciente e sentindo-se pronto para uma equipe grande, já virou a casaca em uma oportunidade e iria para o time que mais cresce no momento, ainda que precise de anos ainda para lutar por vitórias. E seria essa mudança que chacoalharia todo o mercado.

 

No momento são tantos nomes ligados a tantas equipes que tem gente apontando para tudo quanto é lado para, eventualmente, acertar um ou outro. Para a Mercedes, se Ocon deixar o programa não é um grande problema, pois Russell parece pronto – bem mais que Norris.

 

Na Red Bull, a situação é mais complicada, porque Sainz fica livre no mercado dia 15 de setembro, já que não haverá lugar no time principal – e isso era a única mudança que eles podiam fazer dentro do contrato atual. Eles até tentaram oferecer outro contrato, para voltar à Toro Rosso, mas o espanhol não quis. Alonso estaria tentando mexer seus pauzinhos pelo compatriota, mas a família Sainz não tem certeza de que esse seria o caminho.

 

Depois de tentar convencer a Williams a se tornar uma espécie de Haas, Laurence Stroll agora tenta colocar seu filho na Force India, ainda que não exatamente comprando a equipe. Lá, como já explicado anteriormente, Perez tenta sair, provavelmente para o lugar de Grosjean na Haas.

 

Basicamente, os pilotos mais seguros do quarto time para trás são Magnussen e Gasly. Entre os demais, o futuro de um depende da decisão a respeito do outro. E quem parece sobrar são Hartley, Grosjean e possivelmente Vandoorne. A fase do belga está tão ruim que até a mala ele perdeu na chegada no aeroporto de Frankfurt.

 

Lendo essas linhas, parece que vamos ter uma completa revolução. Mas também não dá para menosprezar o valor da continuidade na F-1.

 

Na verdade, o mais interessante para mim é ver todos os contratos se encerrando em 2020. Mas esse é assunto para outro drops.

Montanha-russa de emoções

Lembro que há algumas semanas escrevi que esse campeonato me lembrava 2010, quando tivemos aquela sequência de corridas mornas na Espanha, Mônaco e Canadá e várias reviravoltas no campeonato. Depois de quatro etapas em cinco semanas, a situação mudou de figura – várias vezes, inclusive – como em outro campeonato, de 2008.

A luta é tão apertada entre Mercedes e Ferrari, Hamilton e Vettel, que ambos os lados estão muito propensos a erros, como vimos no caso do alemão neste domingo, e falhas, como ocorreu com o inglês no dia anterior. E as reações fortes de ambos os pilotos ao lado de seus carros parados na área de escape do circuito de Hockenheim em dias distintos só ilustra isso perfeitamente.

Era para ser uma vitória fácil para Vettel, mesmo que com seus dramas. O alemão se manteve na ponta após conquistar uma pole que deixou a Mercedes preocupada com a evolução do motor da Ferrari, e não parecia ter adversários, ainda que a caminhada até a volta 52 e os 8s de vantagem para Valtteri Bottas não tenha sido 100% tranquila.

A Ferrari dividira a estratégia de seus pilotos, colocando Kimi Raikkonen na tática de duas paradas para proteger Vettel de Lewis Hamilton, que já tinha chegado ao quinto lugar na volta 14 após forte recuperação. Com isso, quando Vettel fez sua parada, voltou atrás do finlandês, pois o ritmo dos dois, com pneus macios, era melhor. E parece que a Ferrari, pelo menos desta vez, esqueceu de ensaiar sua inversão de posições, cabível quando se tem um deles lutando pelo campeonato e ainda por cima com estratégia diversa.

A demora em fazer a inversão pode ter custado caro. É claro que a escapada de Vettel foi um erro banal dele, “uma maneira bem pouco espetacular de terminar uma corrida”, como ele mesmo definiu, mas é de se imaginar que o desgaste inicial do pneu no ar turbulento do companheiro não contribuiu negativamente.

Nesse momento, Hamilton vinha andando muito forte com o pneu ultramacio em quarto, e via na chuva sua grande oportunidade. “Meu coração acelerou quando viu os pingos, sabia que seria minha chance”, disse o inglês em entrevista emocionada no final da prova. Mal sabia ele que não teria de fazer mais nenhuma ultrapassagem para vencer: Vettel não só saiu de seu caminho como causou um Safety Car que deixaria Bottas e Raikkonen muito expostos, uma vez que ambos estavam com pneus macios já desgastados, que perderiam muita temperatura com o ritmo mais lento. Eles tinham que parar, Hamilton não – embora os estrategistas da Mercedes por pouco não tenham comido bola mais uma vez, chamando o inglês, mas logo depois desistindo. A manobra em si – cruzar a linha do pitlane – não é legal, mas os comissários determinaram que o período de SC e o fato de Hamilton ter voltado em segurança à pista foram atenuantes, e o consideraram culpado sem puni-lo com perda de tempo, ou seja, dando-lhe a reprimenda. Caso tivessem optado pela pena seguinte, de 5s, Hamilton teria perdido a prova por 0s5 para seu companheiro.

Dito isso, Bottas mais uma vez tem motivos para ficar no “e se”, depois de um pitstop lentíssimo que, pelo menos, não o fez perder a posição para Raikkonen.

Se dentro da pista os erros se somam a cada corrida, exatamente como naquele 2008, fora dela Hamilton e Vettel também travam uma batalha para demonstrar confiança. O alemão saiu da corrida caseira garantindo que não perderia o sono pela batida e dizendo-se contente com o ritmo demonstrado pela Ferrari – e ele tem lá seus motivos – enquanto Hamilton deu seu recado para quem chegou a questionar após a classificação que ele estava perdendo a cabeça: “Para quem acha isso… não estou cometendo erros. Tenho o foco total no meu sonho e, por mais difícil que ele seja, tenho que dar a volta por cima. Quando sentei do lado do meu carro no sábado, não estava chorando, mas sim pensando ‘amanhã é a oportunidade de fazer algo grandioso’.” E fez.

Confira o placar entre companheiros e as diferenças na classificação do GP da Alemanha

 

Hamilton 6 a 5 Bottas
Vettel 10 a 1 Raikkonen
Verstappen 7 a 4 Ricciardo
Perez 4 a 7 Ocon
Hulkenberg 7 a 4 Sainz
Stroll 4 a 7 Sirotkin
Gasly 7 a 3 Hartley
Alonso 11 a 0 Vandoorne
Leclerc 9 a 2 Ericsson
Grosjean 3 a 8 Magnussen

Diferenças de hoje:

Hamilton x Bottas: sem tempo

Vettel x Raikkonen: 0s335

Verstappen x Ricciardo: sem tempo

Perez x Ocon: 0s293

Hulkenberg x Sainz: 0s132

Sirotkin x Stroll: 0s498

Alonso x Vandoorne: 0s787

Gasly x Hartley: 0s296

Magnussen x Grosjean: 0s344

Leclerc x Ericsson: 0s741

As diferenças são calculadas nas sessões em que o companheiro com classificação pior é eliminado e os placares contabilizam o resultado do treino, e não a posição de largada, que pode ser alterada devido a punições.

Turistando na F-1: GP da Alemanha ao vivo

Compre ingresso para: general admission

As arquibancadas em Hockenheim são limitadas e estão basicamente no antigo estádio e na reta principal. Tendo isso em vista, e já que o general admission dá direito a ficar na parte de dentro do hairpin do estádio e é muito mais barato que os ingressos de arquibancada, essa é a melhor opção.

Hospede-se em: Heidelberg

Nem precisa de muita explicação: você estará em uma das mais belas cidades da Alemanha, que guarda ainda um quê medieval em seu centro – algo raro no país por conta das sucessivas guerras – e a 20min de carro da pista.

Vá de: transporte público

As vias ficam muito congestionadas e o estacionamento está a 20min andando da arquibancada. Ao invés desse perrengue, opte por pegar trem até Hockenheim e, de lá, haverá ônibus para o circuito.

Não perca: Museu da Mercedes

Ele fica a 1h30 da pista, não é tão perto assim. Mas é o museu da Mercedes, em Stuttgart. A cidade, aliás, também abriga o museu da Porsche. Achou muito longe? Um passeio que achei muito legal foi conhecer a cidade natal de Vettel, Heppenheim, que fica a 45min da pista. Só de sentar para tomar um chá na praça dá para entender muito sobre o tetracampeão.

Combine com: tour na Bavaria

Nuremberg, Munique e a região dos alpes, onde ficam castelos que são dois cartões-postais da Alemanha – Neuschwanstein e Hohenschwangau – não estão apenas razoavelmente perto de Hockenheim, como também no caminho para Budapeste.

Quanto fica? O melhor caminho para o GP da Alemanha é voando via Frankfurt, por 4500 reais (essa é a época cara de ir para a Europa por conta do verão). Os ingressos para GA são 600 reais e a hospedagem em Heidelberg sai em torno de 1400 para dois, então dá para calcular 8 mil de gastos.

Por dentro da F-1 e o que aconteceria se o reabastecimento voltasse

Volta e meia vemos o debate sobre o retorno do reabastecimento na Fórmula 1 aparecer. Ele foi permitido de 1994 a 2009, tendo sido tirado do regulamento por questões de segurança e gastos. Partidário da ideia, o presidente da FIA, Jean Todt, fala que os gastos seriam irrisórios, de cerca de 50 mil euros por ano. Os chefes de equipe, no entanto, falam em 1 milhão. Ainda assim, em uma categoria que luta para implementar o teto orçamentários de 150 milhões, não é muito. Mas é algo que só seria bem-vindo caso trouxesse claros benefícios para o esporte. E não é bem esse o caso.

A questão da segurança também pode ser contestada, uma vez que hoje tecnologicamente falando a F-1 poderia desenvolver sistemas mais seguros. No entanto, nada pode ser comparado com simplesmente banir o reabastecimento.

Primeiro, vamos voltar um pouco na história: Fangio venceu sua última corrida, o GP da Alemanha de 1957, fazendo um pitstop para reabastecimento. Acabou sendo uma prova emocionante, com o argentino só voltando à liderança na última volta depois de um início tranquilo. E justamente pela parada ter transformado uma vitória tranquila em uma aventura, ninguém mais tentou isso por décadas.

Isso, até Colin Chapman perceber que o reabastecimento poderia ser uma boa para os motores turbo no início dos anos 80, pois eles precisavam usar mais combustível que os aspirados. Porém, demorou para a tática dar certo por conta da péssima confiabilidade dos Brabham em 82. Foi só em 83, no GP do Brasil, que Nelson Piquet conseguiu vencer fazendo um pit stop para reabastecer. Na mesma corrida, contudo, a Williams tentou fazer o mesmo e seu carro pegou fogo. Então, na temporada seguinte, os reabastecimentos estavam proibidos por questões de segurança. Voltariam só em 94, com direito a trapaça da Benetton, cujo sistema permitia um fluxo maior que o regulamentar e resultou nas imagens impressionantes do fogo no carro de Jos Verstappen no GP da Alemanha daquele ano.

Mais velocidade, menos ultrapassagens

Mas e se o reabastecimento voltasse hoje? O lado positivo seria o ganho de velocidade: hoje os carros largam com 100kg de combustível no tanque e, quando carregam menos peso, têm de lidar com o desgaste de pneus. Com o reabastecimento, portanto, estaríamos vendo as corridas mais rápidas da história, ainda que haja dúvidas quanto a isso.

Carros mais rápidos colocam mais estresse nos pneus e também em todos os componentes, especialmente o motor. Na F-1 atual, os pneus são feitos para se degradarem e os motores, para durarem. Então fica a dúvida de quanto o reabastecimento efetivamente mudaria a cara das corridas, pois a necessidade de poupar equipamento continuaria alta.

A própria diferença de velocidade não seria assim tão grande, uma vez que a unidade de potência atual é perto de 40% mais eficiente que os antigos V8 ou V10. Com esses motores, o tanque chegava a ter 180kg. Um cálculo simples usando como parâmetro um circuito como de Barcelona, em que 10kg de combustível equivale a 0s3 por volta, leva a crer que um carro que larga com 50kg seria 1s5 mais rápido por volta do que o atual.

O grande problema trazido pelo reabastecimento, contudo, é seu efeito negativo nas ultrapassagens. Os números de 94 a 2009 são muito claros: foi a época em que as corridas tiveram menos manobras na história, sendo que a única variável que se manteve neste período foi justamente o reabastecimento. Houve mudanças nos carros, nos pneus, nos motores, e uma mistura de temporadas de domínio claro de uma equipe e anos mais competitivos em termos de performance. Mas nunca em termos de ação na pista.

Durante estes campeonatos, as grandes variáveis aconteciam quando alguma equipe arriscava largar bastante leve ou o contrário, mas, com o passar dos anos, houve uma padronização de estratégias que levou várias corridas a serem decididas nos boxes. Esse elemento continua existindo de maneira muito forte devido ao desgaste dos pneus, porém a diferença entre uma corrida decidida na estratégia de combustível e de pneus é que a segunda está muito mais nas mãos do piloto. Afinal, dependendo do desenrolar de uma corrida, ele pode economizar pneu e retardar sua parada, ou o contrário. Mas se o plano inicial era parar, digamos, na volta 14 por conta do combustível, a corrida fica muito mais na mão dos engenheiros. Não há dúvidas que as estratégias ficam mais abertas quando definidas pelos pneus e não pelo nível de combustível no tanque.

Há quem diga que o reabastecimento colocaria mais uma pimenta nas estratégias, mas provavelmente aconteceria o contrário: enquanto mudanças sutis na temperatura do asfalto, por exemplo, podem mudar a história de uma corrida, como vimos recentemente no atual campeonato, a quantidade de combustível no tanque é algo exato, então as estratégias ficariam, na verdade, mais engessadas.

Há, também, a questão do impacto que mais uma variável estratégica teria na captura de novos fãs, uma vez que tornaria o esporte ainda mais difícil de ser seguido pelo expectador não habitual. Que o diga a regra pela qual os pilotos classificavam com o nível de combustível com o qual largariam, o que serviu mais para confundir novos fãs do que efetivamente criar resultados inesperados. Sim, víamos uma Toyota ou uma Renault na primeira fila, mas aquilo não era real e rapidamente isso ficava claro.

Outro fator é do acerto e da própria filosofia dos carros. É muito mais complexo tentar fazer um carro bom em classificação e em corrida quando se tem uma diferença tão grande entre uma volta lançada e o início da prova. E isso é destacado pelo parque fechado, que limita muito as mudanças. Novamente, o reabastecimento diminuiria o efeito disso.

E tornar as corridas mais humanas e menos complicadas para novos fãs é tudo o que a F-1 vem buscando.

Um penta da F1 conquistado em julho

É interessante observar como vem crescendo o número de fãs que identificam o início dos anos 2000 como a melhor época da F-1. Talvez sempre será assim: cresci ouvindo que os grandes eram os gladiadores dos primórdios da categoria, depois vieram aqueles que falavam saudosamente dos anos 1980 e hoje, dos 2000. Há contra-argumentos em relação a todos eles para uma questão que não tem uma resposta definitiva mas, ao mesmo tempo que dá para entender por que a F-1 de cerca de 15 anos atrás desperta tanto interesse, houve momentos em que ela deixou bastante a desejar em termos de competitividade.

Os carros da primeira metade da primeira década dos anos 2000 foram os mais rápidos da categoria, pelo menos até a geração de 2017. Eles tinham visual agressivo e eram bem, bem mais barulhentos que os carros atuais – e os pilotos tinham mais respaldo da tecnologia para pilotar, com controle de tração e telemetria bilateral, ou seja, a possibilidade de configurações do carro serem alteradas pelos engenheiros com o carro na pista, o que explica por que o volante tinha menos botões. A proposta dos pneus também era outra, voltada à performance e alimentada pelo embate entre fabricantes.

É nesse caldeirão que surgiu um dos conjuntos mais dominantes da história da categoria. Com orçamento astronômico financiado em boa parte pelo dinheiro do tabaco (perda da qual a F-1 não se recuperou até hoje), testes ilimitados, pneus feitos sob medida e toda uma equipe trabalhando em uma de um piloto, Michael Schumacher conseguia o que muitos – principalmente aqueles que veneravam os gladiadores dos anos 50 – consideravam impossível: igualava os cinco títulos de Juan Manuel Fangio.

E, sim, estamos na metade da temporada de 2018 e, há 16 anos, Schumi estava já selando o penta. Foi na 11ª de 17 etapas, no GP da França, oitava vitória do alemão no campeonato. Ser campeão com seis corridas para o fim é, até hoje, um recorde, ainda que, dois anos depois, Schumi venceria mais vezes – 14 corridas contra 11 de 2002.

O penta foi conquistado justamente na França, palco do maior número de vitórias de Schumacher na carreira, oito. Mas não foi tão fácil quanto a narrativa do campeonato faria crer: a temporada de 2002 foi marcada por muitas poles de Juan Pablo Montoya, de uma Williams calçada com pneus Michelin que era muito melhor em classificação do que em corrida, e não foi diferente em Magny-Cours.

Em um circuito conhecido pela dificuldade de ultrapassagem e em uma época da F-1 que a média era perto de 15 manobras por corrida, a estratégia da Ferrari foi usar o pit stop para que Schumacher voltasse na frente. A tática, a princípio, funcionou, e Schumacher saiu logo à frente de Montoya após as paradas, porém um erro fez com que todos acreditassem que o título teria de esperar mais um pouco: o alemão tocou a linha branca na saída dos boxes e levou um drive through, voltando em terceiro lugar, atrás do colombiano e de Kimi Raikkonen, que perseguia sua primeira vitória na F-1.

Montoya, então, continuava em primeiro e segurando o pelotão, até uma segunda parada lenta o tirar da luta pela vitória, que ficaria entre Raikkonen e Schumacher. O finlandês aguentou bem a pressão do então tetracampeão na saída dos pits e parecia ter a vitória nas mãos até que escorregou no óleo deixado pelo Toyota de Allan McNish e permitiu a ultrapassagem da Ferrari.

Schumacher chegou a perguntar à equipe se teria de devolver a posição, mas a manobra foi limpa e o alemão cruzou a linha de chegada a 1s de Kimi, e mais de 30s de seu então companheiro de McLaren David Coulthard. Apenas os cinco primeiros estavam na volta do líder.

Há quem possa dizer que a era Schumacher foi muito positiva ou muito negativa para o esporte. Mas algo que particularmente sempre me atraiu na F-1 é o nível de profissionalismo. E, nestes vídeos da época, fica claro porque o conjunto Schumacher-Ferrari conquistou tanto. De Ross Brawn cobrando-se por estar falando com Michael quando o alemão estava retornando à pista, no lance que resultou o drive through, às palavras do próprio piloto reconhecendo a enorme pressão à qual ele mesmo se submeteu para ser campeão. Em pleno mês de julho.

http://www.youtube.com/watch?v=843PI0fJSWM

A mina de ouro do automobilismo virtual

Ele começou no kart, como tantos outros pilotos. E também como muitos deles acabou tendo de deixar as pistas por conta dos altos gastos com o esporte. Para continuar fazendo o que gostava, passou a participar de campeonatos virtuais, ao mesmo tempo em que trabalhava em um escritório e seguia uma vida “normal”. Até que venceu o “World’s Fastest Driver” e passou a integrar a equipe McLaren. Hoje, faz o trabalho no simulador que um tal de Fernando Alonso não gosta de fazer.

A história de Rudy van Buren aponta para um novo caminho na cara tarefa de encontrar e desenvolver talentos. E ainda abre as portas para uma democratização jamais vista no esporte.

Não é por acaso que as equipes de F1 estão dando muita atenção ao campeonato de esports, que no momento está na fase de draft, com os 40 melhores lutando para serem selecionados para as equipes que vão disputar o Pro Series Championship no segundo semestre, com direito a final durante o final de semana de corrida em Abu Dhabi, dentro do paddock. Na fase atual, eles passam por testes de reação iguais aos dos pilotos profissionais, ou seja, é clara a intenção de não apenas encontrar bons gamers, mas potenciais profissionais, que podem se envolver no esporte disputando corridas ou ajudando no desenvolvimento dos carros.

Existe o preconceito dos mais puristas a respeito da transferência do talento dos simuladores para a pista. Porém, ao invés de duvidar, as empresas do ramo estão investindo justamente para encontrar um método de testar esses pilotos virtuais e encontrar futuros campeões. Uma das empresas que aposta nisso é a Formula Medicine, na Itália, que já vem aplicando uma série de testes em pilotos de categorias de base, focando em um método empírico para identificar futuros campeões.

Outra empresa que vem investindo pesado nisso é a McLaren. Conversei recentemente com Ben Payne, diretor de esports do time, e ele fez uma comparação interessante. “Um bom jogador de Call of Duty não é necessariamente um atirador de elite. Nos simuladores de corrida a transferência entre as habilidades do game e da pista é muito maior, muito mais que em qualquer tipo de jogo.” E é justamente por isso que existe a tendência de cada vez mais se olhar para o virtual em busca de um piloto real.

Payne reconheceu que ainda há muitos desafios. “No final das contas, acabamos com 10 homens brancos na decisão do World’s Fastest Gamer, e agora estamos tentando modificar isso, tirando empecilhos como disputas acontecendo só em um determinado horário, para que pessoas possam concorrer em diferentes fusos horários. E para as mulheres estamos tentando restringir os comentários online, pois isso é um fator que as afasta das competições.”

Por outro lado, são inúmeras as vantagens. O investimento é menor do que financiar uma carreira “offline”, as fontes de receita são ampliadas com o aporte de empresas do ramo de tecnologia e jogos e o esporte tem uma chance de ouro de se democratizar. Afinal, quantas pessoas com talento não ficaram para trás por falta de investimento ou por viverem em lugares onde o automobilismo não é bem desenvolvido? Não dá para fechar os olhos para uma oportunidade como esta.

Estratégia do GP da Inglaterra e a Mercedes no contrapé

É fato que a Mercedes não gosta muito de calor, mas seria um erro colocar a vitória da Ferrari em Silverstone na conta das raras semanas de verão de verdade que vive o Reino Unido. Ao não poder controlar o ritmo por uma largada ruim do pole Lewis Hamilton, o time teve que arriscar na estratégia, mas mesmo assim não conseguiu impedir mais uma vitória de Sebastian Vettel.

Com a Red Bull um pouco mais longe do que o normal em uma pista em que hoje em dia, uma vez que várias curvas são feitas em pé embaixo, a potência do motor vale mais ainda, a luta ficou restrita a Mercedes e Ferrari. E que luta.

Avaliação antes da corrida era de que Mercedes estava desgastando menos os pneus, como foi o caso das outras vezes em que esse tipo de construção foi usado. Então a melhor chance da Ferrari seria passar os prateados na largada e controlar o ritmo na frente, sabendo que os rivais teriam que manter certa distância para preservar seus pneus, especialmente com o calor atípico em Silverstone e também pela natureza aerodinâmica gerada pelas sequências de curvas de média/alta, que fazem com que a turbulência do carro à frente seja sentida até com diferença maior do que os 3s de outros circuitos.

Foi dito e feito no primeiro stint. Bottas parecia lutar contra um escudo de força e ficou a 5s de Vettel, não conseguindo aproveitar o overcut. Pelo menos a parada foi rápida (a quinta melhor do dia, em 2s45, algo que não tem sido de praxe neste ano na Mercedes).

Mais atrás, era impressionante a facilidade de Lewis Hamilton em abrir caminho no pelotão mesmo em um circuito em que é geralmente difícil seguir um carro de perto. Depois da prova, Charlie Whiting foi perguntado sobre o efeito das três zonas de DRS e garantiu que elas não fizeram muita diferença – a não ser para causar acidentes, pois na zona adicionada neste ano cabia ao piloto desativar o dispositivo manualmente (uma vez que não se tratava de uma área de frenagem), e quem não tinha carro tão no chão, como Marcus Ericsson, acabou no muro.

O stint voador de 25 voltas de Hamilton (cinco voltas a mais que Vettel e quatro além do que Bottas conseguiu) talvez seja um indicativo de que seu companheiro poderia ter forçado mais na luta com Vettel, ou ficado mais tempo na pista, algo que mudaria a história de sua corrida. O fato é que, mais uma vez, para Bottas o GP da Inglaterra foi a narrativa do que poderia ter sido.

Quando Hamilton parou na volta 25, a prova já estava se desenhando de uma forma diferente do previsto. Caso algum dos Mercedes estivesse na ponta desde o começo, adotaria um ritmo bem lento no início para fazer apenas uma parada. Com Vettel forçando mais, começaram os estudos para entender quem teria que parar duas vezes.

Raikkonen, que fizera seu primeiro pit na volta 13 e vinha em uma briga com as Red Bull, estava comprometido a fazer duas paradas, o que acabou atraindo Ricciardo aos boxes por uma segunda vez na volta 30. Ao mesmo tempo, a equipe orientava Verstappen a cuidar dos pneus traseiros, na tentativa de ir até o final.

Até que Ericsson e seu DRS aberto geraram o primeiro Safety Car. Com a dúvida entre uma ou duas paradas, Ferrari e Red Bull resolveram chamar seus pilotos. Para a Mercedes, a decisão era mais difícil pois, ao contrário dos rivais, nem Bottas, nem Hamilton tinham pneus macios novos, então eles teriam que colocar médios, mais de 0s5 mais lentos. Chegara a hora de confiar no menor desgaste de seus pneus.

Ainda assim, ficar na pista era assumir um risco alto, pois a perda no final da prova seria bem superior a meio segundo por volta, especialmente para Bottas, mais exposto por ter pneus com quatro voltas a mais que Hamilton.

No final, isso de fato fez diferença. Bottas perdeu quase 9s em relação a Vettel nas últimas seis voltas, sinal claro de que seu pneu estava acabado. Já Hamilton perdeu 2s. Perguntei a ele se havia sentido que fora um erro não ter feito a troca no SC e o inglês disse que gostaria de sentar e rever os números, mas sentia que, se estava em quinto e terminou em segundo por não ter parado, foi o correto. Porém, é de se lembrar o quão importante foi o respiro dado pelo segundo SC. Sem ele, a queda dos pneus dos Mercedes no final teria sido mais acentuada.

Mas não é por acaso que Wolff saiu da Inglaterra falando que as largadas contam mais que a estratégia. De fato, sem conseguir manter-se à frente – e ainda mais quando se foca em um acerto mais de classificação justamente por acreditar que pode somar poles – a Mercedes corre o risco de ver os rivais ditarem um ritmo que muda a cara da prova. E, ao correr atrás do prejuízo, o time alemão percebe que, até em Silverstone e com a construção de pneu que em teoria lhe favoreceria, dá para perder neste ano.

Drops do GP da Inglaterra e o futebol em casa

O GP da Inglaterra teve um item diferente na bolsa…

A frase mais repetida das últimas semanas na Inglaterra se tornou quase um cumprimento em Silverstone. Não precisava falar bom dia, obrigado. Era só mandar um “it’s coming home” e vinha o sorriso de volta. A frase vem da música de 1996, feita na época que os ingleses sediaram a Eurocopa, que acabou voltando às paradas no país durante a Copa do Mundo. O sentido original era duplo: com a competição, o futebol voltava para casa, assim como havia a confiança de que um título internacional também voltaria.

 

É curioso estar no verdadeiro país do futebol na época de Copa, tão diferente do Brasil. Por um lado, tem a ver com um nível de confiança de que a seleção iria bem, absurdamente menor – e por motivos óbvios. E, ao invés da obrigação, a completa surpresa a cada vitória. Mas é fato que toda a “licença poética” que os brasileiros usam para escapar de quaisquer compromissos ou trabalho por um mês não existe, mesmo que a Inglaterra também seja apaixonada pela bola.

 

Estava contando a um colega dinamarquês como até os bancos e o mercado financeiro param nos jogos do Brasil. Ele se surpreendeu e disse: “com todo o respeito, mas é por coisas desse tipo que vocês são subdesenvolvidos”. Difícil discordar.

 

Mas na hora que as quartas de final coincidiram com as entrevistas logo após as entrevistas, sobrou para os franceses, que estavam bem na frente da única tela (que estava dividida ainda por cima) em que podíamos ver o jogo no cercadinho. Eles tiveram que esperar os pilotos sentados, caso contrário lá vinha reclamação.

Mas o maior telão era no centro do paddock, e tinha certamente mais de 100 pessoas vendo lá. Melhor para o pessoal da Mercedes, cujo terraço dava bem de frente para a tela. Aliás, é nessa hora que você vê que a F-1 é, na verdade, inglesa, com os “alemães” da Mercedes e os “franceses” da Renault, para ficar em dois exemplos, com os olhos grudados na tela.

 

Voltando à F-1, Brendon Hartley tem adotado uma tática bastante inteligente, usando a oportunidade que teve para estreitar suas relações com a Honda. O piloto neozelandês tem estado bem próximo dos japoneses, frequentando seu motorhome a todo momento, demonstrando interesse pelo desenvolvimento do motor. É como se soubesse que seu período na F-1 será limitado, mas sabendo que há uma carreira pela frente.

 

Falando em Honda, não há como não pensar na McLaren e na crise que o time vive. Quem acompanha a coluna já sabia que Gil de Ferran estava sendo preparado para a vaga de diretor esportivo. Conversei com ele na sexta e foi daquelas entrevistas difíceis, quando, apesar do respeito e da simpatia, o entrevistado não quer entregar muito.

 

Existe a especulação de que Gil não ficará muito tempo no cargo, que seria parte de uma transição que incluiria até mesmo Zak Brown. Isso porque os acionistas não estariam satisfeitos com as promessas do norte-americano que não passaram disso até agora.

 

Outro time inglês que está em um buraco difícil de sair, a Williams escancarou em Silverstone um problema que vem tirando o sono dos engenheiros desde o início da temporada. Algo na asa dianteira “estola” o assoalho nas curvas para a esquerda. Mas isso não acontece do outro lado, mesmo que tudo seja simétrico. O pessoal que desenha as peças culpa quem as faz e o contrário, enquanto os pilotos perdiam o controle do carro em plenas curvas de alta em Silverstone.

 

Um GP da Inglaterra não estaria completo sem a visita ao Rice Bowl, restaurante chinês que era o preferido de Senna em Towcester. Os brasileiros têm uma tradição de comer lá pelo menos uma vez durante o GP, mas o quórum atual é tão pequeno que temos nos juntado aos alemães que também batem cartão por lá. Desta vez, fui a primeira a chegar e perguntei pela mesa em nome de Michael Schmidt (aliás, para quem não conhece, um dos jornalistas mais competentes do paddock). A dona do restaurante me corrigiu. “Não, o nome dele não é Michael, é superman 2. Porque o superman 1 está lá em cima”, disse apontando para o céu.

Qui a casa loro

Quando a Mercedes trouxe a atualização de seu motor e dominou o GP da França, a impressão era de que as três corridas seguidas do período de Copa do Mundo seriam decisivas para a arrancada de Lewis Hamilton rumo ao pentacampeonato, uma vez que seria difícil a Ferrari reagir em tão pouco tempo.

Mas a briga de gigantes que tem tornado a temporada de 2018 tão fascinante e imprevisível garantiria reviravoltas. Na Áustria, apareceram as fraquezas do conjunto Mercedes que só afloraram sob pressão – do erro estratégico às quebras. Mas foi na Inglaterra que aconteceu o resultado mais significativo.

Voltemos 12 meses no tempo. Lewis Hamilton venceu tranquilo em Silverstone (mais do que isso, fez um Grand Chelem, com pole, volta mais rápida, e vitória liderando todas as voltas) e ainda impôs 37s de vantagem para a Ferrari mais próxima, de Kimi Raikkonen, em dia que Sebastian Vettel teve um furo no pneu com duas voltas para o final.

Com uma combinação de longas retas, poucas freadas fortes para ajudar na recuperação de energia e curvas de média e alta velocidades, Silverstone sempre foi o parque de diversões da Mercedes na era híbrida. Mas desta vez não foi assim.

A pole position foi suada, com Vettel só 44 milésimos atrás – em 2017, a diferença superou meio segundo – e o ritmo de corrida do alemão na ponta foi tranquilamente superior ao de Bottas antes do Safety Car (mais uma vez ele!) que chacoalhou a prova. É fato que, vindo de trás, Hamilton era mais veloz, mas, como de praxe nesta temporada, o líder sempre tende a segurar o ritmo para evitar o desgaste de pneus.

Não foi à toa que Vettel estava mais contente com o ritmo da Ferrari em Silverstone do que com a vitória em si. “We have been hammered here, literally”, disse ele, usando a expressão com o sobrenome do rival para dizer que a Ferrari fora arrasada na pista inglesa no passado recente. E celebrou a conquista “qui a casa loro”, na casa deles.

Isso é mais uma prova da evolução constante do carro da Ferrari, que ganhou novo assoalho e novo posicionamento dos espelhos em Silverstone, dentro das atualizações que chegam continuamente dos dois lados e que vão mudando a história do campeonato semana após semana.

Não é a toa, também, que Hamilton e Toto Wolff demonstraram terem acusado o golpe logo depois da corrida, insinuando que os incidentes da França entre Vettel e Bottas e deste domingo entre Lewis e Raikkonen não teriam sido coincidência. Falei com o piloto inglês poucos minutos depois e ele já tinha voltado atrás, mas a pressão para os dois lados é evidente.

Tanto, que o próprio Hamilton foi o primeiro a salientar que muitos pontos foram jogados fora nestas 10 primeiras etapas. Ele se referia ao próprio campeonato, mas também houve situações em que Vettel e a Ferrari que não aproveitaram oportunidades. E, com os italianos e a Mercedes travando um duelo técnico de tão alto nível, com uma sem deixar que a outra se sobressaia por muito tempo, a má notícia para os nervos dos postulantes ao título e a boa para nós é que será assim até o final.

Confira o placar entre companheiros e as diferenças na classificação do GP da Inglaterra

 

Hamilton 6 a 4 Bottas
Vettel 9 a 1 Raikkonen
Verstappen 7 a 3 Ricciardo
Perez 3 a 7 Ocon
Hulkenberg 6 a 4 Sainz
Stroll 4 a 6 Sirotkin
Gasly 6 a 3 Hartley
Alonso 10 a 0 Vandoorne
Leclerc 8 a 2 Ericsson
Grosjean 3 a 7 Magnussen

Diferenças de hoje:

Hamilton x Bottas: 0s325

Vettel x Raikkonen: 0s054

Verstappen x Ricciardo: 0s497

Ocon x Perez: 0s472

Hulkenberg x Sainz: 0s439

Sirotkin x Stroll: sem tempo

Alonso x Vandoorne: 0s909

Gasly x Hartley: sem tempo

Magnussen x Grosjean: 0s211

Leclerc x Ericsson: 0s601

As diferenças são calculadas nas sessões em que o companheiro com classificação pior é eliminado e os placares contabilizam o resultado do treino, e não a posição de largada, que pode ser alterada devido a punições.

“Energizado” por desafio na McLaren, Gil de Ferran rasga elogios a Alonso

Foi difícil arrancar alguma coisa de Gil de Ferran no primeiro dia em que o brasileiro deu entrevistas como chefe da McLaren. Tranquilo, porém escolhendo cuidadosamente cada palavra, o novo cartola do time inglês destacou que se sente preparado e, em suas palavras “energizado”. E não quer saber do rótulo de homem-forte de Zak Brown, que conhece há anos do automobilismo norte-americano, nem de Fernando Alonso, com o qual trabalhou na empreitada das 500 Milhas de Indianápolis ano passado. “Quero pensar que eu estou aqui por minha competência. E ponto”, disse ao blog em Silverstone.

Cuidadoso ao falar da situação da equipe, o novo chefe da McLaren esteve mais à vontade para falar sobre Alonso, a quem rasgou elogios, dando a entender que é importante para a equipe mantê-lo. “O meu respeito por ele como piloto cresce a cada dia e, como pessoa não tenho um ‘a’ para falar. Eu acredito que o Fernando Alonso é um dos melhores pilotos da história do automobilismo. E ponto, não precisa de mais nada. De fora, as pessoas não têm a mesma visão que eu estou tendo agora. Você vê o que o cara está fazendo e pensa ‘nossa senhora’. Em tudo, tudo. Tudo o que você pode pensar que faz um piloto bom ele é ou 9,5 ou 10 em tudo. O cara é realmente espetacular.”

Perguntei também sobre as declarações do piloto, querendo de afastar da imagem de alguém que teria uma grande influência nas decisões da equipe. Na quinta-feira, o espanhol falou insistentemente em sua entrevista coletiva que só pilota o carro e que seu poder dentro da McLaren se resumia a coisas relacionadas a isso. Para Gil, o discurso e a maneira como Alonso trabalha dentro da equipe estão alinhados.

“Ele é bem assim mesmo. Ele é importante no sentido de saber o que está falando. Quando ele fala, é melhor você prestar atenção porque ele sabe do que fala. É um piloto fantástico e tem muita experiência.”

Sobre a situação da equipe, Gil se mostrou alinhado ao discurso de Brown, falando em “olhar para dentro e entender o que está errado”, sem entrar em detalhes se vai comandar uma reestruturação total. “É claro que o carro está abaixo das expectativas. Estamos super determinados a olhar para dentro e fazer o que for necessário dentro da organização para tocar o negócio para frente.”

E, para tanto, o brasileiro se vê preparado. “Sinto-me muito mais preparado do que há 10 anos [disse, referindo-se a sua passagem pela BAR-Honda]. Hoje tenho 50 anos e sinto que todas as experiências que passei na vida me preparou de alguma forma para este momento, desde as conversas com meu pai, até os anos que passei tocando minha equipe. Desde que parei de correr, fui gestor, investidor, tudo isso fez parte da minha formação.”

E tudo isso será mesmo importante para um desafio grande que Gil de Ferran tem pela frente: a McLaren não faz um carro forte desde 2013, e não ganha um campeonato desde 2008. Hoje em dia, basicamente não há nenhum quesito em que o time se destaque – economicamente, tecnicamente ou mesmo na operação de pista (as estratégias não chamam a atenção, nem mesmo os pit stops, uma vez que o time é em média o terceiro mais lento no quesito no ano). E não é por acaso que o brasileiro começa sua jornada no comando sob os olhares atentos dos acionistas, presentes em Silverstone, onde o time se prepara para mais um fim de semana como têm sido os últimos anos: uma corrida para limitar os danos.

Por dentro da F-1 e a revolução dos pit stops da Sauber

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Todo mundo sabe que um segundo é muita coisa na Fórmula 1. E o quanto é difícil ganhar um segundo de uma hora para a outra. Mas foi o que a Sauber conseguiu nesta temporada: ganhar mais de 1s nos pit stops e ir de lanterna a uma das equipes mais rápidas do grid no quesito.

Os números são impressionantes. Ano passado, o time teve apenas em uma oportunidade – no GP da Áustria – um dos 10 pit stops mais rápidos de uma corrida. E ele não foi particularmente veloz: 3s05. Isso fez com que o time ficasse em último, com apenas um ponto, no campeonato de pit stops, algo que passa batido para a maioria dos fãs, mas que é levado muito a sério pelos mecânicos. O título do ano ficou com a Mercedes, com 472 pontos, seguido por Williams e Red Bull. A pontuação funciona da mesma forma que do campeonato de pilotos.

Um ano depois, a Sauber é a segunda no campeonato de pit stops. Por três vezes, o time foi o mais rápido e, na última corrida, fez o segundo pit stop mais veloz.

Mas como a equipe de Leclerc e Ericsson conseguiu uma mudança tão significativa em tão pouco tempo? O mecânico brasileiro Tiago Fadel, que está na Sauber desde 2014, contou ao blog.

“A gente vem de uma década de BMW em que nada funcionava. O material era antiquíssimo. Tudo arrebentava e nós tínhamos que reformar porque não havia dinheiro para comprar peças novas. Por isso estávamos sempre em último, com 1s atrás de todo mundo.

“Neste ano, tivemos a ajuda da Ferrari. Eles cederam para nós todos os mecanismos, ou seja, as porcas e as parafusadeiras. Compramos o material novo, igual o que todo mundo usa e, com isso chegamos mais perto. Com isso conseguimos tirar um segundo.”

Mas mesmo isso não seria possível para liderar a tabela de pits stops mais rápidos. Faltava investir na preparação e estudar os pontos fracos da equipe da qual Tiago faz parte como responsável por trocas de asa e acertos de flaps.

“Fomos em fevereiro para a Itália para nos prepararmos com a Fórmula Medicine. Foi uma preparação forte, mental, que nos deu a chance de chegar onde estamos chegando. A gente treina muito e descobrimos quem é melhor em cada função. Mexemos praticamente no time todo e então conseguimos chegar nos melhores. Agora sabemos que vamos colocar pelo menos um carro com certeza no top 3 em todas as corridas até o final do ano, mas nosso objetivo é colocar sempre os dois carros lá na frente, para que a gente possa ganhar o campeonato deste ano.”

De fato, a Sauber segue em evolução. No começo do ano, com os novos equipamentos, o time fazia suas melhores paradas em cerca de 2s80. Agora, está fazendo trocas consistentemente em 2s30.

Colocar os dois carros consistentemente no top 10 será fundamental para o time chegar no almejado título, uma vez que a diferença para a líder, a Red Bull, é grande. O time de Ricciardo e Verstappen tem 242 pontos. E, curiosamente, com o segundo lugar da Áustria, a Sauber acaba de passar sua “benfeitora”, a Ferrari.

Drops do GP da Áustria com saudades de casa

Isso faz muito tempo

A demora na divulgação do calendário para o ano que vem já está chamando a atenção no paddock e as teorias para a demora são, no mínimo, curiosas. Tem as partes que fazem sentido, como a pressão dos americanos para que o GP do Japão seja em abril, para juntar as provas asiáticas. Mas é improvável que isso aconteça, já eles já avisaram que a chance de ter a prova cancelada, de tanta chuva nessa época, é real.

 

A corrida da Rússia, contudo, não voltaria para a primeira parte da temporada. Já que Putin está pressionando que a prova seja parte das comemorações de seu aniversário, dia 7 de outubro. É sério.

 

Com os alemães de Hockenheim deixando claro que suas negociações são para 2020, e não para a próxima temporada, aumentou a pressão para que a prova de Miami saia do papel, já que a Liberty quer manter 21 corridas no calendário. Mas parece que, a cada semana, aparece um empecilho administrativo/legal e pode não haver tempo suficiente para fazer a corrida já em 2019. Nesse cenário, Nurburgring passa a correr por fora.

 

Acho que muitos de nós já nos pegamos inventando um calendário perfeito para a F-1, mas há quem diga que 75% das provas têm as datas fixadas por contrato.

 

O que também está tomando forma é o mercado de pilotos. A ida de Leclerc para a Ferrari parece selada, mas não a aposentadoria de Raikkonen. As conversas com a McLaren fazem sentido porque o time precisa de um campeão do mundo – está lá em seu media kit que eles têm pelo menos um campeão desde 2007 – e Kimi estaria feliz em ter mais um ano de salário alto. Ele está na mesma situação de Massa ano passado: quer ser aquele que vai decidir sobre seu futuro e está motivado para continuar correndo (ainda que já não tenha a velocidade de antes). Mas ao mesmo tempo teme acabar a carreira se arrastando no fundo do grid.

 

Falando em voltar a uma velha casa, Alonso nem está mais se esforçando para manter as aparências na McLaren, apesar de não parecer convencido a se aposentar da F-1. Ir para a Indy ou focar apenas no Endurance e nas 500 Milhas são possibilidades, mas ele não desistiu completamente do paddock. E seu empresário já sondou a Renault sobre uma possível troca com a McLaren envolvendo Sainz. O que não parece ter sido muito bem recebido pelo time de Enstone.

 

Em qualquer cenário, o fato é que Vandoorne sobra na McLaren, que precisa arrumar uma vaga para Norris antes que outro time o faça. Seu empresário tem relações na Sauber e tenta algo por lá, mas tudo depende do investimento dos suecos para manter Ericsson, uma vez que a outra vaga iria para Giovinazzi, substituto natural de Leclerc.

 

Com o programa da Red Bull vivendo época de seca e McLaren e Ferrari fazendo seus pilotos “rodarem”, abrindo vagas, será interessante ver o que a Mercedes fará com Russell. Para mim, o melhor piloto da F-2 no momento.

 

Voltando a Leclerc, conversei com o brasileiro Tiago Fadel, que trabalha com ele na Sauber, e sua opinião é clara: “Ele vai bater Vettel na Ferrari”. Veremos.

Expondo as bolhas

Quando o diretor de competições da Pirelli, Mario Isola, sentou para falar com os jornalistas em Spielberg sobre as primeiras impressões após os treinos livres do GP da Áustria, seu desânimo por não ter muito o que dizer era claro: como de costume quando são escolhidos os compostos ultra, super e macio, o delta entre eles era pequeno e não havia degradação excessiva. Ou seja, pelo menos do ponto de vista dos pneus, não havia motivos para acreditar em uma corrida com muitas alternativas.

Mas Isola deixou um ponto no ar. O asfalto em Spielberg é daqueles novos, que parecem um tapete. Na verdade, pareciam. À medida que a superfície vai “amadurecendo”, especialmente o traçado ideal e os pontos de freada vão craquelando, algo que já tinha sido observado em Paul Ricard. E era algo que poderia mudar o curso da história.

Pouco menos de 48h depois, todo aquele marasmo a respeito da nona etapa do campeonato tinha ficado para trás. Vimos ultrapassagens na parte de cima, do meio e do fim do pelotão, carros com diferentes estratégias devido a comportamentos distintos dos pneus.

Mas tudo isso só aconteceu por conta de uma quebra. Uma queda de pressão hidráulica que fez o câmbio do carro do líder Bottas travar, trazendo o Safety Car Virtual à pista na volta 18.

Era a janela para quem estava com os ultramacios, como a Ferrari. Mas também não estava muito longe da janela dos supermacios, da Red Bull e de Hamilton. Sem calcular bem a perda da parada sob VSC, a Mercedes deixou o inglês na pista e jogou contra a estratégia vencedora da temporada, de vencer da maneira mais lenta possível.

Isso porque Hamilton teria de forçar o ritmo, o que acabaria com os pneus mais cedo e não garantiria os 8s necessários para parar e voltar tranquilo na ponta. Isso, logo neste ano, em que a receita de sucesso é proteger ao máximo os pneus para parar o menor número de vezes possível.

Quando ficou claro que Hamilton já não tinha pneus para tentar abrir – na verdade, o prejuízo acabou ficando maior do que os 8s iniciais, a solução foi chamá-lo ao box e calçar os macios para tentar ir até o fim. Isso seria fácil se o inglês estivesse controlando o ritmo na ponta, mas não tentando recuperar terreno no meio do trânsito. Assim como Ricciardo, que também estava atacando Raikkonen, Hamilton acabou com seus pneus na briga com Vettel. E ambos já eram cartas fora do baralho antes de seus abandonos – Hamilton por queda de pressão de combustível e Ricciardo por um problema no escapamento.

Não que Verstappen, mesmo controlando o ritmo na ponta, não tivesse problemas com bolhas, mas o fato de estar em primeiro permitiu que ele entendesse qual a melhor forma de corrigir isso, não forçando tanto nas curvas para a direita – que colocam pressão no traseiro esquerdo – e ganhando tempo nas demais partes do circuito. Diminuindo a temperatura no pneu que estava sendo o mais afetado pelas bolhas, ele conseguiu manter um bom ritmo até o fim.

Esse não foi, contudo, o caso das Ferrari. Kimi teve sua briga com Ricciardo e Vettel, com Hamilton, e mesmo assim seus pneus macios aguentaram bem até o final.

Trata-se de uma vantagem que a Ferrari tem desde o início do ano, mas que fica escondida quando se sacrifica o ritmo de corrida para evitar um segundo pit stop. Isso só deixa claro como a Ferrari teria o campeonato na mão se conseguisse largar na frente das Mercedes. Ainda mais agora que o carro prateado gera ainda mais pressão aerodinâmica com as atualizações, e depende ainda mais de um ritmo cadenciado que esteve longe de ser a realidade do GP da Áustria.

Confira o placar entre companheiros e as diferenças na classificação do GP da Áustria

 

Hamilton 5 a 4 Bottas
Vettel 8 a 1 Raikkonen
Verstappen 6 a 3 Ricciardo
Perez 3 a 6 Ocon
Hulkenberg 5 a 4 Sainz
Stroll 4 a 5 Sirotkin
Gasly 5 a 3 Hartley
Alonso 9 a 0 Vandoorne
Leclerc 7 a 2 Ericsson
Grosjean 3 a 6 Magnussen

Diferenças de hoje:

Hamilton x Bottas: 0s019

Vettel x Raikkonen: 0s196

Verstappen x Ricciardo: 0s156

Ocon x Perez: 0s131

Sainz x Hulkenberg: 0s294

Stroll x Sirotkin: 0s058

Alonso x Vandoorne: 0s306

Gasly x Hartley: 0s355

Grosjean x Magnussen: 0s841

Leclerc x Ericsson: 0s511

As diferenças são calculadas nas sessões em que o companheiro com classificação pior é eliminado e os placares contabilizam o resultado do treino, e não a posição de largada, que pode ser alterada devido a punições.

Direto da sala de reunião dos pilotos

Tivemos uma conversa muito interessante com Charlie Whiting aqui na Áustria sobre como os comissários decidem sobre as punições. O motivo do chamado foi a irritação da FIA com as críticas de Grosjean pela punição no GP da França, e os replays mostrados deixaram claro que o francês jogou o carro em cima do compatriota Ocon antes da primeira curva.
Mas Whiting abordou também a polêmica punição de Vettel. Disse que outros incidentes semelhantes resultam em 10s de punição, mas que toques na primeira curva sempre são analisados de maneira diferente, então isso explica os 5s. “Por motivos que acredito que estejam claros para todo mundo”, disse Whiting, referindo-se a freios e pneus mais frios e à proximidade entre os carros.
Mas o questionei sobre a possibilidade dos comissários passarem a analisar também as consequências dos toques na hora de decidir as punições e Whiting disse há a discussão se isso deve fazer parte do julgamento de uma penalidade efetivamente.
“Os comissários não olham as consequências, ainda que, no final das contas, seja algo que inconscientemente interfere. É algo que estamos discutindo porque isso poderia abrir a porta para algo que não esperamos, mas há quem possa dizer que seria senso comum. É algo que estamos discutindo no momento.”
A entrevista foi reservada a poucos jornalistas, não mais de 10, e foi feita na mesma sala onde, logo mais, os pilotos vão se reunir para sua reunião tradicional pós-treinos livres. É neste momento que os pilotos, se estiverem infelizes com alguma punição, podem reclamar diretamente com Whiting. E ele estará lá, com o mesmo sistema utilizado pelos comissários.
Foi a primeira vez que vi esse sistema. Todos os incidentes podem ser listados por corrida, por piloto, por tipo de infração e por qual foi a decisão tomada. Então fica fácil para os comissários estudarem punições anterioes para o mesmo tipo de incidente. Em cada arquivo, estão os ângulos vistos pelos comissários (no caso de Grosjean, nos foi mostrada a filmagem panorâmica da largada, que não foi usada durante a prova) e o documento da FIA com a decisão, com a explicação detalhada do porquê cada punição foi – ou não – dada.
Vendo tudo aquilo, fiquei pensando em tudo o que foi mudando na F-1 desde que cheguei por aqui, em 2011, em relação ao julgamento de punições. Whiting foi tentando prever todas as infrações no regulamento, e depois desistiu, vendo como é difícil colocar uma regra só quando há vários “campos de jogo”. Hoje, os limites são mais conversados internamente com os pilotos do que descritos nas regras. E não surpreenderia se o jugalmento das consequências também entrassem nesse bolo.

Drops do GP da França e o chocolate da McLaren

Era um desastre anunciado: é justo dizer que em algum momento todos que estiveram no GP da França ficaram presos em um engarrafamento nos arredores ou até mesmo dentro da pista. Ao longo do final de semana, a polícia local foi modificando o esquema de trânsito para dar mais fluidez, mas mesmo assim as filas eram enormes. Há apenas dois acessos principais para o circuito, de mão dupla, e foram vendidos 65 mil ingressos para o domingo – e inclusive na sexta-feira havia muito mais gente na pista do que o normal.

 

A resposta de Chase Carey ao problema foi péssima: “Pelo menos quer dizer que estamos populares”. Bom, não vão ficar por muito tempo quando se paga caro pelo ingresso para chegar até a perder atividade de pista. Isso, e também as críticas ao layout do circuito geraram a discussão se não seria melhor ir para outro lugar, até mesmo voltar para Magny Cours. A questão é que há dinheiro e interesse na França para um GP, mas nenhum autódromo que comporte a F1 atual.

 

Além de um esquema diferente para o trânsito, discutiu-se também a possibilidade de alterar a pista, que tem dezenas de configurações distintas. Quando a questão foi levantada na reunião de pilotos e o problema dos custos foi levantado, Vettel se opôs: “Eles não têm problema de dinheiro aqui se cobram 80 euros por um sanduíche no hotel da pista!”

 

Falando em Vettel, vi o momento em que ele, logo que saiu do carro, foi se explicar com Bottas. O finlandês manteve-se de capacete, só deu de ombros e basicamente deixou o alemão falando sozinho. O curioso foi que Verstappen, Hamilton e até Alonso aproveitaram a situação para alfinetar Vettel – Max foi irônico e advogou em causa própria, pedindo que a mídia passasse a pressionar Seb da mesma forma que fez com ele, Hamilton disse que ele se safou e que deveria ter recebido punição mais forte e Alonso falou aos italianos que o piloto que tomou sua vaga na Ferrari arriscou demais na primeira volta para alguém que está lutando o campeonato.

 

A coletiva dos chefes de equipe teve uma extensa discussão sobre premiar seus funcionários com um chocolate com cara de sapo. Tudo começou com uma matéria do jornalista Jonathan McEvoy, do tabloide inglês Daily Mail, sobre o clima ruim que Eric Boullier tem na McLaren, e como ele teria tentado “comprar” seus funcionários com o tal chocolate, chamado Freddo.

 

O jornalista acabou sendo banido do motorhome da McLaren por conta da matéria, mas Boullier não conseguiu escapar dos questionamentos porque estava escalado para a coletiva. O francês até tentou colocar Zak Brown no seu lugar, mas foi avisado que isso não passaria a melhor das mensagens para a imprensa.

 

O fato é que Boullier está sob intensa pressão, como já coloquei por aqui, e aumenta a especulação de que ele não chega a Spa no comando da McLaren.

 

O mercado de pilotos também está começando a se agitar – ou pelo menos o mercado de boatos. Nesta fase, é muito comum alguns jornalistas serem usados para passar as mensagens que os times querem. Tanto que veio do Bild via Marko a tal proposta da McLaren para Ricciardo, por exemplo. E na imprensa italiana também ganha força que Raikkonen está fora e Leclerc, dentro da Scuderia em 2019. Mas será que não é exatamente o que a Ferrari quer para tirar mais de seu piloto? Sempre é bom ver de onde vem e questionar as informações.

 

O que posso dizer é que Ricciardo e Horner deram a entender que a renovação está próxima. Ele falou em assinar na semana que vem ou na próxima, porque quer resolver logo. E seu chefe falou que seria muito surpreendente se ele desistisse de uma equipe com a qual está ganhando.

 

Mas a renovação seria por quanto tempo? Ricciardo é o primeiro a reconhecer que todos estão tentando dar uma de Hamilton e acertar quem vai levar vantagem em 2021. “Se bem que o Lewis diz que não, mas eu acho mesmo é que ele deu sorte”.

Na hora certa

Havia uma sensação de alívio quando Lewis Hamilton recebeu a bandeirada do GP da França. Afinal, tínhamos visto uma corrida bem mais movimentada do que era esperado, e isso não dependeu somente das provas de recuperação de Sebastian Vettel e Valtteri Bottas. Os pilotos vinham para as entrevistas empolgados porque quase todos tiveram alguma briga real em determinado momento da prova.

Menos ele, Hamilton. Como tem sido a regra neste ano, especialmente de maio para cá, a cada circuito que a F-1 visita um protagonista se destaca. Na Espanha, foi o próprio. Em Mônaco, Daniel Ricciardo. No Canadá, Sebastian Vettel e agora, novamente o inglês. E com alguns ingredientes semelhantes àquele final de semana em Barcelona, como os pneus e curvas rápidas de raio longo.

Mas ninguém na Mercedes escondia a satisfação com a atualização do motor, que acabou sendo até melhor do que inicialmente era planejado. A versão 2.0 que faria sua estreia no Canadá acabou virando a 2.1 na França, e os pilotos relataram uma melhora clara de dirigibilidade. A questão da confiabilidade, contudo, tem de ser levantada após a queda de pressão de água que fez Sergio Perez abandonar.

Do lado de Vettel, ficou a sensação de que o alemão não esteve em seus melhores dias na França. Na classificação, ele calcula que a diferença real para Hamilton tenha sido de 0s2, e não os quase 0s4 reais, uma vez que não acredita que tenha dado uma volta perfeita em nenhum momento no final de semana. E, na corrida, disse que ficou encaixotado e perdeu aderência na primeira curva, admitindo o erro que mudou a história da corrida – e que acabou saindo barato com a punição de apenas 5s, uma vez que basicamente acabou com as chances de Bottas, que visivelmente tinha dificuldade de pilotar um carro que precisou apenas de “velocidade de cruzeiro” para vencer com seu companheiro.

Fazia tempo que a F-1 não tinha uma primeira volta tão cheia de ação, e isso tem explicação. Os ultramacios e supermacios eram muito parecidos em rendimento e degradação, e por isso as equipes fizeram escolhas variadas. A única diferença entre os compostos, contudo, seria na largada, o que contribuiu para que os primeiros metros dos carros não fossem lineares. E o segundo fator é a própria pista, com a primeira volta relativamente perto da largada e com uma área de escape enorme. No final das contas, correu-se muitos riscos, carros com rendimentos diferentes acabaram se misturando e, enfim, tivemos uma corrida.

A boa notícia é que, na Áustria, o cenário tem tudo para ser parecido. Teremos os mesmos compostos, ainda que não exatamente os mesmos pneus, pois voltam os mais grossos, mas o importante é que, por toda a temporada e independentemente das condições, o ultra e o supermacio têm tido rendimento semelhante. E a primeira curva da Áustria também tem uma larga área de escape, ainda que haja mais reta desde a pole.

Em um campeonato no qual detalhes como estes podem mudar o rumo das corridas, não dá para dizer que a (segunda) virada de Hamilton é definitiva, mas o fato é que, com quatro corridas nas próximas cinco semanas, está claro que ela acontece na hora certa.

Confira o placar entre companheiros e as diferenças na classificação do GP da França

 

Hamilton 5 a 3 Bottas
Vettel 7 a 1 Raikkonen
Verstappen 5 a 3 Ricciardo
Perez 3 a 5 Ocon
Hulkenberg 5 a 3 Sainz
Stroll 3 a 5 Sirotkin
Gasly 5 a 3 Hartley
Alonso 8 a 0 Vandoorne
Leclerc 6 a 2 Ericsson
Grosjean 2 a 6 Magnussen

Diferenças de hoje:

Hamilton x Bottas: 0s118

Vettel x Raikkonen: 0s657

Verstappen x Ricciardo: 0s281

Ocon x Perez: 0s379

Sainz x Hulkenberg: 0s099

Sirotkin x Stroll: 0s090

Alonso x Vandoorne: 0s186

Gasly x Hartley: 0s422

Magnussen x Grosjean: 0s038

Leclerc x Ericsson: 0s765

As diferenças são calculadas nas sessões em que o companheiro com classificação pior é eliminado e os placares contabilizam o resultado do treino, e não a posição de largada, que pode ser alterada devido a punições.

Quando Jim Clark deixava a F1 de antigamente sem graça

Terceira corrida de um campeonato que já ia se desenhando como fácil para Jim Clark. Na estreia, em Mônaco, fez a pole batendo até mesmo o Mr. Mônaco Graham Hill, mas abandonou com problemas de câmbio (em uma corrida que tinha 100 voltas na época e demorava mais de 2h30!).

Na segunda etapa, na Bélgica, vencera com facilidade, e mostrara novamente sua superioridade na classificação na Holanda: Clark fez a pole position com oito décimos de vantagem.

Não que isso surpreendesse os rivais: foi justamente em Zandvoort no ano anterior que Colin Chapman apareceu com o Lotus 25, um dos melhores carros da história da F1, com o qual sua equipe dominaria os anos 1960.

Na largada, Clark manteve a ponta, com Graham Hill – que tentara usar a BRM nova, mas tivera de voltar ao carro antigo – em segundo e Bruce McLaren em terceiro apenas até a terceira volta, quando seu câmbio quebrou.

Mais atrás, quem chamava a atenção era Dan Gurney, que largou em 14º e não demorou para alcançar o pelotão da frente, mesmo tendo perdido todos os treinos por um problema no carro, chegando a emprestar o bólido do companheiro – e chefe de equipe – Brabham para se classificar.

A corrida chegou a ter bastante ação do segundo para trás: Hill foi ultrapassado por Jack Brabham e depois recuperou a posição depois do acelerador do carro do australiano ter ficado travado e ele ir parar na areia, e John Surtees teve uma briga particular com Gurney até a volta 63, quando o britânico cometeu um erro.

Hill parecia estar tranquilo em segundo quando teve um problema de superaquecimento, fez reparos nos boxes, e ainda teve tempo de se recuperar, chegando a voltar ao segundo posto antes de seu motor quebrar. Assim, Clark recebeu a bandeirada em primeiro, seguido por Gurney e Surtees.

Dos 19 carros que largaram, nove completaram, sendo que só um por acidente. Mas que seja dado um desconto para as máquinas da época: a prova foi mais longa do que hoje em dia, com 335km no total. Mesmo sendo muito mais veloz que os rivais, Clark completou as 80 voltas em 2h08min.

Era o segundo grand chelem da carreira do escocês, algo que se tornaria comum entre 63 e 65. E, de quebra, a Lotus colocou uma volta até mesmo no segundo colocado, em um ano no qual Clark seria campeão pela primeira vez com sete vitórias, contra apenas duas de Hill e uma de Surtees, com a Ferrari, estabelecendo um recorde que duraria mais de 20 anos.

Apenas em 1984 Alain Prost igualou as sete vitórias em uma temporada e, em 1988, Ayrton Senna chegaria a oito e finalmente bateria Clark, ainda que a média do escocês fosse superior, ao vencer 70% das provas disputadas na temporada, contra 50% de Senna no que também foi seu primeiro título mundial.

Estratégia do GP do Canadá e como a Ferrari ganhou na ‘casa’ da Mercedes

Na sexta-feira depois dos treinos livres, o cenário era de um GP do Canadá completamente aberto, com vantagem para a estratégia de duas paradas, dando preferência aos hipermacios – justamente os pneus dos quais o time que tinha tido o melhor ritmo nas simulações de corrida, a Mercedes, queria fugir a todo custo. Como terminou sendo uma prova monótona, e com a Ferrari na frente?

Primeiro, algumas considerações sobre os pneus. Na sexta-feira, o supermacio era 0s5 mais lento que o ultramacio que, por sua vez, era 1s1 mais lento que o hiper. Mas o mais significativo era que o comportamento dos compostos rosa e roxos era bem distinto, dificultando o acerto: com o hiper, os traseiros logo tinham graining por conta dos vários trechos de tração do circuito Gilles Villeneuve; com o ultra, a traseira entrava na temperatura ideal e dava muita aderência, “jogando o carro para frente” e desgastando mais os dianteiros. Ou seja, seria difícil acertar o carro e a pilotagem para ambos ao mesmo tempo.

O ideal, portanto, seria esquecer a história das duas paradas e tentar fazer o Q2 com o ultramacio, fugindo do hiper na corrida. As únicas equipes que tinham ritmo para tanto, claro, eram Mercedes, Ferrari e Red Bull. As duas primeiras seguiram a cartilha. A terceira, sabendo que dificilmente conseguiria um lugar nas duas primeiras filas, muito em função do (ainda) deficitário modo de classificação do motor Renault, e teria que atacar no começo da prova, e apostando no seu bom trato com os hiper, optou pelo pneu rosa.

Enquanto isso, na briga entre Mercedes e Ferrari, o time italiano foi se encontrando ao longo do final de semana, algo muito comum nas últimas duas temporadas e que tem a ver com a boa compreensão da evolução da pista, algo fundamental em Montreal, circuito que não é usado no decorrer do ano.

Isso tornou a briga pela pole muito difícil para a Mercedes, que já tinha dois fatores jogando contra: a falta de atualização e o excesso de quilometragem de seus motores e o superaquecimento dos pneus hipermacios. Junte a isso o pássaro que entrou no duto de freio do carro de Hamilton – aquela fritada do hairpin já foi suficiente para lhe custar a pole – e temos Vettel em uma merecida pole, Bottas em segundo e Verstappen conseguindo mais do que a Red Bull imaginava em terceiro.

No domingo, com condições climáticas similares aos dias anteriores – uma queda de temperatura favoreceria o hipermacio, mas ela não veio – só havia um fator que poderia movimentar a prova: se Verstappen e Ricciardo conseguissem usar a aderência adicional para ganhar posição de pista logo de cara.

Isso não aconteceu, e a partir daí se tornou mais uma corrida de administração de combustível e unidade de potência do que de estratégia e pneus. Até porque ultrapassar se mostrou muito mais difícil do que o esperado, mesmo com três zonas de DRS. São três os fatores: perda de pressão aerodinâmica no tráfego, superaquecimento de freios, cada vez mais complexos, e dos próprios pneus. Isso gerou mais uma “não-corrida” e desestimulou a tradicional briga entre pilotos com uma e duas paradas em Montreal, pois desta vez não valia a pena parar duas vezes e ficar preso atrás de outro carro.

A única tática que funcionou foi o undercut, o que só evidencia a dificuldade de ultrapassar, pois quer dizer que o carro quem vem atrás tem mais ritmo e, mesmo potencialmente desgastando mais os pneus no trânsito, consegue usá-lo para passar no box. Foi o que aconteceu na briga entre Hamilton e Ricciardo (ajudado pelo erro do inglês), Hulkenberg e Ocon e Alonso, que depois abandonou, e Leclerc. Basicamente as trocas de posição após a primeira volta foram ou pilotos passando Sirotkin, ou Perez se recuperando da parada antecipada, ou por meio de undercut.

Talvez a única decisão estratégica que poderia ter sido diferente é em relação a Raikkonen, que passou algumas voltas na janela de undercut de Hamilton, mas a Ferrari optou por mantê-lo na pista e ele acabou perdendo essa vantagem. Isso foi entre as voltas 24 e 30 – o finlandês parou na 32 – mas a diferença nunca foi clara o bastante para que ele realmente voltasse à frente. Contudo, sabendo que os supermacios aguentariam sem problemas até o fim, valeria a pena arriscar antecipar o pit stop de Kimi.

Voltando à administração, chamou a atenção a declaração de Valtteri Bottas de que sua Mercedes chegou no limite de combustível, enquanto Vettel demonstrou todas as vezes que o finlandês apertou o passo que tinha ritmo sobrando. Mas isso pode ter a ver com o descompasso das atualizações. O que a Mercedes tem de ficar de olho é em seu rendimento com pneus mais macios: em uma temporada que cada vez mais se desenha para ser ditada pela posição de pista, e não durabilidade dos pneus ou estratégias mirabolantes, largar na frente se tornou mais importante do que nunca.

Drops do GP do Canadá e o futuro da F1

20180607_152336Duas perguntas: A, a Mercedes entrou em contato com você? B, a Ferrari entrou em contato com você? E Daniel Ricciardo sorri e diz. “A, talvez. B, talvez.”

Não há dúvidas de que o valor de mercado do piloto australiano aumentou significativamente neste início de temporada, mas apostar hoje em uma ida a uma destas duas equipes seria bem ousado. Na Mercedes, é bom lembrar que Wolff ainda leva uma parcela dos contratos de Bottas, e na Ferrari há a questão se Vettel poderia barrar Ricciardo – ou mesmo se Ricciardo dividiria o time italiano com o alemão da mesma forma que Raikkonen o faz.

Há, é claro, opções mais ousadas, como a Renault, equipe que mais vem crescendo nos últimos 18 meses na F-1, ou a McLaren, com Fernando Alonso cada vez dando mais a impressão de que cansou de esperar uma melhora do time e vai atrás mesmo é da sua tríplice coroa.

Falando nela, há quem diga no paddock que, se ele vencer Le Mans, não vai aceitar nada que não lhe dê a chance de tentar a vitória nas 500 Milhas em 2019. Não é a toa que Zak Brown disse em Montreal. “Não sei o que ele vai querer fazer ano que vem, mas tenho certeza de que será com a McLaren.”

O time não esconde que está estudando entrar na Indy, e oficialmente esse é um dos motivos pelos quais Gil de Ferran foi contratado como uma espécie de conselheiro. Nos bastidores, contudo, o nome dele já surge como um possível substituto de Eric Boullier, que para muita gente no paddock já está fazendo hora extra no cargo.

Mas voltando a Ricciardo, qualquer movimento vai ter que esperar algo maior que está acontecendo nos bastidores: a definição do regulamento de motores de 2021. Até porque outra definição, do fornecimento da Red Bull para 2019, está  atrelada a isso.

A Honda já deixou explícito que quer manter o MGU-H no regulamento, e se isso não acontecer pode muito bem sair da categoria ao final de 2020. A Mercedes também se colocou a favor da continuidade do MGU-H, mas ainda não há consenso e, em Montreal, deu para ver uma série de reuniões entre os chefões.

O problema da Red Bull é que existe a possibilidade de que não haja uma definição até o fim do mês, como as montadoras prometeram à FIA, e as negociações podem se estender por meses. Ou seja, por mais tempo do que o time gostaria para ou apostar na Honda, ou seguir com a Renault. Essa, sim, garantida por contrato para além de 2020.

E esse não é o único foco de tensão no paddock. As TVs à cabo, especialmente a Sky inglesa, cujo contrato fechado até 2024 vale quase 5 bilhões de reais, não estão gostando nada do aumento de conteúdo gratuito produzido pela FOM. O centro da discórdia é o programa ao vivo do Twitter, que teve 2.5 milhões de views em Mônaco, 50 vezes (!) o previsto inicialmente. Mais da metade desses views aconteceram durante a transmissão, ou seja, durante o pós-show da Sky, que é paga e tem audiência total na Inglaterra de cerca de 600mil espectadores por corrida.

Trata-se de um choque de cultura na maneira como a Liberty pensa em lucrar com a F1: disponibilizando o máximo de conteúdo grátis possível e cobrando pelos extras, revertendo a tendência de levar a F-1 à TV a cabo. O paddock club agora é controlado por uma empresa norte-americana, outro passo que muitos consideram um erro, além da flexibilização das taxas para receber as corridas. Basicamente, eles estão desconstruindo todo o mecanismo de receita de Ecclestone apostando nas plataformas online. Visão ou ingenuidade? A velha-guarda da F1 tem a resposta na ponta da língua.

Já vimos esse filme

Parece até um repeteco de 2010, com uma alternância de rendimento entre as equipes e várias ocasiões em que a competição é tão apertada que mesmo os grandes não conseguem maximizar seus resultados, seja por falhas das equipes ou de seus pilotos. Parece até um repeteco de 2010, com um campeonato cheio de alternativas e várias corridas em que não muita coisa acontece.

Se em Mônaco já tinha se acendido o sinal amarelo em relação à não-disputa que a atual geração de carros proporciona, em Montreal isso ficou escancarado. A corrida tinha tudo para ser agitada, com seis carros andando em um ritmo bastante parecido nas simulações de corrida, uma pista com várias retas e, inclusive, três zonas de DRS, os pneus que se degradam mais na escala da Pirelli, e estratégias diferentes nos três primeiros.

Mas o que poderia movimentar a corrida acabou não acontecendo. Valtteri Bottas teve todo o sangue frio do mundo para dividir as duas primeiras curvas com Max Verstappen, se manteve à frente e basicamente matou, ali, a corrida, pois a Red Bull precisava ganhar posição de pista para fazer sua tática de largar com os hipermacios funcionar.  

A partir daí só Ricciardo conseguiu usar as dificuldades com a PU e o erro de Hamilton na saída do box para ganhar uma posição. Até mesmo o décimo lugar de Charles Leclerc dependeu do toque entre Sainz e Perez. O top 10 foi basicamente definido no sábado.

Não que todas as corridas deste ano tenham sido assim, e basta lembrar do grande final do GP da China, mas também é verdade que, em última análise, toda a emoção que tivemos na pista nesta temporada esteve ligada a um Safety Car. Em relação aos carros, não há o que se possa fazer – e o regulamento de 2019 já tenta mudar o problema da turbulência. A esperança é que as escolhas de compostos da Pirelli para a segunda metade da temporada ajude, uma vez que, a partir da Hungria, a tendência é que a maioria das corridas tenham um “salto” de compostos (por exemplo, ultramacio, macio, médio). Isso só não foi feito até agora porque as decisões até aqui já tinham sido tomadas antes da temporada começar.

Esse dado, inclusive, está aí só para nos lembrar que o campeonato só acabou de passar do primeiro terço, e a liderança do campeonato já trocou de mãos duas vezes. Depois da segunda corrida, Vettel abriu 17 pontos. Depois da quinta, era Hamilton quem tinha 17 pontos de vantagem. E agora o alemão está na frente novamente.

Por quantas vezes não terminamos uma corrida pensando que toda essa alternância tinha chegado ao fim? No Canadá, a Ferrari deu a impressão de ter dado um passo importante em seu motor em relação à eficiência de seu motor, pois, nas entrevistas após a prova, ficou claro que o ritmo de Vettel foi o que mais impressionou. Uma vez que a avaliação desde a sexta-feira era de que a Mercedes era o time que lidava melhor com os pneus – não os hipermacios, claro! – essa diferença foi creditada à menor necessidade de poupar combustível, uma vez que Bottas chegou ao fim no limite.

A eficiência do motor é um dos fatores que vão piorando ao longo de seu ciclo de vida, mas a Mercedes garantiu que uma de suas grandes armas é justamente o fato deles terem conseguido minimizar todas as perdas relacionadas à quilometragem. Tanto, que quando os pilotos eram questionados se a maior diferença seria a falta de atualização ou o excesso de quilômetros no motor, os pilotos sempre elegiam o segundo, mas garantiam que não seria mais do que cerca de dois décimos. Não é por acaso, portanto, que Wolff cobrou uma reação de seu time que, não pela primeira vez no ano, deixou de maximizar um resultado em uma pista na qual deveria dominar.

Falando em motores, a Renault parece ter dado um passo, com Verstappen ficando a pouco mais de dois décimos da pole, mas também é fato que a tração da Red Bull é um ponto muito forte do carro e o trato com os hipermacios, também, então é melhor esperar por outras pistas. Ou esperar por outro update, como prefere Verstappen. De fato, a desvantagem era grande e a realidade da Red Bull segue sendo apostar em uma estratégia diferente para recuperar posição de pista, pois sabe que vai classificar um pouco mais atrás, ou esperar algum ingrediente como o SC (ou uma pista como Hungaroring). E por isso não dá para colocar Ricciardo como candidato ao título.

Já do lado da Honda, os ganhos foram claros. É só olhar a classificação de Hartley, com motor novo, e de Gasly, com o velho. Ver uma grande atualização funcionar não foi algo comum nos primeiros anos dos japoneses na F-1, e não há motivos para que isso não se torne a regra.

Falando em motores, eles serão importantes novamente em duas semanas, na França. Mas depois dessa corrida em que o rei de Montreal Hamilton não passou de quinto e a Ferrari, quem diria, adotou o modo econômico, mas nesse campeonato tão 2010, é melhor deixar as previsões de lado e curtir a viagem.

Confira o placar entre companheiros e as diferenças na classificação do GP do Canadá

 

Hamilton 4 a 3 Bottas
Vettel 6 a 1 Raikkonen
Verstappen 4 a 3 Ricciardo
Perez 3 a 4 Ocon
Hulkenberg 5 a 2 Sainz
Stroll 3 a 4 Sirotkin
Gasly 4 a 3 Hartley
Alonso 7 a 0 Vandoorne
Leclerc 5 a 2 Ericsson
Grosjean 2 a 5 Magnussen

Diferenças de hoje:

Bottas x Hamilton: 0s139

Vettel x Raikkonen: 0s331

Ricciardo x Verstappen: 0s179

Ocon x Perez: 0s587

Hulkenberg x Sainz: 0s195

Stroll x Sirotkin: 0s053

Alonso x Vandoorne: 0s011

Hartley x Gasly: 0s540

Grosjean x Magnussen: sem tempo

Leclerc x Ericsson: 1s648

As diferenças são calculadas nas sessões em que o companheiro com classificação pior é eliminado e os placares contabilizam o resultado do treino, e não a posição de largada, que pode ser alterada devido a punições.

Por dentro da F-1 e das diferenças com o seu motor

Muito se fala sobre a transferência de tecnologia da Fórmula 1 para os carros de rua – e também muito se questiona a respeito. Isso porque essa transferência dificilmente é direta e muitas vezes a pesquisa e desenvolvimento para algo que talvez nem seja usado nas ruas acaba saindo bastante caro.

A atual unidade de potência é um exemplo disso. Sua parte mais complicada e cujo desenvolvimento é mais aberto é o MGU-H, unidade de recuperação de energia calorífica. Pelas regras, a recuperação e uso dessa energia é ilimitada, enquanto o MGU-K tem recuperação limitada a 2MJ/volta e uso de 4MJ/volta.

Desde que essas regras foram estabelecidas, a Mercedes calcula que o volume de conhecimento sobre a termoeficiência do motor evoluiu mais que em 100 anos de indústria automobilística. Porém, nem tudo o que foi compreendido tem utilidade para os carros de rua.

Para entender essas diferenças, aí vão as principais diferenças entre o motor de um Fórmula 1 e mesmo aqueles que equipam superesportivos:

Para economizar peso/espaço, os carros de F-1 não têm motor de arranque e precisam ser ligados externamente. (Ok, existe método de acioná-lo usando o MGU-K, mas isso certamente não simplifica as coisas!). Além disso, o motor tem de ser pré-aquecido por água a cerca de 80ºC para ser ligado, uma vez que as tolerâncias em termos de materiais são tão mínimas que afetaria o funcionamento dos pistões. Afinal, sem essa dilatação térmica, o esforço entre os dentes das engrenagens seria demasiadamente alto.

Isso nos leva ao segundo ponto, o arrefecimento. É óbvio a qualquer um que observe um carro de F-1 que ele tem muito mais entradas de ar que um carro comum. Se a unidade de potência da categoria fosse instalada em um carro de passeio somente com as entradas frontais, ele se superaqueceria. Fora que a posição dos radiadores – apontando para baixo e nas laterais – ajuda a diminuir o arrasto aerodinâmico.

Outro problema óbvio seria reabastecer seu carro equipado com motor de F-1. O combustível não é tão diferente do usado nos carros de rua, mas o controle de resíduos é infinitamente mais restrito. Não que os motores de competição sejam mais fracos, mas sim são projetados para trabalharem sob um estresse muito alto, o que nos leva ao próximo tópico.

Que tal se seu carro gastasse 100 quilos de combustível (algo em torno de 125l) em uma hora? E se ele perdesse 5% de rendimento depois de andar por duas horas no calor e umidade?

Esses números são diretamente relacionados ao nível alto de rendimento que os motores de F-1 atingem. A pressão interna de um cilindro, por exemplo, pode chegar a 1500psi por segundo. Já os pistões vão subir e descer 200 vezes por segundo, suportando uma carga que chega perto de 10.000 vezes a força da gravidade.

Basicamente, a única vantagem de ter um motor de F-1 em seu carro é que ele seria mais leve. O peso mínimo da unidade de potência é de 145kg e mesmo os carros de maior performance têm motores de cerca de 170kg. Mas o lado bom para por aí.

Os limites nos quais um motor de F-1 trabalha são tão tênues que os fornecedores encontraram vários desafios simplesmente para fazer suas unidades de potência durarem por seis corridas. Tudo precisou ser feito com materiais mais resistentes, mas ao mesmo tempo ganhando o menor peso possível. Mas isso já é assunto para outro post.

O professor de Fittipaldi

“Minha idade? 76.000 quilômetros”, disse certa vez Chico Landi, considerado o grande pioneiro do automobilismo brasileiro e cuja morte completa 29 anos nesta semana. Contemporâneo de nomes como Nuvolari e Fangio, é ele quem é citado por Emerson Fittipaldi quando o bicampeão é questionado sobre seu pioneirismo. “Eu só segui o Seu Chico.”

O primeiro contato do filho de italiano com ítalo-brasileira foi nas ruas do bairro de Santana, em São Paulo, assistindo a corridas de carroceiros. Com a morte do pai, ainda adolescente, começou a trabalhar como mecânico, e sua habilidade em consertar carros acabou lhe dando fama nos rachas que eram disputados na cidade paulistana no final dos anos 1920.

Em 1928, Chico Landi comprou um Chevrolet 28, conhecido como “Cabeça de Cavalo”, carro com o qual diz ter aprendido a pilotar. Mas sua primeira corrida oficial foi no chamado “trampolim do diabo”, na Gávea, em 1934. Landi liderava quando abandonou e só venceria a primeira corrida no ano seguinte.

Foi para a Europa somente em 1947, inicialmente, a princípio para assistir ao primeiro GP de Bari, mas acabou correndo em impressionando ao bater os italianos Luigi Villoresi e Achille Varzi, que competiam com carros Maserati, iguais ao seu, e eram dois dos melhores pilotos da época, ao lado de Fangio, Ascari e Farina.

Seu grande momento no automobilismo europeu, contudo, seria no ano seguinte, GP de Bari 1948, quando venceu de forma tão inesperada que os organizadores improvisaram “O Guarani” ao invés do hino brasileiro. Na volta ao Brasil, mais problemas: os italianos não queriam deixá-lo passar com o troféu na alfândega e Landi precisou de intervenção do consulado brasileiro.

Foram oito anos de Europa e há quem diga que a única diferença de Landi e Fangio foi o grande incentivo financeiro dado ao piloto pelo governo argentino, embora o brasileiro fosse mais velho e tenha tido seu auge justamente durante os anos de Segunda Guerra e reestruturação da Europa. A Landi, cabia carregar ele mesmo a bandeira brasileira em sua mala para garantir que ela fosse hasteada nas corridas.

Já perto dos 50 anos quando a história da F-1 começou, Landi acabou disputando apenas seis provas na categoria entre 1951 e 1953, além do GP da Argentina de 1956, quando conquistou seu único ponto pelo quarto lugar – na verdade, 1,5 no carro dividido com Gerino Gerini.

Curiosamente, um dos carros com que Landi correu na F-1 era verde-amarelo, mas não se tratava de uma equipe essencialmente brasileira: eram três Maserati correndo sob o nome de Escuderia Bandeirantes, e as cores foram definidas pelos organizadores, que identificavam os carros de acordo com a nacionalidade dos inscritos. O time inscreveu-se apenas em quatro GPs, e teve como melhor resultado o 8º lugar no GP da Itália de 1953.

Porém, mais do que marcas em si, o que fica de Landi é sua paixão pelas corridas, que o levou até a construir, nos anos 1960, carros de corrida totalmente brasileiros com configuração de F-1, ainda que o projeto não o tenha levado à categoria. O primeiro deles, Landi-Bianco F1, teve vida curta, de um ano, após a morte de Celso Lara Barberis quando o pilotava nos 500km de Interlagos de 1963.

Em uma época na qual o Brasil era importador de petróleo e sofria com a falta do produto por conta da guerra, Landi chegou a vencer provas pilotando carros movidos a etanol, de fabricação nacional, e ficou conhecido como o rei do gasogênio, uma vez que sua empresa fabricou o que seria a fonte de combustível muito usada neste período como substituto da gasolina. E também venceu corridas com carros movidos a carvão vegetal.

Não por acaso, deixou de correr apenas aos 66 anos, em 1974. Nos últimos anos de vida, assumiu a direção do Autódromo de Interlagos com a missão de levar a corrida de F-1 a São Paulo, mas morreu em 7 de junho de 1989, menos de um ano antes do retorno da prova à capital paulista. De certa forma, porém, ele estava por lá: após a morte por infarto, suas cinzas foram espalhadas pelo autódromo.

Estratégia do GP de Mônaco e o que poderia ter mudado a prova

A tática de Gasly mostra o que poderia ter sido o final do GP de Mônaco

“Suponho que o ritmo foi lento porque os outros estavam economizando pneus, enquanto meu ritmo era lento porque eu estava com menos potência e cuidando dos freios”. Essa explicação de Daniel Ricciardo não apenas dá um belo panorama do GP de Mônaco, como também enfatiza o tamanho da vantagem da Red Bull em ritmo de corrida e de classificação no Principado. Parte disso tem a ver com o circuito, mas o australiano também afirmou acreditar que ninguém se entendeu melhor com os pneus hipermacios do que eles. E o composto vai aparecer de novo na próxima etapa, em Montreal.

Em Mônaco, a diferença foi gigantesca: ficar sem o MGU-K, como aconteceu com Ricciardo, não apenas significa ter 160cv a menos de potência, como também compromete os freios, que ficam sem a ajuda do torque do sistema. Para combater uma possível – e quase real – falha total de freios, Ricciardo jogou o equilíbrio de freios em 6 a 7%, segundo ele mesmo, para os dianteiros (os pilotos não costumam mexer em mais de 2% ao longo de uma corrida), correu com 1ª a sexta marchas e mudou sua pilotagem. E ainda assim a equipe calcula que seu déficit tenha sido de 2s por volta.

Nem assim foi suficiente para que Vettel atacasse. O alemão explicou ter optado por preservar os pneus e chegar em segundo do que atacar e arriscar sofrer no final da prova.

Mônaco nunca é uma prova em que os pneus são um problema, pelas curvas não colocarem muita energia neles e pelo asfalto liso. Mas a Pirelli tentou mudar isso neste ano, fabricando um composto de altíssima aderência e degradação, o hipermacio. O objetivo era que os pilotos precisassem de dois pit stops para completar a prova.

Porém, como Mônaco é Mônaco e a posição de pista é fundamental, a opção foi por adotar um ritmo bem mais lento e só parar uma vez. Isso, mesmo com um carro muito mais lento liderando o pelotão. Prova da lentidão é a diferença para o “melhor do resto”, Esteban Ocon: 23s. Em Barcelona, aquele que ocupou essa posição, Kevin Magnussen, ficou a mais de 80s do vencedor.

Outro dado interessante: mesmo antes dos problemas no MGU-K começarem, Ricciardo já estava bem mais lento do que poderia, andando na casa de 1min17, 7s acima da pole. Três deles vêm do peso do combustível e 2s do modo de motor mais conservador para a corrida. Então ele já andava 2s mais lento do que poderia só para levar os hipermacios até perto da volta 20. Não é a toa que os pilotos reclamaram que não houve corrida em Mônaco!

Mesmo naquele momento, não havia o que os rivais pudessem fazer, por conta do graining, especialmente nas Mercedes. O carro mais longo e que já vem, desde o início da temporada, sofrendo com os compostos mais macios – lembrando que o time chegou a tentar fugir dos hipermacios na classificação – e o quadro foi até pior em Mônaco devido às características da pista.

Mas e com Ricciardo com problemas, seria possível mudar a estratégia e a cara da corrida? Em teoria, qualquer um dos quatro primeiros parasse com, digamos, 20 voltas para o fim e colocasse os hipermacios “pagaria” sua parada em quatro voltas, sendo naturalmente 5s por volta mais rápido. Mas seria o suficiente para passar quem não tivesse parado? É essa a aposta que os estrategistas não quiseram fazer em uma pista como Mônaco.

Por outro lado, a sorte de Ricciardo é que seu problema começou depois das paradas. Caso Vettel não tivesse feito o pitstop e, com isso, estivesse na ponta, ganharia a corrida. É o que indica a boa tática da Toro Rosso, que manteve Pierre Gasly na pista por 37 voltas com o hipermacio, fazendo com que ele tivesse pista livre em momentos-chave para passar Sainz e Perez com o overcut e estar em posição de herdar a posição de Alonso quando o espanhol teve uma quebra, terminando em uma ótima sétima posição.

Os compostos serão os mesmos para a próxima etapa, no Canadá, mas o cenário muda totalmente por ser uma pista em que dá para ultrapassar. E também pela indicação da  Mercedes, que ao selecionar apenas cinco hipermacios, mostrou que vai fugir deles na corrida.

Drops do GP de Mônaco e as picuinhas da F1

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A chegada do avião ao aeroporto de Nice é uma das mais bonita – talvez a melhor – da temporada. Você vai vendo as praias e o mar incrivelmente turquesa, vai chegando cada vez mais perto até pousar do ladinho do mar. Depois, no caminho a Mônaco, de ônibus e principalmente de trem, a cada fim de túnel começa um paraíso diferente.

 

Mas não dessa vez. O tempo estava (bem) feio na chegada, ainda na terça-feira, e voltou a piorar na segunda. Então esse GP de Mônaco acabou ficando mais com o gostinho de outra marca registrada da prova: de ser um GP estilo Forest Gump.

 

Os fotógrafos, claro, têm números muito mais impressionantes. Mas até a jornalista aqui andou quase 77km a pé durante o GP e subiu o equivalente a 174 andares, seja em escadas mesmo ou nas ladeiras do Principado.

 

Já tinha me programado ir para a McLaren para saber mais sobre o papel de Gil de Ferran na equipe quando soube que a filha dele estava namorando Vandoorne. Então lá fui eu, acredito que apenas pela segunda ou terceira vez, para a coletiva do belga, que é daqueles pilotos que não costumam dar declarações lá muito interessantes. Coitado, ele não esperava a pergunta e ficou roxo.

 

Com Gil, tinha acertado uma entrevista, que foi barrada com a McLaren. Querem esperar que ele entenda melhor a filosofia do time – ou seja, o que pode falar – para conversar com a imprensa.

 

Continuando com os brasileiros, Sette Camara saiu do circuito ainda durante a segunda corrida da F-2, muito irritado com a maneira como foi tratado pelos médicos. Depois de ter sido vetado para a primeira corrida devido a uma luxação no pulso, consequência de uma batida na classificação, ele sequer chegou a ser examinado antes da prova 2, mesmo sentindo-se totalmente apto a correr. O lado bom é que pelo menos ele tem um mês até a próxima corrida, na França.

 

É impressionante nos bastidores da F-1 como coisas que não vão mudar o preço do dólar tomam proporções maiores do que deveriam. Em Mônaco, de um lado o pessoal da FOM estava irritadíssimo porque especialmente a mídia inglesa falava no retorno das grid girls – e falo mais sobre isso adiante – e, do outro lado, a FIA se revoltava com o site oficial (ou seja, com a FOM) pela cobertura questionando a legalidade do motor da Ferrari.

 

Isso porque a FIA estava tentando manter tudo debaixo dos panos, sendo inclusive curiosa a forma como o conglomerado que controla Motorsport.com e Autosport tratou o assunto. No final das contas, a federação acabou dizendo que o motor estava ok em Mônaco – e é claro que estava! – mas sem explicar como se chegou até ali.

 

Sobre as grid girls, a questão da FIA era que, pela acepção do termo, grid girls seguram placas com números e bandeiras dos pilotos. E no caso de Mônaco era uma ação publicitária em que isso não aconteceria. O fato é que homens e mulheres estavam no grid com plaquinhas com frases supostamente de fãs. Foi uma boa forma de dar visibilidade à marca e até eu fui puxada pelos modelos brasileiros que estavam no carro de Hamilton para tirar foto e entrar na brincadeira. Mas o difícil é achar essas contas que estavam citadas nas placas…

 

Falando em show, pela segunda vez o Twitter da F1 fez uma transmissão ao vivo, com entrevistas após a corrida. As visualizações superaram 1.4 milhão, muito mais do que o próprio Twitter esperava. Os americanos acreditavam que a categoria ficaria no mesmo patamar do programa feito de forma semelhante na NBA, que tem média de 600 mil espectadores. Para a FOM, perfeito. Já as TVs fechadas que pagam milhões em direitos e têm como uma das armas o conteúdo pós-corrida, não foi uma ideia muito popular.

 

Falando em FOM, uma fofoca engraçada. A F1 agora tem uma pessoa encarregada de selecionar digital influencers para ir ao paddock e ajudar na promoção da categoria especialmente entre o público mais jovem. Isso pode ser fácil em alguns lugares, mas é preciso conhecer um pouco da cultura. Pois bem. Em Baku, a primeira gafe: algumas mulheres foram selecionadas por terem muitos seguidores. No final, descobriu-se que eram prostitutas, e não influencers.

 

Voltando às corridas, Mario Isola, da Pirelli, falava sobre a escolha de pneus para o GP da Hungria e perguntei se eles estavam esperando Mônaco para decidir se daria para usar os hipermacios lá. A resposta foi franca: “Não, não saiu ainda porque esqueci de mandar o email”. Atrasos à parte, a boa notícia é que, na segunda metade do ano, as escolhas de compostos devem ter saltos, ou seja, algo como: médio, macio, ultramacio.

 

Personagem do final de semana, Verstappen surpreendeu com a firmeza em não reconhecer os erros neste ano – somente China e Mônaco foram culpa dele, pela sua conta. Mas seu olhar perdido logo após a coletiva lotada mostrava mais um menino perdido e pressionado do que o piloto que respondia firmemente instantes antes. No domingo, o semblante mudou, as respostas ficaram mais maduras. Mas esse foi exatamente o mesmo filme que vi depois do GP da China.

“Correndo” nas ruas de Mônaco

É fato que o GP de Mônaco historicamente é ganho até com facilidade com apenas uma parada no box. Mas não deixou de chamar a atenção o fato de, mais uma vez, os pilotos terem corrido com o “freio de mão puxado” para fazer a melhor estratégia na pista funcionar. No caso de Mônaco, esse sempre foi o caso porque se “a” pista em que a posição de pista ganha vantagem em relação a qualquer outra tática. Mas o que estamos vendo é que, em que pese a competitividade do campeonato, o que nos fez ter resultados até aleatórios na temporada até aqui, os carros atuais fazem brotar aqui e ali cada vez mais Mônacos, mesmo com os pneus mais macios que a Pirelli já fez.

Esse está longe de ser um problema novo, mas em 2011 o combo DRS e pneus de alta degradação pareceu ter dado uma nova cara às corridas. A Ferrari, com Alonso, chegou a ganhar uma corrida com quatro paradas no box, em uma performance alucinante do espanhol. Porém, especialmente após as alterações de 2017, esse tipo de tática passou a ser impossível porque simplesmente é preciso uma diferença abismal para sequer tentar uma ultrapassagem.

Sabendo disso, a Pirelli tornou seus pneus mais macios e criou o hipermacio, o que em teoria significa dois degraus acima em termos de degradação em relação ao ultramacio do ano passado. E o que aconteceu? Mais uma vez valeu mais a pena andar devagar e sempre do que efetivamente disputar uma corrida em Mônaco.

Não por acaso, Hamilton saiu do carro dizendo que, se estivesse no sofá de casa, estaria dormindo. Isso não aconteceu por conta de uma excelente pilotagem de Daniel Ricciardo, que superou uma perda significativa de motor de maneira tão brilhante que Vettel sequer chegou a pressioná-lo. O australiano falou que perdeu o MGU-K. Se foi esse mesmo o caso, ele tinha uma desvantagem de cerca de 160 cavalos para Vettel e também não podia usar a oitava marcha para não danificar o motor. Ou seja, no único ponto de ultrapassagem do circuito, estava exposto, mas conseguia se garantir focando no trecho entre o Cassino e a Portier.

Existe, contudo, o outro lado da história. Vettel disse que desistiu de tentar qualquer coisa porque, caso contrário, temia que os pneus ficassem num estado muito ruim. E isso basicamente acabou com suas opções de vitória.

Quem também evitou um sono coletivo foi Max Verstappen, mais pela expectativa gerada do que pelo que ele mesmo conseguiu fazer na pista. No início, passou de maneira limpa os rivais mais lentos e depois passou grande parte da corrida andando no mesmo ritmo de Alonso e tentando levar os pneus ultramacios ao maior número de voltas possível antes de colocar os hipermacios para atacar no fim. Ou seja, estava sendo bem mais lento do que poderia porque ser rápido não adianta quando não se tem posição de pista em Mônaco.

Em mais um final de semana sólido, Pierre Gasly conseguiu fazer os hipermacios – aqueles que deveriam derreter em pouco tempo – durarem até a volta 43: perguntei como e ele disse “boa pergunta”, mas creio que já temos a resposta. É porque ele pilotou bem mais devagar do que poderia.

Isso surpreende em Mônaco? Não. A grande empolgação do Principado é o limite tênue entre ser um Ricciardo e ser um Verstappen: o próprio Gasly disse que tocou a mesma barreira que o holandês na classificação, mas conseguiu se safar. Mas é uma tendência que nem mesmo os pneus chiclete puderam resolver.

Confira o placar entre companheiros e as diferenças na classificação do GP de Mônaco

 

Hamilton 4 a 2 Bottas
Vettel 5 a 1 Raikkonen
Verstappen 4 a 2 Ricciardo
Perez 3 a 3 Ocon
Hulkenberg 4 a 2 Sainz
Stroll 2 a 4 Sirotkin
Gasly 4 a 2 Hartley
Alonso 6 a 0 Vandoorne
Leclerc 4 a 2 Ericsson
Grosjean 2 a 4 Magnussen

Diferenças de hoje:

Hamilton x Bottas: 0s209

Vettel x Raikkonen: 0s227

Verstappen x Ricciardo: sem tempo

Ocon x Perez: 0s093

Sainz x Hulkenberg: 0s125

Sirotkin x Stroll: 0s526

Alonso x Vandoorne: 0s171

Gasly x Hartley: 0s238

Grosjean x Magnussen: 0s463

Leclerc x Ericsson: 0s436

As diferenças são calculadas nas sessões em que o companheiro com classificação pior é eliminado e os placares contabilizam o resultado do treino, e não a posição de largada, que pode ser alterada devido a punições.

Por dentro da F-1 e o desafio logístico de Mônaco

Era para ser um pitstop de rotina para Daniel Ricciardo, líder do GP de Mônaco de 2016. A pista já dava claros sinais de que estava seca e o australiano trocaria seus pneus intermediários pelos supermacios. O problema é que eles não estavam lá, a parada foi demorada, e Ricciardo voltou à pista vendo o carro de Lewis Hamilton passar na sua frente para vencer.

Erros de pitstop acontecem em qualquer corrida, certo? Mas aquela falha da Red Bull pode ser colocada no saco das “coisas de Mônaco”. Neste caso, coisas que só acontecem com a logística maluca de Mônaco. Os mecânicos estavam preparados para colocar os pneus macios, mas os estrategistas decidiram de última hora que o supermacio deveria ser usado. Isso não seria um problema em qualquer outro circuito, porque os jogos de pneus disponíveis para a corrida ficam na garagem, mas não em Mônaco. Lá, os pneus ficam na parte de trás da garagem e apenas são trazidos para a parte da frente, onde são feitos os pit stops, perto das paradas. Os estrategistas tinham esquecido que Mônaco é Mônaco.

Imagine um país que tem 0s4km/2 a mais que o Parque do Ibirapuera e possui uma população de 38 mil habitantes de repente ver 200 mil pessoas chegarem para uma corrida de carros que, em si, já vai ocupar espaço por natureza. A montagem da pista começa apenas seis semanas antes do evento, e consiste na colocação de 1200 toneladas em arquibancadas, 1000 toneladas para a construção da região dos pits, 20.000 metros quadrados de fios, 3000 pneus para os muros de proteção e quase 34km de guard rails. Esse material chega por trens e mais de 500 trailers, vindos de galpões na França e na Itália. Sabe quantos engenheiros fazem a instalação? 50. Só do lado do Automóvel Clube de Mônaco são mais de 2000 pessoas trabalhando no GP.

Pois bem. Aí chegam as equipe, seus trailers e materiais. A maioria traz os motorhomes, que ficam em um apertado paddock. A Red Bull se instala em um iate gigantesco. A parte “em terra” é tão apertada que os pilotos estacionam as scooters que costumam usar no Principado na parte de fora, ou seja, têm de passar pelos fãs para chegar a elas. E nós jornalistas também, pois Mônaco é uma das poucas provas em que trabalhamos fora do paddock.

Você atravessa uma ponte daquelas de patrocínio e chega no pitlane. Os boxes têm dois andares graças a uma reforma de 2004, mas ainda assim o espaço é reduzido. No andar de baixo, ficam os carros e o equipamento mais básico possível. Todo o restante vai para o andar de cima, inclusive o “pitwall”. E é comum ver empilhadeiras fazendo “entregas” para a parte de cima pela janela mesmo. Os motores, por exemplo, são montados no andar de cima.

O aperto é tanto que é normal as equipes levarem menos peças de reposição para Mônaco. E isso mesmo com a possibilidade maior de acidentes. Os mecânicos também têm de se virar com menos ferramentas do que o normal.

E quem vai ao GP pode ver esse aperto todo de perto por conta de outra particularidade do GP de Mônaco: mesmo com muita atividade de pista, uma vez que é um final de semana que tem outras categorias além da F-1, trata-se do único circuito que é aberto durante o final de semana de corrida. Como os treinos livres acontecem, excepcionalmente, na quinta-feira, no dia seguinte, inclusive, todo o circuito é reaberto ao tráfego normal de carros. Nos demais dias, são poucos os carros que passam pela parte do porto, mas o restante está totalmente liberado.

Isso também exige um esforço logístico. As vias são fechadas às 6h da manhã de quinta-feira para a instalação das últimas barreiras, e são reabertas às 19h. Isso acontece todos os dias (a não ser na sexta, quando as vias ficam totalmente abertas. Depois da corrida, a liberação acontece ainda mais cedo, às 18h. Ao mesmo tempo, começa o trabalho de desmontagem de todo o aparato, feito de madrugada. Em três semanas, não há mais sinal de que houve um GP ali.

Um recorde de Senna que segue em pé

Nada parecia estar do lado de Ayrton Senna antes da largada daquele GP de Mônaco de 23 de maio de 1993. Nem mesmo seu estado de espírito.

Senna sofreu um forte acidente na Ste Devote, ainda na sexta-feira, depois de passar por uma ondulação e perder o controle da McLaren. “Achei que me machucaria feio, que perderia minhas pernas”, disse o brasileiro na ocasião. E ainda teve outra batida, bem mais leve, no sábado na saída do túnel pelo mesmo motivo, o que Ayrton sentar pensativo ao lado da pista depois de ficar com o terceiro lugar no grid, a quase um segundo do pole Prost e atrás também de Schumacher.

Mas, no domingo, tudo deu certo para o brasileiro.

Prost ficou para trás logo no começo, devido à punição por uma largada queimada que gerou muita discussão na época e sobre a qual não se chegou a um consenso. Sem todos os sensores existentes hoje – e que ainda assim deixaram dúvidas com Bottas ano passado na Áustria – ficou registrado nas matérias da época que “se Prost queimou, foi por muito pouco”. A punição saiu cara para o francês, que deixou o motor morrer duas vezes ao cumprir o stop and go e perdeu tempo suficiente para voltar uma volta atrás e perder e qualquer chance de pódio mesmo que sua Williams fosse o melhor carro disparado.

Ainda assim foi o francês quem entreteve a torcida, passando boa parte do pelotão, ainda que a superioridade da Williams tenha ficado clara no resultado final: Prost foi o único com uma volta atrás, ou seja, não a recuperou, enquanto quem vinha atrás levou duas voltas do líder.

Líder este que era um Schumacher tranquilo até a volta 32, quando já tinha mais de 10s de vantagem. Atrás dele, Senna disse depois da corrida que estava andando mais lento do que podia, preservando os pneus e esperando para atacar no final, mas mesmo antes da metade da prova o alemão da Benetton teve um problema hidráulico que acabou comprometendo seu câmbio e motor, e abandonou.

Daí em diante ficou fácil para Senna, que colocou mais de 50 segundos em Damon Hill, companheiro de Prost que, curiosamente, acabou a prova logo atrás do piloto brasileiro.

É interessante que os relatos da época dão conta de que não se criou uma expectativa exagerada diante da possibilidade de Senna conquistar sua quinta vitória seguida em Mônaco ou a sexta na carreira, superando a marca de Graham Hill, tamanho o déficit da McLaren em 1993, embora Senna tivesse vencido nos dilúvios de Interlagos e Donington. Desta vez, o braço não contou tanto quanto nas outras vitórias históricas daquele que considero o melhor ano do piloto brasileiro, mas fica a lembrança pela marca histórica que ainda não foi atingida de seis vitórias no Principado. No atual grid, só Alonso, Hamilton e Vettel ganharam a prova, os três em duas ocasiões cada.

PS.: Algo que me chamou a atenção nos vídeos da corrida é a lentidão dos carros especialmente onde eles mais me impressionam hoje em Mônaco, nos S da piscina. Se não me engano, o traçado mudou um pouco por questões de segurança e se tornou mesmo mais veloz, mas fui checar: em duas corridas sem chuva, Vettel venceu sendo oito minutos mais rápido em 2017, com o mesmo número de voltas e também apenas uma parada nos boxes, sem reabastecimento.

Estratégia do GP da Espanha e mais sobre o motor “bombado” da Ferrari

O post é de estratégia e vamos falar muito dos pneus, mas ao que parece não foi esse o motivo do domínio da Mercedes no GP da Espanha. A FIA teria descoberto um conector extra no MGU-K no motor da Ferrari, achou uma bateria a mais, não teve uma resposta convincente do que seria e teria mandado parar com isso, uma vez que a inspeção no MGU-K principal já tinha constatado que ele trabalhava no limite de 2MJ por volta.

Era a informação sobre essa engenhoca que Lorenzo Sassi, que foi da Ferrari para a Mercedes, teria passado aos alemães. A tal bateria extra daria algo em torno de 0s270 por volta – mais em classificação e em situações cruciais da corrida, como largada, in e outlaps ou ultrapassagens. A Mercedes nega essa teoria, diz que seu GPS mostra que os motores estavam iguais e que a diferença ficou nas curvas de baixa. Porém, se a tendência da Espanha continuar, teremos a confirmação de que foi essa mesmo a história.

Com ou sem bateria extra o final de semana na Espanha já foi complicado o suficiente por conta dos pneus. A combinação das características do circuito, temperatura e o pneu com superfície mais fina fez com que se tornasse difícil extrair rendimento do supermacio, pois os dianteiros começavam a volta frios e os traseiros a terminavam muito quentes. Isso, em uma volta lançada. Nos stints longos, havia muitas bolhas nesse composto.

Então a decisão de se livrar do supermacio para a corrida foi fácil, tornando o GP da Espanha uma prova de, teoricamente, uma parada, ainda que as temperaturas causassem incertezas a respeito de quão fácil isso seria.

No final das contas, acabou ficando no limite entre uma e duas. A Red Bull foi para a prova com um ritmo de corrida um pouco superior, mas dependia muito da largada: seus pilotos acabaram se mantendo em quinto e sexto e foram claramente limitados pelo ritmo de Raikkonen.

Mas como se pode dizer isso se eles nunca chegaram a tentar uma manobra? Barcelona é um dos circuitos em que o efeito do ar turbulento é mais sentido, e se um carro se mantém por várias voltas a 1s5 do outro, quer dizer que tem mais ritmo, pois a turbulência lá começa a afetar o rendimento com mais de 3s entre os carros!

O mesmo aconteceu com Bottas em relação a Vettel. O finlandês teve mais um final de semana de “e se”, depois de perder a pole por 40 milésimos e se ver exposto à curva 2 na largada. Depois do primeiro stint todo atrás da Ferrari, o máximo que podia almejar era o segundo lugar.

Outra prova de que o ritmo de Bottas era forte foi a parada antecipada de Vettel que, ao contrário de Raikkonen, que ia mais lento, fez bolhas em seus pneus. A parada aconteceu na fronteira entre as estratégias de uma ou duas paradas, o que explica a espionagem que vimos do engenheiro da Mercedes no box ferrarista: seria uma tática ou uma necessidade?

Os alemães, então, decidiram jogar em duas frentes: Hamilton estenderia seu stint e faria uma parada, enquanto Bottas aproveitaria que Vettel voltou atrás de uma Haas, faria duas voltas voadoras e tentaria o undercut mesmo colocando os médios, mais difíceis de aquecer. E daí para frente seria uma questão de defender a posição de pista, algo fundamental em Barcelona, aguentando até o final. Teria dado certo, mas a parada do finlandês foi lenta e ele voltou logo atrás.

A corrida acabou tendo alguns dramas em termos de tráfego (Vettel com Magnussen e depois Hamilton com Verstappen) que só ilustram como é quase impossível passar em Barcelona. Mas o único drama da parte final foi a indecisão da Mercedes sobre a duração dos pneus de Bottas. Porém, seria uma questão dele se segurar na pista após Vettel fazer sua segunda e inevitável parada. Novamente, posição de pista é o que conta em Barcelona.

A Ferrari ainda deixou o alemão ao máximo na pista esperando um SC ou VSC e conseguiu isso quando Ocon parou com o motor quebrado. Poderia ter sido o suficiente para perder apenas a posição para Bottas, mas a inlap de Vettel não foi boa devido ao trânsito e ele também errou suas marcas a hora da parada, atrasando o trabalho da Ferrari. Foram detalhes que acabaram tirando-o do pódio.

O desgaste de pneus de Vettel tem motivos para preocupar a Ferrari. O próprio alemão já voltou atrás, na entrevista que deu nos testes, que isso tenha algo a ver com a mudança feita nos compostos para Espanha, França e Inglaterra por conta das curvas rápidas mais longas: além dele, só Perez, Hartley e Sirotkin tiveram de fazer a segunda parada.

Outro fator que chamou a atenção foi o domínio da Haas de Magnussen na ponta do segundo pelotão, justamente em uma corrida na qual a Renault trouxe várias novidades para o carro. E, também, usando um motor Ferrari…

Drops do GP da Espanha com Alonso no WEC e a pressão da Mercedes

Hamilton quando soube do GP em Miami: Uhu!! Hamilton quando viu o circuito proposto: Meh…

A história do GP de Miami empolgou os pilotos, mas foi curioso perguntar a Sergio Perez se ele achava que mais uma prova na região seria boa para o México e ele olhar incrédulo: “Mas isso realmente vai acontecer?” Mesmo depois de responder, ele não continha a empolgação. “Então vamos nos livrar de Baku?” Perguntei por que ele gostaria disso, já que tem dois pódios lá. “Não que eu queira, é o que ouvi.”

 

Mas não, pelo menos para o ano que vem o GP está garantido e deve voltar a sua data original. Mas onde entra Miami? Fala-se que em Outubro mesmo, até em finais de semana seguidos com Austin. Se esse for o caso, é difícil pensar que a corrida em COTA vai durar muito tempo. Ainda mais com as negociações com New Jersey reabertas.

 

Há várias teorias sobre como o calendário ficará, mas esse está longe de ser o maior problema. Os organizadores do GP da Alemanha em Hockenheim e também de Silverstone estiveram em Barcelona para discutir a extensão de seus contratos basicamente com o mesmo pedido: dividir os lucros ao invés de pagar uma taxa para receber os GPs, a fim de “retirar o risco de prejuízo”. No caso dos alemães, que pelo menos neste ano estão empolgados com o boost de ter Vettel bem e Verstappen sozinho trazendo pelo menos ⅙ do público, o acordo acaba em 2018. Na Inglaterra, são só duas corridas garantidas.

 

Reduzir drasticamente o dinheiro ganho com as taxas teria um grande impacto no dinheiro que movimenta a F-1. Atualmente, a soma é superior a meio bilhão de dólares. O total dividido pelos promotores e times é de 1.8 bi.

 

A boa notícia para os organizadores europeus é que eles são os primeiros a admitir que, diferentemente da era Ecclestone, pelo menos agora eles sentem que há abertura para conversar. Mas nem todos estão contentes. Há quem veja um foco exagerado no business.

 

Bottas garantiu que esqueceu rápido do desastre de Baku, mas talvez a ressaca tenha sido pior que a decepção. Ou pelo menos foi para quem teve de tomar shot atrás de shot com ele no domingo no Azerbaijão.

 

Quem chegou sorridente em Barcelona foi Fernando Alonso. Conversei com pessoas que estiveram em Spa no WEC e têm boas conexões com a Toyota e a avaliação era sempre a mesma: ele não é o mais rápido entre os pilotos da equipe ainda, mas o nível que mostrou e o quanto vem trabalhando tem impressionado a todos.

 

Isso, até mesmo entre os colegas de F-1, que não acreditaram quando ele pegou carona no jatinho de volta de Baku, pegou o carro em Genebra e dirigiu por horas madrugada a dentro para a fábrica da Toyota em Colônia, na Alemanha. No dia seguinte passou horas dirigindo novamente, no simulador. Para Le Mans, contudo, não chega como favorito. Tem um certo Koba guiando mais que ele.

 

Voltando ao paddock da F-1, foi intensa a movimentação do pessoal da Liberty Media dentro do hospitality da Mercedes por todo o final de semana. O motivo é a desconfiança dos alemães de que o motor ferrarista é ilegal, o que teria a ver com a forma como eles usam o sistema de MGU-H, algo que expliquei por aqui. A FIA não quer fazer estardalhaço sobre o tema, mas os times estão pressionando-os a enviar alguma clarificação oficial até antes de Mônaco. Caso contrário, vai ter protesto.

Em sintonia com Barcelona

São vários os motivos que levam a Fórmula 1 todo ano para o Circuito da Catalunha para os testes de pré-temporada. Um deles é o clima, ainda que neste ano ele não tenha ajudado tanto assim, mas o principal é o traçado. Afinal, o palco do GP da Espanha tem curvas longas de alta velocidade, que testam a aerodinâmica do carro, de médias e lentas no final da volta, em que a parte mecânica também é colocada à prova.

Uma vitória acachapante na Espanha como a da Mercedes neste domingo, portanto, só pode significar que os alemães agora têm o melhor carro do grid.

A não ser que isso também tenha acontecido durante os testes e não tenha se confirmado nas provas seguintes.

Até as condições climáticas em Barcelona eram parecidas com a segunda semana de testes, com temperaturas por volta de 15 graus, quando a maioria das simulações de corrida foram feitas, o que explica por que Bottas e Hamilton logo se apressaram em fazer a comparação. “Quando saímos daqui no inverno achávamos que tínhamos uma vantagem considerável e não foi o que aconteceu”, disse o inglês.

Mas há também outra linha de pensamento. Mesmo antes da corrida, a Ferrari deixou claro seu descontentamento com a mudança que a Pirelli fez nos pneus para algumas etapas, começando na Espanha. Os italianos fortaleceram a “parede” do pneu para evitar a formação de bolhas em circuitos que colocam muita energia nos pneus. Até aí não há problema algum, a não ser que essas bolhas apareceram apenas nos carros de Mercedes e Red Bull durante os testes.

Nenhum desses fatores, contudo, tira os méritos de Hamilton, que foi se encontrando ao longo do final de semana para chegar a um estágio de sintonia com o carro que ele ainda não tinha tido neste ano. Na sexta-feira, ele estava atrás de Bottas, mas na hora da verdade acabou colocando 20 segundos no companheiro. O ritmo do finlandês foi comprometido inicialmente por Vettel, mas só aumentou depois que o alemão saiu de sua frente. Bottas e todo o grid sabem muito bem que, quando Hamilton está se sentindo bem com o carro, é quase impossível batê-lo.

Enquanto isso, Vettel perdeu mais pontos, agora não por culpa sua, mas pelo desgaste surpreendente dos pneus da Ferrari. Parar duas vezes e colocar os médios não foi uma estratégia mirabolante e, sim, uma necessidade. Seria algo relacionado ao composto especial da Pirelli para Barcelona ou à pista em si? Resta ao tetracampeão esperar que sim.

Verstappen, por sua vez, teve a corrida tranquila que precisava para começar a colocar as coisas novamente no lugar. Foi mais rápido que Ricciardo o tempo todo e lucrou com os problemas ferraristas.

É fato que houve um momento em que Ricciardo disse à Red Bull que estava mais rápido, tentando forçar uma inversão de posições. Ele estava 1s5 atrás, o que demonstra um ritmo efetivamente mais forte em Barcelona, mas Verstappen também estava na mesma distância de Raikkonen, apagado neste final de semana.

Mas como assim “ele estava 1s5 atrás, o que demonstra um ritmo efetivamente mais forte em Barcelona”? A explicação sobre as mudanças de regras de 2019 neste final de semana deu números para a dificuldade atual de se fazer ultrapassagens na F-1: quando o carro está a 3s de um rival, já perde pressão aerodinâmica de forma significativa em uma pista com curvas longas como o Circuito da Catalunha. E a ideia do novo regulamento é diminuir esse efeito para 1s.

Enquanto 2019 não vem, não vai ter jeito: por mais que o grid esteja muito competitivo (em duas partes, é verdade, com os três melhores carros a milhas de distância do restante), haverá pistas em que as corridas serão procissões.

Confira o placar entre companheiros e as diferenças na classificação do GP da Espanha

Hamilton 3 a 2 Bottas
Vettel 4 a 1 Raikkonen
Verstappen 4 a 1 Ricciardo
Perez 3 a 2 Ocon
Hulkenberg 4 a 1 Sainz
Stroll 2 a 3 Sirotkin
Gasly 3 a 2 Hartley
Alonso 5 a 0 Vandoorne
Leclerc 3 a 2 Ericsson
Grosjean 1 a 4 Magnussen

Diferenças de hoje:

Hamilton x Bottas: 0s040

Vettel x Raikkonen: 0s310

Verstappen x Ricciardo: 0s002

Ocon x Perez: 0s402

Sainz x Hulkenberg: 0s443

Sirotkin x Stroll: 0s530

Alonso x Vandoorne: 0s223

Gasly x Hartley: sem tempo

Magnussen x Grosjean: 0s159

Leclerc x Ericsson: 0s832

As diferenças são calculadas nas sessões em que o companheiro com classificação pior é eliminado e os placares contabilizam o resultado do treino, e não a posição de largada, que pode ser alterada devido a punições.

Por dentro da F-1 e da tecnologia de macacões e capacetes

Entenda a tecnologia presente em capacetes e macacões de F1

Na maioria dos esportes, as roupas têm que ser leves e resistentes, e dotadas de alguma tecnologia que melhore a troca de calor entre o corpo e o ambiente. Na Fórmula 1, contudo, a indumentária usada pelos pilotos tem uma função a mais: salvar suas vidas. E não para por aí: até mesmo os acessórios utilizados visam promover o ganho de alguns décimos de segundo.

Dúvida cruel

Nos primórdios do automobilismo, o macacão servia apenas para proteger as roupas de manchas de óleo. Eles eram feitos de algodão e não havia qualquer tratamento para torná-los mais leves ou eficientes contra o calor. Sequer eram usados capacetes.

Até que um tecido desenvolvido pela Du Pont para o exército norte-americano, o Nomex, entrou em cena nos anos 1960 e passou a ser utilizado nos Estados Unidos após a morte de Jerry Unser Jr. Sua vantagem é que sua estrutura molecular só se alterava aos 370ºC.

O problema era que os estudos com o exército demonstravam que o tecido era mais eficaz se mais de uma camada fosse utilizada. Portanto, quando o Nomex cruzou o Atlântico pelas mãos do médico Sid Watkins, muitos pilotos se relutaram a utilizá-lo, pois o macacão ficava quente demais.

O material foi sendo desenvolvido nos anos 1980 e se tornou mais leve. Hoje, os macacões de Nomex possuem de duas a quatro camadas, mas a temperatura interna não passa dos 41ºC. Para serem usados não apenas pelos pilotos, como também pelos mecânicos, eles são lavados e secados 15 vezes e depois submetidos a testes com 600 a 800ºC. A temperatura dentro do macacão não pode ultrapassar os tais 41ºC, temperatura considerada crítica para o ser humano, por mais de 11s. Eles também possuem tecnologia que dissipa o suor. Em média, um piloto usa 16 macacões por ano.

Até as botas são especiais

Hoje, a Federação Internacional de Automobilismo cuida até dos zíperes, que não podem derreter ou transferir calor para o corpo do piloto. O macacão possui ainda uma espécie de gancho de tecido na parte do ombro, para que, no caso de um atendimento, o mesmo possa ser puxado de seu carro junto de seu banco.

Em termos de leveza, apenas o fato dos logos serem impressos ao invés de costurados fez com que o peso diminuísse em meio quilo, algo importante em uma categoria na qual sempre busca-se ficar próximo do peso mínimo – que é contabilizado junto do piloto e seu equipamento.

Embaixo do macacão, os pilotos usam meias, calça e camiseta também à prova de fogo, além da balaclava. As botas são especiais para protegerem os pés ao mesmo tempo em que não prejudicam a sensibilidade com os pedais, da mesma forma que as luvas, que têm camurça nas palmas para melhor aderência no volante.

Capacete aerodinâmico

O capacete é um elemento de segurança à parte e foi alterado depois que Felipe Massa foi atingido por uma mola na classificação do GP da Hungria de 2009, quando ganharam uma camada de um material chamado Zylon, posicionado entre o visor e a parte de cima do capacete. Os capacetes têm de ser extremamente leves – geralmente pesam cerca de 1,250kg – e resistentes. Por isso, são feitos de fibra de carbono e várias camadas de Kevlar, tecido usado também em roupas à prova de bala. Já a viseira é feita de policarbontato, e possui camadas, que são retiradas pelo piloto quando estão sujas durante a corrida. Elas têm um tratamento que impede que embaçem semelhante ao de câmeras de TV.

Capacetes não são iguais

Apesar de padronizados, os capacetes não são iguais. Eles possuem diferentes configurações que visam ajudar na aerodinâmica do carro. Cada fabricante desenvolve suas próprias maneiras de fazer isso, por meio da forma em si e de aletas colocadas na parte externa. Além da questão técnica, a adaptação de cada piloto e até contratos com equipes vão definir quem opta por qual marca no grid.

Alonso é um piloto que tem experimentado de tudo. Trocou a Schuberth, marca associada à Ferrari, pela japonesa Arai em 2016, marca que já tinha usado no início da carreira, mas hoje utiliza Bell.

O espanhol explicou que as diferenças são pequenas, porém marcantes. “Cada um tem um peso, e você sente isso quando está pilotando. A refrigeração é diferente e o conforto também muda. Mesmo que eles preparem o capacete com a forma da sua cabeça, tem aquele com que você vai se sentir confortável logo de cara e o outro que vai precisar de várias mudanças.”

Além do peso e do formato, há outras variáveis, como ventilação e até o quanto o piloto escuta do som ambiente.

Pode haver, também, questões sentimentais. Felipe Massa contou certa vez que passou a usar o Schuberth por instrução da Ferrari e depois seguiu fiel porque o capacete salvou sua vida no acidente da Hungria. Já Daniel Ricciardo revelou que a Red Bull pede que seus pilotos usem Arai porque é o modelo utilizado em seu túnel de vento. Não é a mesma política da Mercedes, que tem Hamilton com o Bell (o inglês, aliás, criticou a ex-parceira Arai publicamente ao dizer que faltava desenvolvimento ao capacete deles, quando os trocou pela Bell em 2016) e Bottas com a jovem empresa italiana Stilo, conhecida por ter os capacetes mais leves do mercado e por oferecer atendimento VIP por ter menos clientes que as demais.

Quanto custa a “armadura”?

Na Fórmula 1, os pilotos têm acordos com suas marcas favoritas, que ganham espaço de publicidade nos macacões e capacetes. Mas quem quiser se vestir como um piloto de verdade, terá de desembolsar algo em torno de R$ 9.000 (contabilizando 860 pelas roupas de baixo, 6 200 pelo macacão, 1.330 pela bota, 300 pelas luvas, 185 pela balaclava, 100 pelas meias). Isso, sem contar em um investimento de 40 a 50 mil reais no capacete de padrão F-1.

Villeneuve: O trágico fim do “hooligan milagreiro”

“Nenhum ser humano consegue fazer milagres, mas Gilles fazia você imaginar que é possível”, disse certa vez Jacques Laffite. “O último grande piloto – o resto de nós é um bando de bons profissionais”, endossou Alain Prost. Ou um “hooligan que jamais teria sido campeão do mundo”, como o considera Eddie Jordan. Ou mesmo um pouco dos dois. O fato é que poucas vezes um piloto que venceu apenas seis provas em sua carreira na F-1 despertou tantas paixões quanto Gilles Villeneuve, que perdia a vida em um acidente dia 8 de maio 36 anos atrás.

A lista dos feitos do único piloto que o comendador Enzo Ferrari considerou comparável ao lendário Tazio Nuvolari é longa. Em um treino livre no GP dos EUA em 1979, o piloto que viria a ser campeão naquele ano, Jody Scheckter, terminou uma volta sob forte chuva acreditando de que tinha sido rápido. E descobriu que o companheiro Villeneuve fora 10s mais rápido.

Em Mônaco, também sob chuva, no ano seguinte, o canadense andou 5s mais rápido que os rivais mesmo com uma Ferrari que ficara devendo naquele ano e com pneus slick.

Em 1981, em Jarama, circuito travado, segurou carros mais rápidos por 50 voltas, no que Gordon Murray classificou na época como a melhor pilotagem que já tinha visto.

Isso, só para ficar em algumas narrativas daquele que foi um dos protagonistas do que é considerado o maior duelo roda a roda da história da F-1.

O que há de comum entre todas as narrativas sobre Villeneuve é a agressividade, algo que reaparecia toda a vez que ele pegava no volante. “O jeito mais fácil de encontrar o limite é ir cada vez mais rápido até você passar do ponto”, defendia. Nunca me esqueço de uma passagem do livro de Sid Watkins em que ele narra um passeio de carro com Gilles, em que sua esposa, Johanne, entrou na parte de trás e se deixou no assoalho, com toda a naturalidade do mundo. Era o jeito mais seguro de pegar carona com Gilles e Watkins logo entendeu por quê.

http://www.youtube.com/watch?v=wW36MiuRlk8

Curiosamente, toda essa agressividade desaparecia quando não era necessário acelerar. Villeneuve sempre foi conhecido entre seus pares por sua integridade – e até por isso sua morte teve traços ainda mais dramáticos. Contrariando a teoria de Jordan, o canadense teve chance de título, ainda que remota, em 1979. Porém, ao seguir as instruções da Ferrari e não ultrapassar Scheckter durante o GP da Itália, deu adeus a suas possibilidades com duas corridas para o fim.

Até por isso a atitude de seu então companheiro, Didier Pironi, no GP de San Marino de 1982, de desobedecer uma ordem semelhante e ultrapassá-lo, fez com que Villeneuve dissesse que jamais voltaria a falar com o amigo. O acidente em Zolder, duas semanas depois, quando Villeneuve tentava bater o tempo 0s1 mais rápido do próprio Pironi, acabou com qualquer chance de entendimento entre os dois.

Mas teriam os feitos de Villeneuve sido aumentados pela morte prematura e por seu estilo showman? Quem o viu na pista diz que o que sempre chamou a atenção foi como ele sempre parecia carregar muito mais velocidade que os rivais, o que explica por que, às vezes, tirava absolutamente o máximo do carro, e outras ia parar no muro. Mas sempre mergulhava em todas as oportunidades possíveis. Seu estilo também quebrou muitos motores e a diferença que o piloto pode fazer por meio da maneira como comanda o volante é bem menor hoje devido à eletrônica, e essa combinação nos leva a crer que nunca veremos um novo Gilles Villeneuve na F-1 novamente. Mas, se houvesse, como nos 70 e 80, seria um dos favoritos da torcida.

F-1 busca mais ultrapassagens em 2019. Entenda como

Ninguém deu muita atenção para a votação das novas regras logo após o GP do Azerbaijão por um simples motivo: nem mesmo a Liberty Media acreditava ter votos suficientes – precisava de pelo menos 18 de um total de 25 – para aprovar, de última hora, mudanças que visam facilitar as ultrapassagens. Mas o apoio inesperado das clientes de Mercedes e Ferrari acabou sendo suficiente e, dois anos depois de adotar um conjunto de regras bastante polêmico justamente por ir na contramão de tudo o que se sabia sobre ultrapassagens, a Fórmula 1 faz um mea-culpa.

Algumas mudanças já tinham sido acertadas, como o fim dos “penduricalhos” na parte superior da asa dianteira, defletores mais baixos entre as rodas, o aumento do escapamento para evitar o uso dos gases para fins aerodinâmicos, e a separação entre o peso do piloto (fixado em 80kg) e o peso mínimo do carro (733kg).

Na semana passada, foi definido um segundo pacote, que é resultado do trabalho do grupo de ultrapassagem, que utiliza a estrutura das equipes para testar soluções, e consiste em mais mudanças na asa dianteira, no eixo dianteiro e na asa traseira. Tudo para diminuir o efeito do ar “sujo” no carro do piloto que persegue um rival. Simples? Bom, as equipes teriam recebido um documento com nove páginas especificando quais as mudanças!

Os estudos mostraram que, hoje em dia, dois grandes redemoinhos são formados na traseira do carro, como resultado de todo o downforce que ele produz. Então fica fácil entender por que o carro que vem atrás, projetado para trabalhar com o ar limpo, perde estabilidade, impedindo que o piloto se aproxime para tentar a ultrapassagem.

A ideia das novas asas é limpar isso. E isso começa na dianteira porque parte desse efeito vem do ar canalizado por pela asa e que passa pelo difusor.

Os detalhes estão sendo conhecidos aos poucos: a asa dianteira mais 2.5cm de profundidade e terá também mais superfície total (o limite para a parte central subiu em 10cm). Os elementos da asa só podem ter cinco tipos de desenhos diferentes e eles não podem estar sobrepostos, como nos efeitos cascata que temos hoje. Isso representa o corte de dois terços dos desenhos que temos hoje nas asas mais avançadas. Slots que direcionem o ar para o lado de fora da asa também estão proibidos.

A mesma ideia de minimizar as “curvas” do ar que passa pela parte dianteira está por trás da proibição de fluxo pelo eixo dianteiro. Ou seja, aqueles dutos de freio complicados de hoje vão dar lugar a simplesmente peças que esfriem o sistema de frenagem.

Na parte traseira, a asa fica 25,4cm mais larga e 5,08cm mais alta (esses números estão em polegadas na regra). Isso, em conjunto com as medidas tomadas na dianteira, tornam a asa traseira muito mais efetiva na geração de pressão aerodinâmica. O DRS, inclusive, será mais poderoso, pois a distância entre as das lâminas vai de 65 para 85mm quando o asa móvel estiver ativada, diminuindo ainda mais o arrasto.

Não se trata, portanto, de uma revolução como a de 2017, mas da adoção de um conceito distinto para as asas que trará dados importantes para direcionar os engenheiros para, aí sim, algo mais significativo, em 2021. Então por que não se sabia se as equipes concordariam? Existe, como sempre, o temor do aumento dos gastos, pois todas as simulações de CFD terão de ser refeitas, além de toda mudança de regra dar a chance dos times com orçamentos maiores aumentarem ainda mais sua vantagem.

Estratégia do GP do Azerbaijão e o pênalti

Quando vejo alguém dizendo que uma corrida cuja história muda após um Safety Car envolve puramente sorte, lembro da eterna discussão sobre cobranças de pênalti. Acertar uma cobrança sob extrema pressão tem a ver com tranquilidade emocional, que tem um ingrediente pessoal, mas é fundamentalmente algo que vem da confiança que o jogador tem porque treinou bastante, estudou o goleiro, e sabe o que tem de fazer.

A analogia para as corridas é válida. Há corridas em que as equipes desenham suas estratégias antevendo um Safety Car. É claro que não se pode prever com exatidão quando ele vai aparecer, mas em alguns momentos as possibilidades são maiores: nas primeiras voltas, quando os carros estão mais próximos, e no final de provas que permitem estratégias diferentes, pois pilotos estarão encontrando-se na pista com ritmos bem distintos.

Isso é algo que dá para prever de antemão. Quem estava ligado na transmissão da BandNews me ouviu dizer ainda no grid que “a corrida é de uma parada fácil, mas a pista é complicada, então é uma prova em que os engenheiros têm de olhar mais para a pista do que para seus computadores.”

E quem estava olhando a pista percebeu o quanto que os pilotos estavam sofrendo com a falta de aderência no pneu macio, que tem uma janela de temperatura mais alta que os outros dois compostos disponíveis. Tudo tinha começado na seleção dos pneus: as equipes acreditaram que o ultramacio seria o preferido na corrida e deixaram os super meio de lado. E, como a diferença entre o ultra e o super era pequena e o segundo é mais resistente, acabaram ficando sem jogos suficientes para a prova, tendo de recorrer ao macio.

Dentro de todo esse cenário de compostos e SC, o melhor seria usar o supermacio no Q2, fazer uma longa primeira parte da corrida com ele e depois colocar o ultramacio no final. Raikkonen errou na classificação e jogou essa possibilidade no lixo ainda no sábado. Os dois pilotos da Red Bull, com problemas para carregar a bateria, já ficaram fora de combate logo de cara. Lewis Hamilton começou a ver as temperaturas de seu supermacio caírem abaixo do ideal relativamente cedo, cometeu erros e acabou tendo de antecipar sua parada. “Naquele momento achei que estava fora da luta”, admitiu depois.

A parada na volta 22 surpreendeu a Ferrari, que começou a discutir com Vettel fazer a melhor tática – ficar na pista esperando um SC e colocar ultramacios se ele acontecesse na parte final da prova – mas após algumas voltas Hamilton começou a melhorar seus tempos com o macio e o alemão decidiu parar, na volta 30. Não foi uma decisão completamente errada, mas certamente conservadora, que surpreendeu a própria Mercedes.

Isso deixou Valtteri Bottas com a missão de fazer os supermacios funcionarem e durarem mesmo em um carro que não estava tratando-os bem. E o finlandês fez isso com primazia. Seu stint de 40 voltas em condições difíceis foi muito forte, e no fim ele estava andando mais rápido que Hamilton com macios bem mais novos. Esperou o SC chegar pois a possibilidade disso acontecer era gigante. E ele veio. O quanto de sorte existe nisso?

Mesmo em um cenário sem o Safety Car, a corrida tinha um fim indefinido. Não pela vitória, mas pelo segundo lugar, pois Bottas voltaria com ultramacios a 1s de Hamilton com macios desgastados em condições normais. Vettel estaria 8s na frente, com 10 voltas para o fim, então seria improvável uma briga pela vitória.

Mas os 13s que tinha em relação a Vettel no momento do SC já eram suficientes para que ele voltasse na frente do alemão, o que explicou a troca de pneus do alemão e de Hamilton. Com ultramacios na relargada, Vettel julgou mal o aquecimento de pneus e freios quando já estava bem frio no fim de tarde em Baku, e saiu da briga. E o resto é história.

Drops do GP do Azerbaijão e a cabeça de piloto

Baku vai conquistando a F-1. Um lugar fácil para as equipes trabalharem, em que há o interesse de receber a categoria, em uma pista que fica bem no vídeo e tem os muros sempre perto, prontos para gerar confusões nas corridas. Mas tudo tem seu preço. Quando o contrato de 10 anos foi assinado, a posição de barganha da F-1 era grande e os azeris aceitaram pagar 60 milhões de dólares por ano, entre os maiores valores do calendário. O contrato previa uma renegociação depois de três anos, em que qualquer uma das partes pode romper. E agora é claro que os organizadores pressionam por uma redução de custos.

 

E a Liberty Media pode não ter tantos motivos assim para ceder, uma vez que o governo norte-americano estaria questionando o envolvimento de certas pessoas na organização, situação parecida com o que está acontecendo em Sochi e pode tirar a prova do calendário. Seriam perdas muito significativas, pois trata-se das duas que mais pagam para receber a F-1.

 

Os problemas não param por aí. As dúvidas em relação à concretização da prova no Vietnã parecem ter fundamento, com um certo sumiço dos organizadores de lá.

 

Algumas candidaturas, por outro lado, estão ganhando força. Fala-se em Miami, Buenos Aires e Copenhagem aparecendo calendário se não em 2019, pelo menos em dois anos, e existe a vontade de aproveitar a febre Verstappen na Holanda.

 

Mas isso significa um calendário com 25 corridas ou algo do tipo? Além da questão de Baku e Sochi, a Alemanha é sempre uma prova ameaçada, há conversas sobre problemas já aparecendo com os franceses e Silverstone cancelou a extensão de seu contrato ano passado, então se não conseguir uma negociação melhor o GP por lá não passa do ano que vem. Isso sem falar no Brasil, que perdeu sua situação de barganha com Ecclestone fora, a questão da segurança, que ainda é muito comentada no paddock, e uma rival tão próxima quanto a Argentina.

 

Só para explicar como a cabeça dos pilotos funciona, uma história curiosa. O tailandês/britânico Albon ganhou a primeira corrida da F-2 e é um piloto geralmente muito elogiado pelos outros de sua geração, que dizem que ele é melhor que Charles Leclerc. Esteban Ocon explicou o porquê: os Verstappen não gostam de Leclerc porque ele jogou o Max para fora da pista uma vez no kart, e meu problema com ele é por causa de uma menina.

 

O próprio Ocon tem outra inimizade no grid, Gasly. Eles eram muito amigos até, segundo o piloto da Force India, “eu começar a ganhar dele sempre”. Há quem diga que o motivo é outro.

 

Falando em um motivo que parece, mas não é, chama a atenção a baixa velocidade de reta da McLaren nas primeiras corridas. Isso indica que, primeiramente, o motor Honda não era o único responsável pela falta de velocidade do time, como também mostra que toda a propaganda sobre o “segundo melhor chassi do grid segundo as medições de GPS em pista de baixa velocidade” na verdade é um carro que gera muito mais arrasto do que deveria.

 

Enquanto isso, a Honda já começou as negociações para ceder motores à Red Bull a partir do ano que vem.

 

Falando no futuro das equipes, depois de sondar a compra da Force India, papai Stroll agora tenta viabilizar um plano para tornar a Williams tão ligada à Mercedes como a Haas é com a Ferrari. Até porque ele já percebeu que, no que depender dos profissionais que estão na equipe no momento, vai jogar dinheiro fora.

 

Voltando a Baku, já imaginou o que passou pela cabeça de Ross Brawn quando ele viu a batida entre Verstappen e Ricciardo? “Ele não pode mudar de trajetória duas vezes… ou pode?” As regras acabaram ficando tão vagas a esse respeito que nem ele sabe.

 

E para acabar com um toque humano, se eu que desci para a zona de entrevistas com umas cinco voltas para o final já quase congelei, imagine os repórteres e câmeras de TV que ficaram lá desde a largada, com uns 15 graus de temperatura e vento gelado na cara? Quando o último piloto, Lewis Hamilton, chegou, mais de 1h depois do fim da corrida, Mariana Becker já batia os dentes. Literalmente mesmo! A ponto do inglês parar por um instante de falar e colocar suas mãos na dela para ajudar a esquentar. Quem disse que a F-1 é um mundo frio?

Coisas de Baku

Foi impossível não lamentar o furo de pneu de Valtteri Bottas a duas voltas do final do GP do Azerbaijão. Afinal, com uma pilotagem muito precisa, ele foi o único do (então) top 3 que não travou os pneus e saiu da pista em nenhum momento sob condições bem difíceis na já dura Baku, ao mesmo tempo em que fazia os pneus supermacios suportarem 40 voltas. E ainda por cima estava rápido por todo o stint. Sim, se a vitória – e a liderança do campeonato – tivessem ficado com ele, seria pelo SC. Mas da mesma forma, por todos os motivos acima, era ele quem estava nessa posição e não Lewis Hamilton.

Até por isso o inglês fez o generoso gesto de atrasar a cerimônia do pódio para ir falar com o companheiro. Nas últimas duas corridas, ele sabe que foi batido por Bottas, que evoluiu de uma maneira que poucos no paddock previam.

Evolução essa que vem em um carro complicado de pilotar, repetindo um padrão que vimos na primeira metade do ano passado. A Mercedes evoluiu consideravelmente no entendimento de sua máquina ao longo do final de semana no Azerbaijão e, pela reação de Hamilton após a prova, chegou a uma conclusão alarmante: não é só uma questão de adaptação aos pneus, o conjunto no momento simplesmente não é suficientemente forte para ganhar o campeonato. E essas são palavras do próprio líder do campeonato.

Isso talvez explique a calma de Vettel. Ainda que este seja outro traço similar a 2017, quando mesmo na lavada do GP da Itália o alemão só queria ver o lado positivo. Mas agora há também algo de concreto: não há dúvidas de que a Ferrari, no momento, é melhor em classificação. Na corrida, a vantagem diminui, mas ainda existe.

Dito isso, pela segunda corrida seguida Vettel falha em traduzir esse bom momento em pontos. Na China, por um encontro com o furacão Verstappen. Em Baku, por julgar mal a freada com pneus e freios frios. Certamente não é o ideal quando se luta com um piloto consistente como Hamilton.

Falando no furacão, ele parecia determinado a calar os críticos, defendendo-se por boa parte da prova justamente daquele que deu aula de ultrapassagem há duas semanas. Até que os dois arriscaram demais. Ricciardo sabia que perderia pressão aerodinâmica chegando tão perto do companheiro, mas ficou indeciso depois de Verstappen mudar sutilmente de trajetória por duas vezes. Algo que é sua marca, e é extremamente perigoso.

É um dos problemas para a Red Bull resolver. O time não conseguiu mostrar o ritmo dos treinos livres na corrida por um problema de bateria, jogando luz no calcanhar-de-Aquiles que é o complexo motor Renault, o qual só ganhará um upgrade em junho e certamente renderá punições ao longo do ano. Não é por acaso que o time já está de olho em seu futuro: a primeira reunião com a Honda foi em Baku.

Falando em Honda, o GP do Azerbaijão escancarou que parte considerável da falta de velocidade de reta da McLaren tem mesmo a ver com o carro, que produz arrasto em excesso. Enquanto a Red Bull, que mudou de filosofia neste ano, estava no topo da speed trap com o mesmo motor, Alonso e Vandoorne se arrastavam.

A queda da McLaren e da Haas em Baku ajudou, mas nada tira o mérito do final de semana fortíssimo de Charles Leclerc, piloto que será interessante de se observar nas próximas etapas. Depois da classificação ele disse que antes estava tentando acertar o carro de uma maneira que não funciona na F-1.

Seria o monegasco descoberto o caminho das pedras para a Sauber, da mesma forma que a Williams andou muito melhor neste final de semana, ou tudo faria parte da mágica de Baku? Ao ver uma Force India que chegou ao Azerbaijão sonhando com pontos chegar ao pódio, em uma pilotagem muito forte de Sergio Perez nas últimas voltas, não custa perguntar.

Confira o placar entre companheiros e as diferenças na classificação do Azerbaijão

Hamilton 2 a 2 Bottas
Vettel 3 a 1 Raikkonen
Verstappen 3 a 1 Ricciardo
Perez 3 a 1 Ocon
Hulkenberg 4 a 0 Sainz
Stroll 2 a 2 Sirotkin
Gasly 2 a 2 Hartley
Alonso 4 a 0 Vandoorne
Leclerc 2 a 2 Ericsson
Grosjean 1 a 3 Magnussen

Diferenças de hoje:

Hamilton x Bottas: os160

Vettel x Raikkonen: 1s049

Verstappen x Ricciardo: 0s083

Ocon x Perez: 0s024

Hulkenberg x Sainz: 0s285

Stroll x Sirotkin: 0s301

Alonso x Vandoorne: 0s479

Gasly x Hartley: sem tempo

Magnussen x Grosjean: sem tempo

Leclerc x Ericsson: 1s789

As diferenças são calculadas nas sessões em que o companheiro com classificação pior é eliminado e os placares contabilizam o resultado do treino, e não a posição de largada, que pode ser alterada devido a punições.

Por dentro da F-1 e do “cérebro” padronizado dos carros

Dá para dizer que todos os carros da F-1 pensam da mesma forma, e têm ideias McLaren. Brincadeiras à parte, o fato é que, há 10 anos, desde que o controle de tração foi banido, a FIA adotou uma central eletrônica, a chamada ECU padronizada, com o intuito de controlar toda a atividade eletrônica dos carros, aumentar a segurança e baixar custos. Ao longo dos anos, a ECU foi ganhando poderes e permitiu a adoção de sistemas como o DRS e o alerta de bandeiras amarelas e SCs por meio de luzes no cockpit.

Com tantas atribuições, o ECU acaba gerando até 0.5 megabyte de informações por segundo, o que significa que um carro gera de 2 a 3 terabytes por temporada.

O equipamento é desenvolvido pela McLaren Electronic Systems, que é um dos braços do McLaren Group, assim como a equipe de F-1. Ele foi escolhido após a FIA ter convidado todos os fabricantes de produtos eletrônicos automotivos a disputarem uma concorrência em 2006.

A unidade de potência, o câmbio e tudo o que o piloto pode controlar dentro do carro tem que estar conectado à ECU para que a FIA capte todas as informações. Com elas, sabe-se se algum time está tentando usar ajudas eletrônicas mascaradas por outros comandos e também são tomadas decisões no caso de punições. Foi com esses dados, por exemplo, que a FIA determinou que Hamilton não fez um brake test em Vettel em Baku um ano atrás, como o alemão argumentava.

Os dados são acessados simplesmente plugando o carro a um notebook. Outras informações são obtidas por meio da telemetria, passada em tempo real por uma frequência determinada pela FIA em cada local.

 

ECU e o DRS

A ECU é importante também para a comunicação da FIA com o piloto, pois é por meio dela que são liberados os acionamentos de DRS. Assim que os computadores verificam que o piloto está a menos de 1s do rival no ponto de detecção, ele recebe um comando luminoso no painel e aciona o botão de abertura da asa. Assim que aciona o freio, a asa volta ao normal.

Mas e se o sistema falhar? O regulamento prevê que a equipe pode assumir a função de avisar o piloto momentaneamente, até o sistema voltar. Existe, porém, um sistema auxiliar para prevenir que isso ocorra.

Além do DRS, o ECU também permite que a FIA informe os pilotos sobre a situação de pista, e por isso todos os volantes têm de ter luzes vermelhas, amarelas e verdes. A centralina também ajuda a controlar a velocidade em períodos de SC Virtual, quando os pilotos recebem um delta de tempo que têm de respeitar.

Outro ponto curioso da regra do ECU é que ele congela algumas funções logo após largadas e pit stops para evitar mudanças na embreagem e na unidade de potência que possam caracterizar algum tipo de ajuda eletrônica ao piloto. A centralina também tem funções menos “nobres”, como indicar o início de uma volta, uma parada nos boxes ou uma largada queimada.

 

ECU e a segurança

Muitas vezes vemos que o piloto saiu sem qualquer problema do carro após uma batida, mas mesmo assim passou pelo centro médico logo que chegou no paddock. Isso porque os carros são obrigados a ter um sistema que calcula a desaceleração no caso de colisão. Se ela passa de 5G, uma luz se acende no painel indicando ao piloto que tem é obrigado a passar por checagem médica.

As luzes que indicam um acidente mais forte não aparecem apenas para o piloto, mas também do lado de fora do cockpit, próximo ao botão de acionamento externo da embreagem e exaustor (onde sempre há a letra E gravada), a fim de que a equipe de resgate receba rapidamente essa informação.

Mas a ECU não trabalha sozinha no caso de acidentes. O carro tem ainda o chamado gravador de dados de acidentes (accident data recorder), em outras palavras a caixa-preta de um de F-1, ligado a dois acelerômetros de 500G e localizado na célula de sobrevivência. Ele é alimentado por energia elétrica por meio dos sistemas de recuperação do carro.

O ADR também é padronizado pela FIA e é alimentado ainda por acelerômetros instalados nos protetores auriculares dos pilotos e por uma câmera de alta velocidade direcionada para a cabeça do piloto.

Estas duas últimas fontes de informação são relativamente novas e começaram a ser usadas em 2016. Dados coletados por elas foram fundamentais, por exemplo, para o desenvolvimento da estrutura do halo, e mostraram dados impressionantes, como os 46G de pico de força no acidente de Alonso na Austrália daquele ano.

 

P.S: Pesquisando no regulamento técnico sobre a ECU, encontrei o seguinte trecho: “Radiação eletromagnética entre 2.0 e 2.7GHz está proibida, salvo quando houver consenso em escrito por parte da FIA.” Algum engenheiro de plantão arrisca explicar o porquê?

As tragédias e talentos do Dr. Marko

O hoje todo poderoso consultor da Red Bull Helmut Marko é contemporâneo de outro austríaco famoso, Jochen Rindt, mas sua (curtíssima) história na F-1 começou apenas depois do ex-colega de escola ter se tornado o único campeão póstumo da história da categoria, em 1970. O motivo? O título de Doutor Marko, que não é mera formalidade: o aniversariante do dia 27.04 é doutor em Direito pela Universidade de Graz.

Os estudos atrasaram sua carreira no automobilismo mas, um ano após a morte de Rindt, Marko foi campeão das 24h de Le Mans. Isso lhe rendeu um convite da McLaren, mas ele não conseguiu se classificar para o que seria seu primeiro GP por uma falha na bomba de combustível. Marko, então, tentou a sorte com a BRM, equipe com a qual fez quatro corridas em 1971.

Justamente na prova em que finalmente estava conseguindo mais visibilidade, em 1972, na França, quando tinha se classificado na terceira fila e vinha andando em quinto, uma pedra voou do Lotus de Emerson Fittipaldi e atingiu seu visor, quebrando-o e fazendo com que o piloto perdesse um olho, e nunca mais corresse na F-1.

Isso, no entanto, não encerrou sua carreira no automobilismo e Marko começou a apoiar jovens pilotos austríacos e alemães e passou a ter equipes próprias, primeiro nos protótipos e depois na DTM e fórmula.

Hoje sabemos que ser protegido de Marko é um bom negócio, mas não foi sempre assim: seu primeiros pilotos tiveram fins trágicos. Helmuth Koinigg foi o primeiro deles e morreu no GP dos EUA em 1974. Hans Georg Burger e Markus Hottinger o seguiram e tiveram o mesmo fim em provas de F-2 nos anos 80.

Seu primeiro caso real de sucesso foi com Gerhard Berger, ainda que isso não tenha acabado totalmente com a sina dos pilotos de Marko, que apoiou Karl Wendlinger na F-3, antes do piloto quase morrer e encerrar a carreira na F-1 após um forte acidente em Mônaco em 1994.

Nos anos 90, contudo, ele já tinha a equipe RSN Marko, que colecionou títulos na F-3 e na antiga F3000. Tal time chegou a contar com Juan Pablo Montoya, mas a relação com Marko não durou muito.

Foi em 1999 que começou a relação com a Red Bull, ainda na base. E o primeiro talento recomendado por Marko foi Enrique Bernoldi, o que fez o dono da marca, Mateschitz, cobrar o nome do brasileiro na equipe que então pretendia comprar na F-1, a Sauber, de tal maneira que acabou encerrando a relação com o time, pois Peter Sauber queria um desconhecido Kimi Raikkonen. Mas foi apenas em 2004 que a Red Bull comprou, de fato, uma equipe, a Jaguar. Nesse meio tempo, a empresa já tinha um extenso programa de jovens, com 14 pilotos assinados, e tinha passado o desenvolvimento para o time de um tal de Christian Horner na F3000.

Mas isso significa que Marko deixou de ter importância? O próprio Berger descobriu que não era bem assim. Quando o ex-Ferrari assumiu a Toro Rosso, estava do lado de Vitantonio Liuzzi, enquanto Sebastian Vettel era o protegido de Marko. E quem subiu para a Red Bull? Para muitos, isso explica porque, por exemplo, Marko atacou duramente Mark Webber quando o australiano e Vettel bateram no GP da Turquia de 2010. E Horner, que não é bobo, também ficou no lado do piloto que, na verdade, causou o acidente.

Estratégia do GP da China e a bobeada da Ferrari

O GP da China mostrou que o equilíbrio deste início de temporada na Fórmula 1 é tão grande que um Safety Car pode virar completamente a mesa. Antes dele, na volta 31, a prova tinha um desenho: Bottas e Vettel fariam uma corrida tática até as voltas finais e, se conseguisse manter seus pneus em bom estado, o que não parecia um desafio tão grande assim com os macios, o finlandês levaria. Mais atrás, Hamilton parecia seguro em relação ao ataque das Red Bull e de Raikkonen.

Foi então que chegou o momento crucial da corrida – e talvez uma lição sobre esses pneus para os estrategistas.

Fazia calor em Xangai, a temperatura da pista estava bem acima dos 30 graus, e nestas circunstâncias o esperado seria o médio andar bem e o macio acabar caindo após poucas voltas, perdendo a vantagem de performance. “Não acreditamos, baseados nas evidências que tínhamos, que haveria uma diferença de performance suficiente para que um pneu macio ultapassasse um médio com 10 voltas a mais”, explicou o chefe de estratégia da Mercedes, James Vowles.

Nesse cenário, é normal proteger a posição de pista, e foi por isso que Ferrari e Mercedes decidiram manter seus pilotos na pista. Quanto mais duro o pneu, mais alta a janela de temperatura em que ele funciona melhor e a avaliação era de que, naquelas condições, o macio acabaria trabalhando acima dessa janela e perdendo rendimento ao longo das voltas.

Obviamente, não foi isso que aconteceu: as duas Red Bull – uma precisa, outra errática – vieram babando para cima de Hamilton, Vettel e Bottas e o resto é história do que deveria ter sido uma dobradinha do time anglo-austríaco. E eles devem ter ficado orgulhosos da decisão arriscada de fazer um pit stop duplo justamente para não prejudicar a corrida de nenhum de seus pilotos. Se tivessem escolhido aquele que vinha à frente, potencialmente teriam saído da China de mãos vazias.

A bobeada da Ferrari

expliquei aqui por que a Mercedes escolheu largar com os macios e como a Ferrari entendeu qual era a tática cedo o suficiente para reagir. Mas a boa leitura ferrarista parou por aí, dando uma bobeada que no final acabou deixando Vettel em posição vulnerável.

Na volta 18, Hamilton fez sua parada e deu a dica de que Bottas, que vinha em segundo a 3s5 de Vettel e já tinha recebido a instrução de acelerar, pararia logo em seguida. A Ferrari, contudo, não reagiu imediatamente chamando Vettel aos boxes, subestimando o poder do undercut.

Não há nenhuma explicação lógica para isso. Desde o início da prova, Gasly e logo depois Alonso vinham andando muito bem com os médios e estava claro que eles fariam a diferença na hora da parada. Com pneus novos e fazendo uma outlap perfeita, Bottas assumiu a ponta.

O time italiano, que vem lendo bem as estratégias nos últimos anos, desta vez foi conservador demais e ainda jogou fora a estratégia de Raikkonen para tentar consertar o erro. A corrida do finlandês já tinha sido comprometida pelo próprio Vettel na largada, quando ele o obrigou a tirar o pé, efetivamente colocando Bottas entre os dois. E depois Kimi ficou na pista para atrapalhar o compatriota, que não tomou conhecimento em uma bela manobra por fora.

Em uma corrida de reviravoltas, Verstappen acabou devolvendo Raikkonen a sua posição inicial. A diferença, para a Ferrari, é que seu piloto número um não estava lá para desfrutar do champanhe ao lado do companheiro.

Drops do GP da China e a tiete

Eu e “ele”

Não tem quem não goste de Daniel Ricciardo. E, quando ele faz uma corridaça como na China, não poderia ser diferente: o australiano foi aplaudido pelos jornalistas quando entrou na zona de entrevistas, ainda segurando seu troféu, visivelmente emocionado. E sem uma das botas.

 

Alguns minutos antes, outra cena que também contou parte da história da corrida: logo depois dos dois saírem do carro, Max Verstappen correu até Sebastian Vettel, o pegou pelo braço e fez questão de pedir desculpas. Que foram aceitas. Nas respostas, Max, que geralmente fica agressivo quando erra, desta vez estava calmo e demonstrou entender que não está fazendo nenhum bem a si mesmo.

 

O sucesso do próprio companheiro, que largou atrás dele e estava na mesma estratégia, gera um golpe duplo para ele. E o holandês ainda teve que testemunhar a alegria de Ricciardo no lounge do aeroporto e no voo de volta. Cercado pelo pessoal da F1 e com duas garrafas de vinho na mão, Daniel pediu licença: “Preciso muito comemorar essa.”

Com um final de semana correndo no Bahrein e, logo em seguida, em Xangai, a única certeza da viagem era que você encontraria alguém da F1 no aeroporto. Tem quem encare isso numa boa, tem que parece ter pavor desses encontros, como Lewis Hamilton. Vestido com uma chamativa calça amarela, capuz e boné, não exatamente a melhor roupa para passar despercebido, ele saiu correndo quando percebeu as primeiras pessoas conhecidas chegando para esperar a mala. O serviço teve que ficar com sua assistente, Angela.

 

O inglês estava no meu voo, daqueles que claramente preferem a China ao Bahrein: saindo 2h30 da segunda de Manama e chegando à noite em Xangai. Sinceramente não sei qual o apelo extra que o deserto pode ter em comparação a uma cidade tão vibrante, mas muita gente prefere ir à China o mais tarde possível.

 

Não que a China seja o melhor lugar do mundo. É interessante na mesma medida em que é cansativo, pois vários pequenos obstáculos vão aparecendo no dia a dia, muitas vezes causados pelo idioma. Na quarta-feira tive uma surpresa bem desagradável: depois de passar dois dias em Xangai, me mudaria para um hotel mais próximo do circuito, em Jiading. Mas quando cheguei tinham cancelado minha reserva e vendido meu quarto. Nem é preciso dizer o quão difícil é encontrar um hotel razoavelmente barato para um final de semana de corrida em cima da hora.

 

Quem estava se divertindo na China era Pierre Gasly, pegando carona no grande resultado do Bahrein. O francês arrancou gargalhadas dos jornalistas quando disse que a mensagem no rádio de “agora podemos lutar”, imitando Alonso, tinha sido apenas uma “yoke”. O que isso significa? Bom, é como o próprio Alonso pronuncia a palavra brincadeira em inglês.

 

Falando em McLaren, os jornalistas também não puderam evitar os risos, ainda que contidos, quando Eric Boullier disse que o time estava bem, era só o carro “ganhar velocidade nas retas e nas curvas”. Oi?

 

O fim de semana também teve uma tentativa de aumentar a popularidade da F-1 na China, com o segundo F1 Live realizado. Ao contrário do megaespetáculo de Londres em julho do ano passado, esse evento não foi comandado pela Liberty Media por questões burocráticas chinesas. Foi um evento da patrocinadora, Heineken, algo facilitado pelo fato da empresa já ter operação na China.

 

Até por isso foi mais um evento de música do que propriamente de F-1, e tenho minhas dúvidas se realmente agregou algo à categoria, com a demonstração de carros que eram qualquer coisa a não ser um F-1 de verdade, estacionados em um canto na rua no centro de Xangai. A intenção da Liberty era fazer algo mais grandioso e isso deve ser tentado no próximo ano. Mas, como o mundo da F-1 já aprendeu em 15 anos de China, nada é tão fácil quanto parece por lá.

Pelo menos eu lucrei com o esforço dos patrocinadores, que devem ter pago um cachê de cerca de 500 mil dólares para ter o DJ Armin van Buuren em Xangai por três dias. Quem ouviu a transmissão da Band já sabe o tanto que sou fã dele e é muito legal quando alguém que você admira te trata muito bem. Fiquei pensando, fora do esporte, que figura que poderia aparecer em um GP do mesmo nível do Armin para mim. Só os irmãos Gallagher. Mas aí o tratamento certamente já seria outro 😉

Terceiro poder

Será que o GP da China foi apenas a primeira vez em que Mercedes, Ferrari e Red Bull puderam medir forças de igual para igual? Perguntei isso a Kimi Raikkonen e até mesmo o finlandês de poucas palavras levou mais de um minuto para responder. Basicamente para dizer que ninguém sabe e o quanto toda essa indefinição é boa para o esporte.

Essas três primeiras pistas do campeonato têm uma parcela de culpa em toda essa indefinição. Com aderência baixa, Melbourne diz pouco. O calor do Bahrein não costuma se reproduzir muitas vezes na temporada. E circuitos, “front limiteds” como a China, ou seja, que geram desgaste de pneus mais forte na dianteira do que na traseira, são raridade no calendário.

Mas alguns padrões começam a aparecer. A Mercedes focou na pré-temporada na preparação com o pneu médio e usou um pouco o macio, nunca se preparando para classificação. Segundo Toto Wolff, a ideia era atacar o ponto fraco. Mas ao que parece isso deixou a equipe exposta a um crescimento da Ferrari em classificação.

A vantagem do modo de motor já não parece existir. O próprio Vettel explicou que a aberração de Melbourne não foi por conta do motor, como ele mesmo suspeitou na época. E o carro do alemão trabalha melhor os pneus mais macios, enquanto os Mercedes os superaquecem.

Isso, a ponto de, na China, a Mercedes deixar claro desde a sexta-feira que ia evitar os ultramacios a todo custo, apostando em uma parada com a combinação macio-médio. A Ferrari jogou na mesma moeda.

Uma bobeada da Ferrari ao demorar para parar Vettel e uma boa corrida de Bottas (enquanto Hamilton, como ele mesmo admitiu, estava completamente perdido com o carro) teriam feito a tática dar certo, até porque o ritmo de corrida da Mercedes com o médio é superior. Mas aí entrou o “terceiro poder”.

Com os ultramacios, provavelmente a pior escolha em um dia de pista quente em Xangai (o pneu mais macio trabalha em uma janela de temperatura mais baixa), a Red Bull aparentemente conseguiu se manter no páreo na primeira parte da corrida pela necessidade dos rivais dosarem o ritmo para conseguirem fazer a estratégia de uma parada funcionar. Mas isso também os deixou expostos a um Safety Car.

Curiosamente, enquanto na Austrália foi a Ferrari Júnior que gerou o SC que ajudou Vettel, agora foram as duas Toro Rosso que se tocaram. E deram a chance da Red Bull arriscar uma parada dupla para deixar seus dois pilotos não apenas com compostos mais rápidos (macios x médios das Ferrari e Mercedes), como também mais novos.

É preciso uma diferença de cerca de 0s8 entre os carros para se passar na China e essa diferença de pneus explica isso. Entretanto, se o carro da Red Bull não tivesse um ritmo tão forte quanto seus rivais, não seria o suficiente.

Desde que chegou no Bahrein, Ricciardo estava muito confiante com o ritmo da Red Bull. Cheguei a perguntar para ele se sentia que podia vencer no deserto. Ele sorriu e balançou a cabeça em sinal positivo. Por lá, não teve tempo de mostrar isso. Na China, fez um final de prova sensacional, como sempre com seus ataques precisos e predadores.

Essa deve ser uma qualidade importante para ele nesta temporada. O modo de classificação do motor Renault não é tão forte – o motor Renault não é tão forte e ainda tem problemas de dirigibilidade – então dificilmente ele e Verstappen vão largar na frente. Mas o ritmo de corrida já provou ser muito forte.

Pelo mesmo motivo, é bom Verstappen começar logo sua autoanálise. Ele disse no domingo que não se vê agressivo demais, mas acha que está exagerando na vontade. Ele está, na verdade, tentando inventar. Nada como o replay das manobras do companheiro para apontar o caminho.

Confira o placar entre companheiros e as diferenças na classificação da China

Hamilton 1 a 2 Bottas
Vettel 2 a 1 Raikkonen
Verstappen 2 a 1 Ricciardo
Perez 2 a 1 Ocon
Hulkenberg 3 a 0 Sainz
Stroll 1 a 2 Sirotkin
Gasly 1 a 2 Hartley
Alonso 3 a 0 Vandoorne
Leclerc 1 a 2 Ericsson
Grosjean 1 a 2 Magnussen

Diferenças de hoje:

Bottas x Hamilton: os050

Vettel x Raikkonen: 0s150

Verstappen x Ricciardo: 0s150

Perez x Ocon: 0s126

Hulkenberg x Sainz: 0s287

Sirotkin x Stroll: 0s223

Alonso x Vandoorne: 0s273

Hartley x Gasly: 0s090

Grosjean x Magnussen: 0s462

Leclerc x Ericsson: 0s463

As diferenças são calculadas nas sessões em que o companheiro com classificação pior é eliminado e os placares contabilizam o resultado do treino, e não a posição de largada, que pode ser alterada devido a punições.

Turistando na F1: Guia de sobrevivência do GP da China

Uma cidade que não para e que vai supreendendo a cada novo canto que você conhece. Ok, o povo não é o mais hospitaleiro do planeta, mas tem nuances interessantes. E, sim, muitas vezes você vai se sentir o único ocidental do mundo, vão pedir para tirar foto com você ou te filmar escondido no metrô: não é só você que está estranhando tudo isso. Bem-vindo a Xangai.

 

Compre ingresso para: Reta principal (ingresso A High)

Aproveite que os ingressos na China não são muito caros e fique de frente para os boxes. Isso significa pagar menos de 250 reais para os três dias. E, de quebra, na sexta-feira o acesso para todas as demais arquibancadas é livre.

 

Hospede-se em: Xangai

Pode parecer óbvio ficar em Xangai na corrida de Xangai, mas não é bem assim. O circuito fica a cerca de 1h30 de metrô do centro da cidade, em Jiading. Porém, vale a pena perder algumas horas no transporte público e curtir uma metrópole bastante vibrante. Dê preferência a um hotel próximo à linha 2.

 

Vá de: metrô

Com um bilhete de três reais, você faz a viagem de pouco menos de 1h30 do centro até a pista. A linha 2 dá acesso fácil à 11, que vai ao circuito. A estação, inclusive, te deixa na porta da pista, bem perto da arquibancada da reta principal.

 

Não perca: a noite de Xangai

Deve ser algo relacionado à quantidade de pessoas na cidade: sempre há algo para fazer na noite de Xangai, não importa o dia da semana. A cidade é conhecida por ser vibrante e não desaponta. A visita ao Bund, claro, também não pode faltar, especialmente no entardecer, quando as luzes dos prédios são acesas.

 

Combine com: Pequim

Não que eu fale com conhecimento de causa: os chineses controlam os dias que jornalistas podem ficar no país e não permitem viagens fora do evento. Se eu quisesse estender minha estadia, teria de ter dois vistos – de jornalista e de turista – e sair do país após o GP, voltando de novo como turista. Para quem não tem problemas desse tipo, vale pegar o trem de pouco mais de 2h até Pequim e conhecer uma China mais tradicional.

 

Quanto fica?

Dá para encontrar passagens saindo de São Paulo por 3000 reais, e ingresso, estadia e custos saem por cerca de 1000 reais para três dias. Ainda tem o visto, que é obrigatório mas custa pouco mais de 100 reais.

Drops do GP do Bahrein entre cortes e biscoitos

A corrida foi boa no Bahrein, como de costume, e abriu uma série de possibilidades no campeonato, mas o assunto que roubou a cena no final de semana foi a apresentação das diretrizes da Liberty Media. É tudo o que se tem como ponto pacífico que é o melhor para o futuro da categoria, mas isso não quer dizer que todos ficaram contentes. Afinal, há muitos provilégios sendo quebrados, especialmente atingindo a Ferrari, que perde o poder de veto depois de mais de 30 anos e boa parte de seus bônus.

 

Logo depois da reunião, na sexta-feira, deu para entender qual o caminho que as discussões tomaram, com chefes de Force India e Williams dizendo-se contentes e Toto Wolff falando em detalhes que têm de ser acertados. A grande questão é o teto orçamentário de 150 milhões de dólares, metade do que os grandes estão gastando. Isso significa forte corte de funcionários e toda uma readequação em como a equipe atua. Por isso, ao que tudo indica, é algo que vai demorar anos para ser 100% implantado.

 

O que deve acontecer é a adoção do teto, mas inicialmente com vários itens ficando de fora da conta e, aos poucos, esses itens vão sendo incluídos. Por outro lado, a ideia de que uma equipe pequena conseguiria fazer a temporada em bom nível com apenas 30 milhões de dólares de patrocínio é um bom indicativo, especialmente em tempos em que não se consegue uma vaga em time de médio para baixo por menos de 10.

 

Falando em equipes cobrando muito por pilotos, tive alguns papos com Sergio Sette Camara ao longo do final de semana e ele reconheceu que não levou negociações para ser piloto de testes da F-1 nesse ano adiante porque o preço estava um absurdo. Afinal, ele viu exemplos recentes com brasileiros – Luiz Razia levou milhões para a Caterham que acabaram indo para o lixo, pois ficou de fora quando a grana acabou, e Felipe Nasr, mesmo com resultados bem melhores nas categorias de base e tendo feito um bom trabalho na Sauber, viveu algo semelhante quando o valor do patrocínio do BB despencou. Seu plano é lutar pelo título da F-2 mesmo sendo companheiro do grande favorito Lando Norris, que parece já ter toda a equipe de seu lado pelo que observei no Bahrein.

 

Corre por aí uma história que ilustra bem isso. Quem viu Daytona ficou impressionado pelo fato que Norris foi efetivamente mais rápido que Fernando Alonso. Pois, bem. Analisando os dados da corrida, o espanhol percebeu que o novato sempre fora à pista com pneus novos, quando as condições da pista estavam melhores, com regimes mais potentes de motor… Zak Brown tinha usado a prova como vitrine para o menino. Nem é preciso falar que Alonso ficou furioso.

 

Existe também uma história que liga Norris a Nasr. Como assim? O brasileiro foi contratado para testar um carro de GP2 junto do inglês, ganhando justamente para forçá-lo ao máximo e prepará-lo para sua estreia.

 

Voltando ao paddock do Bahrein, uma história para dar risada: não vou citar nomes, mas um colega estava com fome e decidiu procurar algo em seus bolsos. Achou um biscoto e comeu. Só depois percebeu que tinha usado aquela calça pela última vez quando andava com seu cachorro…

 

O paddock em Sakhir teve algumas caras amarradas ao longo do final de semana. Kimi estava um absoluto limão, e pela primeira vez vi um piloto dar entrevistas de costas para a câmera. Ele não gostou nada de ter ficado no escuro em relação à estratégia em Melbourne e gostou menos ainda de ter sido jogado no trânsito no Q3 no Bahrein. Mas já na quinta foi ríspido na coletiva insistindo que suas ideias sobre como deveria ser o regulamento não importavam porque ele não tinha poder para mudar nada.

 

Hamilton seguiu linha parecida, e pediu que, seja quem for que faça as regras, que pelo menos tenha pilotado uma vez na vida. Mas há quem diga que pilotos não poderiam se encarregar do regulamento porque… mal sabem escrever. Maldade?

 

Falando em Hamilton, no sábado sua fotofobia voltou. Fotofobia? Sim, os colegas ingleses juram que ele realmente tem um problemas com luzes na sua cara, mas elas só parecem realmente incomodar quando o resultado não é o que ele espera.

 

Voltando a Kimi, outra história que circulou após a prova foi que a Ferrari pediu que ele fosse ao hospital visitar o mecânico ferido em seu pit stop. E ele questionou por que deveria fazer isso. Enquanto isso, Vettel se oferecia para pagar um jatinho para que o mecânico voltasse para casa.

 

Mas não dá para falar de GP do Bahrein sem comentar sobre Pierre Gasly. Quem ouviu a transmissão da BandNews sabe da alegria da Toro Rosso apenas em alinhar em quinto e pode imaginar a festa da equipe com o quarto posto. Perguntei a ele o que ele diria se eu lhe contasse que Alonso nunca conseguiu um resultado tão bom com o motor Honda. “Now we can fight”, respondeu com um sorriso.

Foi miragem do deserto ou campeonato será apertado mesmo?

Não deixou de ser um alívio acompanhar o desenrolar do GP do Bahrein, especialmente depois de que, na quinta-feira, Sebastian Vettel explicou que as análises da Ferrari mostraram que a vantagem na classificação na Austrália não tinham tanto a ver com o tal modo festa do motor da Mercedes (na verdade, ambos os equipamentos aparentam estar praticamente parelhos nesse sentido) mas ainda assim o alemão acreditava que seus rivais tinham “três ou quatro décimos de vantagem”.

Contudo, pelo menos em uma pista que vem sendo boa para a Ferrari ao longo dos anos, não foi bem assim. Desde os treinos livres, ficou claro que os carros italianos e também a Red Bull estavam mais equilibrados que as Mercedes, que vinham derrapando de traseira nas curvas. A dificuldade de Hamilton e Bottas ficou clara na classificação, em que ambos diziam não se incomodar tanto com o equilíbrio do carro, mas simplesmente não eram velozes o suficiente.

A explicação é algo que já está implícito desde o lançamento da Mercedes. O carro deste ano acabou ficando com o centro de gravidade mais pesado que o anterior, e mesmo antes do início dos testes Toto Wolff já apontava que era algo que preocupava a equipe, pois isso gera mais carga nos pneus. No calor do Bahrein e com os pneus supermacios, que trabalham melhor em janelas de temperatura mais baixas, o temor se tornou realidade.

A Mercedes simplesmente superaquecia seus pneus na classificação, o que também acabou ditando sua opção estratégica na corrida. Curiosamente, nos testes, a equipe mal usou o composto vermelho, focando seu trabalho quase inteiramente nos médios. Seria a queda do Bahrein um indicativo de que isso tenha sido um erro?

Sabendo disso, a Ferrari foi para a corrida com a ideia de proteger sua primeira fila com a estratégia teoricamente melhor, de duas paradas com dois stints de pneus macios, mas sabendo que os rivais, por preferirem os médios e sequer terem supermacios novos, poderiam optar por fazer apenas um pit stop. E souberam reagir quando perceberam que esse era o caso.

Não que tenha sido fácil. Vettel mesmo disse que, quando informado de que teria de fazer seus pneus macios durarem 38 voltas (nos treinos livres, a maior sequência tinha sido de 25), não acreditou que seria possível. E sua pilotagem foi incrível para suportar a pressão de Bottas, concentrando-se em acumular o máximo de energia possível para se defender nas retas. Se fosse Hamilton quem estivesse atrás a história seria diferente? Até mesmo Toto Wolff deixou isso em aberto, mas não era o dia do inglês.

Mesmo tendo tendo a manobra do dia, passando três de uma vez – perguntei a ele sobre aquele momento, e ele disse que pegou dois vácuos, chegou a desesperar-se sem saber para onde ir e nem sabe como conseguiu fazer a curva depois – Hamilton pecou na largada, não conseguindo ganhar posições, e perdeu voltas preciosas atrás de rivais lentos, o que foi decisivo para seu resultado.

Mas é bom lembrar que houve uma terceira variante que acabou ficando de fora dessa batalha. A Red Bull era a equipe (ainda que marginalmente) que tinha o melhor ritmo de corrida nos treinos livres, mas isso não pode ser comprovado na corrida. Seria também uma questão trazida pelo calor barenita? O lado bom é que a resposta não vai demorar a chegar. Xangai é uma pista bem diferente do Bahrein e o frio costuma aparecer por lá. Será que os sinais de um campeonato apertadíssimo vão ser os mesmos do último final de semana?

Confira o placar entre companheiros e as diferenças na classificação do Bahrein

Hamilton 1 a 1 Bottas
Vettel 1 a 1 Raikkonen
Verstappen 1 a 1 Ricciardo
Perez 1 a 1 Ocon
Hulkenberg 2 a 0 Sainz
Stroll 1 a 1 Sirotkin
Gasly 1 a 1 Hartley
Alonso 2 a 0 Vandoorne
Leclerc 0 a 2 Ericsson
Grosjean 0 a 2 Magnussen

Diferenças de hoje:

Bottas x Hamilton: os096

Vettel x Raikkonen: 0s143

Verstappen x Ricciardo: sem tempo

Ocon x Perez: 0s147

Hulkenberg x Sainz: 0s416

Sirotkin x Stroll: 0s089

Alonso x Vandoorne: 0s313

Gasly x Hartley: 0s269

Magnussen x Grosjean: 0s936

Ericsson x Leclerc: 0s357

As diferenças são calculadas nas sessões em que o companheiro com classificação pior é eliminado e os placares contabilizam o resultado do treino, e não a posição de largada, que pode ser alterada devido a punições.

Um GP desastroso para Senna no Brasil

Há quem até arrepie ao ler a sigla MP4/4. Afinal, trata-se de um dos carros mais dominantes da história da F-1 – e foi aquele com o qual Ayrton Senna conquistou seu primeiro título mundial. Mas, no GP do Brasil, disputado dia 3 de abril de 1988, a McLaren era uma grande incógnita devido à pouca quilometragem dos testes.

As dúvidas, contudo, começaram a ser sanadas já na sexta-feira, quando o time inglês foi o mais rápido. As reacelerações indicavam que a Honda era quem tinha interpretado melhor as novas regras de boost, algo que ficou evidente na prova de recuperação – que no final acabou não valendo nada – da estreia de Senna na McLaren.

Pole position, Senna fez uma volta de apresentação bastante lenta, sabendo que seus adversários, especialmente a Williams, tinham enfrentado problemas de superaquecimento em seus carros na pré-temporada. Mas foi o próprio motor do brasileiro que acabou morrendo instantes antes da largada, obrigando-o a largar do pitlane com o carro reserva, em um lance que definiria sua corrida.

Lá na frente, Prost, terceiro no grid, logo se livrou de Mansell, que herdara a pole, e sumiu. Com 16 voltas, o francês já estava mais de 18s na frente. A diferença chegou a diminuir na parte final da prova, mas quando a Ferrari de Gerhard Berger apertou o ritmo, Prost logo respondeu e mostrou que só estava administrando a vantagem – sim, naquela época os pilotos também economizavam pneus, combustível, etc.

A primeira ultrapassagem de Senna mostrada no vídeo em que a disputa chega a ir para a freada, ainda que com aparente facilidade, é com Piquet pelo quarto lugar. Ultrapassagem essa que deve ter tido um gostinho a mais, pois o então campeão do mundo em exercício tinha acabado de dar aquelas famosas declarações incitando com conotação jocosa que Senna seria homossexual. O terceiro e o segundo lugares são herdados por paradas e, quando é a vez do brasileiro fazer seu pit stop, ele provavelmente já estaria tão à frente que voltaria em segundo, mas deixou o motor morrer e perdeu 20s, voltando em sexto.

Mas sua corrida teria outra reviravolta: os comissários decidiram lhe dar uma bandeira preta cerca de 1h depois da largada por uma infração que seu time deveria conhecer bem. A McLaren não poderia tê-lo deixado largar com o carro reserva após fazer a volta de apresentação com outro carro, repetindo o erro que também desclassificou Prost no GP da Itália de dois anos antes.

Piquet, correndo no circuito que tinha acabado de ser rebatizado com seu nome, ainda faria uma ousada manobra para ultrapassar Boutsen e Warwick em uma curva para terminar em terceiro, atrás de Berger e de Prost, que conquistou a quinta vitória no GP Brasil em sete anos em uma daquelas típicas provas para começar o ano desanimando qualquer adversário. Mas o interessante dos registros daquele dia é que ninguém apostava em um domínio tão grande de um carro que venceu 15 das 16 provas da temporada. Talvez isso fosse fruto da falta de confiabilidade da época: dos 26 carros que largaram, apenas nove viram a bandeirada. E nenhum abandono foi por acidente!

Vettel incomodado e o fantasma de 2014

Durante toda a temporada de 2017, Sebastian Vettel adotou um discurso otimista em relação ao desenvolvimento da Ferrari e ao que cada resultado significava. E, aperfeiçoando a arte de encontrar pontos positivos até em uma lavada em Monza, conseguiu manter a chama ferrarista acesa mesmo quando já estava claro que a Mercedes tinha se encontrado, superando o time italiano em termos de conjunto na segunda metade do ano.

Pode ser que seja uma nova roupagem para a mesma estratégia, assim como pode ser o presságio de um ano muito difícil para o alemão. Mas o fato é que por todo o final de semana na Austrália ele fez questão de dizer que não está à vontade no carro.

Até mesmo no pódio, sendo entrevistado pelo ex-companheiro Mark Webber, Vettel disse algo como “não estou à vontade e você sabe bem como é.” É questionável se o australiano, alguma vez, teve braço para bater Vettel em condições normais, mas também é fato que a diferença entre os dois foi aumentando na mesma proporção em que Adrian Newey ia aprimorando um carro pensado no estilo pouco intuitivo do alemão, chegando ao abismo de performance do GP de Cingapura de 2013, quando Vettel era simplesmente 1s mais rápido por volta.

O ano seguinte, quando o alemão já dividia a Red Bull com Daniel Ricciardo, mostrou o outro lado da moeda. Com o novo regulamento, Vettel não conseguia usar os mesmos “truques”, especialmente pelo banimento do escapamento soprado, e acabou sendo dominado pelo então pouco experiente companheiro.

A partir de 2015, na Ferrari, Vettel encontrou um carro menos nervoso e voltou a andar bem, algo que foi acentuado pelas dificuldades encontradas por Kimi Raikkonen e sua falta de confiança na dianteira não tão presa assim, algo que talvez tenha sido herança da era Alonso.

Pois, bem. Em 2018, desde os testes, Raikkonen aparenta estar muito mais confortável com seu carro e a Ferrari efetivamente chama a atenção pela dianteira presa e pela tração. O finlandês, então, pode usar à vontade seu estilo de priorizar a saída de curva pois o carro entra equilibrado e aceita que se reacelere rapidamente.

Mas, aparentemente, não dá para agradar os dois pilotos ferraristas ao mesmo tempo, e Vettel tem reclamado de não conseguir “jogar” o carro nas curvas, como costuma fazer, pois não sente confiança na traseira, que anda mais solta do que ele gostaria.

Na Austrália, vimos o resultado prático disso, com Raikkonen sendo mais consistente e Vettel, mais propenso a erros: um repeteco de 2014. É claro que é de todo interesse da Ferrari agradar sua estrela e isso certamente será um dos alvos do desenvolvimento e do acerto para as próximas provas. Mais sensível ao comportamento do carro que os pilotos considerados os melhores do grid, o tetracampeão sabe que muito de suas chances de penta passam por aí.

Estratégia do GP da Austrália e o erro da Mercedes

Não é sempre que vemos um erro de cálculo tão básico

Há 12 meses, a Mercedes perdeu uma corrida que parecia ganha para uma estratégia inteligente e que demonstrava que a Ferrari consumia menos pneus que o time alemão. Neste GP da Austrália, a situação foi diferente: como Vettel não tinha ritmo para ir à ponta mesmo com as voltas extras que fez com o primeiro jogo de pneus, o único jeito de Hamilton perder a liderança era com um Safety Car. E, mesmo neste pior cenário possível, isso só aconteceu devido a um erro primário do sistema da Mercedes.

O GP da Austrália sempre é uma corrida estudada, pois o consumo de pneus não costuma ser alto, até pelas temperaturas relativamente amenas em comparação ao restante da temporada, mas principalmente devido ao consumo de combustível elevado. É uma pista em que se fica muito tempo em pé embaixo, e neste ano essa porcentagem aumentou, uma vez que os carros da ponta hoje têm tanto downforce que estavam conseguindo fazer mais curvas com potência total.

Por conta deste conjunto, os times sempre buscam fazer apenas uma parada, e a estratégia sempre visa proteger a posição de pista, uma vez que é bem difícil ultrapassar. Fazer isso, contudo, sempre é difícil quando se tem dois carros de uma mesma equipe podendo atacar um rival, e a melhor maneira de aproveitar essa vantagem numérica é dividindo as estratégias.

Foi o que a Ferrari fez, chamando Raikkonen aos boxes assim que o finlandês abriu diferença suficiente para voltar na frente das Haas. Isso causou o contra-ataque da Mercedes. Até aí, não há nenhum erro. O problema é que, sabendo que Vettel ficaria mais tempo na pista, cabia aos engenheiros projetarem o ritmo que Hamilton precisava adotar para sair da janela de SC. E foi nesse cálculo o problema: o sistema da Mercedes falava que Vettel precisava de 13s5 de vantagem para se aproveitar de um VSC, enquanto o tempo, na realidade, era de cerca de 10s.

Do lado da Ferrari, o VSC era a melhor coisa que poderia acontecer naquele momento da prova, pois Vettel já não tinha bom ritmo e a Haas de Magnussen, antes de sua parada, era rápida o suficiente para evitar que o alemão abrisse a diferença necessária para sair do trânsito.

Então, se a vitória de Vettel foi circunstancial, qual o tamanho da vantagem da Mercedes?

Para ultrapassar em Melbourne, a diferença de rendimento entre os carros deve ser de pelo menos 1s8. Ficou claro que a Mercedes não tem tanta vantagem por toda a segunda metade da prova em que Lewis não conseguiu atacar Sebastian de fato, mas é difícil precisar o quanto realmente existe.

Na classificação, foi uma lavada e, ao que tudo indica, Hamilton nem teve que usar todo o boost que seu motor tem. A Mercedes tem dois qualy modes à disposição, o primeiro dá cerca de 0s4 e o segundo, mais 0s2. Como ele estressa mais a unidade de potência, o ideal é não usar o último, enquanto o primeiro costuma aparecer já no Q2. Já sabendo que teria certa folga e sem Bottas no páreo, Hamilton ao que tudo indica não usou tudo o que o motor pode dar.

Em situação de corrida, contudo, o cenário é um pouco diferente, ainda que a Mercedes aparente estar mais forte que ano passado. Por outro lado, a necessidade de poupar motores e o erro de algoritmo fizeram com que Hamilton não tenha mostrado seu ritmo e a reação do inglês deixou claro que, se ele soubesse que tinha de acelerar mais logo após sua parada para impedir que Vettel abrisse 10s, teria conseguido fazer isso. Acredita-se que, pelo menos em Melbourne, que é uma pista boa para a Mercedes, a vantagem tenha sido de 0s4 por volta.

Um fator que praticamente não entrou em cena na primeira corrida foi a Red Bull. Em Melbourne, eles escolheram uma boa tática, que só não resultou em algo mais que o quarto lugar pela punição dr Ricciardo e pelos erros de Verstappen na classificação e na corrida. Especialmente com o SC ocorrendo na hora certa, era possível que um dos dois se beneficiasse de largar com o pneu mais resistente, o supermacio. Prova disso é o salto que Ricciardo conseguiu dar nesse momento na prova, o mesmo tendo acontecido com Fernando Alonso na McLaren.

Muita coisa nesse cenário deve ser diferente no GP do Bahrein, começando pelas temperaturas, bem mais altas, o circuito com trechos mais travados e a maior chance de ultrapassagens. Tudo isso deve convergir em uma prova disputada em um ritmo mais forte, com duas paradas. E nos dará mais elementos para entender quais as nuances desta temporada.

Drops do GP da Austrália: de granadas a grid kids

Temporada nova, vida nova. Uma cena comum na quinta-feira na época de McLaren era ver os técnicos da Honda trabalhando até tarde para deixar o carro pronto para os primeiros treinos livres. Na Austrália, eis que lá pelas 18h a Toro Rosso já estava uma calmaria só. E os japoneses até aproveitaram para uma raríssima oportunidade de não jantar no circuito.

 

Por outro lado, já deu para entender qual será a retórica de Alonso pelo menos neste início de temporada. Lembram da história de sua primeira passagem pela McLaren, de “não estão respeitando meus 0s6?” Agora são 0s4, pois Alonso vem dizendo que, se seu carro estiver a pouco menos de meio segundo da ponta, ele tem condições de lutar.

 

Em Melbourne, o espanhol chegou a dizer que a situação seria semelhante a 2012, quando chegou “à última corrida liderando o mundial mesmo largando fora do Q3”. Menos, Nandinho. É fato que aquela Ferrari tinha problemas de aquecimento de pneu e classificava mal, e o piloto passou boa parte do ano largando entre o quinto e sétimo lugares e fez um dos campeonatos mais fortes que eu já vi um piloto fazer. Mas fatos são fatos e, fora do top 10, ele só largou duas vezes naquele ano.

 

Ninguém entendeu muito bem o novo corte de cabelo de Sebastian Vettel, que virou motivo de chacota para Daniel Ricciardo quando os dois se encontraram no cercadinho na quinta-feira. Houve quem não entendesse, também, o nome do novo carro do alemão. Loria, ele repetia e todos entendiam Gloria. Mas o próprio reconheceu que a intenção está lá: “É porque soa como glória em italiano”.

 

Falando em Ferrari e Red Bull, o clima pesou na coletiva de sexta-feira entre os chefes de equipe. Enquanto Christian Horner basicamente acusava a Ferrari de ter se beneficiado de algo que eles mesmo estavam reclamando – no episódio da contratação de um alto funcionário da FIA meses depois de ter ficado acertado, por outra negociação igualmente polêmica da Renault, que isso não poderia ser feito sem um extenso “gardening leave” (período em que um novo contratado fica impedido de trabalhar para o novo empregador). Ao seu lado (na verdade, com Toto Wolff entre os dois), Maurizio Arrivabene chacoalhava a cabeça. O italiano tentou explicar, mas não convenceu.

 

Esta está longe de ser a única polêmica nos bastidores. Tanto, que há quem inclusive já esteja querendo um retorno à “boa” época da ditadura de Ecclestone. Não dele em si, mas de seu estilo. “A Liberty fica querendo agradar todo mundo e isso não é possível”, é o que mais se ouve. O discurso lembra o que ouvia do pessoal das antigas na minha infância, que “pelo menos na ditadura o Brasil era mais organizado”. Sabemos que a democracia não é fácil, mas parece que esqueceram de como era a época em que, como Toto Wolff disse, “Bernie primeiro jogava a granada e depois via entre os escombros quem eram os feridos.”

 

Pelo menos os grid kids funcionaram bem. Quem ouviu a transmissão pela Rádio Bandeirantes deve ter cansado de me ouvir falar nisso, mas foi muito legal ver os rostinhos felizes de meninos e meninas envolvidos com automobilismo e que tiveram a chance de estar no grid. Mais do que isso, ficaram andando no paddock com seus pais, se apresentando para pilotos novos e da “velha guarda”. Acho que deu vontade em muito(a) marmanjo(a) e voltar a ser criança um dia.

Rápido e travado ou lento e animado?

Parece que voltamos um ano no tempo: a Mercedes e Lewis Hamilton parecem ter um ritmo superior, mas a Ferrari consegue algo com a estratégia e é Sebastian Vettel quem começa o ano vencendo. Seria o prenúncio de mais uma temporada em que a disputa vai ficar entre os dois?

Houve algumas diferenças entre a história do GP da Austrália deste ano e o do início de 2017. Há um ano, Vettel ficou mais tempo na pista do que Hamilton e conseguiu, com um ritmo superior, voltar na frente depois de seu pit stop. Na corrida deste domingo, isso só aconteceria se um Safety Car aparecesse. E ele veio na hora certa e foi o suficiente para Vettel voltar em primeiro, contrariando os cálculos da Mercedes.

Mas também é verdade que Hamilton não conseguiu (ou não pôde) abrir mais de 3s na ponta na primeira parte da corrida. Perguntei se ele estava administrando naquele momento e ele garantiu que não, ainda que dificilmente isso seja 100% verdade.

Isso porque as mensagens dos engenheiros deixaram claro o quanto o GP da Austrália foi controlado. Existe uma clara preocupação com a vida útil destes motores que terão de fazer sete corridas, além da necessidade de poupar combustível. A segunda é uma realidade comum em Albert Park, onde se passa muito tempo da volta com o pé embaixo e é um reflexo óbvio da maior velocidade dos carros no segundo ano de desenvolvimento do atual conjunto de regras e também com pneus mais aderentes. Mas será que isso será bom ou ruim para o campeonato a longo prazo?

Por um lado, é bom porque, se a expectativa de que a Mercedes está um degrau acima dos outros se confirmar nas próximas provas, essa necessidade de poupar o motor e combustível sempre deixará Hamilton vulnerável a diferentes estratégias, como aconteceu em Melbourne. Ao mesmo tempo, podemos ver em vários momentos pilotos simplesmente abdicarem da tentativa de ultrapassagem, como o próprio inglês fez nas voltas finais, ainda que a dificuldade de seguir um rival de perto em Albert Park tenha contribuído bastante para isso.

Como de costume, o GP de abertura da temporada deixa mais perguntas do que respostas – e a preocupação com a falta de ultrapassagens após a prova australiana é tradicional e acaba diminuindo ao longo do ano até pela natureza de Albert Park. Mas, internamente, o questionamento já existe. “Queria saber a opinião dos demais, mas precisamos entender se queremos ter carros muito rápidos ou se queremos carros mais lentos com os quais seja possível ultrapassar. Eu sei o que quero: quero poder brigar por posições na pista!”, me disse Ricciardo.

Não é uma discussão nova. Desde antes que o regulamento de 2017 foi anunciado, muita gente já reclamava, temendo as consequências do aumento da pressão aerodinâmica. O temor se mostrou justificado ano passado, pois o número de manobras caiu drasticamente, mas a maior competitividade do campeonato equilibrou as críticas. Agora, quem por exemplo defende o halo ou proteções do tipo diz que o futuro da F-1 seria um carro extremamente seguro, mas que poderia chegar a 450km/h. Mas será que uma fila indiana em altíssima velocidade seria interessante de se assistir?

É bem verdade que esse segundo ano do atual regulamento promete classificações excepcionais – que ficariam ainda melhores se os demais motores tivessem os dois modos de classificação da Mercedes, mas de qualquer maneira a sensação de velocidade do onboard de Hamilton foi incrível em Melbourne.

Em duas semanas, no Bahrein, teremos um dos melhores circuitos em termos de ultrapassagem e calor, que pode dar mais protagonismo aos novos pneus, que deixaram a desejar na etapa de abertura. Isso porque a expectativa era de que as corridas tivessem pelo menos duas paradas.

No mais, quem se aproveitou do travado Albert Park foi Fernando Alonso, que adotou a mesma estratégia de “wait and see” de Vettel e depois conseguiu segurar um errático Verstappen para chegar em quinto lugar com o carro que deve ser o que mais vai evoluir nesse início de ano.

Falando em evolução, algo que chamou a atenção após a vitória de Vettel foi o reconhecimento por parte do alemão que ele não está confortável com sua Ferrari. “O carro não está fazendo o que eu quero”. Já vimos especialmente em 2014 como o alemão cai de produção quando não tem o carro na mão e, na Austrália, foi notável como Kimi Raikkonen esteve confortável por todo o final de semana. Como a Ferrari vai reagir a isso também é algo que veremos nos próximos capítulos.

Confira o placar entre companheiros e as diferenças na classificação da Austrália

Hamilton 1 a 0 Bottas
Vettel 0 a 1 Raikkonen
Verstappen 1 a 0 Ricciardo
Perez 1 a 0 Ocon
Hulkenberg 1 a 0 Sainz
Stroll 1 a 0 Sirotkin
Gasly 0 a 1 Hartley
Alonso 1 a 0 Vandoorne
Leclerc 0 a 1 Ericsson
Grosjean 0 a 1 Magnussen

Diferenças de hoje:

Hamilton x Bottas: sem tempo

Vettel x Raikkonen: 0s010

Verstappen x Ricciardo: 0s273

Perez x Ocon: 0s781

Hulkenberg x Sainz: 0s045

Stroll x Sirotkin: 0s458

Alonso x Vandoorne: 0s161

Hartley x Gasly: 0s763

Magnussen x Grosjean: 0s152

Ericsson x Leclerc: 0s080

As diferenças são calculadas nas sessões em que o companheiro com classificação pior é eliminado e os placares contabilizam o resultado do treino, e não a posição de largada, que pode ser alterada devido a punições.

Por dentro da F-1 e a nova “suspensão ativa”

O halo e o fim das barbatanas de tubarão são as mudanças óbvias, mas uma das novidades técnicas menos comentadas deve dar bastante dor de cabeça para as grandes equipes – e também para a FIA. São as suspensões inteligentes usadas especialmente por Red Bull e Ferrari e que estão na mira de Charlie Whiting.

A diretiva técnica que limita a atuação destas suspensões foi enviada às equipes em meados de dezembro, algo que não teria agradado especialmente a Red Bull, time que teria os sistemas mais avançados. E teria feito com que a própria Mercedes propusesse a volta da suspensão ativa, mas agora com software e hardware padronizados pela FIA.

Isso porque o efeito destes sistemas engenhosos é semelhante àquele que fez o FW14B, carro com o qual Nigel Mansell foi campeão do mundo, fazer história no início do anos 1990 e que oficialmente banida no final de 1993.

Digo oficialmente porque, desde então, os engenheiros vêm encontrando diversas formas de reproduzir os mesmos efeitos da suspensão ativa e, a cada vez que têm sucesso, a FIA fecha a brecha regulamentar. Foi assim com os amortecedores de massa da Renault, por exemplo, ou com a suspensão integrada da Mercedes mais recentemente. E até por isso surgiu essa ideia dos alemães, que foi apoiada na época pela McLaren, de acabar de vez com esse banimento que joga mais para a torcida do que efetivamente controla o uso da suspensão para ganho aerodinâmico.

A altura do carro em relação ao chão vai se alterando naturalmente no decorrer de uma volta. Na freada, por exemplo, o peso vai para a frente, e ela acaba se abaixando. E, em uma curva para a direita, esta parte do carro vai mesmo ficar mais próxima ao solo.

Mas o que a FIA estava observando é que o movimento dos carros excedia o que era natural e, sabendo do ganho aerodinâmico disso, Whiting decidiu limitar que a alteração de altura não pode ultrapassar 5 milímetros.

Para tanto, o diretor de provas citou o artigo 3.8 do regulamento técnico em conjunto com uma decisão da corte de apelações de 1993. E é aí que pode estar a brecha: o artigo é aquele que vira e mexe é usado, proibindo que partes do bodywork se mexam para melhorar a aerodinâmica, à exceção do DRS. Seria a suspensão bodywork? E valeria correr o risco de continuar usando a suspensão até que a regra em si for alterada? Há muita gente dentro do paddock que acredita que sim.

Então por que Whiting não mudou a regra? Pois esse tipo de alteração não pode ser feito tão em cima da hora.

Na prática, essas suspensões “inteligentes” dão mais aderência, permitindo que os pilotos carreguem mais velocidade nas curvas sem que o carro escorregue, o que também tem efeito benéfico na conservação dos pneus.

Um piloto com (quase) nome de maquiagem

Ele poderia ter tido uma vida glamurosa em Nova York, curtindo a juventude nos efervescentes anos 1960, nadando no dinheiro de sua família, fundadora da marca de cosméticos Revlon. Mas escolheu um caminho que até hoje é trilhado por poucos norte-americanos: tornar-se piloto de Fórmula 1. A trajetória durou pouco e acabou tragicamente, deixando o legado de um piloto consistente, com duas vitórias em 30 corridas, e que tinha cara de ator de cinema e teve de lutar contra o preconceito por ser o “riquinho de NY”.

Toda a carreira de Revson, ou Revvie, como era conhecido, foi pouco comum: ele começou a correr no Havaí, quando fazia faculdade, em 1961, e venceu a segunda prova que disputou. Na terceira, ganhou novamente e foi banido por excesso de agressividade. Juntou dinheiro e foi para a Europa, onde vivia em uma van que transportava seu carro para as corridas de F-3 e F-2.

O sucesso não foi imediato e Revson voltou aos Estados Unidos, onde correu no endurance e iniciou sua relação com a McLaren, cujo ex-dono, Ted Mayer, chegou a dizer que se tratava de “um dos seis melhores pilotos do mundo” na época. Por lá, o piloto chegou a fazer dupla com o ator Steve McQueen nas 12 Horas de Sebring, mas só chamou a atenção da F-1 em 1969, quando terminou em quinto lugar nas 500 Milhas de Indianápolis depois de se classificar em 33º.

Em 1972, Revson faria oito das 12 provas do campeonato da F-1, pela McLaren, e terminaria em quinto lugar, com quatro pódios. Seu companheiro, Denny Hulme, campeão de 1967, foi o terceiro naquele ano, tendo feito todas as provas. Na temporada seguinte, Revson repetiria o quinto lugar, mas desta vez superando Hulme e conquistando as duas únicas vitórias da carreira – a mais impressionante tendo sido a primeira, em Silverstone, após ultrapassar o velocíssimo Ronnie Peterson e surpreender.

Revson acabou ficando de fora da McLaren quando o time decidiu contratar Fittipaldi, que seria campeão com o time em 1974. Mas o norte-americano estava feliz na Shadow, sua nova equipe, apesar de dois abandonos nas provas iniciais.

Não teve tempo, contudo, de ver a bandeirada com seu carro preto: em um teste na pista de Kalayami, na África do Sul, dia 22 de março de 1974, uma quebra na suspensão de titânio, material que começava a ser usado naquela época o jogou contra o muro e o carro entrou debaixo do guard rail até a posição onde estava o cockpit.

Revson muito provavelmente já foi retirado do carro sem vida, mas não ajudou o fato da ambulância estar sem gasolina e demorar a levá-lo ao hospital. O descaso foi tanto que o amigo Hulme conta que acabou decidindo deixar as pistas por conta daquele acidente, que completa 44 anos nesta semana.

Grid de 2018 é ao mesmo tempo jovem e cheio de velhos conhecidos

O discurso do brasileiro teoricamente mais próximo da Fórmula 1 tem batido na mesma tecla nos últimos meses: Sergio Sette Camara entende a importância de buscar alguma conexão direta com algum dos programas de desenvolvimento de pilotos e tenta compreender onde a fila vai andar mais rápido. Foi o mesmo dilema vivido por Felipe Nasr, que optou seguir “carreira solo” por acreditar que esse tipo de programa lhe prenderia a um plano de carreira e acabou não tendo tempo para se firmar na categoria.

Tais programas não são novidade. Renault dava incentivo a pilotos franceses desde os anos 70 e Schumacher teve o mesmo com a Mercedes. Mas a formação integral que se tem hoje foi muito influenciada pela falta de testes: como preparar um piloto para estrear na F-1 se ele mal pode andar de F-1? Apostar em simulação e em uma formação mais global foi uma solução que deixou as equipes mais seguras com seus novatos e é importante para que pilotos com menos aporte financeiro ainda consigam chegar à categoria mesmo agora que o dinheiro do cigarro e de algumas montadoras se foi e os times passaram a depender mais de patrocinadores menores.

É bom que se diga que, como sempre foi o caso na F-1, se o piloto traz rendimento e alguns milhões, sua chance é maior e os programas de desenvolvimento estão longe de garantir que os melhores sempre vão chegar.

É claro que estar em um programa não é garantia de vida fácil na F-1. Que o diga Pascal Wehrlein, para ficar em um exemplo, mas o número chama a atenção: dos 20 pilotos que vão alinhar no grid na Austrália dia 25 de março, apenas quatro nunca passaram por um programa de formação de pilotos.

São eles Kimi Raikkonen, digamos, da “velha guarda”, Nico Hulkenberg e Valtteri Bottas, que entraram por meio da Williams, única que não possui um programa próprio, e Marcus Ericsson, que come pelas beiradas em equipes pequenas levando um bom aporte financeiro e não comprometendo na pista.

Fora os quatro, nem todos foram efetivamente formados por estes programas. Fernando Alonso, na Renault em 2002, e Max Verstappen, na Red Bull em 2015, foram contratados já dando o último passo. Outros acabaram chegando à F-1 bem depois de terem saído dos programas, como é o caso de Lance Stroll, ex-Ferrari. Há exemplos ainda de quem rompeu as amarras cedo, como outro ex-Ferrari, Sergio Perez, e até de quem virou a casaca, como Esteban Ocon, hoje piloto Mercedes, ex-Renault.

Está claro, portanto, que não existe apenas uma rota e um conjunto de qualidade-circunstâncias-patrocínio dificulta encontrar uma receita para chegar na F-1 – e permanecer lá. Mas o fato é que, em poucos anos, será fácil imaginar um grid com 100% de pilotos com alguma passagem pelos programas de desenvolvimento.