O segredo da traseira ‘fininha’ da McLaren

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Em 2014, a Mercedes separou as turbinas de entrada e saída do turbo, colocando uma em cada extremidade do motor de compressão. E esse foi considerado um dos motivos para o sucesso de seus motores.

São várias as vantagens: em relação ao funcionamento do motor em si, a confiabilidade aumenta porque o risco das temperaturas subirem demais, especialmente na problemática relação entre o MGU-H e o MGU-K, diminui. Com menor necessidade de arrefecimento na turbina de entrada, que fica longe das pressões exercidas pelo escapamento, o intercooler pode ser menor. Além disso, são necessários menos tubos de admissão, o que significa uma resposta mais rápida no motor.

Essa redução nos tubos também diminui o turbo lag, um atraso natural deste tipo de motor. Assim, a energia calorífica é canalizada para outros usos, tornando o motor mais eficiente.

Essas são as vantagens no funcionamento do motor em si. O segundo conjunto de benefícios foi mais bem aproveitado pela equipe de fábrica no primeiro ano porque seu carro foi concebido com esta configuração da unidade de potência em mente. Os clientes – menos a Lotus, que estreia o motor em 2015 – tiveram a oportunidade de se aprofundar nos ganhos aerodinâmicos durante a última temporada.

Um intercooler menor significa mais espaço para soluções aerodinâmicas agressivas. A separação entre entrada e saída da turbina também permite que a transmissão fique mais à frente, o que auxilia no centro de gravidade e, consequentemente, no equilíbrio do carro.

Retomei toda essa explicação para chegar na novidade deste ano, a Honda. Acredita-se que os japoneses seguiram um caminho totalmente diferente, posicionando o MGU-H entre o compressor e o turbo, com ambos ficando na parte traseira do motor. Já o MGU-K vai na parte da frente. Para efeito de comparação, Ferrari e Renault não separaram compressor e turbo e colocaram o motor elétrico no V do motor de combustão.

A ideia da Honda seria melhorar a eficiência do MGU-H ao colocá-lo mais próximo de sua fonte (a alimentação é feita pela energia calorífica do turbo), além de, assim como a solução da Mercedes, diminuir o turbo lag. O MGU-K na frente faria com que todo o sistema precisasse de menor refrigeração, gerando aqueles benefícios aerodinâmicos do caso Mercedes.

Se será um caso como o RB10, que acabou tendo de prejudicar sua parte aerodinâmica para fazer o motor Renault funcionar da melhor maneira possível, ou se engenheiros de McLaren e Honda conseguirão trabalhar em conjunto para resolver as questões que apareceram nos testes e fazer as novidades funcionarem, só o tempo dirá. Por enquanto, o que temos visto é um carro com uma traseira incrivelmente enxuta, algo diretamente ligado às soluções dos japoneses – e com mais problemas do que grandes ideias.

Mais perguntas sobre o acidente de Alonso

Crédito: James Moy
Crédito: James Moy

Com o veto da participação de Fernando Alonso na abertura do campeonato em decorrência de acidente sofrido há 10 dias nos testes de pré-temporada, aumentaram as especulações acerca do que realmente teria acontecido com o espanhol.

Não vamos entrar aqui em teorias conspiratórias. O respeitado jornalista alemão Michael Schmidt publicou hoje novos detalhes do acidente, que confirmam essas dúvidas: por que o bicampeão ficou aparentemente sem reação nos 3s anteriores à batida?

Segundo a reportagem, essa seria apenas a segunda vez em que um acidente não é totalmente explicado pela Federação Internacional de Automobilismo – a primeira foi em uma categoria de base. “E a única pessoa que poderia trazer algo significativo não consegue se lembrar. Alonso tem amnésia do momento do acidente.”

As cinco novidades sobre o acidente de Alonso:

1. Alonso entra na curva a 215km/h

De acordo com os dados, a maior velocidade de Alonso na curva 3 do Circuito da Catalunha, na Espanha, é de 215km/h. Então o espanhol freia e diminui três marchas. A McLaren continua relativamente estável.

2. Alonso perde o controle e chega a reduzir para 135km/h

Algo acontece e faz com que Alonso comece a diminuir a velocidade. Segundo a McLaren e a FIA, não houve problema no carro. A teoria da equipe é de que o vento tenha feito o espanhol perder o controle. Quando a velocidade cai para 135km/h, o carro se move de forma abrupta para o lado de dentro da curva, movimento feito pelo próprio piloto.

3. Alonso deixa de reagir a 3s do impacto

Segundo a Auto Motor und Sport, o grande mistério está nos 3s finais do acidente, quando Alonso parece não evitar mais o acidente – segue virando em direção ao muro e deixa de frear. Tanto, que o carro perde só 30km/h nesses 3s. Lembrando que um carro de F-1 leva 1s4 para reduzir 100km/h. O choque com o muro ocorre a 105 km/h.

4. Impacto foi menos forte do que o inicialmente divulgado

Sensores colocados no protetor auricular do espanhol demonstram um impacto de 16G (ou seja, equivalente a 16 vezes o peso do piloto), bem menor do que o inicialmente divulgado, 30G. Como o capacete não apresentava nenhuma marca, a proteção do pescoço – HANS – está sendo examinada para determinar se ele teve algum impacto lateral que justifique a concussão.

5. A FIA desconsidera choque elétrico

A entidade estudou o sensor que determina a segurança do circuito elétrico. Ele permaneceu emitindo a luz laranja enquanto o carro estava em movimento e, 10s após ele parar, ela se tornou verde. Tudo isso está de acordo com um funcionamento normal do sistema.

Os novos dados fazem com que a teoria de que Alonso tenha tido algum problema físico anterior ao impacto ganhem força. Isso explicaria a permanência do espanhol no hospital por mais de 3 dias e o cuidado dos médicos.

Lembro que a concussão em si é apontada por neurologistas como motivo suficiente para tirar o espanhol do GP da Austrália mesmo que os exames não apontem qualquer alteração. Isso é devido ao temor de que um segundo acidente cause a “Síndrome do Segundo Impacto”, que pode ser bastante prejudicial ao funcionamento do cérebro. A McLaren deve estar longe de lutar por bons resultados em Melbourne e não vale a pena arriscar. Mas a possibilidade que os motivos que levaram Alonso ao muro nunca sejam totalmente explicados aumenta a cada nova informação que surge.

Expectativa é de lavada

Que tempos são esses, Mercedes? (Crédito: www.jamesmoy.com)
Que tempos são esses, Mercedes? (Crédito: www.jamesmoy.com)

Se a temporada será uma lavada ainda maior para a Mercedes, ainda é cedo para prever, especialmente com o desenvolvimento das unidades de potência ao longo da temporada. Mas a evolução demonstrada pelos carros desta pré-temporada é impressionante. Enquanto a pole position do GP da Espanha de 2014 foi 1m25.232s, Nico Rosberg fechou os testes com o melhor tempo em 1m22.792s.

Essa melhora – que vem, prioritariamente, da unidade de potência em si e de sua interação com o carro – ajuda a explicar o tamanho do desafio da Honda. Por mais que tenha se aproveitado das informações dos rivais, nada substitui a experiência de pista. Não por acaso, vimos os japoneses enfrentando uma série de dificuldades e rodando lentos, indicando que ainda não se sentem confortáveis para andar com seu motor na potência máxima.

Isso deve ser um problema sério para a McLaren, uma vez que a limitação de quatro motores por temporada prioriza uma abordagem mais conservadora de quem não está confiante em relação à confiabilidade.

Não é o caso da Mercedes, que revelou ter usado apenas um motor durante toda a pré-temporada. E olha que eles rodaram mais de 6.000km, o que significa que estão mais do que preparados para enfrentar a nova regra: os motores terão de durar entre 3.400 e 3.500km em 2015, dependendo da realização ou não do GP da Alemanha. Ano passado, a quilometragem era de cerca de 2.700.

Falando em unidades de potência, a evolução da Ferrari parece ter colaborado para a Red Bull, que segue com problemas de dirigibilidade com a Renault, cair. Pelos tempos do último teste, o time parece mais inclinado a brigar com sua ‘equipe B’, a Toro Rosso, do que com Williams e Ferrari pelo título de segunda força.

Em uma comparação publicada pelo blogueiro James Allen baseada nas simulações de corrida feitas no último teste, a Williams aparece ganhando essa briga, com Felipe Massa “recebendo a bandeirada” 16s à frente de Raikkonen na Ferrari. Mais 16s e chegaria a Red Bull, seguida pela Toro Rosso, Lotus, Force India e Sauber, cujo objetivo será lutar para voltar aos pontos após viver sua pior temporada da história. A McLaren não chegou a fazer simulações.

E a diferença da Williams para a Mercedes, que estava na casa do meio segundo no final do ano passado, parece ter aumentado, estando entre 0s8 e 1s/volta. Isso significa que, até mais do que nas provas finais de 2014, Massa e Bottas – assim como toda a concorrência – só podem almejar mais do que um terceiro lugar caso Hamilton e Rosberg sofram algum problema de percurso.

Porém, com a confiabilidade melhorada em relação a 2014 demonstrada nos testes, parece que a grande questão durante o ano será quais os coelhos que Nico vai tirar da cartola para evitar o tri de Lewis.

Ensaio final

Motor Racing - Formula One Testing - Test Two - Day 4 -  Barcelona, Spain

Última oportunidade de testar updates no carro – e no motor – antes do início do campeonato, o teste final em Barcelona é aquele que costuma dar os sinais mais claros de como o ano vai se iniciar. Afinal, em algum momento, todos vão querer fazer pelo menos uma simulação de corrida e de classificação com tudo o que têm de melhor – das peças ao acerto, que começa a amadurecer nessa fase final de preparação.

É claro que, como estamos em um teste e nem todos vão à pista no mesmo momento e sob as mesmas condições – há times, por exemplo, que não fazem simulações completas de GP, deixando no ar a dúvida a respeito do combustível – as respostas definitivas ainda terão de esperar. Mas daqui a quatro dias já teremos um indicativo interessante para as perguntas que estão no ar no momento.

A primeira delas é: o quanto os rivais conseguiram tirar do domínio da Mercedes? Sim, porque a temporada passada terminou com quase 0s6 de vantagem em classificação e, em um ano de poucas mudanças de regras, não é algo que vai desaparecer num passe de mágica.

Depois de Nico Rosberg impressionar sendo o segundo mais rápido na semana passada mesmo usando pneus médios – 0s8 mais rápido que o segundo melhor com o composto, Kimi Raikkonen, com um tempo de três dias antes – a Mercedes promete vir com novidades aerodinâmicas. O time andou experimentando bastante com a asa traseira, portanto, um dos detalhes que veremos no Circuito da Catalunha será a sustentação da asa, com um ou dois pilares.

Já a Ferrari, depois de fazer testes com menos combustível em Jerez, deve focar mais em simulações de corrida. Isso porque o diretor técnico James Allison declarou que ainda não está contente com a confiabilidade e a consistência do carro.

A Red Bull, por sua vez, admite que a dirigibilidade do motor Renault ainda está longe de satisfazer, problema que já existia ano passado. Isso, combinado com a relativa falta de quilometragem, especialmente no primeiro teste, tem dificultado a avaliação da competitividade da equipe. Neste segundo teste de Barcelona, ficará mais claro se Ricciardo e Kvyat estão no bolo que parece juntar Ferrari e Williams, com Lotus mais atrás.

Isso, pensando no que o time de Grove fez no final do ano passado e na pré-temporada praticamente sem problemas que Massa e Bottas tiveram até aqui. A velocidade também esteve lá – o carro foi o mais rápido no speed trap em Barcelona. Porém, em termos de performance em si, ainda não ficou claro o que o FW37 pode fazer.

Seguindo com os brasileiros, Felipe Nasr parece ter na Sauber um carro com boa velocidade de reta e aerodinâmica ainda pouco desenvolvida. Isso explicaria o fato do carro ser o mais veloz entre os que usam o motor Ferrari e, ao mesmo tempo, pecar na consistência nas simulações de GP, com o próprio Nasr admitiu. De qualquer forma, com McLaren e Force India andando pouco nos testes, fica a expectativa real dos suíços voltarem à zona de pontuação depois de mais de um ano.

Mesmo sendo importante para todos, o teste desta semana tomou ares dramáticos para McLaren e Force India. A primeira completou 927km até o momento, enquanto a Mercedes ultrapassou os 4300km. E a Force India só vai tentar sair do zero com o carro de 2015 na sexta-feira. Nem precisa dizer o quanto ambos estão crus em termos de conhecimento das reações do carro, acertos, rumos para o desenvolvimento. Assim como acontece na ponta com a Mercedes, não é uma diferença que se tira da noite para o dia.

Em choque

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“O carro de Fernando Alonso espalhou na entrada da curva 3 – que é uma curva de alta, em subida, para a direita – fazendo que ele passasse na grama sintética que reveste a parte de fora da pista. Uma consequente perda de tração causou uma instabilidade, jogando-o de volta para o interior do circuito, onde ele recuperou a tração e atingiu o muro do lado direito. Nossos resultados indicam que o acidente foi causado pelos tempestuosos e imprevisíveis ventos naquela parte do circuito naquele momento, que afetou outros pilotos de forma similar.”

“Da cena do incidente, ele foi levado para o centro médico do circuito, onde recebeu os primeiros socorros e, de acordo com os procedimentos normais, foi sedado para ser transferido para um hospital. No hospital, foi feita uma profunda e completa análise de sua condição, envolvendo tomografias e exames de ressonância magnética, todas as quais foram completamente normais.”

A descrição da McLaren a respeito do acidente de Alonso no último dia de testes de Barcelona faria todo o sentido, caso não houvesse alguns fatores a mais. Entre eles, os testemunhos de Sebastian Vettel, que vinha logo atrás, e do fotógrafo Jordi Vidal, que registrou a sequência de imagens do acidente, dando conta de que foi uma batida em relativa baixa velocidade. O estado do carro, pouco danificado para trazer consequências tão fortes ao piloto, a ponto do empresário Luis García Abad dizer que ele “só sairá do hospital para voltar à vida normal, sem transições, e se para isso tivermos de continuar um, dois ou três dias aqui, de acordo com os médicos, o faremos.” E, por fim, a estranha mancha negra na lateral, justamente onde estaria localizado o MGU-K.

Primeiramente, havia, de fato, a questão do vento, citada por vários pilotos. E a relação entre o pouco dano aparente no carro e todo o cuidado em relação ao piloto também teria explicação. O comunicado da McLaren não especifica, fala em “quantidade considerável de força G”, mas alemães e italianos falam em pico de 30G, recebidos de forma lateral, o que justifica por que os pneus e suspensões estavam relativamente intactos. Então o piloto teria perdido o controle, batido de lado e raspado no muro por 15m sem que as suspensões tivessem ajudado na absorção do impacto, e isso explicaria o desmaio (ou mais de um desmaio, como atestam algumas fontes, especialmente na Espanha), pois uma grande parte dessa energia teria sido absorvida pelo próprio corpo de Alonso.

A batida me lembrou dois acidentes, por motivos diferentes, ambos em Mônaco. O primeiro, do próprio Alonso, em 2010: uma batida a 60km/h que não pareceu grave em um primeiro momento mas que, devido ao ângulo, entortou seu chassi. E de Sergio Perez, também lateral, no ano seguinte: o impacto de 80G lhe deixou com tonturas por mais de duas semanas, impedindo-o de participar da prova seguinte (ele chegou a passar pelas provas da FIA, mas desistiu após não se sentir bem nos treinos livres para o GP do Canadá).

Mas nada do que a McLaren disser no momento vai acabar com as suspeitas de que os problemas enfrentados pelo time com a vedação da MGU-K, motor responsável por transformar a energia cinética advinda dos freios em elétrica, sejam a real causa do acidente. Ainda mais com a mancha preta da lateral, indicando uma explosão.

De acordo com engenheiros da Renault, é praticamente impossível o piloto sofrer uma descarga elétrica dentro do cockpit, “ainda que não 100% improvável”. O perigo estaria ao sair e entrar do carro, pois nesse caso o corpo serviria como condutor de energia, assim como quando mecânicos e comissários tocam o carro. É por isso que os bólidos contam com luzes para indicar se estão com o sistema elétrico seguro. E as mesmas fotos que mostram a tal mancha escura no carro de Alonso demonstram que as luzes estavam verdes.

Não precisa ser nenhum gênio para imaginar o quanto o projeto da Honda estaria comprometido se a hipótese de descarga elétrica se confirmasse, ainda mais a menos de um mês da primeira etapa do campeonato. A reação do time no teste que começa já na quinta-feira será um bom indicativo para encerrar de vez (ou apenas inflamar) as especulações.

Lugar de mulher é na…

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‘Mulher ao volante, perigo constante’. ‘Vai pilotar fogão!’

Em um dos raros esportes em que homens e mulheres podem competir juntos, é como se eles fizessem um favor para que elas dividam as pistas. Como aquelas crianças que invadem as brincadeiras dos maiores e viram ‘café com leite’.

Foi o que Susie Wolff sentiu na pele nessa semana durante os testes de pré-temporada. Piloto de testes da Williams, ela se envolveu em um acidente com Felipe Nasr sob circunstâncias que não ficaram bem claras, devido à falta de imagens. E viu toda a admiração por ser a primeira a pilotar um carro da categoria em sessões oficiais em mais de 20 anos virar uma chuva de críticas.

A presença da piloto tem a ver com a tentativa de fomentar a participação feminina. Porém, assim como em qualquer meio, é da quantidade que sairá a qualidade e o número de mulheres envolvidas no esporte ainda é tímido.

Contudo, o problema dessa situação é que, como piloto, Susie é fraca. Não fez nada em sua carreira, predominantemente calcada em carros de turismo para justificar um lugar na Fórmula 1. Observando sua tocada, fica claro que ela nem de longe explora os limites do carro. Está na Williams, claramente, por ser esposa de um dos acionistas da equipe, Toto Wolff, homem que ganhou poder da categoria nos últimos anos ao acumular seu papel no time de Grove à direção na Mercedes.

Porém, assim como a escocesa, são inúmeros os pilotos que chegaram à F-1 mais por obra dos interesses comerciais do que pelo talento em si. E isso não é de hoje – Taki Inoue e Pedro Paulo Diniz, para ficar em alguns exemples, que o digam. É só lembrar que, no final de 2014, a falida Caterham recrutou Will Stevens, piloto endinheirado que venceu apenas cinco provas em todos os seus 8 anos de carreira no automobilismo. Quando o inglês entrou em uma disputa com Fernando Alonso, o espanhol perguntou, irritado, via rádio: “Quem é esse?”. Ouviu do engenheiro que se tratava do “garoto novo”. E respondeu: “Ele tem muito a aprender. Muito.”

É nesse grupo que a questão de Susie tem de entrar. Trazer dinheiro ou patrocínio não é crime nenhum, mas conseguir uma vaga apenas por interesses comerciais, sem mostrar serviço na pista, é.

Susie não merece estar na Fórmula 1. Especialmente em uma equipe que tenta voltar a ser grande, como a Williams, e não pode desperdiçar tempo de pista apenas por razões comerciais, possíveis acordos com seu acionista ou mesmo pelo interesse que existe em trazer mulheres para a categoria.

E isso não é uma questão de gênero.

Coluna publicada no jornal Correio Popular

O preço de assistir à Fórmula 1

Motor Racing - Formula One World Championship - Monaco Grand Prix - Sunday - Monte Carlo, Monaco

Assistir às corridas da Fórmula 1 ao vivo e em canais abertos é cada vez mais raro ao redor do mundo. Seguindo diretrizes dos detentores de direitos comerciais da categoria, que buscam garantir contratos lucrativos com as TVs pagas, a temporada de 2015 será vista da mesma maneira que no Brasil em apenas outros 10 países.

A maioria deles está na Europa, berço da categoria, mas s fãs de vários países tradicionais já tiveram de se acostumar com a mudança. A Fórmula 1 continua grátis na Áustria, Bélgica, Alemanha, Hungria, Eslovênia, Eslováquia e na Espanha. Índia, Paquistão e Austrália completam a lista.

Outros países, como Inglaterra e Itália, contam com um sistema de rodízio (tendo metade da temporada com transmissão ao vivo na TV aberta) ou totalmente pago. E a variação dos preços pela assinatura anual impressiona.

Os petrodólares dos Emirados Árabes Unidos não pagam por somente a prova mais cara da temporada, em Abu Dhabi, como também pela transmissão de maior valor. Mas as quantias acobradas em países como Rússia e Estados Unidos, grandes mercados nos quais a categoria luta para se estabelecer, também impressiona.

Coincidência ou não, paralelamente ao crescimento da Fórmula 1 na TV paga ao redor do mundo, a audiência da categoria vem caindo. Os últimos números mostram um decrécimo de 5,6%, de 450 espectadores no mundo todo para 425 em 2014. As perdas aconteceram inclusive na Inglaterra (em 5,2%), país de grande tradição no esporte e terra do campeão Lewis Hamilton.

Estilos de pilotagem: Kimi Raikkonen

Motor Racing - Formula One Testing - Day 4 - Jerez, Spain

O estilo de pilotagem de Kimi Raikkonen ganhou grande atenção ano passado, tamanha a diferença de performance em relação a Fernando Alonso e também ao próprio desempenho do piloto finlandês nos dois anos anteriores, na Lotus. Além de mais lento, o campeão de 2007 ainda gastava mais pneus, exatamente o oposto do que vinha acontecendo desde seu retorno à Fórmula 1.

Perguntado sobre o assunto, Kimi por várias vezes admitiu que precisava esperar o próximo projeto da Ferrari para mostrar o que o trouxe de volta ao time de Maranello. Era um caso, portanto, de má adaptação entre o comportamento do carro e um estilo responsivo como o do finlandês.

O primeiro ponto é que o estilo de Alonso sempre será mais adaptativo do que o de Raikkonen, por induzir o carro a responder de determinada forma, e não esperar que ele responda de determinada forma. E o segundo é que a tendência de saída de frente da Ferrari de 2014 é o pior cenário para Kimi. Enquanto o espanhol faz as curvas controlando a pressão no pedal de freio, Raikkonen caracteriza-se pela grande habilidade em modular o acelerador e à sensibilidade aos sinais do volante. O que vimos em 2014 foi Kimi muitas vezes frear, esperar a frente se normalizar e então reacelerar. Nesse processo, perdia o embalo e, quando chamava o acelerador, a falta de tração da Ferrari ficava ainda mais evidente, junto de um decorrente desgaste de pneus.

A questão é que toda essa sensibilidade de Kimi depende de uma dianteira bastante presa, algo que a Ferrari não conseguia ter ano passado e que também tem a ver com a aderência dos pneus. Na época dos aderentes Michelin, o estilo de Raikkonen caía como uma luva e quando os Pirelli eram mais macios ele também tinha vantagem por evitar que a dianteira escorregasse. Não coincidentemente, quanto mais duros ficaram os compostos Pirelli, mais dificuldades Kimi teve, o que começou a ser notado em meados de 2013.

O exemplo do finlandês também nos dá algumas lições importantes sobre a complexidade atual da Fórmula 1. Não conseguir trabalhar a temperatura dos pneus dianteiros e ter de jogar o equilíbrio de freio para a frente afeta a recuperação de energia. Se você recupera menos energia, gasta mais combustível. Se está gastando mais, precisa tirar o pé para economizar, o que vai prejudicar ainda mais a temperatura dos pneus…

Se o problema não era simples de ser resolvido ano passado, nesta temporada basta a Ferrari fazer um carro com a dianteira mais presa – o que parece ter sido o caso tendo em vista as reações após os primeiros testes – e Kimi saberá o que está fazendo.

Estilos de pilotagem: Lewis Hamilton

Motor Racing - Formula One Testing - Day 4 - Jerez, Spain

 

Hamilton é daqueles que freia tão dentro da curva que até com o equilibrado W05 costumava fritar os pneus e não adianta copiar: é a intimidade que ele tem com o pedal de freio que faz com que isso funcione a seu favor. Na modulação da frenagem, consegue controlar as saídas de traseira que ele mesmo provoca de forma a não perder tempo.

Parte do segredo tem a ver com sua precisão com o volante. E, quando o carro se equilibra no meio da curva, ele é rápido na reaceleração, tendo um estilo visivelmente agressivo. E, se alguma destas variáveis não funciona como planejado, Hamilton tem a seu favor uma grande sensibilidade, o que o ajuda a lidar com qualquer tipo de comportamento de carro, ainda que prefira ter saídas de traseira do que de dianteira.

Toda essa agressividade clara na tocada de Hamilton acabou fazendo com que muita gente se apressasse em decretar o fim do inglês em duas oportunidades: quando os pneus se tornaram mais sensíveis, com a chegada da Pirelli em 2011, e quando a economia de combustível se tornou mais importante, ano passado.

Mas o fato é que o estilo de Hamilton acabou funcionando bem com esses dois requisitos. A explicação que engloba ambos os aspectos é que o inglês, por induzir o carro às saídas de traseira, se sente mais à vontade com o equilíbrio de freios sendo jogado mais para os pneus traseiros do que os dianteiros. Isso é importante para a recuperação de energia, que acontece apenas neste eixo, e ao mesmo tempo protege os pneus.

Além disso, feliz em ter um carro mais nervoso na entrada da curva, ele consegue carregar mais velocidade e precisa de menos reaceleração. Com isso, na mesma tacada, economiza combustível e pneus especialmente em pistas nas quais a degradação é longitudinal, e não por força lateral (aquelas com curvas em que o carro escorrega de lado).

É por essas e outras que, antes de julgar o estilo de Hamilton como agressivo, é preciso lembrar que sua grande característica é a sensibilidade.

Estilos de pilotagem: Sebastian Vettel

Motor Racing - Formula One Testing - Day 2 - Jerez, Spain

O estilo de pilotagem de Sebastian Vettel é muitas vezes descrito como contra-intuitivo. Tanto, que duvidava-se que ele continuaria tentando usar os mesmos truques quando a Red Bull perdesse a pressão aerodinâmica com o fim do difusor soprado. De fato, era impossível replicar o que foi feito nos anos do tetracampeonato, mas o alemão ainda não parece ter se livrado dos velhos vícios.

A tendência de Vettel é iniciar a curva como Alonso, com uma pressão de média para forte nos freios. Porém, o alemão não provoca a saída da frente do carro, demorando bem mais para começar a girar o volante.

Então, quando o carro está quase indo reto, o piloto vira violentamente. Essa sempre foi sua grande característica: a rapidez em girar o carro no meio da curva.

É quase como se ele terminasse a curva antes dela. Isso normalmente não seria o jeito mais rápido de contorná-la, mas a enorme pressão aerodinâmica da traseira das Red Bull de difusor alimentado pelos gases do escapamento dava a estabilidade necessária para que ele reacelerasse quase imediatamente e acabasse ganhando tempo ao invés de perder.

Foi curioso ao longo dos anos do tetra observar como carro e piloto foram moldando-se para explorar essa forma de pilotar ao máximo. Não coincidentemente, Mark Webber foi ficando cada vez mais para trás, ganhando um ‘respiro’ quando as regras eram apertadas e Adrian Newey ainda não havia encontrado alguma forma de retomar o uso dos gases. Com o tempo, o próprio comportamento do carro acabou se tornando contra-intuitivo. Para todos, menos para Vettel.

Sem tanta pressão aerodinâmica e com mais torque das unidades de potência, agora é o piloto que tem de lutar contra sua intuição. No primeiro ano sem difusor soprado, o estilo de Vettel provou ser não apenas mais lento, como também provocou maior desgaste de pneus em relação a Ricciardo.

Tudo isso significa que Vettel é uma farsa? Ninguém ganha quatro campeonatos por coincidência, seja com qual carro for. Mas o que os números que o alemão de apenas 27 anos já tem vão representar quando ele encerrar a carreira depende de como ele vai se reinventar daqui em diante.

Estilos de pilotagem: Fernando Alonso

Motor Racing - Formula One Testing - Day 3 - Jerez, Spain

Muito se fala sobre como um determinado carro favorece o estilo de pilotagem de certo piloto para se explicar, por exemplo, como um companheiro consegue ser rápido enquanto o outro sofre. O tema ganhou maior destaque ano passado, quando, após uma mudança importante no regulamento, Sebastian Vettel e Kimi Raikkonen sofreram de maneira que despertou a desconfiança em muitos da qualidade de homens que chegaram ao título mundial.

Começo hoje uma série sobre as particularidades dos estilos de pilotagem daqueles considerados os melhores da atual geração. Para iniciar os trabalhos, o estilo que tem se provado ao longo dos anos o mais adaptável de todos: de Fernando Alonso.

A forma agressiva como o espanhol inicia as curvas era mais evidente naquelas Renault com traseiras pesadas até 2006, mas continua presente até hoje. Tudo começa com uma freada de média para forte, já iniciando ainda na freada a virar o volante. O movimento dos braços acelera na parte final, causando uma espécie de saída de dianteira falsa, controlada com o freio. É como se o piloto fizesse duas curvas em uma, aliviando e apertando a pressão no pedal de forma a manipular o equilíbrio entre os quatro pneus.

Dependendo da situação, isso pode fazer com que a traseira escape, mas Alonso espera que isso aconteça e já está preparado para responder rapidamente, sem perder tempo. Felipe Massa não chega a ter um estilo muito distante disso, ainda que a maior agressividade na frenagem no caso do brasileiro torne sua tocada menos consistente e com maior propensão a bloqueio dos pneus.

O estilo Alonso permite entrar muito forte na curva, mas evitando que o carro saia muito de traseira e, com isso, o desgaste dos pneus traseiros. Mas o ponto crucial é que é ele quem determina como o carro vai se comportar, e não o contrário. É uma tocada que você não vai aprender em nenhum manual e, na teoria, não funcionaria. Mas o que temos visto ano após ano é sua grande adaptabilidade e eficiência.

Treino é treino…

É fácil fazer bonito nos testes de pré-temporada. Não precisa nem andar fora de regulamento, como muita gente repete sem nenhuma base teórica. Fazer isso, aliás, seria extremamente contraproducente. E, no final das contas, não é necessário.

Imaginem que cada 10 quilos a mais no tanque de gasolina – na F1 a conta é feita em quilos, e não em litros – representa 0s3 por volta no circuito de Jerez, que abrigou os primeiros testes da pré-temporada, entre domingo e quarta-feira. Para se ter uma ideia do impacto do peso do combustível, a pole position do GP da Espanha do ano passado foi feita em 1min25s232. Com os mesmos pneus, mas de tanque cheio, o líder começou a prova andando em um ritmo de 1min32. Isso mesmo, sete segundos mais lento!

E tem ainda a questão dos pneus. Vemos ao longo da temporada que a diferença entre os pneus macio e médio, por exemplo, raramente é menor do que 1s. E nos testes não há qualquer obrigatoriedade em relação ao composto utilizado.

É por essas e outras que, quando se diz que os tempos mais rápidos das Ferrari de Sebastian Vettel e Kimi Raikkonen em três dos quatro dias de treinos – e do estreante brasileiro Felipe Nasr, da Sauber – não significam muita coisa, é pra valer.

Raikkonen fechou o primeiro de três testes da pré-temporada como o mais rápido, com uma marca estabelecida com pneus macios e em uma saída na qual deu poucas voltas, indicando que não estava com muito combustível.

Que a Ferrari melhorou, não há dúvidas, haja visto que era difícil piorar em relação ao desequilibrado e lento modelo de 2014, com o qual a Scuderia passou seu primeiro ano desde 1993 sem vitórias. E o próprio Raikkonen se disse bem mais confortável no carro e elogiou os ganhos da nova unidade de potência, um dos pontos mais deficitários do ano passado. Vale lembrar que a Sauber também usa motor Ferrari.

Porém, depois de terminar a temporada mantendo uma vantagem considerável em relação à concorrência, a Mercedes também demonstrou ter dado um salto – e não precisou liderar nenhuma sessão para provar isso.

As simulações de corrida de Nico Rosberg e Lewis Hamilton chamaram a atenção: o alemão fez 24 voltas – portanto, tinha um volume considerável no tanque – com tempos entre 1min23 e 1min24, usando os pneus médios (nenhum dos pilotos da Mercedes chegou a colocar o composto macio durante o teste). Comparando com o 1min20s8 de Raikkonen e as condições em que esse tempo foi obtido, dá para concluir que os atuais campeões mundiais poderiam batê-lo. Com um pé nas costas.

 Coluna publicada no jornal Correio Popular.

Mais confusão no desenvolvimento de motores

Motor Racing - Formula One Testing - Day 4 - Jerez, Spain

A questão do desenvolvimento de motores ao longo da temporada ainda não teve seu último capítulo. Depois da FIA ter reconhecido uma brecha encontrada pela Ferrari e liberado os fabricantes de uma data de homologação que simplesmente não estava explicitada no regulamento de 2015 (o contrário do que acontecera em 2014), a Honda continua lutando para ter mais direitos mesmo estreando sua unidade de potência nesta temporada.

A questão é mais complexa do que eu havia inicialmente exposto no blog. Vamos ao que está acertado até agora:
O regulamento prevê que cada fabricante use até 32 tokens para alterar peças da unidade de potência. O token é uma espécie de ficha, dando pesos diferentes a mudanças em cada parte do motor – veja quais os pesos na página 89 do regulamento técnico. A unidade de potência é formada, no total, por 66 tokens, ou seja, em 2015, 48% do motor pode ser alterado.

O que será modificado e quando isso vai acontecer são decisões que cada fabricante deve tomar dependendo de sua estratégia. Nada impede que, por exemplo, a Mercedes chegue a Melbourne tendo usado 20 fichas e deixando as 12 restantes para o decorrer da temporada, e a Ferrari praticamente zere as fichas disponíveis.

Isso tudo sempre lembrando que cada piloto tem direito a apenas quatro unidades de potência durante o ano.

É claro que nenhum fornecedor quer entregar quantos tokens pretende usar até a Austrália. A Ferrari já avisou que só quer “gastar poucos antes do início da temporada para manter uma oportunidade significativa de desenvolvimento ao longo do ano.” A Renault diz ter “usado a maioria dos tokens para a primeira corrida, então o uso no decorrer da temporada será modesto.”

A Mercedes, por sua vez, está escondendo o jogo sobre qual estratégia utilizará. O caminho mais óbvio para quem dominou 2014 seria economizar tokens no início e ir usando o restante à medida que o campeonato avança, dando chance de testar melhor o que for alterado. Afinal, como salientou Rob White, da Renault, “se introduzir as mudanças no início da temporada, a tecnologia estará mais imatura, mas pode dar mais performance relativa, enquanto guardar para depois assegura que a novidade será mais testada, mas o impacto na performance é potencialmente menor.” Porém, a permissão concedida à Honda pode alterar o jogo.

O caso Honda

Inicialmente, a Honda, por estrear neste ano, não teria direito a usar nenhum dos 32 tokens. Após os japoneses reclamarem, a FIA abriu uma brecha: chegando na Austrália, tiraria-se uma média dos tokens ainda não utilizados pelos três fabricantes (ou seja, o que seria atualizado ao longo do ano) e esse seria o número ao qual a Honda teria direito.

De acordo com um dos jornalistas mais bem informados do paddock, o alemão Michael Schmidt, a expectativa é de que a Ferrari use 20 tokens até Melbourne (deixando 12 para o restante do ano), a Renault use 25 (faltariam 7) e a Mercedes, 26 (faltariam 6).
Somando e dividindo tudo, a Honda teria direito a 8 tokens (lembrando que, na necessidade de arredondar, sempre será para baixo, mesmo se o resultado for 7,9, por exemplo).

Os japoneses não estão satisfeitos com a resolução e querem, pelo menos, o mesmo número de tokens do rival que tiver usado menos até a Austrália (no exemplo acima, seriam os 12 da Ferrari). E, é claro, os italianos serão os primeiros a resistir. Mais uma para a série “pra quê facilitar?” dos gestores da Fórmula 1.

Os 3 problemas dos novos bicos

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De degraus a formas pouco elegantes, os bicos dos carros de Fórmula 1 vêm dando trabalho para a FIA depois que a entidade resolveu restringir a altura em nome da segurança. Além desse objetivo não ter sido inteiramente atingido devido às soluções encontradas pelos engenheiros, de quebra, surgiram outros problemas. Estéticos.

Para ficar de bem com a segurança e com o espelho, a categoria tem nos bicos sua maior mudança no regulamento técnico para este ano. Por um lado, os carros estão mais bonitos; por outro, a criatividade para encontrar novas saídas vale menos e os modelos estão mais padronizados.

Aquelas prolongações do ano passado eram estruturas independentes do próprio bico e que apenas existiam para satisfazer as regras, sendo o mais estreitas possíveis para não interferir no fluxo de ar embaixo do bico. Equipes como Mercedes e Ferrari, por outro lado, optaram por abaixar bastante a parte final do bico e criar um venturi, uma área de aceleração do fluxo de ar.

Esses times tendem a sofrer menos com o novo regulamento, que requer maior simetria e transição consistente em toda a extensão do bico e prevê uma circunferência mínima – na prática, inibe as feiosas estruturas independentes. O problema é que o fluxo não entra mais onde o túnel de vento diz ao engenheiro que ele seria bem-vindo. E cada um encontra uma maneira de minimizar os danos – ao mesmo tempo em que faz o bico “conversar” com o restante do projeto.

Em termos de rendimento, perde-se downforce, pois foi justamente para aumentar o fluxo de ar no difusor que os bicos começaram a subir no início dos anos 1990. E ganhar performance por meio de um assoalho eficiente na geração de downforce é mais útil do que por meio das asas, que também geram arrasto – ou resistência ao ar. Por isso é uma área tão importante.

O que temos visto são basicamente dois tipos de solução: há os bicos mais arredondados, como os de McLaren, Ferrari ou Mercedes, e os “pontudos”, como da Williams. A diferença, de acordo com Pat Symonds, diretor técnico do time de Felipe Massa, é que um shape como o do FW37 “é melhor aerodinamicamente, ainda que seja mais difícil passar no crash test.” Sim, não é só com a geração de pressão aerodinâmica com que os engenheiros têm de se preocupar.

E também há um terceiro elemento complicador: é no bico do carro que estão montados diversos elementos, de barras de torção até centrais eletrônicas, em alguns casos. Então os bicos mais achatados criam a dificuldade de acomodação de toda a parafernália, e por isso vemos bicos mais largos como o da McLaren.

Como bem descreveu o próprio Symonds, resolver todas essas questões com mais uma mudança nos bicos – a quarta em quatro anos – foi “uma dor de cabeça maior do que o esperado”.

Sinais

Crédito: James Moy
Crédito: James Moy

Novas caras, rostos conhecidos com uniformes diferentes, carros mais elegantes, o retorno de uma parceria histórica. A pré-temporada da Fórmula 1 começa neste final de semana com muitas novidades, mas será que todas essas mudanças serão suficientes para abalar o domínio avassalador que a Mercedes obteve ano passado?

Essa é uma das perguntas que os quatro dias de atividades de Jerez devem começar a responder. Os campeões do mundo já saíram na frente, colocando o carro na pista na última quinta-feira, e o fato das mudanças no regulamento deste ano serem mínimas dá motivos para que Lewis Hamilton esteja confiante no tricampeonato e Nico Rosberg acredite que terá outra chance de ouro para conquistar seu primeiro título.

No primeiro teste, as equipes não costumam visar performance, focando-se em checar o funcionamento do carro e seus sistemas, além da correlação entre os dados obtidos nos simuladores e túneis de vento e na pista. E essa missão será particularmente importante para a McLaren, única equipe do grid que contará com um motor completamente novo, da Honda, que retorna este ano à categoria para retomar uma das parcerias mais vitoriosas da história, com quatro títulos em cinco anos entre 1988 e 1992.

Os primeiros testes da McLaren-Honda, usando o carro do ano passado, foram marcados por problemas na nova unidade de potência, por isso ganhar quilometragem nos quatro dias em Jerez se tornou fundamental para que o time que conta com a dupla mais experiente do grid, Fernando Alonso e Jenson Button, chegue bem preparado no início da temporada.

Afinal, foi logo no primeiro teste do ano passado que a Red Bull percebeu que teria um ano bem diferente dos quatro títulos das temporadas anteriores, muito em função dos problemas da unidade de potência da Renault, que permitiram que o time completasse apenas 21 voltas em quatro dias. Após um ano de experiência, é de se esperar um salto importante, mas o tamanho dessa melhora será fundamental para prever se o time poderá almejar superar as Mercedes em 2015.

Depois de sofrer com a Red Bull no primeiro teste de 2014, Vettel espera um começo mais produtivo em sua nova caminhada com a Ferrari. O time italiano também sofreu com uma unidade de potência deficiente ano passado, além de um carro desequilibrado. Os pilotos costumam dizer que, após dar poucas voltas, já têm uma boa ideia de como será sua temporada. Vejamos, portanto, o que a expressão de cada um deles revelará após esse primeiro contato com suas novas máquinas.

Coluna publicada no jornal Correio Popular

Nem a McLaren é só motor

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Tem-se falado tanto em motores nesta pré-temporada da Fórmula 1 que nem parece aquela mesma categoria rendida às engenhosas soluções aerodinâmicas de Adrian Newey de 15 meses atrás. Mas será que ter a melhor unidade de potência significa tudo hoje em dia e o campeonato de 2015 será decidido apenas por quem desenvolver melhor seus turbos e unidades de recuperação de energia?

O desenho da própria temporada passada prova que não. Afinal, justamente a Red Bull de Newey (que já declarou ver a F-1 de hoje como um compromisso 50/50 entre chassi e motor) se mostrou tão boa do ponto de vista aerodinâmico que nem os cavalos a menos – segundo a Renault, 60 no final do ano – impediram que o time batesse todo o restante do grid. Menos a Mercedes.

Mercedes que fez toda a lição de casa correta, principalmente em termos de acomodação da nova unidade de potência.

São dois os pontos fundamentais do domínio da Mercedes – e que explica o banho que os alemães deram até em quem também tinha a mesma unidade de potência: primeiro, a inteligente e compacta suspensão dianteira, que melhorou o fluxo de ar para o restante do carro; segundo, a eficiência do sistema de arrefecimento permitiu uma traseira mais enxuta, chegando a níveis semelhantes aos de 2013 mesmo com uma necessidade de resfriamento muito maior.

Esses dois pontos também chamam a atenção na McLaren-Honda. Os japoneses são famosos por trabalharem bem com espaços pequenos, algo que se transferiu da cultura para a indústria automobilística do país. E parece que o mesmo se aplica em seu retorno à Fórmula 1, com uma parte traseira bastante enxuta. A suspensão – que segue sendo pushrod, vejamos o que a Ferrari faz – é incrivelmente achatada, visando trabalhar bem o fluxo de ar junto do novo bico, que ganhou ares de Red Bull, talvez sinal da influência do ex-braço direito de Newey, Peter Prodromou.

É óbvio que, se o motor Honda não andar, não tem aerodinâmica que salve. Mas colocar tudo na conta dos japoneses, alemães ou de qualquer outra montadora é ignorar uma parte que ainda é capital na Fórmula 1.

A Fórmula 1 dos V6 é lenta?

Muita gente torceu o nariz em Mônaco ano passado quando terminou a classificação da GP2: o pole position na ocasião, Jolyon Palmer, que viria a ser campeão da temporada, fizera um tempo melhor do que o último colocado da Fórmula 1, Marcus Ericsson, da Caterham.

Para efeito de comparação, o orçamento da pior equipe do grid da F-1 é 25 vezes maior do que de um time da GP2. As mudanças de regulamento tinham ido longe demais?

Essa noção de que a Fórmula 1 tinha perdido a mão ganhou força junto das reclamações pelo ruído mais fraco dos motores V6 turbo híbridos e pelo domínio de apenas uma equipe.

A expectativa é que pelo menos o problema dos tempos de volta esteja sanado já no segundo ano de uma tecnologia que, temos de lembrar, é pioneira, especialmente na recuperação de energia calorífica para gerar mais potência. Com o desenvolvimento das unidades de potência, a Pirelli espera uma evolução de dois a três segundos por volta.

Caso isso se confirme, significaria um retorno aos tempos de volta da época em que a Fórmula 1 teve seus carros mais velozes – mais especificamente, em 2004, ano em que foram obtidos todos os recordes, excluindo as pistas novas ou que foram alteradas de lá para cá. E olha que estamos falando de V10 e aerodinâmica mais livre.

Na verdade, os carros ano passado, mesmo com os motores pouco desenvolvidos, ficaram a 10km/h do recorde de velocidade máxima da categoria, que é de 372km/h e foi estabelecido nessa época.

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É claro que os pneus são outros, não há reabastecimento e hoje utiliza-se o DRS na classificação. A comparação, portanto, é difícil. Também é verdade que os carros ficaram devendo mais em termos de pressão aerodinâmica (para comprovar isso, basta ver em que tipos de circuito a diferença para 2013 foi maior) do que de motor.

Ainda assim, inquietos com esse aumento dos tempos de volta, a falta de barulho e a noção de que a Fórmula 1 vem perdendo sua aura de topo do automobilismo, os dirigentes já acenam com mudanças para 2017. Estariam se mexendo cedo demais ou toda essa onda de energia recuperada não tem a ver com a categoria?

As 5 melhores corridas de Alonso na Ferrari

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Depois da retrospectiva dos momentos mais marcantes dos seis anos – e quatro títulos – de Sebastian Vettel na Red Bull, chegou o momento de recordar o melhor da passagem de Fernando Alonso na Ferrari.

Enquanto já está claro que a parceria Vettel/Red Bull ficará marcada pelos triunfos – ainda que a valorização do papel do alemão nesse domínio esteja diretamente relacionada ao que ele vai conseguir fazer daqui em diante sendo testado em diferentes situações – ainda é difícil mensurar o que a Era Alonso vai significar daqui alguns anos. Será que a noção geral será de que um grande piloto desperdiçou um período precioso em uma equipe que não lhe deu chance real de ser campeão? Ou que a Ferrari é que perdeu seu tempo focando todas as suas forças em alguém que não foi um líder bom o bastante?

Seja como for, a parceira Alonso/Ferrari deu o que falar. E nos trouxe momentos inesquecíveis.

5. GP da Hungria de 2014

Essa prova ficou marcada por mais um final excepcional de Daniel Ricciardo, passando Lewis Hamilton e o próprio Alonso nas últimas voltas para vencer a segunda da carreira.

O fato do espanhol estar na liderança até três voltas do fim foi um dos feitos mais impressionantes de toda a temporada. Foram 32 voltas de excelente ritmo em um pneu macio que já fora utilizado na classificação.

Não coincidentemente, a performance veio em uma pista que neutralizava a desvantagem da unidade de potência da Ferrari e em uma prova de difícil leitura estratégica.

Leia mais: Guarde esse GP na memória

4. GP da Itália de 2010

Primeiro GP da Itália a bordo da Ferrari, primeira vitória. Mas não foi só por seu significado que o triunfo de Monza marcou. Na batalha com Jenson Button, que durou por toda a corrida, Alonso se recuperou de uma largada ruim para dar uma de Schumacher – nos tempos de Maranello – e executar com perfeição a estratégia.

Alonso largou na pole e perdeu a liderança na primeira curva para Button, que tinha um carro com bastante asa, que escapava nas Lesmo e na Parabolica, dificultando que o espanhol pegasse o vácuo. Logo ficou claro que a corrida teria de ser ganha no box. Inlap, posicionamento no box e outlap perfeitos pavimentaram o caminho para aquela que viria a ser a única vitória do bicampeão na casa italiana.

Leia mais: A volta dos que não foram – e uma decisão difícil 

3. GP da Espanha de 2013

Se ganhar um GP que só foi conquistado pelos poles em 16 dos últimos 18 anos saindo da quinta colocação já não fosse um feito por si só, a maneira agressiva como Fernando Alonso pilotou em Barcelona para sua segunda vitória no circuito catalão deixou essa prova marcada na passagem do espanhol pela Ferrari.

Tudo começou com uma largada alucinante e ultrapassagem dupla, sobre ninguém menos que Kimi Raikkonen e Lewis Hamilton, por fora, na traiçoeira curva 3. Dali em diante, quatro paradas nos boxes e pé direito cravado. Apresentação de gala daquela que viria a ser a última vitória de Alonso pelo time de Maranello.

Leia mais: Vencedores e perdedores do GP da Espanha

2. GP de Cingapura de 2010

Um momento decisivo na carreira de Fernando Alonso foi quando, aos 23 anos e ainda com apenas três vitórias no currículo, suportou uma incrível pressão de Michael Schumacher no quintal da Ferrari, em Imola, e venceu o GP de San Marino de 2005. O espanhol viria a, de certa forma, compensar aquela derrota do time italiano cinco anos depois.

E segurando outro alemão. Desta vez, Sebastian Vettel, em uma disputa de gato e rato que durou praticamente toda a prova, em um circuito escaldante e que não perdoa erros.

Curiosamente, este foi o primeiro grad chelem da carreira de Alonso, e o conquistou de forma bem mais dramática do que esse tipo de marca costuma ser: com o rival a 0s2 na linha de chegada!

1. GP da Europa de 2012

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Vencer largando de fora do 10 top é feito para poucos na Fórmula 1 moderna. Descontando Cingapura/08, isso só aconteceu uma vez nos últimos sete anos, naquele GP da Europa. E logo em Valência, circuito que ficou marcado pelo marasmo em sua curta vida no calendário.

É claro que Alonso teve sorte, com o abandono de Vettel, mas primeiro ele teve de se colocar em posição de se aproveitar da quebra do rival. E o fez com uma pilotagem agressiva e ultrapassagens decididas – o que dizer sobre as manobras sobre Schumacher, Webber e Grosjean?

Mas a aura especial daquela corrida vai além disso. A Espanha vivia um momento econômico especialmente delicado em 2012 e Alonso foi um dos ícones esportivos, ao lado de Nadal, Contador e da seleção de futebol, que ajudaram a elevar o moral nacional. E o piloto nunca demonstrou aceitar esse papel de maneira tão intensa quanto no momento em que parou sua Ferrari na frente da arquibancada para vibrar com a torcida.

Leia mais: Como Alonso conseguiu e uma nova forma de encarar Valência

As 5 melhores corridas de Vettel na Red Bull

Às vésperas de vermos Sebastian Vettel sendo apresentado oficialmente como piloto da Ferrari e Fernando Alonso novamente com o macacão da McLaren, fica o registro do final de duas eras na Fórmula 1: a passagem com mais fama do que glórias de cinco anos do espanhol no time italiano e os seis anos que cravaram o nome de uma nova força, a Red Bull, na história.

Começando pela parceria Vettel-Red Bull, duas forças que cresceram juntas e renderam alguns grandes momentos para a categoria. Recupero junto de textos atuais algumas impressões e análises publicadas na época em que as corridas foram disputadas.

5. GP da China de 2009

Era apenas a terceira corrida do alemão de 21 anos em uma equipe que, pela primeira vez em sua história, tinha feito um carro competitivo. Apesar do domínio da Brawn de Jenson Button no início da temporada, a Red Bull teria a chance de mostrar, sob chuva em um circuito complicado como o de Xangai, que tinha se tornado protagonista.

E coube a Vettel, e não ao companheiro bem mais experiente, Mark Webber, mostrar isso. O alemão largou na pole position e tomou as decisões certas em uma prova com Safety Car e muitas escapadas.

4. GP de Mônaco de 2011

No papel, uma vitória de ponta a ponta. Na realidade, um misto de agressividade e delicadeza para fazer os pneus Pirelli resistirem por mais de 50 voltas, mesmo recebendo forte ataque de Fernando Alonso e Jenson Button, ambos com borracha bem mais nova, no terço final da prova.

No fim, é verdade, Vettel seria ajudado por uma bandeira vermelha, que permitiria que trocasse os pneus, acabando com a vantagem de Alonso e Button. Mas não dá para esquecer as emocionantes voltas em que Vettel, que se segurava com uma parada, Alonso, após duas trocas, e Button, voando na tática de três pit stops, andavam pelo sinuoso circuito como se fossem um só. Tanto, que receberam a bandeirada separados por 2s3!

3. GP de Abu Dhabi de 2012

Ganhar 21 posições em um circuito estigmatizado como o parque de diversões mais sem graça de que se tem notícia. Justamente em uma prova decisiva para seu tricampeonato – na temporada de maior nível de pilotagem entre os postulantes ao título dos últimos anos – Sebastian Vettel fez uma das melhores corridas da carreira.

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Fico com as linhas que escrevi na época, em uma análise da prova, que pode ser conferida na íntegra neste link: “Há duas maneiras de olhar o feito: os detratores apontarão sorte e um carro configurado para ultrapassar; os admiradores, a prova cabal de que o bicampeão sabe ultrapassar e se dar bem largando mais atrás. Contudo, nenhuma delas explica completamente a corrida do alemão. Uma grande parcela de competência o colocou em posição de desfrutar da sorte.”

2. GP do Brasil de 2012

A exemplo da corrida de Abu Dhabi, que acontecera duas semanas antes, Vettel teve de colocar a cabeça no lugar e se safar de uma situação bastante desfavorável na corrida que lhe daria o terceiro título. O alemão largou mal e se viu no meio do pelotão, sendo acertado por Bruno Senna. Caiu para último, com o carro avariado.

Foi escalando o pelotão e chegou ao quinto lugar, suficiente para garantir o título, quando tomou uma decisão errada, colocando pneus de seco logo antes de voltar a chover, e viu seu campeonato mais uma vez sob risco. Sempre com a cabeça no lugar, fez o suficiente para não ser ultrapassado por Alonso na tabela do campeonato e sagrou-se tri.

Leia mais: Como Vettel ganhou e perdeu por duas vezes o campeonato

1. GP de Cingapura de 2013

Quando buscar um exemplo clássico do que foi o período Vettel/Red Bull, é este o momento definitivo: Sebastian andando mais de 2s/volta mais rápido do que todos os demais, incluindo o próprio companheiro Mark Webber nas ruas de Cingapura.

A performance histórica do alemão em um dos circuitos mais seletivos do campeonato define bem os motivos pelos quais o piloto, a bordo dos carros de Adrian Newey na Red Bull, venceu quatro títulos seguidos: uma mistura entre um equipamento muito forte e um estilo de pilotagem perfeitamente alinhado ao carro. Naquele 22 de setembro de 2013, homem e máquina se tornaram um só.

Leia mais: Ganhadores e perdedores do GP de Cingapura

O mistério alemão

Motor Racing - Formula One World Championship - German Grand Prix - Practice Day - Hockenheim, Germany

A Alemanha é um mistério. Eles dominam o esporte há cinco anos – primeiro com os quatro títulos em sequência de Sebastian Vettel, depois com a Mercedes ganhando tudo e dando sinais de que não vai parar de vencer tão logo – mas vivem uma crise de interesse pela categoria. E correm o risco de ficar sem um Grande Prêmio nesta temporada.

Os números não mentem. A Alemanha é um dos países que protagonizaram a maior queda de audiência entre 2013 e 2014: 17,4%. A última edição do GP do país contou com menos de 50 mil espectadores no domingo – para efeito de comparação, 85 mil estiveram no GP da Grã-Bretanha para ver as sessões de treino livre da sexta-feira.

A queda do interesse alemão interfere diretamente na saúde financeira de seus circuitos. Em 2008, teve início um revezamento entre os circuitos de Hockenheim e Nurburgring, não para dar vasão a um interesse fora do comum, mas justamente porque os organizadores de ambas as pistas não conseguiam arcar com tanto prejuízo e decidiram realizar um GP a cada dois anos.

Porém, a situação de Nurburgring se tornou mais dramática após os administradores tentarem um ambicioso projeto para atrair o público durante todo o ano, com direito a parque de diversões, e acabarem imersos em dívidas e até com problemas com o governo alemão. E, sob nova administração, a lendária pista, que fez parte do primeiro calendário da história da Fórmula 1, em 1950, diz sequer ter um contrato para realizar a corrida de 2015.

O promotor da Fórmula 1, Bernie Ecclestone, entrou em cena para confirmar que o revezamento de pistas será desrespeitado e a prova, neste ano, será em Hockenheim. Os administradores do circuito, porém, nada sabem. Jogo de cena para forçar Nurburgring a se mexer? Muito provavelmente. Mas nada disso resolve o mistério alemão.

Há quem diga que a Alemanha vive uma ‘ressaca’ parecida com o pós-Senna no Brasil. Apesar dos títulos, Vettel não teria com o povo alemão a mesma identificação de Schumacher. E Rosberg, criado em Mônaco e com ares de bom moço, muito menos.

Há quem diga que o problema são os preços dos ingressos. Afinal, os alemães lotam os circuitos para ver as etapas da DTM, categoria nacional equivalente à Stock Car brasileira. E houve até quem justificasse que o sucesso no futebol tenha desviado as atenções.

O mais provável é que seja um pouco de tudo. O que não pode ser ignorado é que um dos berços do automobilismo está dando as costas para a categoria mesmo que, de lá, venham alguns dos maiores ícones das últimas duas décadas. Isso não é pouco.

Treine duro, corra fácil

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“Treine duro, corra fácil”. A frase do estreante Carlos Sainz vem acompanhada de um resumo do treino de dia, usando a modalidade predileta dos pilotos para trabalhos cardiovasculares na pré-temporada, o ciclismo de estrada: 4h42, 110km, 2.280m de elevação, 3.260kcal gastos.

No plano, porém no calor de Dubai, seu compatriota Fernando Alonso exibia seu feito do dia, 108km em 3h56. Para o bicampeão, que conviveu com lesões nas últimas temporadas, especialmente tendinites no joelho, trata-se de um período importante. Mas por que tanto treino se a temporada começa só em março? A fisiologia esportiva explica.

Trata-se de um trabalho de base, que visa desenvolver todas as valias físicas que serão demandadas durante a temporada. Com uma base bem feita, o trabalho do restante do ano, quando os pilotos estarão viajando e com menos tempo para treinar, será mais específico. Por exemplo: na Malásia, onde a temperatura nos cockpits pode chegar a 60ºC, a adaptação será ao calor e à umidade; em Mônaco, onde quase não há retas para ‘respirar’, o treino utilizado será intervalado e de resistência de força para os músculos do braço. E assim por diante.

Nesse momento do ano, as atividades cardiovasculares de longa duração são priorizadas. Afinal, treinamento de base e altos volumes são sinônimos, a fim de melhorar a estrutura do músculo cardíaco e adaptar o organismo para que, ao longo do ano, ele possa ser exigido em treinamentos mais intensos. A ideia é sempre forçar o corpo além de uma situação de prova para gerar as adaptações necessárias – a chamada resistência aeróbia – e se assegurar de que não faltará fôlego durante os GPs, o que prejudicaria a concentração e faria o piloto render menos. E é importante chegar já no início do ano bem, devido às etapas de alta demanda física da Malásia (uma das piores do ano, junto de Cingapura) e do Bahrein. Nesse período, também é feito um fortalecimento geral da musculatura como um meio de prevenção de lesões.

Há também a questão da balança: mesmo que o peso mínimo dos carros tenha aumentado em 11kg para esta temporada, permitindo que os pilotos desenvolvam mais massa muscular e não precisem enfrentar dietas tão restritivas, a folga não é tão grande assim, já que havia conjuntos acima do peso mínimo em 2014.

Ainda que os pilotos prefiram fazer seus treinamentos aeróbios na bike, são várias as possibilidades de trabalhar o coração. O próprio Sainz começou sua preparação esquiando, assim como faz Lewis Hamilton, pelo segundo ano consecutivo. A principal opção do inglês é o cross country com ski, que promove um trabalho cardiovascular e muscular intenso, especialmente nos membros superiores.

Untitled-1Felipe Massa, por sua vez, postou foto de treinamento funcional. Esse tipo de trabalho (na verdade, uma nomenclatura genérica para uma imensidade de possibilidades) é muito mais do que uma modinha: visa preparar o corpo para torná-lo mais eficaz para fazer seus movimentos naturais e tem a vantagem de ser bastante adaptável.

Mas o que os pilotos gostam mesmo de fazer nessa época do ano é se gabar de seus feitos. Na bike, Bottas revelou ter gasto mais de 1100kcal gastos em apenas um treino. Na última sexta-feira, o finlandês publicou uma foto sua correndo e revelou que aquela era a nona sessão de treino da semana. Esse está levando ao pé da letra a definição de que treino de base é feito de altos volumes.

Já o companheiro de Felipe Nasr na Sauber, Marcus Ericsson, optou por passar duas semanas na Tailândia em um centro de treinamento com instalações de nível olímpico, com estrutura especialmente voltada para o treino de triathlon. Em pleno domingo, lá estava o sueco fazendo uma sessão de mais de 4h de bike.

Falando em triathlon, impossível não lembrar de Jenson Button, que nem aproveitando as férias para casar deixou o treinamento de lado, nadando em mar aberto, pedalando e correndo.

Quem parece já estar em outra fase do treinamento é Romain Grosjean, que postou uma atividade mais específica, que certamente será repetida durante o ano e é um bom exemplo de como um piloto se prepara: uma corrida intervalada simulando o aumento da frequência cardíaca na classificação, ou seja, respeitando o tempo do Q1, Q2 e Q3. É o treinamento físico assegurando que os pilotos estarão com a cabeça apenas na pilotagem durante a temporada.

Legado

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Lá se vão mais de três meses do acidente – que até hoje parece surreal – de Jules Bianchi no GP do Japão. O legado da batida de maiores proporções na Fórmula 1 dos últimos 20 anos começa a tomar forma. E deixa muito a desejar.

Nesta semana, tivemos duas notícias indiretamente relacionadas ao acidente que me chamaram a atenção: a Pirelli cobrando que as equipes se movimentem para um teste representativo com pista molhada e os organizadores do GP da Austrália garantindo a largada de sua prova para as 17h.

Lembremos que um dos motivos apontados para que Sutil e Bianchi aquaplanassem naquele 5 de outubro foi a insistência em permanecer na pista com pneus intermediários desgastados mesmo com o aumento da chuva. Como Sebastian Vettel chegou a comentar na época, isso se tornou regra entre os pilotos devido à fraca performance dos pneus de chuva da Pirelli: a preferência é assumir o risco de aguentar ao máximo com os intermediários.

Como de costume, a tradicional impossibilidade das equipes trabalharem para o bem comum trava essa questão dos testes da fornecedora de pneus há anos. E não há solução em vista a curto prazo, mesmo que o item esteja na lista de recomendações da comissão que avaliou as causas do acidente de Bianchi.

No caso dos australianos, a manutenção da largada no horário mais propício para vender a prova na Ásia e, principalmente, na Europa, passa por cima de outra diretriz da comissão. A indicação é de que a largada não ocorra a menos de 4h do pôr-do-sol – que costuma ser por volta das 19h30 na cidade de Melbourne em março.

Dá tempo? Claro, se tudo correr bem. Mas é mais um indicativo de que o fator inicial que desencadeou o aumento de risco do GP do Japão de 2014, cujo horário não sofreu nenhuma alteração mesmo com a previsão da chegada de um tufão, ainda pode se repetir.

Resta saber se a terceira recomendação mais importante – e única que, até agora, virou regra – vai funcionar: o Safety Car Virtual. Pode ser que demore um pouco para vermos a novidade em ação, uma vez que ela será acionada com as bandeiras amarelas duplas, mas a medida tem tudo para cumprir seu papel. Afinal, será controlada da mesma forma que a velocidade em períodos de Safety Car, por meio da central eletrônica, que envia um delta de tempo de volta mostrado no display do volante. Pelo menos, se infelizmente tivermos outra situação como a de Suzuka, não vão poder culpar a falta de prudência do piloto.

Miopia

Motor Racing - Formula One World Championship - Belgian Grand Prix - Race Day - Spa Francorchamps, Belgium

A confirmação da estreia de Max Verstappen assustou a Fórmula 1, não há como negar. Afinal, o holandês vai largar no GP da Austrália, em março, com 17 anos e apenas 11 finais de semana andando de Fórmula 3. É um salto de provas de duração máxima de 35 minutos, usando motores de 240 cavalos para disputas que podem chegar a 2h com carros cuja potência beira os 800cv.

O mundo do esporte em geral tem se deparado com a questão da pouca idade de seus novos ídolos. Afinal, com o aprimoramento dos sistemas de treinamento e a iniciação precoce, várias modalidades têm visto grandes atletas surgindo ainda no final da adolescência. No automobilismo, como trata-se de um esporte de risco, a preocupação com a falta de experiência é ainda mais justificada.

Por outro lado, a história do esporte mostra que aqueles atletas especiais inúmeras vezes demonstraram desde bem cedo a que vieram, como Pelé campeão do mundo aos 17 anos ou Jordan, que costumava anotar mais de 40 pontos por jogo ainda na época de colegial.

Então como controlar a ascensão de atletas que correm o risco de estar imaturos demais para disputar em alto nível sem impedir que os grandes demonstrem seu potencial logo cedo?

A resposta que a Federação Internacional de Automobilismo deu à precocidade de Verstappen não resolve essa questão. Além de um limite de idade, a entidade estabeleceu uma espécie de ranking, dando pesos diferentes às categorias de base e obrigando os postulantes à superlicença – espécie de CHN para pilotos de F-1 – a conquistarem determinados resultados antes de subirem ao topo.

Um dos problemas é a própria pontuação, que claramente visa promover os campeonatos diretamente organizados pela FIA e carece de lógica. Disputar a Fórmula Renault 3.5 Series, por exemplo, que vinha ganhando espaço como categoria formadora em detrimento da GP2 nos últimos anos e que usa motores de mais de 500cv, vale o mesmo que a GP3, com máquinas pelo menos 20% menos potentes. E, pior, a categoria mais valorizada pelo sistema de pontuação é a F-2, que está em fase de estudos.

A lista de pilotos que ficariam de fora – ou, pelo menos teriam sua estreia na Fórmula 1 adiada – mostra qual o problema das medidas adotadas. Ao mesmo tempo em que lá estão aqueles que chegaram à categoria mais por razões financeiras do que por performance (Marcus Ericsson, Will Stevens, Giedo van der Garde e Max Chilton, por exemplo), nada menos que quatro dos cinco campeões do mundo do atual grid (Alonso, Raikkonen, Button e Vettel) também não teriam pontuação suficiente para estrear, além da nova estrela Daniel Ricciardo. Voltando no tempo, nomes com Ayrton Senna e Michael Schumacher também estariam fora da lista da FIA.

Isso mostra que a entidade contornou, mas não resolveu a questão fundamental que trava vários setores da Fórmula 1, um dos campeonatos mais ricos do mundo: a má distribuição de dinheiro. Afinal, o problema não está na idade ou na experiência – quem é bom o suficiente, e a história mostra isso, supera estas disparidades. A relação qualidade/lucro é que deve ser revista.

Entenda a liberação na data de homologação dos motores

Motor Racing - Formula One World Championship - Abu Dhabi Grand Prix - Race Day - Abu Dhabi, UAE

O ano da Fórmula 1 começou com uma notícia que parece piada: a FIA reconheceu uma brecha no regulamento que desobriga os fornecedores de motores de homologar suas unidades de 2015 em 28 de fevereiro, como ocorreu em 2014. Isso significa que será possível que Mercedes, Renault e Ferrari melhorem as unidades de potência durante o campeonato. A Honda, como estreia em 2015, continua com o prazo anterior. É o fim do domínio da Mercedes e a promessa de um ano vergonhoso para a McLaren? E os gastos, vão às alturas novamente? Como sempre no caso da Fórmula 1, não é tão simples assim.

Tratarei mais a fundo sobre o que é permitido ser modificado nas unidades de potência em outro post, mas, para compreender o que significa essa liberação da FIA, é preciso conhecer alguns itens básicos das regras:

– apesar de não haver data específica para homologação (a não ser no caso da Honda), cada fabricante poderá homologar apenas um motor em 2015. Antes disso, terá de usar a unidade de 2014. Ou seja, postergar a homologação e descongelar o desenvolvimento ao longo da temporada são coisas distintas.

– cada piloto só pode usar quatro unidades de potência durante a temporada.

– a quantidade de mudanças permitida é limitada. Vou explicar o complicado sistema em outra oportunidade, mas trabalha-se, para 2015, com alteração de um limite de 32 tokens, o que representa 48% dos itens do motor. O token é como se fosse uma “moeda”: por exemplo, mudar toda a MGU-H “custa” 2 tokens.

Com isso, na prática, a permissão de uma homologação após o início da temporada dá mais tempo especialmente para Renault e Ferrari reagirem, mas tem seus custos. Primeiro, porque não é tudo que pode ser modificado. Segundo, porque ninguém pode se dar ao luxo de demorar muitas etapas para homologar o novo motor, pois teria de continuar usando a unidade de 2014 e espera-se um grande salto de potência em relação ao ano passado.

Exatamente por isso, é fácil entender por que a Honda foi deixada de fora: ela não tem um motor de 2014, então precisa homologar o seu antes dos testes de pré-temporada, assim como fizeram seus rivais ano passado. Continua havendo um risco dos japoneses não acertarem a mão e terem um ano difícil? Sim, mas liberá-los para, efetivamente, homologar dois motores no mesmo ano não seria justo.

Juntando todos esses fatores, vejo duas possibilidades de aproveitar a brecha dada pela FIA: o mais óbvio seria experimentar tudo o que for possível nos testes e homologar o motor antes da Austrália. O mais arriscado seria ganhar cerca de dois meses de desenvolvimento, usar o motor de 2014 nas quatro (ou cinco, se o GP da Coreia acontecer, o que é bastante improvável no momento) primeiras etapas e utilizar as outras três unidades permitidas (já com a versão 2015 do motor) nos 16 GPs seguintes.

Seja como for, isso não deve representar uma grande ameaça para a Mercedes ou um grande prejuízo para a Honda ou para o bolso dos fabricantes. Mas novamente dá a mensagem de que interesses podem moldar o regulamento e expõe a FIA ao ridículo.

Caminhos perigosos

Há um ano, a Fórmula 1 vivia a expectativa da maior revolução tecnológica de sua história, que traria consigo um novo panorama na relação de forças da categoria, destronando os então imbatíveis da Red Bull e promovendo a ascensão da Mercedes e sua competente integração entre a unidade de potência e o chassi.

Há quem diga que toda essa revolução foi um tiro no pé. Muita gente torceu o nariz para o som menos potente e mais “melódico” dos novos motores, os custos das equipes foram às alturas sem que os dirigentes entrassem em acordo sobre uma consciente redução de gastos, que se faz necessária e “mofa no escaninho” há anos a exemplo da reforma política no Congresso brasileiro, e, na prática, a dinastia de uma equipe foi transferida para outra.

Porém, o importante, e de muitas formas corajoso, passo dado em direção a tecnologias mais sustentáveis e diminuição de pelo menos 35% no consumo de combustível nunca seria algo absorvido facilmente em tão pouco tempo. Se a adoção de carros que poluam menos enfrenta resistências até entre os consumidores comuns, o que dizer de quem passou a vida inteira jogando poluentes no ar somente para saciar seu gosto pela velocidade?

Toda mudança cultural é lenta. E, na Fórmula 1, há mais do que a cultura do culto a motores beberrões e barulhentos que precisa ser mudado. Afinal, uma categoria que rivaliza em termos de lucro com eventos com muito mais datas ao longo do ano, como o campeonato inglês de futebol ou as grandes ligas norte-americanas, e só fica atrás das Copas do Mundo de futebol e dos Jogos Olímpicos vive a séria ameaça de ter um grid de apenas 18 carros, fruto da distribuição escusa e desigual dos recursos.

Apesar das mudanças sutis no regulamento de 2015 significarem que as equipes terão menos desafios técnicos, isso não quer dizer que a Fórmula 1 esteja navegando por mares mais calmos. E é nesse clima de instabilidade que mora o perigo.

A história é prova disso. Não foram poucas as vezes em que o promotor da categoria, Bernie Ecclestone, se aproveitou – e até fomentou – esses momentos de crise para ganhar poder. E, mesmo aos 84 anos, o ex-vendedor de carros usados não parece disposto a largar o osso. E faz campanha para que a Fórmula 1 retroceda até na questão dos motores, jogando com os interesses de quem tenta derrubá-lo, como sempre fez com maestria. Uma nova vitória de Bernie seria outra derrota para a competição, que precisa de estabilidade para acertar as contas e desenvolver uma tecnologia importante para o futuro.

 

Metas de Ano Novo

Motor Racing - Formula One World Championship - 2014 Abu Dhabi Grand Prix - Race Day - Yas Marina Circuit

Assim como muita gente gosta de fazer quando o Ano Novo se aproxima, a Fórmula 1 tinha lá suas metas no início de 2014. Quando decidi que hoje escreveria sobre as lições desta temporada, lembrei-me de uma lista que escrevera antes das luzes vermelhas se apagarem na Austrália e decidi checar se as previsões que fizera tinham realmente se concretizado.

O texto, de 12/03 (que pode ser conferido na íntegra neste link) apontava os motivos para não perder a temporada 2014 e os pontos que geravam dúvidas. E quase tudo acabou se confirmando. Ainda bem, contudo, que surgiram algumas surpresas no caminho.

Chacoalhão na relação de forças: “não estranhe se vir uma Force India confortavelmente na frente da Red Bull no GP da Austrália ou uma Williams, que ano passado suava para ficar no top 10, brigando por pódios”. A Red Bull acabou se recuperando ao longo do ano e foi a única a vencer corridas além da Mercedes, mas de fato teve um ano difícil, enquanto a Williams foi o time que mais cresceu de 2013 para cá.

Red Bull longe do topo: “Apesar da equipe ter condições de dar a volta por cima, não dá para saber quanto tempo isso vai demorar. Bom para vermos como Vettel vai se portar dentro e fora das pistas.” Nove meses depois, o então inquestionável alemão até que lidou muito bem com o ano difícil sob os holofotes, mas saiu de ‘casa’ por baixo, buscando escrever um novo capítulo de sua história na Ferrari.

Recomeço para Massa: “Massa tem tudo para conquistar, em 2014, seus melhores resultados desde 2008.” Na verdade, foi o melhor campeonato desde 2010, mas algumas situações que saíram de seu controle, especialmente em meados do ano, contribuíram para isso. O brasileiro começa 2015 com motivos reais para esperar ainda mais.

Alonso e Raikkonen sob o mesmo teto: “O nível de tensão vai depender das possibilidades ferraristas no campeonato, mas é certo que a dupla vai fazer bonito – e dar trabalho.” Essa foi a grande decepção do campeonato. Com a dificuldade de adaptação de Kimi, algo que não era esperado, o esperado duelo virou lavada.

Carros não serão mais à prova de balas: “As complicadas unidades de potência híbridas, com as quais as equipes têm pouquíssima experiência, vão jogar um tempero a mais de incerteza.” Claro que os prognósticos pessimistas de Christian Horner antes do início da temporada, de que poucos carros cruzariam a linha de chegada nas primeiras provas, não se concretizou, mas a (falta de) confiabilidade foi importantíssima na disputa do título, algo que não se via há algum tempo.

Ultrapassagens até o final: “Há diversos fatores que interferem no número de ultrapassagens, mas o que vimos nos últimos anos foi uma dificuldade de fazer manobras no final das provas devido à sujeira na pista, causada pelos chamados marbles (ou bolinhas de gude). Isso não deve ser um problema em 2014.” Realmente não foi, mas alguns dos fatores que vêm a seguir limitaram o efeito dos pneus.

O que pode dar errado

Dificuldade de leitura das corridas: “será que este carro está lento mesmo ou apenas poupando combustível?” A luz vermelha piscante utilizada quando um carro economizava combustível ajudou, mas é fato que ficamos à margem de muita coisa com que os pilotos tinham de lidar. Um exemplo é a disputa de posições pautada pela disponibilidade variável das fontes de energia elétrica/calorífica. Nesse sentido, os gráficos deixaram a desejar.

Disputas em banho-maria: “como este novo regulamento foca em eficiência, os carros terão de completar os GPs com cerca de 35% menos combustível. Isso significa uma necessidade de adaptação do estilo de pilotagem e em GPs mais estudados.” A necessidade de economia de combustível acabou não tendo um reflexo claro na maioria das provas. Mérito dos engenheiros no desenvolvimento das unidades de potência.

Diferença entre os motores grande demais: “pelo que vimos na pré-temporada, a Mercedes é a mais bem preparada entre as fornecedoras, com grande diferença em relação à Renault, que poucas vezes conseguiu fazer toda a unidade de potência funcionar. Isso gerou diferenças de mais de 20km/h nas retas nos testes, o que dividiria a F-1 em sub-categorias.” Isso só não aconteceu porque a aerodinâmica ainda se mostrou importante, mas em termos de campeonato, ter produzido a melhor unidade de potência “em casa” fez a diferença para a Mercedes.

As surpresas acabaram ficando no campo dos pilotos. Daniel Ricciardo deu um tempero inesperado com sua agressividade na pista e sorriso aberto fora dela. Valtteri Bottas confirmou sua consistência, premiada com seus seis pódios, enquanto Vettel e Raikkonen decepcionaram.

A hora é de fazer a listinha de metas para 2015. O que será que os próximos 12 meses nos reservarão?

Papo saudosista

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Dia desses, vi Felipe Massa ser bombardeado pelas frases na linha do “a Fórmula 1 não é tão emocionante como antigamente”, ou “os carros de hoje são muito fáceis de pilotar em relação à época do Senna e do Piquet” em um programa de televisão. O piloto brasileiro bem que tentou explicar que a evolução aerodinâmica fez simplesmente com que alguns tipos de manobras se tornassem impossível e ressaltou que “se a gente não faz as mesmas coisas hoje, não é porque não temos capacidade de fazer igual, mas os carros é que são diferentes”.

De fato, quem acompanha a categoria atualmente (e isso inclui figurões do passado, como Jackie Stewart, tricampeão dos anos 60 e 70 que diz aos quatro cantos considerar a geração de Alonso, Hamilton, Raikkonen e Vettel possivelmente a de melhor nível técnico da história) tem de concordar com Massa. Os carros de hoje em dia não são mais ou menos difíceis de pilotar do que as máquinas do passado. Simplesmente, sua complexidade é diferente, em grande parte devido aos sistemas híbridos.

Mas este seria um papo muito chato para convencer os saudosistas de plantão que o argumento de que as “corridas de verdade” eram as dos anos 80 não passa de uma impressão que se mistura com a memória seletiva e as conquistas de Senna e Piquet. Talvez os números ajudem a colocar alguns pingos nos is: a média de ultrapassagens dos anos 80 era de 40 por GP e chegou a cair para 15 nos 2000, mas de 2011 para cá subiu para 55.

Os campeonatos estão chatos porque somente o melhor carro vence? Peguemos os “anos de ouro” da Fórmula 1 no Brasil, do primeiro título de Senna a seu último campeonato completo, e comparemos com as últimas seis temporadas: os carros campeões de construtores venceram  61,5% das corridas no período de 1988 a 1993, número que caiu para 57,6% de 2009 para cá.

E se alguém ainda vier com o argumento de que a vantagem da Mercedes hoje deixa as corridas mais chatas, é só relembrar, como fez Massa, do famoso GP do Japão de 1989, aquele da batida que deu o título a Prost: a vantagem das McLaren era tanta (para se ter uma ideia, Senna tinha colocado mais de 3s no terceiro colocado na classificação) que o piloto brasileiro, após a colisão, ocorrida a 6 voltas do fim, ficou parado, teve a ajuda dos comissários, deu uma volta inteira com a asa dianteira quebrada, em ritmo mais lento, parou nos boxes e ainda conseguiu vencer a prova. Por mais que Ayrton fosse um grande piloto, isso só foi possível com uma grande vantagem de equipamento. Que me perdoem os saudosistas.

Coluna publicada no jornal Correio Popular

Ação na pista: as ultrapassagens de 2014

Na temporada em que a Fórmula 1 ganhou mais um gigante na hora de decidir ultrapassagens, o número de manobras caiu, repetindo tendência que vinha desde o ano passado. Mais do que o novo regulamento, a maior durabilidade dos pneus é um fator importante para explicar os números, que ainda estão longe de emular a época pré-DRS e Pirelli.

Será interessante ver como esses números evoluem na próxima temporada, em que espera-se motores mais nivelados e carros mais rápidos o que, consequentemente, forçará mais os pneus e provocarão maior desgaste. Tendo em vista que existe a grande possibilidade do grid contar apenas com nove equipes, uma manutenção dos níveis de 2014 já seria interessante.

Número de ultrapassagens por temporada

Ano Ultrapassagens totais Ultrapassagens por GP
2014*** 828 43,5
2013** 988 52
2012 1.143 57,1
2011* 1.152 60,32
2010 547 28,7

*introdução dos pneus Pirelli e DRS

**Grid com 11 equipes

***Grid com 9 equipes em duas etapas e com 10 em uma.

E quem é o tal gigante? O “assassino sorridente”, claro. Sua forma decidida de abordar as ultrapassagens abriram caminho para vitórias no Canadá e na Hungria – essa última, naquela que foi provavelmente a performance da temporada – e para o pódio nos Estados Unidos. De quebra, o australiano ainda tirou uma casquinha do próprio companheiro: Sebastian Vettel está procurando-o até hoje lá em Monza.

Mas me desculpe Ricciardo. Talvez de tão decidido, não deu chance para os rivais darem o troco. Nos melhores duelos da temporada, que deu show de como atacar e defender até o limite foram Hamilton e Rosberg no Bahrein e Alonso e Vettel em Silverstone. Vamos relembrar os momentos de maior ação na temporada? E qual a lista das melhores manobras para vocês?

A calma antes da tempestade?

Quase não falamos nela neste ano, não? Depois de ser protagonista, para o bem e para o mal, da temporada 2013 e do temor por um ano com ainda mais problemas com o novo regulamento, a Pirelli foi conservadora e, mesmo assim, foi um dos pontos que promoveu boas corridas. Teria a fornecedora de pneus atingido o tempero certo?

pirelli

 

Ao tornar todos os compostos mais duros, querendo evitar o vexame dos estouros de 2013 e temendo o maior torque dos motores turbo, a Pirelli alterou um pouco a dinâmica das corridas. Mesmo assim, a tônica dos últimos três anos foi mantida, com o undercut (antecipar a parada em relação ao rival mais próximo para sair na frente, usando a aderência do pneu novo) ainda sendo a melhor aposta para os estrategistas.

O número de paradas também ficou dentro do que é proposto aos italianos, entre duas e três (sendo que, em 2014, a balança pendeu mais para as duas paradas, o que favorece a compreensão das provas, apesar de torná-las menos movimentadas e diminuir a vantagem de carros que economizam mais os pneus). Para se ter uma ideia, o número médio de pit stops caiu de 51 em 2013 para 44 em 2014. Porém, o ano foi mais uniforme: a prova com mais pits (GP do Bahrein) teve 58, 22 trocas a menos que a ‘campeã’ de 2013, o GP da Espanha. E a prova com menor paradas (decorrência da falta de curvas e da alta perda de tempo no pit pelas características do circuito) seguiu sendo o GP da Itália, com 23, somente uma a menos que ano passado.

Mas a grande diferença foi a aproximação de rendimento dos compostos, o que criou algumas oportunidades estratégicas, como por exemplo a que gerou a grande disputa do ano, entre Lewis Hamilton e Nico Rosberg pela vitória no Bahrein. Cada um utilizou um composto diferente e, no final, Nico estava atrás, mas com o pneu mais rápido e menos durável. Cenas parecidas poderiam ter acontecido até na última prova caso a Williams de Massa tivesse mais rendimento.

Houve alguns erros, como o excesso de cuidado na Rússia, mas foi um ano com muito menos sustos do que 2013, quando a alteração feita no meio do campeonato alterou completamente a disputa, que vinha aberta e se transformou em um passeio de Vettel.

Para 2015, mesmo não prevendo grandes alterações no pneu, a Pirelli prevê que os carros fiquem 1s mais rápidos, o que pode fazer com que os pneus se degradem mais. É uma expectativa conservadora, convenhamos, com a evolução que se espera nas unidades de potência. Será que essa combinação será suficiente para os pneus voltarem a provocar resultados imprevisíveis, como os sete vencedores diferentes nas primeiras sete provas em 2012?

O caso Ferrari

Crédito: James Moy
Crédito: James Moy

Dia desses perguntei aos leitores do blog quem eles acreditavam que seria campeão primeiro: Sebastian Vettel na Ferrari ou Fernando Alonso na McLaren. E a balança pendeu para a reedição da parceria do espanhol com o time inglês.

Não é por acaso. É difícil ver na Ferrari um sinal claro de reação após a perda da chance de usar seu potencial como equipe de fábrica para dominar uma Fórmula 1 mais voltada à capacidade mecânica do que aerodinâmica. Na verdade, o que 2014 escancarou é que a aerodinâmica não era o único ponto fraco da Scuderia, que não conseguiu se organizar para fazer uma unidade de potência que funcionasse a contento, sofrendo com problemas básicos como funcionamento do MGUH e o controle do calor do turbo e terminando a temporada atual pior do que começou em termos organizacionais.

Sim, os italianos vivem a expectativa do primeiro projeto sob comando da dupla ‘importada’ da Lotus ano passado, James Allison e Dirk de Beer, e têm condições de ter um carro melhor em 2015, e os problemas enfrentados no campo da unidade de potência não são tão difíceis de resolver – mesmo em meio a uma troca no comando, com a saída de Luca Marmorini, substituído por membros de sua própria equipe – mas a distância razoável para a ponta vista especialmente em 2010, 2012 e na primeira metade de 2013, se transformou em abismo.

A lógica aponta uma evolução – e é muito provável que Vettel comece sua jornada em Maranello à frente de Alonso e possa, junto de Raikkonen, sonhar mais alto do que o par de pódios conquistados pelo time em 2014. Isso sem contar que ambos já se mostraram pilotos sensíveis a carros desiquilibrados: ou seja, o sucesso da dupla depende muito do tipo de equipamento que lhes for entregue.

Mas o grande desafio de um sucesso imediato da Ferrari é sua falta de continuidade. Se nos anos da tríade Montezemolo-Domenicali-Alonso a teimosia em se reinventar aerodinamicamente a cada ano acabou cobrando seu preço, agora a ameaça vem das decisões aparentemente imediatistas do novo homem forte da Fiat, Sergio Marchionne, que parece mais preocupado que a Scuderia saia ganhando no turbilhão político por que passa a F-1 do que na pista.

Por outro lado, se há um fator que conta a favor de Vettel em seu novo desafio, é o tempo. O alemão sabe muito bem que o projeto vencedor de seu ídolo Schumacher em Maranello começou a ser traçado sete anos antes do primeiro título do alemão na Scuderia, quando Jean Todt chegou para reorganizar um time que vivia situação ainda pior do que hoje.

Mas ah se ele pudesse roubar um pouco da eficiência da Red Bull… em 2014, parte da eficiência aerodinâmica do RB10 sequer era utilizada, sendo ‘desperdiçada’ quando a equipe buscava compensar a perda pela falta de velocidade de reta da PU da Renault – fala-se em 60cv, ou 15km/h. Andando com menos asa, o carro perdia em equilíbrio.

Em 2015, os tetracampeões precisam aproveitar o último projeto com participação direta de Adrian Newey. Mesmo que Ricciardo já tenha demonstrado que não se intimida com falta de equilíbrio em seu carro, o que é um alento para o time, as possibilidades de voltar a ser o time a ser batido dependem diretamente da Renault.

E agora, McLaren?

Motor Racing - Formula One Testing -  Abu Dhabi Test - Day One - Abu Dhabi, UAE

O time pode amargar duas temporadas sem vencer e ter terminado apenas em quinto no campeonato, por vezes até lutando para entrar no top 10. Mas não é exagero dizer que a McLaren ocupa, hoje, o papel  já foi da Mercedes há dois anos: de melhor aposta para o futuro. Mas o prazo para esse futuro é mais difícil de precisar do que no caso dos alemães.

Isso porque não há uma grande mudança de regulamento, daquelas que promovem um chacoalhão na relação de forças, em vista. Ainda que a equipe esteja se fortalecendo de maneira inteligente para voltar a ser grande, precisa descontar um gap considerável – ao mesmo tempo em que Mercedes e companhia também não estão estacionadas.

A busca por tirar o prejuízo atinge todas as áreas: os projetos de Tim Goss não vinham convencendo há algum tempo, e em 2015 veremos o primeiro carro de Peter Prodromou, discípulo de Adrian Newey. E, em termos de desenvolvimento, pela primeira vez em algum tempo a propagandeada habilidade da equipe em melhorar ao longo do ano foi vista em 2014.

A nova McLaren também busca retomar as vantagens de funcionar como uma equipe de fábrica, agora para a Honda. Apesar dos riscos de estrear uma tecnologia tão complexa com um ano de atraso em relação às outras montadoras, pelo menos os ingleses e os japoneses poderão ter a troca de informações irrestrita que funcionou muito bem na Mercedes.

Economicamente, a equipe também vai bem, sendo a que obteve o maior lucro em 2014 – na casa dos 40 milhões de dólares – muito em função de um novo acordo unilateral com Bernie Ecclestone, nos moldes da Ferrari. E Eric Boullier é um chefe da equipe experiente no meio automobilístico, sabe o que está enfrentando.

Certamente foi esse conjunto de fatores que atraiu Fernando Alonso ao que ele gosta de chamar de “projeto” – e não um retorno à companhia de Ron Dennis. Uma manobra de risco? Sim. Mas depois de esperar (sem grandes frutos) a Ferrari descontar a distância aberta com a mudança de regras de 2009 e depositar suas fichas que uma F-1 menos influenciada pela aerodinâmica pudesse representar o pulo do gato para os italianos, até penar com o projeto verde da McLaren-Honda e trabalhar com o desafeto virou uma opção atraente. Para ambos os lados.

E parece que a opção por Jenson Button, que fez sua melhor temporada desde 2011 neste ano, como seu companheiro é sua primeira vitória interna. Ruim para a McLaren, que atesta a falha em seu programa de desenvolvimento ao dispensar Magnussen após apenas uma temporada – em que, de fato, o dinamarquês aparentou estar verde. Bom para Alonso. Afinal, não haverá motivos para queixas sobre ter de trabalhar sozinho com o acerto do carro ou o desenvolvimento do carro nesse “segundo mandato”.

Os insurgentes: as chances de Lotus, Force India e Sauber

Motor Racing - Formula One World Championship - Spanish Grand Prix - Race Day - Barcelona, Spain

A meta é “dar uma de Williams”. E a realidade? As equipes que mais sofreram com a união entre a má gestão da Fórmula 1 e o aumento dos gastos por conta do novo regulamento têm um ano importante pela frente depois de viverem realidades distintas em 2014. Force India, Lotus e Sauber são as outsiders e vivem uma sinuca de bico.

Apesar de se falar muito da má divisão do dinheiro dos direitos de imagem, resultado dos acordos unilaterais fechados por Bernie Ecclestone nos últimos anos, o grande empecilho para que um esporte que alavanca bilhões consiga se manter política e economicamente estável é o chamado Grupo de Estratégia, que define as mudanças na categoria. Dele, Lotus, Force India e Sauber estão excluídos (teoricamente, a Toro Rosso também, mas o time é menos sensível a isso por ser financiado pela Red Bull).

Seus interesses, portanto, ficam em segundo plano, dificultando sua gestão. E cada um vem reagindo de uma maneira.

Dos três, a Lotus é ao mesmo tempo a grande incerteza e a grande esperança. O time já dava sinais de que entrava em declínio no final do ano passado, quando sofreu uma debandada de profissionais – mais notadamente, a dupla de projetistas, James Allison e Dirk de Beer, que foram para a Ferrari – devido à falta de dinheiro. A falta de recursos – em grande parte aplicados no carro que foi competitivo até o final de 2013 – também atrapalhou o projeto do carro deste ano. Somando estes fatores à unidade de potência deficitária da Renault, vimos um time cair do quarto ao oitavo lugar.

A entrada dos petrodólares de Maldonado deve ter amenizado a situação para o projeto de 2015 e o time terá motores Mercedes ano que vem. Além disso, os problemas aerodinâmicos do E22 foram encontrados em meados deste ano, o que dá tempo hábil para Alan Permane e companhia acertarem a mão desta vez.

Mas a Lotus terá de trabalhar duro para superar a Force India, que tem a seu favor a continuidade. A grana está longe de sobrar no time de Vijay Mallya, mas é interessante como a equipe está conseguindo se manter com bons resultados na Fórmula 1 de uma maneira bastante profissional. Além da parceria com a Mercedes e o comando técnico de Andrew Green, a Force India conta com dois pilotos de competência comprovada – e esse pode ser outro diferencial em relação à Lotus. O que pesa contra o time, contudo, é a tendência a não manter o ritmo de desenvolvimento ao longo do ano, algo que pesou muito em 2014, quando havia, até julho, uma chance considerável de superar a McLaren.

Por último – em 2014 e, salvo uma grande surpresa, em 2015 – vem a Sauber. Problemas financeiros, uma unidade de potência equivocada da Ferrari e a pior dupla de pilotos do time nos últimos anos explicam o vexame de passar uma temporada inteira em branco depois de fazer 57 pontos em 2013. E não há sinais claros de que o cenário mude da água para o vinho em 2015: novamente o time está projetando um carro tendo de segurar os gastos, depende do que a engenharia de motores da Ferrari vai conseguir melhorar e tem dois pilotos com pouca experiência. Pesando o que Lotus, Force India e Sauber fizeram neste ano e a expectativa do que pode melhorar, é mais coerente esperar  que a equipe de Felipe Nasr consiga se reestruturar melhor para 2016. Isso, se o Grupo de Estratégia não aprontar mais nenhuma das suas.

O próximo passo da Williams

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Departamento técnico afinado, novos patrocinadores, dupla de pilotos competente, motor empurrando forte e, melhor, continuidade. O salto da Williams não foi um conto de fadas: é real e tem tudo para dar mais frutos ano que vem. Mas onde será que a equipe pode chegar?

Primeiro, vamos às fundações que permitiram o incrível pulo da nona para a terceira colocação no mundial de construtores em apenas uma temporada. Lembra a Brawn, que apareceu “do nada” para ser imbatível em 2009? Não foi do nada. Aquele era o primeiro projeto de Ross Brawn com orçamento praticamente ilimitado da Honda – e havia uma grande chance com uma mudança de regulamento. A história da Williams tem ingredientes similares.

Não, o FW36 não era um carro de outro planeta. E ter o melhor motor disparado do grid em um ano no qual as unidades de potência reinaram fez muita diferença. Mas o que impressionou na Williams – não só para quem via de fora, mas também a própria equipe – era como a evolução era constante e certeira.

Ele pode ter destruído alguns chassis, mas Pastor Maldonado e seus petrodólares foram importantes para que fábrica não ficasse obsoleta. Depois, a contratação de Pay Symonds, em meados do ano passado, norteou os esforços do time, cuja principal característica nos últimos anos era levar às corridas updates que não vingavam.

Isso é passado. “Nunca tinha visto uma precisão tão grande”, costuma dizer o ex-Ferrari Rob Smedley sobre o túnel de vento. “Se a previsão é de que uma peça vai melhorar o carro em 0s2, é exatamente isso que vemos na pista.”

É lógico que isso não depende apenas do equipamento em si, mas sim de todo o processo de design e execução das peças. E foi aí que entrou Symonds, campeão com Schumacher e Alonso. Sua função foi distribuir melhor as funções e aproveitar o máximo de cada engenheiro. Simples, não?

Mas o desafio só começou. É inegável que existe uma limitação óbvia para que a Williams lute consistentemente por vitórias e pelo título: ela é cliente da Mercedes. Recentemente, Ron Dennis defendeu que é impossível uma equipe cliente ser campeã porque ela “não tem como controlar a energia eficientemente – o que significaria acesso ao source code – e não conseguirá estabilizar o carro na entrada das curvas, etc., e perderá muito tempo de volta.”

Há quem questione essa visão, uma vez que o controle da parte eletrônica à qual Dennis se refere é feita pela ECU, comum a todas as equipes – e inclusive distribuída pela McLaren. Mas o próprio Toto Wolff deu a entender que, neste ano, o time de Woking não recebeu tanto apoio da Mercedes quanto no passado. “Nem usaria a terminologia ‘source code’ porque não faz nenhum sentido. Mas eles estão mudando para os motores Honda e obviamente sabemos muito bem disso. É claro que temos certas vantagens por fazermos os motores e os carros em termos de integração, e isso significa equilíbrio mecânico, centro de gravidade, etc.”

É por isso que o desafio da Williams bater a Mercedes ano que vem é considerável. Por mais que a situação deles seja até politicamente diferente da McLaren, lembrando que Wolff é acionista do time de Massa, há vantagens intrínsecas de ser a equipe de fábrica.

Isso se vê no trabalho mais próximo entre engenheiros de motores e do chassi, pois interações de combustível/uso de energia elétrica/câmbio/configuração aerodinâmica dependem do conjunto carro + unidade de potência, não são relações padronizadas mesmo que se use o mesmo PU.

A aposta da Williams, portanto, seria tirar proveito de seu departamento agora afinado de aerodinâmica e melhorar no ponto mais falho do ano, de execução nos finais de semana – o que inclui pit stops (em média, a equipe foi a sexta mais rápida em 2014) e estratégia – para se firmar no grupo de caça à Mercedes nas próximas temporadas. O passo mais difícil, de deixar o meio do pelotão, já foi dado.

Nada é por acaso no sucesso da Mercedes

Motor Racing - Formula One World Championship - Malaysian Grand Prix - Practice Day - Sepang, Malaysia

Fazia frio no verão belga, mas o clima no paddock após a corrida de Spa não poderia estar mais quente: a direção da Mercedes passava por sua maior crise. Nico Rosberg forçara uma ultrapassagem ainda na segunda volta em cima de Lewis Hamilton e arruinara a corrida do companheiro. E uma vitória certa das Flechas de Prata fora jogada no lixo.

O sempre espitiruoso Toto Wolff chega em um motorhome lotado de jornalistas para dar sua tradicional entrevista pós-prova. Mal senta e, com um sorriso, levanta a mão para pedir a palavra. “Vou fazer a primeira pergunta: o que Niki disse?”

Se a crítica que se fazia no início de 2013 à Mercedes era o excesso de cacique para pouco índio, hoje as peças parecem ter se encaixado. Enquanto os principais atores técnicos, um vindo da Ferrari, Aldo Costa, e outro da McLaren, Paddy Lowe, trabalham silenciosos na máquina, a curiosa dupla do homem de negócios Wolff e o impagável Lauda dão seu show e controlam ao mesmo tempo com charme e pulso firme imprensa e pilotos.

Mas para entender o sucesso da equipe, é preciso voltar no tempo. O acaso não costuma dar frutos na Fórmula 1. Mas, sim, um projeto a longo prazo, que não deixe se abalar logo no primeiro desafio que aparece.

A Mercedes comprou a Brawn no final de 2009. Apesar de ser uma equipe com um DNA relativamente bom – com lampejos em 2003 como BAR e 2006 como Honda, sem contar seu passado como a Tyrrell campeã mundial dos anos 1970 – a perda repentina do apoio dos japoneses ao final de 2008 e a solução aos trancos e barrancos de Ross Brawn para salvar o time, que foi campeão no ano seguinte com uma estrutura bastante enxuta, demandava um trabalho a longo prazo.

E quem ficou a cargo disso? O próprio Brawn. Mais do que Wolff, Lauda, Costa ou Lowe, muito do sucesso da Mercedes tem a ver com ele. Assim como a Benetton no início dos 1990, a Ferrari nos 2000 e a própria Brawn, ele dirigiu a reestruturação do time, melhorando as instalações, colocando as pessoas certas para fazer as funções certas. E construiu as fundações para que a Mercedes pudesse aproveitar uma revolução nas regras para se tornar dominante.

E foi uma revolução praticamente feita`sob medida para os alemães se aproveitarem. A esperta aproximação entre a fábrica de motores em Brixworth e Brackley fez com que a unidade de potência e o carro fossem pensados de maneira integrada, e fermentou o caminho para o título. O único construtor que poderia ameaçá-los seria a Ferrari, mas sem um projeto a longo prazo em Maranello, o caminho ficou livre para os alemães.

A cereja no bolo foram os pilotos, ambos com a medida certa de experiência e fome de títulos. E, enquanto a Mercedes não tem nenhum indício de que a temporada de 2014 foi exceção, também não podemos reclamar de ter, mesmo com um carro dominante, um campeonato como este.

Companheiros: presente e futuro na McLaren

Motor Racing - Formula One World Championship - United States Grand Prix - Practice Day - Austin, USA

Jenson Button

Kevin Magnussen

Placar em classificações

10

9

Diferença média em classificações

+0s165

Posição média no grid

8.47

8.21

Placar em corridas

14

3

Posição média em corrida

6,9

9,3

Voltas à frente do companheiro

733

369

Pontos (% da pontuação do time)

126 (69,6%)

55 (30,3%)

 

Ser rápido em classificação e ficar devendo em corrida virou tradição dos estreantes que pegaram esse regulamento que premia pilotos mais inteligentes. E não foi diferente no primeiro ano de Kevin Magnussen, ainda mais correndo ao lado de um especialista em ‘cozinhar a galo’, como Jenson Button.

Enquanto o dinamarquês sofreu com os pneus e pagou pelo excesso de agressividade nas primeiras voltas – o que não ajudou em nada sua popularidade entre os colegas – o inglês aproveitou os lampejos que a McLaren teve na temporada, tendo performances inspiradas especialmente em Silverstone e em Suzuka, onde conseguiu colocar 1 minuto nas Williams e teve azar de não chegar ao pódio, pois precisou de uma troca de volante. Tanto, que o placar apertado do duelo de classificações virou lavada aos domingos.

Isso já havia acontecido com Button contra Sergio Perez, outro piloto errático como Magnussen, ainda que mais experiente. Então isso tudo quer dizer que a demora da McLaren em divulgar o companheiro de Fernando Alonso ano que vem não se justifica? Primeiramente, devemos lembrar que não é só a questão dos pilotos que está atrasando a definição: Ron Dennis está correndo atrás de investidores para poder exercer seu poder de compra de ações e, aparentemente, o prazo para isso termina nas próximas semanas. E nem precisa falar que esses negócios estão intimamente ligados às escolhas que a equipe tem pela frente.

Na parte técnica, a questão é entender o quão valiosa seria a experiência de Button no desenvolvimento do novo motor, frente às perspectivas de futuro de Magnussen. Valeria a pena ter dois pilotos caros e terminar 2015 com mais uma indefinição, tendo em vista que o inglês não está ficando mais jovem a cada ano? Estaria Vandoorne pronto em 2016 (levando em consideração as declarações de Boullier de que o belga fará mais um ano de GP2 em 2015)? Ou seria melhor – e a balança parece pender mais para isso – não queimar um Magnussen ainda verde? É um quebra-cabeças difícil de montar.

Companheiros: o duelo que não existiu na Ferrari

Motor Racing - Formula One World Championship - Chinese Grand Prix - Race Day - Shanghai, China

Fernando Alonso

Kimi Raikkonen

Placar em classificações

16

3

Diferença média em classificações

-0s528

Posição média no grid

6,89

9,89

Placar em corridas

15

1

Posição média em corrida

5,4

9,1

Voltas à frente do companheiro

854

155

Pontos (% da pontuação do time)

161 (74,5%)

55 (25,4%)

O resultado em si não chega a surpreender, mas ninguém imaginava que Fernando Alonso passaria por cima de Kimi Raikkonen da forma como o espanhol fez. O inverso também é verdadeiro: vindo de dois anos competitivos na Lotus, o finlandês foi uma sombra de si mesmo por todo o ano, levando mais de 0s5 em classificação e, em média, 33s por corrida.

Os problemas de Kimi para se sentir à vontade com o carro foram bem documentados durante toda a temporada. Precisando ter a frente mais pregada para ter confiança em atacar as curvas, o finlandês simplesmente não teve armas para domar o difícil carro da Ferrari que, convenhamos, não ajudou nenhum dos dois ao longo do ano.

Essa dificuldade de adaptação não deveria ser surpresa para quem conhece a carreira de Kimi. O estilo particular (e limitado) do finlandês fez com que a McLaren desenvolvesse uma suspensão diferente para ele em relação ao companheiro Montoya em 2005 e fez com que sua performance despencasse em meados de 2008 após um update na suspensão da Ferrari. Outro fator com o qual o finlandês não conseguiu se adaptar foram os pneus mais duros distribuídos pela Pirelli a partir do GP da Hungria de 2013 – algo que, inclusive, ouvi do próprio piloto e, numericamente, faz sentido: depois de bater Kimi em classificação em apenas três oportunidades em 25 GPs entre 2012 e o começo de 2013, Grosjean foi melhor em quatro das últimas seis provas daquela temporada. E os pneus ficaram ainda mais duros neste ano, em que o finlandês levou 16 a 3 de Alonso. Mas há esperança em 2015, quando a Ferrari terá o primeiro projeto comandando pelo ex-Lotus James Allison e todas as demandas do finlandês em relação ao carro forem atendidas.

Mas só falar das dificuldades de Raikkonen desmerece seu companheiro. A capacidade de Alonso maximizar resultados ficou menos clara em meio às deficiências especialmente da unidade de potência ferrarista, que dificultava a defesa de posição, mas em termos de pilotagem esse talvez tenha sido seu melhor ano, terminando no top 5 oito vezes e cometendo pouquíssimos erros com um carro muito complicado. Uma pena que a reprovação de muitos ao fator extra-pista do espanhol atrapalhe a apreciação ao nível que ele vem atingindo ano após ano.

Companheiros: Rosberg faz Hamilton crescer

Motor Racing - Formula One World Championship - Brazilian Grand Prix - Qualifying Day - Sao Paulo, Brazil

Lewis Hamilton

Nico Rosberg

Placar em classificações

7

12

Diferença média em classificações

+0s187

Posição média no grid

4

1,68

Placar em corridas

10

4

Posição média em corrida

1,43

2,5

Voltas à frente do companheiro

480

496

Pontos (% da pontuação do time)

384 (54,7%)

317 (45,2%)

Levando em consideração que, em setembro, o campeonato estava aberto e os dois pareciam igualados, chega a ser surpreendente a vantagem que Hamilton conseguiu impor em resultados de corrida (10 a 4), mas há alguns fatores que ajudam a compreender isso, assim como a maneira como a balança pendeu para um ou outro lado durante o ano.

Eu dividiria a temporada em três stints. E cada “pitstop” foi uma polêmica. Salvo a quebra da Austrália, até Mônaco Hamilton teve resposta para todos os ataques de Rosberg, que ainda não estava tão afiado em classificações. Do Principado até Spa, ainda que Hamilton só tenha sido batido “fair andsquare” na Áustria, uma série de contratempos deslocaram o favoritismo para Rosberg, que aproveitou muito bem as oportunidades que teve. Mas a maneira como o inglês voltou a decepção na Bélgica seria o golpe final nas aspirações do alemão de conquistar seu primeiro título.

Quebras e erros à parte, não se pode negar os méritos do trabalho de Rosberg, superando de maneira convincente um dos pilotos mais rápidos do grid em classificações. A explicação tem muito a ver com o fato de Nico ser um trabalhador nato, conseguindo extrair das informações do companheiro aquele algo a mais necessário para superá-lo.

“No kart não há telemetria. Enquanto quando você tem uma vantagem, você a carrega consigo”, explicou o próprio Hamilton à BBC. “O outro cara não consegue ver. Na Fórmula 1 há muita informação, então é difícil esconder alguma coisa. Como a experiência que eu tive com o Fernando. Quando cheguei, pensei ‘Jesus, Fernando é muito rápido e usa todas essas técnicas diferentes’. Mas felizmente havia telemetria. Se não houvesse eu não conseguiria batê-lo naquele ano.

“Então há momentos em que Nico está à frente e consigo usar essas coisas. E há momentos em que estou na frente e ele consegue ver. Por exemplo, em termos de uso de combustível. Eles descobriram como estava economizando e se aproximaram. Toda hora uma pequena vantagem desaparece, para mim ou parar ele. Sempre temos de encontrar algo novo.”

Fora esse jogo de gato e rato (jogado em um alto nível por ambos os pilotos ao longo do ano, diga-se de passagem) muitos esqueceram de analisar um ponto em particular ao questionar a habilidade de Hamilton dominar os carros deste ano: ninguém é tão bom e preciso com os freios quanto o inglês. E com a importância ganha pelos freios traseiros, que têm a missão de ‘recolher’ a energia que sustenta o Kers, o fato do piloto sentir-se confortável jogando o equilíbrio de freio para trás caiu como uma luva. E nem precisa dizer o quanto isso dificulta a vida de Rosberg para 2015.

Companheiros: (re)nascendo na Williams

Motor Racing - Formula One World Championship - Abu Dhabi Grand Prix - Race Day - Abu Dhabi, UAE

Felipe Massa

Valtteri Bottas

Placar em classificações

6

13

Diferença média em classificações

+0s401

Posição média no grid

7.68

6

Placar em corridas

8

7

Posição média em corrida

7

5,5

Voltas à frente do companheiro

488

443

Pontos (% da pontuação do time)

134 (41,9%)

186 (58,1%)

Passado mais um ano de desencontro entre a expectativa do torcedor e a realidade do piloto Felipe Massa e da equipe Williams, desarmemos nossos preconceitos e olhemos para o melhor campeonato do brasileiro pelo menos desde 2010. Afinal, desde então ele não havia liderado tantas voltas e subido tantas vezes ao pódio, além de ter feito, em 2014, sua primeira pole desde 2008.

Os números mostram que Massa terminou o ano bastante atrás de um companheiro bem menos experiente e levou, em média, quatro décimos em classificação – esse último item fruto do conhecido alto índice de erros do brasileiro, que fica claro especialmente aos sábados. Mas a realidade da disputa foi bem mais apertada, ainda que com ligeira vantagem para o competente e trabalhador finlandês. Massa teve uma série de infortúnios ao longo do ano: abalroado na largada na Austrália, um pit stop de 1 minuto na China, acidente com Perez no Canadá e com Raikkonen em Silverstone, 40s perdidos pelos detritos presos em seu carro na Bélgica, problemas na classificação e uma estratégia desastrosa na Rússia.

Enquanto isso, os problemas de Bottas se resumiram à quebra de motor em Mônaco, freios no Canadá e a série de dificuldades no Brasil. Tudo isso explica por que o placar de corridas terminadas é bem mais parelho que a pontuação.

O finlandês é daqueles que parecem impressionar mais quem está no dia a dia da Fórmula 1 do que quem olha de fora, algo que tem muito a ver com sua postura, sua óbvia sede de se tornar um piloto melhor. Em seu segundo ano, conquistou o mesmo número de pódios do compatriota Raikkonen, mas, se não tem a mesma incrível habilidade natural de Kimi, também não podemos esperar que as limitações do campeão de 2007 apareçam ao longo da carreira de Valtteri. Mesmo sendo um piloto trabalhador, o finlandês, que cresceu muito a partir da Espanha, terminou o ano perdendo em cinco das sete etapas finais para Massa. Tendo isso em vista, a dupla da Williams passa a ser uma das mais batalhas interessantes de 2015.

Companheiros: Ricciardo destrona Vettel

Sebastian Vettel

Daniel Ricciardo

Placar em classificações

7

12

Diferença média em classificações

+0s077

Posição média no grid

7

5

Placar em corridas

3

11

Posição média em corrida

5

3,75

Voltas à frente do companheiro

448

483

Pontos (% da pontuação do time)

167 (41,2%)

238 (58,7%)

Motor Racing - Formula One World Championship - United States Grand Prix - Race Day - Austin, USA

O GP de despedida de Sebastian Vettel da Red Bull em Abu Dhabi foi emblemático – e nem precisa entrar no mérito da punição pela flexibilidade das asas dianteiras, um dos motivos da superioridade dos carros da equipe nos últimos anos: o alemão largou do pitlane junto do companheiro Daniel Ricciardo. E terminou 35s atrás. O australiano simplesmente conseguiu, o ano inteiro, ter um ritmo de corrida melhor, negociar melhor as ultrapassagens, e ainda assim ser mais rápido.

A superioridade de Ricciardo sobre Vettel foi mais parecida com a que Hamilton teve sobre Rosberg do que Alonso sobre Raikkonen, mas ela é mais visível porque o conjunto da Red Bull era pior (ou seja, enquanto Rosberg terminava em segundo, Vettel recebia a bandeirada a algumas posições do companheiro) e pelo fator surpresa de ver um tetracampeão em apuros.

Mas o que os números mostram é uma batalha que foi sendo equilibrada pelo alemão em classificação ao longo do ano, resultado de sua abordagem metódica, a exemplo do que aconteceu com Rosberg. Porém, como repetir a mesma receita durante toda a corrida não é tão fácil assim, a desvantagem aos domingos foi marcante até o final do ano. Um dado que mostra bem a diferença entre os companheiros é a média de voltas dada com um mesmo jogo de pneu: enquanto Ricciardo ficou, em média, 25.1 voltas com os primes (mais duros de cada final de semana) e 17,2 com os options (mais macios), as médias de Vettel foram de 22,8 e 15,9, respectivamente.

Apesar de ambos terem tido dois abandonos cada por quebras, Vettel perdeu mais tempo de pista que Ricciardo por problemas mecânicos, mas nem ele considera esse o motivo por não ter a confiança no carro dos anos anteriores. “A falta de aderência seria a resposta mais simples, mas o que sinto falta é de poder posicionar o carro do jeito que eu quero na entrada da curva”, explica nessa riquíssima entrevista à Sky Sports. Helmut Marko explicaria de outra forma: “Sebastian é um perfeccionista. Daniel consegue se virar com os problemas.” Que fique a dica para a Ferrari.

 

Muita calma com essa Honda

Motor Racing - Formula One Testing -  Abu Dhabi Test - Day One - Abu Dhabi, UAE

O novo motor Honda roncou alto, mas por pouco tempo em seus primeiros testes do retorno dos japoneses à Fórmula 1. Do lado positivo, o tempo de arrumar a casa – maior do que a Renault, que enfrentou o mesmo tipo de dificuldade na pré-temporada de 2014, por exemplo – do negativo, a pressão de estar vivendo dramas semelhantes aos rivais com um ano de atraso.

O que freou os testes foram problemas elétricos, o que pode significar praticamente qualquer coisa nas unidades de potência usadas na Fórmula 1 atualmente. Isso porque elas são chamadas assim, e não apenas de motor, porque a potência vem ao mesmo tempo do motor de combustão turbo e das unidades que transforma energia calorífica e cinética em energia elétrica. E é tudo tão complexo que mesmo sendo campeã do mundo com sobras, a Mercedes, viveu justamente um problema elétrico com Nico Rosberg na última etapa de 2014, o que dá uma ideia da complexidade dos sistemas.

O fato da parceria entre Honda e McLaren começar com um ano “de atraso” em relação aos demais tem seus pontos altos e fracos. Por um lado, os japoneses tiveram tempo para pensar suas soluções vendo o que os outros fizeram, como a abordagem da separação entre turbinas de entrada e saída do turbo adotada pela Mercedes. A própria equipe, também, tem mais experiência para apontar os melhores caminhos em termos operacionais.

Mas é claro que quem ‘colocou a mão na massa’ durante esse ano todo foram Mercedes, Renault e Ferrari, tendo enormes quilometragens em seus projetos, algo que a Honda não pôde fazer. E lembremos: os dois primeiros dias de testes dos japoneses tiveram menos voltas (5) do que as estreias dos rivais, mesmo se computarmos apenas as piores equipes de cada: nove voltas para a Red Bull-Renault, 60 voltas para a Sauber-Ferrari e 42 para a Williams-Mercedes.

O que é tão fundamental quanto difícil de precisar nesse momento é em que estágio a Honda estará quando os carros alinharem na Austrália. Será que o fato deles terem começado os testes antes que os rivais, que entraram na pista pela primeira vez no fim de janeiro, e o conhecimento – mesmo que somente empírico – sobre o que aconteceu durante 2014 seriam motivos suficientes para crer que esse motor estará apto a competir de igual para igual?

O fato é que o sucesso ou não da Honda em 2015 depende muito mais do quanto os japoneses vão conseguir evoluir até 28 de fevereiro, data da homologação dos motores, do que dos resultados em si dos testes de Abu Dhabi.

GP de Abu Dhabi por brasileiros, britânicos e espanhóis: “This time is hammer time!”

Motor Racing - Formula One World Championship - Abu Dhabi Grand Prix - Race Day - Abu Dhabi, UAE

“Vamos ver quanta precaução Hamilton vai tomar. Acho que ele não vai arriscar e isso pode dar a chance a alguém”, torce o narrador espanhol Antonio Lobato. Mas o inglês tinha outros planos de como começar a prova que lhe daria o bicampeonato: “Hamilton faz uma grande largada e está a quilômetros de distância de Rosberg!”, diz o narrador britânico David Croft, aos berros. “Button consegue o quarto lugar mas que largada sensacional de Hamilton!”

Mas é o brasileiro Galvão Bueno quem define a situação: Tudo mudou porque o Nico largou mal. Nem o Hamilton esperaria isso. Agora, a caça virou caçador.”

Narradores e comentaristas divergem a respeito de qual seria a melhor tática para Rosberg conseguir recuperar o terreno. “Essa é a pista com menos ultrapassagens sem DRS, então ele precisa ficar perto”, defende Reginaldo Leme, assim como Lobato. O comentarista Pedro de la Rosa, por outro lado, prefere pensar em uma maneira de usar a tática para passar. E reflete. “A Mercedes os deixou competir muito honestamente o ano todo, então o que não vai fazer é prejudicar um deles. Vai dar prioridade a Hamilton nas paradas. Assim, eu tentaria usar o DRS para não castigar os pneus e conseguir fazer mais voltas com os supermacios, esperando que Hamilton pegue tráfego de quem largou com os macios.”

Para o comentarista britânico Martin Brundle, contudo, “Nico deve estar pensando: todas as opções que eu tinha para atrasar meu companheiro foram para o alto.” E Croft ainda acrescenta que “Nico fez uma volta a mais nesse jogo de pneus, pois ele errou sua primeira tentativa na classificação.” De la Rosa também vê o alemão entregando o jogo. “O tom da voz dele é quase de funeral”, observa, ainda na volta 10. “E Hamilton poderia estar com a cabeça pesando 2.000 quilos, mas na verdade está muito bem, parece tranquilo.”

O papel da Williams na disputa entra em discussão, com opiniões bastante divergentes. Os espanhóis veem Massa perdendo contato. “Os problemas de Rosberg só aumentam, porque Massa vai ficando para trás e ele precisa de ajuda para que Hamilton seja terceiro.” Para os britânicos, o brasileiro corre até o risco de ser ultrapassado por Button, mesmo que o inglês viesse 5s atrás. “Quem sabe ele não pode antecipar a parada e superar a Williams, lembrando que eles não estão disputando com os demais, só com a Ferrari pelo terceiro lugar nos construtores”, diz Croft, que inclusive vê Bottas parando antes de Massa porque “a equipe vai dar tratamento preferencial para ele porque está na briga com Vettel pelo quarto lugar no mundial.”

Motor Racing - Formula One World Championship - Abu Dhabi Grand Prix - Race Day - Abu Dhabi, UAEPara Galvão, por outro lado, “a Mercedes está demorando a parar porque a Williams está desgastando menos os pneus.” E o narrador ainda ganha o apoio de Luciano Burti. “A Mercedes que se cuide.” Na avaliação do narrador brasileiro, “podemos ter um pulo do gato importante porque Massa ficou na pista pelo dobro de voltas de Alonso, por exemplo. O Massa é como se fosse companheiro de equipe do Rosberg nesse momento. A Williams nunca teve um ritmo de corrida tão próximo das Mercedes. Voltando a ser protagonista a Williams e a expectativa é que melhore ano que vem.” A visão contrasta com Brundle, que afirma que “as Mercedes têm as Williams razoavelmente cobertas. Então o que Lewis tem de fazer é forçar e fazer com que Rosberg acabe com seus pneus.”

De da Rosa também está imaginando o que pode mudar a situação de corrida. “A única chance de Rosberg seria colocar pneus supermacios, que duraram mais do que esperávamos, no final. Tomara que façam algo assim porque, se não fizerem, vão perder.” É a mesma opinião do repórter britânico Ted Kravitz.

Isso, até que Rosberg comete um erro e sai da pista, sendo criticado pelos espanhóis. “Vejam que sempre dizem que Hamilton comete erros sob pressão, mas todas as vezes que Rosberg pôde estar na frente de Hamilton, errou”, observa o comentarista Jacobo Vega. “A questão é quem se impõe ao carro. Hamilton frita o pneu e faz a curva de alguma maneira, Rosberg atira a toalha e sai da pista”, avalia De la Rosa. “Parece que ele está um pouco descafeinado nos momentos-chave”, define Lobato.

Mas erros de pilotagem seriam o menor dos problemas de Rosberg. Pouco tempo depois, o alemão reclama de falta de potência e ouve da equipe que o sistema de recuperação de energia não está funcionando. “Às vezes eles conseguem consertar esse tipo de problema, mas o campeonato mundial está sendo decidido agora. Ele conseguiu terminar em segundo com um problema desse em Montreal, mas é algo que afeta também os freios traseiros porque tudo está interligado”, vê Brundle. “Ele está perdendo 160hp. Como solucionar isso? Alterando o mapeamento do motor. Se eu fosse Hamilton, pensaria que também poderia ter problemas”, crê De la Rosa.

Mas não era um problema solucionável e o alemão logo foi ultrapassado por Massa, com direito a vibração no box da Williams, o que divertiu os espanhóis. “Com que garra o irmão e o pai de Felipe comemoraram essa ultrapassagem fácil”, diz Lobato, rindo. “Ver o piloto que comandou a reestruturação pular para segundo emociona a equipe”, explica Galvão.

A empolgação do narrador brasileiro só aumenta quando os tempos de Motor Racing - Formula One World Championship - 2014 Abu Dhabi Grand Prix - Qualifying - Yas Marina CircuitHamilton começam a subir vertiginosamente. “Ele não pode estar administrando, Massa está tirando 1s5 por volta!”, se empolga. Brundle imagina se Lewis não tirou demais o pé pelas bandeiras amarelas causadas pelo motor em chamas de Maldonado, mas a diferença segue caindo nas voltas seguintes. “Precisamos entender o que está acontecendo com o carro de Hamilton. Estou imaginando se eles estão cuidando de todos os sistemas porque estão controlando a distância para Rosberg. Será que vou ver algum piloto da Mercedes no pódio?”, questiona o comentarista.

De la Rosa imagina dois cenários: “Vamos observar se Hamilton tem algum problema ou se é pelos retardatários porque o ritmo é muito ruim”. Segundos depois, o inglês aparece no rádio pedindo instruções sobre as regulagens. “Já sabemos o que está acontecendo: está pilotando com uma mão porque tem Massa a anos-luz.”

Com a confirmação de Kravitz vinda da Mercedes de que Hamilton não tem problemas no carro, a Sky Sports entrevista o diretor técnico da Williams, Pat Symonds. “Ele só está correndo em relação ao que Nico está fazendo, mas tem de ter cuidado porque, ao fazer isso, ele muda a maneira como o carro funciona, como o pneu funciona. E vamos tentar ir para cima, pois estamos seguros em relação à Ferrari [no mundial de construtores]”, avalia.

Na Globo, a torcida é grande e Burti avalia que “se eu fosse a Williams, sabendo que Massa fez 14 voltas no começo da corrida com o mesmo pneu, eu arriscaria colocar supermacios agora no final. É um risco, mas dá a chance de ganhar a corrida.” Brundle e De la Rosa também acreditam que esta é a única chance de Massa pensar em ameaçar Hamilton. “Se Massa para no final e coloca supermacios e Hamilton tem macios degradados e já é virtual campeão do mundo, não vai dificultar muito”, acredita De la Rosa.

Percebendo a jogada, a Mercedes pede para Hamilton aumentar o ritmo. “Eles estão percebendo que, se Massa vai colocar os supermacios, vai voltar uns 12s atrás e Hamilton precisa reagir”, diz Brundle, que vê “um conflito de interesses”: “Lewis não está nem aí para Felipe, mas a equipe quer vencer a corrida.” É uma avaliação semelhante à de Symonds, novamente ouvido pelos britânicos. “Estamos dando as ferramentas para Felipe, mas não sabemos o quanto Lewis pode forçar e o quanto ele está querendo arriscar. Mas vamos tentar.”

Lobato chega a lembrar que uma vitória de Massa no dia em que Hamilton é campeão não é exatamente um mau sinal para o inglês, pois a última conquista do brasileiro foi justamente na prova que deu o primeiro título ao piloto da Mercedes. “Se Massa vencer, Hamilton vai querer que isso aconteça sempre, pois a última vez que o brasileiro venceu ele foi campeão”, se diverte. Mas De la Rosa começa a ficar cético. “Estamos vendo que Hamilton está muito rápido. Para quem só quer ter o mundial, rápido demais.”

Após uma empolgação inicial por parte de brasileiros e espanhóis – e tensão por parte dos britânicos – com a aproximação de Massa com os supermacios, “parece que os pneus traseiros estão começando a acabar. Hamilton já tem isso coberto”, como observa Brundle. “Dessa vez, a gente não pode criticar a estratégia da Williams. Depois de cansar de errar o tempo todo, dessa vez acertou”, avalia Reginaldo, já em tom de resignação. “Felipe arriscou. Isso é coisa dele com o engenheiro que ele levou para a Williams, o Rob Smedley”, diz Galvão.

Saindo um pouco do foco na luta pela vitória, Brundle aproveita a ultrapassagem de Vettel em Alonso pelo oitavo lugar para filosofar. “Essa briga entre Alonso e Vettel pelo nono lugar é um resumo da Fórmula 1 em 2014 para mim: brigas de qualidade por todo o pelotão, e não só um carro dominante na frente e mais nada acontecendo atrás.” Para Lobato, contudo, “é uma pena que o fim de duas eras, de Fernando na Ferrari e Sebastian na Red Bull, passem despercebidas.”

Enquanto isso, Rosberg sofre, mas não desiste. “Completamente perdido na pista, chega a ser um desrespeito com quem fez um grande campeonato. É um perigo manter o carro assim”, vê Galvão. Mas não é a mesma leitura do alemão, que pede para permanecer na pista mesmo após receber a instrução para abandonar. “Sinto pena por ele, ele merecia ter mais armas para lutar, mas às vezes esse negócio funciona assim. Respeito essa decisão dele”, diz Brundle. “A não ser se for para tirar o companheiro da corrida”, emenda, rindo.

Motor Racing - Formula One World Championship - Abu Dhabi Grand Prix - Race Day - Abu Dhabi, UAEÉ claro que de nada adiantaria tentar algo contra Hamilton, que cruzou soberano a linha de chegada para comemorar o bi, com direito a bandeira britânica em punho. “Aí a nova lenda britânica, repetindo o gesto do grande ídolo dele”, diz Galvão, lembrando Ayrton Senna. A referência de Croft é outra: “É como Mansell em Silverstone”, diz, orgulhoso. “Grande temporada do piloto e, evidentemente, da equipe. Fizeram um carro com uma vantagem abismal. Melhor resultado da Williams em muito tempo, desde 2005”, destaca Lobato.

No pódio, a emoção do inglês não passa despercebida. “Ele está muito mais emocionado e é porque está mais velho e valoriza mais. Quando você chega na Fórmula 1, vem de ter ganhado tudo, mas aqui é diferente, é competitivo demais. Por isso vemos um Hamilton tão emocionado e isso é muito bonito”, analisa De la Rosa.

Mas, ainda que “a Mercedes tenha sido grande ao deixar os dois lutarem, foi um campeonato bonito só para eles, porque o resto precisa trabalhar muito”, na avaliação do piloto de testes. E é nesse clima que os espanhóis encerram o ano, com vinheta narrada por Lobato. “Como disse Woody Allen, o que me interessa é o futuro, porque é o lugar onde vou passar o resto da minha vida.”

Enquanto isso, os britânicos veem certo senso de justiça no bi de Hamilton. “Disse para ele que ele é bom demais para ter apenas dois títulos”, revela Croft. “Ele já poderia ter três ou quatro títulos”, lamenta Brundle. Mas os lamentos param por aí pois, como narra Croft, “this time is hammer time!”

Um risco válido

Motor Racing - Formula One World Championship - Abu Dhabi Grand Prix - Qualifying Day - Abu Dhabi, UAE

Não deu certo, mas pelo menos na última etapa do ano a Williams deixou sua zona de conforto nas estratégias e tentou algo diferente com Felipe Massa. Li muitos comentários de gente cética em relação às reais chances do brasileiro desafiar Lewis Hamilton – e a decisão de sua equipe nas voltas finais do GP de Abu Dhabi foi, de fato, um long shot – mas era o único que poderia ser feito.

Alguns dados devem ter influído na aposta: Massa fizera 13 voltas em seu primeiro stint, com supermacios, quando o carro estava mais pesado e o asfalto, mais quente. E sabia-se, desde a sexta-feira, que a Williams crescia em relação à Mercedes quando a pista esfriava.

Massa começou a virar mais rápido que Hamilton a partir da volta 27, o que coincidia com os problemas de Rosberg e, portanto, poderia significar que o inglês passara a administrar o ritmo por não ter o rival pelo título por perto. Ou poderia ser um sinal de que a equipe temia ter a mesma falha com o outro carro, como aconteceu no Canadá.

O fato é que a diferença caiu de 13s8 para 9s em três voltas. Massa e a Williams tinham 3 opções: continuar com a estratégia normal e conservadora, tentar ir até o final com os pneus duros, que estavam funcionando bem (o que não parece ter sido uma opção séria pelo que Massa falou após a prova), ou estender ao máximo o segundo stint e arriscar voltas de classificação com os supermacios.

Entrevistado pela Sky Sports nesse momento da prova, o diretor técnico Pat Symonds não parecia empolgado, apenas comentando na base do “vamos dar uma chance para o Felipe atacar, até porque não sabemos o quanto Lewis está disposto a se defender”. De fato, o inglês dizia via rádio que não queria saber da posição de Massa, pois seu interesse era ser campeão.

O ritmo de Massa era muito bom. Tanto que, nas seis primeiras voltas após a parada de Hamilton, a diferença se manteve em 15s. Depois, vinha o cálculo difícil: qual a medida certa para fazer uma estratégia de colocar o pneu supermacio e sentar a bota no final funcionar? Quanto tempo perder com o macio desgastado para que o supermacio não acabe antes da hora?

Foi aí que faltou ritmo para a aposta da Williams efetivamente ameaçar a Mercedes. Massa não poderia ter esperado mais para trocar de pneu – já estava perdendo 1s por volta com 13 para o fim – e, nos giros finais, após reduzir a desvantagem de 10s8 para 6s8 em cinco voltas, seu pace ‘encalhou’.

No final das contas, valeu a tentativa mais para a Williams perder o medo de ousar de vez em quando. Perguntei para Massa por que ele achava que o time era tão travado nas táticas e ele citou a juventude como um dos fatores, então toda experiência é válida. Mas também está claro que, para ter chances reais de vitória quando não der nada de errado com as Mercedes, a Williams ainda tem chão para evoluir.

Chuva (prateada) de recordes

Motor Racing - Formula One World Championship - 2014 Abu Dhabi Grand Prix - Race Day - Yas Marina Circuit

A Mercedes de Lewis Hamilton e Nico Rosberg entra para a história ao lado de ícones da Fórmula 1, como as Ferrari de 2002 e 2004, a McLaren de 1988, a Williams de 92 e a Red Bull de 2011. Todos eles carros que colecionaram recordes e mais recordes na categoria.

Parte do sucesso tem a ver com o motor. Na primeira temporada de um regulamento que diminuiu a importância da aerodinâmica em detrimento da unidade de potência, a Mercedes deu show, com 100% das poles do ano, algo inédito na história moderna da Fórmula 1 (aconteceu em 69 com a Ford, quando só havia 11 etapas). Outras montadoras chegaram perto, como a Renault em 2011 (embalada pela superioridade do carro da Red Bull, mas também devido ao ótimo trabalho de integração ao difusor soprado), 95, 93 e 92, e a Honda em 88 e 89, perdendo apenas uma disputa pela pole, mas nunca um único motor havia terminado um ano “invicto” em treinos.

Nem todas essas 18 poles do time Mercedes – a 19ª do motor foi conquistada por Felipe Massa, na Williams – foram convertidas em vitórias. Porém, ainda assim, Hamilton e Rosberg bateram o recorde de maior número de conquistas em um ano, ao vencerem, juntos, 16 das 19 provas, superando os 15 triunfos da McLaren em 1988 (ainda que, percentualmente, Senna e Prost tenham levado 93,75% das provas).

Outro recorde da equipe é de número de pódios no ano, 31. Isso significa um aproveitamento de mais de 81,5% e supera em dois a melhor marca anterior, da Ferrari em 2004. Também caiu por terra o recorde de número de dobradinhas em uma temporada: Hamilton e Rosberg fizeram 11, contra 10 da dupla Senna e Prost em 1988.

Por outro lado, mesmo com a temporada mais longa, a Mercedes também não conseguiu superar o recorde de número de voltas na liderança da McLaren de 1988: 1003 contra 978. Levando em consideração que a temporada de 26 anos atrás teve 1031 voltas no total, é muito improvável que essa marca seja batida um dia em termos percentuais!

Não coincidentemente, Hamilton teve seu melhor ano disparado em termos de números: foram 11 vitórias em 2014, sendo que o máximo que o piloto, único do grid a ter vencido em todos os anos nos quais correu na F-1, tinha conseguido tinham sido 5 em 2008; sete poles (igualando 2012 e 2008) e 16 pódios (superando os 12 do ano de estreia, em 2007).

Curiosamente, o GP de Abu Dhabi marcou a primeira volta mais rápida da carreira de Daniel Ricciardo. Felipe Massa, por sua vez, liderou 14 voltas, mesmo número do GP da Áustria. Para encontrar um GP em que tenha estado na frente por tanto tempo, temos de voltar ao GP da Alemanha de 2010. Este, também, foi o ano em que conquistou mais pódios (3) desde aquela primeira temporada ao lado de Fernando Alonso na Ferrari.

Coração de campeão

Motor Racing - Formula One World Championship - Abu Dhabi Grand Prix - Race Day - Abu Dhabi, UAE

Essa eu errei com gosto. Errei quando apostei em Nico Rosberg pelo título em nosso podcast do final da temporada passada. Errei porque imaginava uma luta igualada, mas uma temporada de difícil compreensão para Lewis Hamilton, piloto que sempre fora agressivo e levara o equipamento ao limite, algo que poderia jogar contra ele com o novo regulamento. Errei com gosto porque é pelo bem da Fórmula 1 que constatamos a evolução daquele que se tornou neste ano o britânico de maior sucesso da história do esporte.

Lewis dá uma dimensão humana a um esporte de mitos. De todos os pilotos do atual grid, é aquele que mais traz consigo a cada curva a montanha-russa de sua vida pessoal – tanto é verdade que chegou a pedir para que a família não o acompanhasse na corrida de Abu Dhabi, mas acabou aliviado com a visita surpresa que recebeu no domingo.

Não foi um caminho fácil desde aquele sofrido título de 2008. Tentando encontrar-se longe da pesada relação com o pai e um relacionamento tão turbulento quanto com uma celebridade, chegou até a usar uma carta que muitos achavam que sempre ficaria escondida dentro da manga: o racismo. Bom para Lewis que sua versão 2011, do “as coisas são piores para mim porque sou negro” ficaram para trás, dando lugar a uma auto-aceitação que abriu o caminho para sua melhor escolha na carreira.

O próprio Lewis reconhece que a grande decisão que fez na F-1 foi tomada com o coração. Mas, se era a libertação das amarras de Ron Dennis que buscava, acabou encontrando muito mais do que isso: um carro que vinha fazendo por merecer especialmente após a grande temporada que fez sem que muita gente percebesse em 2012 e uma nova dose de respeito por quem provou que também tem cabeça.

Confira o placar entre companheiros e as diferenças na classificação do GP de Abu Dhabi

Vettel 7 a 12 Ricciardo
Hamilton 7 a 12 Rosberg
Alonso 16 a 3 Raikkonen
Grosjean 15 a 4 Maldonado
Button 10 a 9 Magnussen
Hulkenberg 12 a 7 Perez
Sutil 10 a 9 Gutierrez
Vergne 9 a 10 Kvyat
Massa 6 a 13 Bottas
Kobayashi 1 a 0 Stevens
Bianchi 12 a 3 Chilton

 

Diferenças de hoje:

Ricciardo x Vettel: 0s626

Rosberg x Hamilton: 0s386

Raikkonen x Alonso: 0s630

Grosjean x Maldonado: 0s094

Button x Magnussen: 0s323

Perez x Hulkenberg: 0s145

Sutil x Gutierrez: 0s073

Kvyat x Vergne: 0s125

Bottas x Massa: 0s094

Kobayashi x Stevens: 0s555

As diferenças são calculadas nas sessões em que o companheiro com classificação pior é eliminado e os placares contabilizam o resultado do treino, e não a posição de largada, que pode ser alterada devido a punições.

Ensinamentos

Motor Racing - Formula One World Championship - Abu Dhabi Grand Prix - Preparation Day - Abu Dhabi, UAE

Mesmo que o dia tenha sido apenas de confirmações em Abu Dhabi – desde os anúncios da Ferrari sobre a saída de Alonso e a chegada de Vettel, até pela postura dos postulantes ao título, com Hamilton falando em correr para vencer e Rosberg gorando o máximo que pode o inglês, sabendo que, mesmo que ganhe a prova, a lógica diz que o título não será seu – ficou um clima de balanço final na parceria do espanhol com o time italiano.

Já falei sobre o assunto por aqui. Por mais que seja lógico dizer que cinco anos de uma parceria sem títulos não pode ser considerado um sucesso para nomes de tanto calibre, não foi exatamente piloto que faltou. Pelo menos dentro da pista.

Dia desses, li a análise do jornalista italiano Léo Turrini – fã confesso (e ultimamente frustrado) de Kimi Raikkonen, diga-se de passagem – sobre a passagem de Alonso pela Ferrari, comparável, para ele, com outros nomes que acabaram passando “em branco” por Maranello, como Gilles Villeneuve, e encontrei uma passagem interessante:

“Alonso teria precisado, e falo de 2005-2006, de pessoas ao lado que o ajudassem a compreender que não era uma grande ideia falar a respeito da Ferrari como uma organização bandida ou algo do tipo.

“Alonso teria precisado de pessoas ao lado que, depois do escândalo de espionagem de 2007, o ajudassem a compreender que era de bom tom dizer: ok, eu não sou o centro dessa história suja (e obviamente não era), e então sinto muito por ter tido um papel nisso.

“Alonso teria precisado, nestas cinco temporadas, de pessoas a seu lado que o ajudassem a entender que sempre ressaltar, nos momentos de dificuldade, a diferença entre seu enorme talento e os limites da Scuderia não era o melhor modo de garantir a simpatia de quem, por ele e com ele, trabalhava.”

Já que Alonso gosta de dizer que aprendeu tanto como piloto e como pessoa nestes cinco anos de Ferrari, já passou a hora de colocar os ensinamentos em prática.

Todos os capítulos do duelo Hamilton x Rosberg

Enquanto Lewis Hamilton teve um início e vem tendo um final de temporada fortes, Rosberg cresceu no meio do ano, chegando a ter 29 pontos de vantagem. Marcada por grandes disputas diretas por posição e controvérsia nos bastidores, a briga dos dois tem um capítulo final em Abu Dhabi, neste final de semana. Mas como os rivais chegaram até os 17 pontos que os separam hoje? Confira como foi o ano GP a GP:

GP da Austrália

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A temporada parecia que começara tranquila para Hamilton. Parecia. Um problema com o motor tirou o inglês da corrida logo nas primeiras voltas, deixando o caminho livre para Rosberg, que largara em terceiro, conquistar uma vitória fácil, com 26s7 de vantagem para o segundo colocado, indicando que seria um ano de passeio da Mercedes.

GP da Malásia

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Sem maiores problemas de equipamento, a Mercedes fez sua primeira dobradinha da temporada, desta vez com Hamilton vencendo, sem dar chances a Rosberg, que novamente viu o companheiro fazer a pole e largou em terceiro. O alemão superou Vettel logo nos primeiros metros, mas não foi páreo para Lewis.

GP do Bahrein

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O grande duelo da temporada aconteceu na terceira etapa: em três fases da prova, Hamilton e Rosberg duelaram roda a roda. Na largada, o inglês superou o alemão, que fizera a pole. Na volta 19, Rosberg chegou a tomar a liderança, mas levou o troco. E, na volta 52, já no final da disputa e usando pneus de compostos diferentes, em uma tentativa da Mercedes de dar chances a Rosberg, os dois novamente ficaram lado a lado, mas Hamilton se defendeu dos ataques e venceu a segunda.

GP da China

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Seria a dobradinha com a maior diferença nos duelos entre Hamilton e Rosberg na temporada: 18s. O alemão teve de abrir caminho no pelotão depois de se classificar apenas em quarto, enquanto o inglês teve uma das provas mais fáceis do ano.

GP da Espanha

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O cenário do Bahrein se repetiu na quinta etapa do campeonato: Hamilton largando na ponta e Rosberg alterando a ordem dos compostos para atacar nas voltas finais. Desta vez, os dois cruzaram a linha de chegada com apenas 0s6 de diferença.

GP de Mônaco

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A primeira grande controvérsia da temporada. Com a pole provisória, Rosberg errou sua volta final e parou seu carro na área de escape, impedindo que Hamilton tentasse roubar-lhe o melhor tempo, devido às bandeiras amarelas que foram agitadas no local. Na corrida, o alemão controlou o ritmo de ponta a ponta, enquanto o inglês chegou a perder rendimento na parte final e a reclamar de um problema no olho, mas conseguiu se manter em segundo.

GP do Canadá

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Rosberg conquistou sua terceira pole do ano ao ver Hamilton errar a última chicane na classificação. Na corrida, o alemão vinha na frente até o inglês o superar depois da segunda rodada de pit stops. Na mesma volta, Hamilton começou a sofrer com os freios e teve de abandonar. Rosberg, contudo, também tinha problemas (no seu caso, no MGU-K, gerador de energia cinética) e diminuiu o ritmo, abrindo o caminho para a primeira vitória de Daniel Ricciardo.

GP da Áustria

08 aus

Após mais uma falha na classificação, Hamilton largou apenas em nono na Áustria e teve de se recuperar para chegar em segundo, atrás de Rosberg, que largou em terceiro e superou as Williams para vencer pela terceira vez na temporada. Hamilton chegou a esboçar uma pressão em cima do companheiro nas voltas finais, mas terminou 1s9 atrás.

GP da Grã-Bretanha

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Hamilton erraria na classificação novamente em sua prova caseira, ao abandonar a última tentativa em uma pista que estava secando, mas se aproveitaria do abandono de Rosberg, com problemas de câmbio. Dali em diante, o caminho do inglês seria tranquilo: Lewis venceu com mais de 30s de vantagem para o segundo colocado, Valtteri Bottas,

GP da Alemanha

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A maré ruim dos sábados de Hamilton continuaria na 10ª etapa do campeonato, mas desta vez foi uma quebra nos freios que surpreendeu o inglês, que largou em 15º. O inglês se recuperou no domingo e terminou em terceiro, enquanto Rosberg teve sua vitória mais fácil do ano.

GP da Hungria

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Desta vez foi um incêndio no motor que acabou com o sábado de Hamilton, que desta vez largou do pitlane. Rosberg, por sua vez, largou da pole, mas foi pego de surpresa por um Safety Car que complicou sua estratégia. Os rivais acabaram se encontrando na pista, com táticas diferentes, e Hamilton não atendeu às ordens para facilitar a vida do companheiro. A defesa foi fundamental para que o inglês se mantivesse na frente do alemão no final da prova, chegando em terceiro.

GP da Bélgica

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Spa foi palco do segundo momento de grande controvérsia da temporada, quando, logo no início da prova, Rosberg arriscou uma manobra para cima de Hamilton, que havia superado-o na largada, e bateu sua asa dianteira contra o pneu traseiro esquerdo do companheiro. O carro de Hamilton ficou comprometido e o inglês acabou abandonando, enquanto o alemão trocou a asa e, ainda assim, foi segundo. A manobra foi classificada como “inaceitável” pelos chefes da Mercedes. Após a prova, Lewis afirmou que, na reunião da equipe, Nico dera a entender que não fizera nada para evitar o toque, conduta pela qual sofreu uma punição da equipe, que nunca ficou clara.

GP da Itália

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Hamilton fez, em Monza, sua primeira pole desde maio, mas perdeu a ponta após uma largada ruim. Rosberg, contudo, não conseguiu capitalizar: depois de dois erros na freada da primeira chicane, acabou sendo ultrapassado por Hamilton, que venceu a prova. Seria a primeira das cinco vitórias seguidas do inglês.

GP de Cingapura

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Novamente pole, Hamilton viu Rosberg ter problemas elétricos antes mesmo da largada, abandonando a prova em definitivo na volta 15. Restou ao inglês passear pelas ruas de Marina Bay e retomar a liderança do campeonato após quatro meses.

GP do Japão

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Rosberg largou na frente no GP do Japão, mas não conseguiu manter a ponta sob condições de pista difíceis devido à chuva. Sofrendo com os pneus, o alemão não segurou Hamilton, que o ultrapassou, por fora, na primeira curva e venceu a prova, marcada pelo sério acidente de Jules Bianchi.

GP da Rússia

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Hamilton foi absoluto na estreia da Rússia no calendário, mas teve a ajuda do companheiro para vencer com tranquilidade: Rosberg viu a oportunidade de superar o inglês logo na segunda curva da primeira volta, mas julgou mal a freada e acabou destruindo seu pneu, sendo obrigado a um pit stop não programado. Nico conseguiu se recuperar, mas foi apenas segundo.

GP dos Estados Unidos

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Em um repeteco do GP do Japão, Rosberg fez a pole em Austin, mas não teve armas para lutar com Hamilton na corrida, sendo ultrapassado no decorrer da prova. Os 24 pontos foram a maior vantagem que Lewis atingiu até agora no campeonato.

GP do Brasil

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Rosberg cresceu no momento certo em Interlagos, após ver Hamilton dominar todos os treinos, e fez a pole. Na corrida, controlou bem e seu ritmo. Logo após sua segunda parada, viu a liderança ameaçada por Lewis, que tentava andar rápido antes de parar a fim de voltar na frente, mas o inglês errou e acabou terminando em segundo.

Hamilton versão (quase) 3.0

Motor Racing - Formula One World Championship - United States Grand Prix - Race Day - Austin, USA

Quem assistiu ao GP da China de 2007, ou ao GP do Japão de 2008, ou mesmo ao GP da Itália de 2010, diria que todo cuidado é pouco ao encher a bola de Lewis Hamilton. Afinal, não foi uma ou duas vezes na carreira que o piloto colocou tudo a perder com julgamentos duvidosos. Mas um erro maior que os cometidos pelo inglês nas provas citadas acima seria o de não reconhecer o amadurecimento daquele que sempre foi, desde aquela ultrapassagem por fora na largada do GP da Austrália de 2007, um dos maiores talentos naturais do grid.

O excesso de agressividade e a maior propensão ao erro são características que marcaram os primeiros anos da carreira de Hamilton tanto quanto seu arrojo, mas têm aparecido com menos frequência de 2012 para cá.

Mais do que isso: o agressivo piloto que pegava pelo pescoço as McLaren carregadas de aerodinâmica a com pneus “longa vida” se tornou o rei do lift and coast, técnica de usar o freio motor para reduzir o consumo de combustível, e tem se mostrado mais inteligente em encontrar o limite dos pneus do que o companheiro Nico Rosberg.

Uma explicação que engloba ambos os aspectos é o fato do inglês se sentir mais à vontade com o equilíbrio de freios sendo jogado mais para os pneus traseiros do que os dianteiros, diferentemente do alemão. Feliz em ter um carro mais nervoso na entrada da curva, ele consegue carregar mais velocidade e precisa de menos reaceleração. Com isso, na mesma tacada, economiza combustível e pneus especialmente em pistas nas quais a degradação é longitudinal, e não por força lateral (aquelas com curvas em que o carro escorrega de lado).

O curioso é que esse “novo” Hamilton agregou qualidades, pois continua sendo aquele que freia por último, fazendo ultrapassagens de muito longe – ou a manobra em cima de Rosberg nos EUA não lembrou aquela sobre Kimi Raikkonen no GP da Itália de 2007? – ao mesmo tempo em que o freio eletrônico e a maior solicitação do KERS dificultaram a vida de alguns pilotos.

É verdade que, nas classificações, Hamilton ficou devendo em relação a Rosberg na temporada, resultado, segundo os engenheiros da equipe, da abordagem mais científica do alemão no acerto fino do carro. Porém, como o comportamento do carro vai se alterando ao longo de uma corrida, diferentemente do que acontece em classificação, o poder de adaptação maior joga a favor de Hamilton.

Não vamos cair na armadilha que “vitimou” muitos ao atribuir poderes sobrenaturais a Sebastian Vettel pelo domínio do alemão. Esse Hamilton em grande forma que estamos vendo tem um belo carro nas mãos. O motor Mercedes é o que menos consome; o carro é o mais equilibrado e, por isso, é mais fácil gerir os pneus; o sistema de freio dos alemães é superior e mais previsível. Porém, independentemente do que acontecer em Abu Dhabi, o hoje quase trintão Lewis já terá deixado para trás de uma vez por todas, com performances como na Hungria ou no Bahrein, a máxima de que só sabe acelerar.

GP do Brasil por brasileiros, britânicos e italianos: “Eu acredito!”

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A ameaça de chuva deu lugar a um asfalto escaldante em Interlagos. E o sol pareceu esquentar não apenas os pneus, mas também a cabeça dos comentaristas. Levado ao erro por Reginaldo Leme, Galvão Bueno viu “Hamilton pulando na frente”, na largada pela TV Globo, enquanto Martin Brundle, na Sky Sports, chegou a ‘corrigir’ o narrador David Croft dizendo que era Daniel Ricciardo que tinha perdido posições na curva 4. Porém, na realidade, Nico Rosberg manteve a ponta e foi Sebastian Vettel quem teve uma “síndrome de 2012” e perdeu terreno.

Narradores e comentaristas mal tiveram tempo de respirar e as paradas já começaram no final da volta 5, como havia previsto o comentarista técnico italiano da RAI, Giancarlo Bruno. “Com pneu macio e 95kg de gasolina – porque o consumo aqui costuma ser menor que o normal – é preciso cuidar dos pneus.”

Galvão comemora a parada antecipada da Williams. “Chamaram na hora certa porque Massa voltou fora do tráfego. Vamos ver o que eles pretendem com essa parada tão cedo”. E Luciano Burti já pensa até na possibilidade do brasileiro roubar o segundo posto. “Massa pode se dar bem porque a preferência da Mercedes é do Rosberg e Hamilton vai ter de ficar na pista com pneus usados.”

Enquanto isso, na transmissão britânica, o repórter Ted Kravitz avisa que “a melhor chance de Hamilton passar Rosberg será depois dessa primeira parada. Rosberg não venceu em Austin porque não estava trabalhando seus pneus bem o bastante.”

Ingleses e italianos destacam que “os pilotos, liderados por Massa, pediram para os pneus serem mais macios” e agora estavam parando bem mais cedo do que nas provas anteriores. Essa discussão apareceria na Globo voltas depois, mas de forma diferente.
O brasileiro mais uma vez se tornou assunto quando foi punido pelo excesso de velocidade nos boxes, o que, para Burti, “não é tão ruim porque ele só vai pagar na próxima parada”. A Globo, então, começa a monitorar a distância com Bottas, quarto. “Ele vai ter que andar muito, mas é possível ele andar mais que o Bottas para compensar punição. Torcida tem que fazer igual a do Atlético e gritar ‘eu acredito’”, pede Galvão.

Na luta pela ponta, Croft destaca que o “Hammer time fez Rosberg suar” mas, mesmo tendo diminuído a diferença, Hamilton não conseguiu superar o líder da prova.

Ainda falando sobre os pneus – ainda que Croft saliente que “não estamos reclamando, pois o desgaste está nos dando uma grande corrida” – Brundle e Bruno percebem que “o grid inteiro está mais ou menos no mesmo ritmo, o que significa que eles estão pilotando seguindo o ritmo que o pneu pode.”

Não demora para os pilotos retornarem aos boxes. Na Globo, como Felipe Nasr trouxe as informações do rádio da Williams, sabe-se que Bottas tem um problema no cinto de segurança e Galvão torce para o finlandês ficar no box “mais um pouquinho, mais um pouquinho”. E justifica. “Tem hora que tem de dar sorte na vida. Desculpe o Bottas, que é um grande piloto e um cara muito bacana.”

Na Sky, a torcida é para Button aproveitar a punição de Massa e superar o brasileiro, “aproveitando que a Williams não tem mais pneus médios novos”, como informa Kravitz.

Enquanto Rosberg faz sua segunda parada, Hamilton faz a volta mais rápida da prova – e com muita margem. “Essa volta do jm1409no306Hamilton é um recado, me lembra Senna. Ele falava para nós que dava essas voltas para dar recado para o rival”, Galvão se empolga, assim como Ivan Capelli. “Se conseguir mais um pouco na próxima volta, retorna na frente.”

O que acaba sendo uma ‘secada’ do italiano também foi a observação de Brundle, respondendo a Croft, que imaginava que aquela volta já era suficiente para dar a liderança ao inglês. “Se ele conseguir outra nesse ritmo, certamente vai conseguir”, disse o comentarista.

Mas Hamilton rodaria algumas curvas depois de impressionar a todos com seu tempo. “Ele usou tanto dos pneus para fazer aquela volta rápida que perdeu o carro na freada”, observa Capelli. “Acho que estava faltando aderência dos pneus traseiros”, completa Brundle. “É por isso que Interlagos é diferente, pois exige do piloto”, conclui Galvão. Porém, mesmo perdendo 6s em relação a Rosberg, Hamilton é elogiado por Burti. “Tem de tirar o chapéu para o Hamilton porque a volta que ele fez com pneu com bolha foi fantástica. Ele ia ganhar a posição.”

Com as posições do líder e de Massa salvas pelos problemas dos rivais, a Globo comenta o alto desgaste dos pneus. “Eles pensavam que a temperatura seria 10ºC menor e por isso a degradação tão grande”, informa Marcelo Courrege. “O asfalto novo deu muito mais aderência e isso os surpreendeu”, emenda Felipe Nasr.

Na briga pela ponta, Capelli observa que “para se aproximar de Rosberg, Hamilton está evitando fazer duas voltas seguidas rápidas. E nas lentas faz o mesmo tempo de Rosberg.” Enquanto isso, brigas por posição como a entre Alonso e Magnussen animam as transmissões. “Deram o lado de fora para ele e ele pensou ‘tá pensando que eu sou bobo?’. Mais uma aula de Alonso mesmo com pneu com bolha”, vibrava Galvão. Para Brundle, o espanhol demonstrou “muita paciência”, enquanto Gianfranco Marccione, narrador italiano, destacou sua “astúcia e experiência.”

Com 48 voltas completadas, Burti começa a falar em possível batida. “A decisão vai para Abu Dhabi de qualquer jeito, não? Então dá um presentinho para nós”. Mas Brundle vê as coisas de uma maneira mais racional. “Agora Hamilton sabe que ele precisa estar perto quando Nico parar e que terá só mais uma volta do pneu para tentar passá-lo.”

Mas quem rouba a cena novamente é Massa. “Ele estava parando no lugar errado? É todo mundo de branco e ele entrou no errado. A sorte é que o Button entrou junto”, Galvão fica aliviado após o segundo erro do brasileiro não lhe custar nenhuma posição. “É GP Brasil, Galvão”, justifica Burti. Já Brundle se solidariza com o piloto da Williams. “É o mesmo uniforme, eu já fiz isso na primeira vez que entrei num F1, fiquei com muita vergonha. Parece bobo, mas é muito fácil de fazer.”

Porém, o foco dos britânicos e dos italianos é na luta pela liderança, pois Hamilton conseguiu tirar os 6s e colar em Rosberg após a última parada. “Agora é luta corpo a corpo. E ele passou em duas das três últimas provas”, lembra Marccione. “Rosberg, quando vê o Hamilton no retrovisor, deve pensar ‘de novo, não’”, brinca Galvão, enquanto Brundle crê que “Nico precisa mostrar que ele não é fraco mentalmente, que não é Hamilton só chegar que vai passar.”

Mas, desta vez, o inglês não consegue colocar de lado. “Ele não consegue chegar tão perto para aproveitar o vácuo. Com carros iguais e idade de pneu parecida, é difícil”, avalia Capelli.

A situação não é a mesma das brigas de Raikkonen com Button e Vettel. O inglês demora, mas passa o finlandês, mostrando, para Brundle, “que ainda merece ficar na Fórmula 1”. Os italianos e brasileiros preferem valorizar a ultrapassagem do alemão, aproveitando o embalo do inglês e superando Kimi por fora no Laranjinha. “Essa foi uma pequena amostra de como vai ser a briga de Vettel e Raikkonen na Ferrari. Vão dividir cada metro”, prevê Galvão, enquanto Marccione classifica a manobra de “estupenda”.

jm1409no407Poucas voltas depois, é Alonso que chega em Raikkonen e, apesar do finlandês estar em estratégia diferente, a ordem da Ferrari, que seria normal em outras circunstâncias, não aparece. Brundle não deixa o fato passar despercebido. “É interessante que não tenham falado para Raikkonen sair do caminho porque as estratégias são diferentes. A mensagem é que Alonso está deixando a Ferrari. Sabíamos disso, mas essa é a confirmação.” Já os italianos ficam praticamente em silêncio durante a briga, só lembrando que Raikkonen costumava conseguir salvar um pit stop em relação aos outros nos tempos de Lotus. E Bruno ainda frisa que “Kimi está fazendo uma corrida sensacional.”

Na luta pela ponta, Burti acha que “Hamilton vai atacar no final porque é mais rápido com pneu usado”, mas Brundle lembra que o líder do campeonato “não precisa vencer” e “vai precisar de um erro de Rosberg para reverter essa prova.”

O erro não vem e o alemão diminui a diferença para o inglês no campeonato. Porém, quem rouba a cena no pódio é Massa. “Esse pódio é como uma vitória. O primeiro dos normais, quando se tem uma Mercedes andando desse jeito”, destaca Galvão.

A Mercedes tirou a vitória de Hamilton?

Motor Racing - Formula One World Championship - Brazilian Grand Prix - Race Day - Sao Paulo, Brazil

O GP do Brasil foi movimentada do começo ao fim e estrategicamente mais parecida com provas que tivemos nos anos anteriores da era Pirelli – devido à mudança dos compostos capitaneada por Felipe Massa, o que fez com que a fornecedora fosse menos conservadora do que em outras etapas. Mas a prova foi ao mesmo tempo, decidida em grande medida pela classificação. Ainda assim, o resultado levantou uma questão tática importante: a Mercedes tirou a vitória de Hamilton ao deixá-lo tempo demais na pista antes da segunda parada?

Se compararmos o top 10 da classificação com o da corrida, vemos que as grandes discrepâncias (fora o problema do cinto de segurança de Bottas e a quebra de Ricciardo) são o rendimento ruim de Magnussen (mais uma vez perdido com os pneus) e a evolução de Hulkenberg, único que conseguiu fazer a tática de deixar o pneu macio para o final funcionar.

O lance taticamente mais polêmico da prova ocorreu na volta 28, quando Lewis Hamilton rodou na tentativa de acelerar, com pneus gastos, e se aproveitar da parada do líder Nico Rosberg. O inglês se queixou da decisão da equipe deixá-lo tempo demais na pista. “Pensei que teria só uma volta rápida e tirei tudo do meu pneu”, justificou.

Sem a possibilidade de executar um undercut (parar primeiro para usar a aderência do pneu novo para andar rápido e superar Rosberg, como Vettel fez com Alonso na metade da prova) contra o companheiro, Hamilton só conseguiria passar o alemão de duas formas: na pista ou andando mais forte quando o rival parasse. E a Mercedes deu a ele essas duas oportunidades.

Quando Rosberg fez sua segunda parada, na volta 26, a diferença entre os dois era de 0s7. A margem que Hamilton precisava para voltar na frente quando parasse, levando em conta a média da Mercedes na corrida, era de 22s7 de perda total no pit.

Na primeira volta sem Rosberg à frente, Hamilton fez a melhor volta da prova e estava 22s4 à frente de Nico no segundo setor, quando a decisão de lhe dar mais uma volta na pista foi tomada. A equipe fez isso porque julgava que não seria suficiente Lewis retornar à frente, mas o inglês não acreditava que poderia manter o ritmo por mais tempo, pois já fizera 19 voltas naquele jogo (assim como Rosberg fez). Porém, no primeiro setor da volta da rodada, tirou mais 0s2 em relação a Nico e, só então, perdeu o carro na freada da curva 4.

A Mercedes acabou assumindo o erro, até para tirar pressão de seu piloto, mas foi uma aposta milimétrica e válida. E uma oportunidade que muitas equipes não dariam caso estivessem na mesma posição. No stint final, Hamilton ganhava com DRS nos setores 1 e 3 e perdia no segundo, mais sinuoso, por perda de pressão aerodinâmica. Assim, a briga direta pela liderança ficou no quase. Por duas vezes.

No mais, Raikkonen merece uma menção honrosa. Mesmo sendo o único a adotar uma estratégia de 2 paradas, não quis se privar de lutar pelas posições, segurando Button, mais rápido e com pneus novos, por 10 voltas, e Alonso, também com borracha 17 giros menos gasta, por 5. Kimi, contudo, poderia ter terminado brigando com Vettel pelo quinto lugar se não tivesse perdido 4s5 por um problema no pit stop e se a Ferrari tivesse se comprometido mais cedo a fazer duas paradas, estendendo seu segundo stint, que foi de 27 voltas. A própria equipe reconheceu ter mudado de ideia durante a prova, o que explica terem deixado 36 voltas para o stint final da corrida.

Terceira via

Motor Racing - Formula One World Championship - Brazilian Grand Prix - Race Day - Sao Paulo, Brazil

O final de semana do GP do Brasil foi marcado pela tensão gerada pelas discussões a respeito do futuro da Fórmula 1. Dentro das incertezas causadas pela ausência das equipes Caterham e Marussia, que não participaram das últimas duas etapas por problemas financeiros, e o descontentamento dos times grandes com o atual domínio da Mercedes, a categoria vive uma das maiores quedas de braço da história.

Antes da largada em Interlagos, o promotor Bernie Ecclestone afirmou que Red Bull e Ferrari correriam com três carros na próxima temporada. Minutos depois, negou. Porém, existe a necessidade contratual do grid ter, pelo menos, 20 carros. Como caso Marussia e Caterham não corram ano que vem, haveria a necessidade de ativar uma cláusula que obriga Ferrari, Red Bull e McLaren a disponibilizar um terceiro carro.

Mas não é tão simples assim, como explicou o chefe da Ferrari, Marco Mattiacci. “O problema é que está tudo sendo enfrentado de maneira fragmentada. Terceiro carro, distribuição de dinheiro, descongelamento dos motores: tudo isso são coisas que é melhor que sejam enfrentadas em conjunto. A Ferrari está disposta a conversar e neste final de semana foram dados pequenos passas.”

Quando fala em motores, o italiano se refere à tentativa de Ferrari e Renault em mudar as regras, liberando que o desenvolvimento continue sendo feito até meados da temporada. A Mercedes, dona da melhor unidade de potência do atual grid – as cinco equipes que usam seus motores estão entre as seis mais bem colocadas no campeonato – já vetou a alteração. A equipe só negociaria a alteração de 5 dos 13 itens que as demais querem continuar desenvolvendo.

Outra moeda de troca, claro, é dinheiro. O plano no terceiro carro não quer dizer mais pontos no campeonato de construtores e nem a possibilidade de formar um dream team. Alguma contrapartida teria de ser negociada.

Como se já não bastassem os diversos problemas, há a questão do tempo. As equipes precisam de uma resposta o quanto antes para contratar engenheiros e fazer os preparativos para aumentar seu efetivo em um terço. É difícil saber como toda essa questão envolta em contratos sigilosos estará resolvida no GP da Austrália, em quatro meses. Mas o fato é que o domingo de Interlagos fez com que a ideia do terceiro carro, que apareceu como um plano aparentemente lunático de Luca di Montezemolo há alguns anos, nunca esteve tão próxima.

Confira o placar entre companheiros e as diferenças na classificação do GP do Brasil

 

Vettel 7 a 11 Ricciardo
Hamilton 7 a 11 Rosberg
Alonso 16 a 2 Raikkonen
Grosjean 14 a 4 Maldonado
Button 9 a 9 Magnussen
Hulkenberg 12 a 6 Perez
Sutil 9 a 9 Gutierrez
Vergne 9 a 9 Kvyat
Massa 6 a 12 Bottas
Kobayashi 11 a 4 Ericsson
Bianchi 12 a 3 Chilton

 

Diferenças de hoje:

Vettel x Ricciardo: 0s137

Rosberg x Hamilton: 0s033

Alonso x Raikkonen: 0s122

Maldonado x Grosjean: 0s196

Button x Magnussen: 0s039

Hulkenberg x Perez: 0s228

Gutierrez x Sutil: 0s508

Kvyat x Vergne: 0s617

Bottas x Massa: 0s058

As diferenças são calculadas nas sessões em que o companheiro com classificação pior é eliminado e os placares contabilizam o resultado do treino, e não a posição de largada, que pode ser alterada devido a punições.

Vudu

Motor Racing - Formula One World Championship - Brazilian Grand Prix - Practice Day - Sao Paulo, Brazil

A punição sofrida por Sebastian Vettel no último GP, com a troca total da unidade de potência, tem muito a ver com as dificuldades enfrentadas pela Renault no início da temporada, mas ele está longe de ser o único dos pilotos de ponta a sofrer com esse tipo de problema. E não está fora de questão que isso seja decisivo para o campeonato.

Não precisa ser necessariamente uma quebra ou uma punição: chegando no final do ano, toda a forma das equipes encararem o final de semana depende da condição das unidades de potência restantes. Quem estiver mais apertado vai andar com revoluções mais baixas ou até dar menos voltas em treinos livres, por exemplo.

Dentro desse quadro, quem está sofrendo mais entre os ponteiros é a Ferrari, que se arrasta usando peças que foram repostas em Cingapura, com Alonso estando na situação mais dramática pela quebra em Monza. Ainda que a equipe não utilize os mesmos itens em todas as sessões – geralmente, os mais velhos ficam reservados para os treinos livres – o equipamento mais rodado vai perdendo eficiência e também limitando o trabalho de pista. (Curiosamente, enquanto escrevia estas linhas durante a segunda sessão de treinos livres, o motor do próprio Alonso estourou aqui em Interlagos, mas era uma unidade que estava no final de sua vida útil)

A pista paulistana é desafiadora para as unidades de potência devido à altitude, uma das maiores do campeonato, o que reduz a porcentagem de oxigênio com que elas trabalham. E isso é ainda mais duro para os turbos em relação aos aspirados. Além de Interlagos, a parte final do campeonato também tem outras pistas complicadas do ponto de vista dos motores, como Sochi e Austin, além de Cingapura, devido à alta umidade.

Mas enquanto a Ferrari cumpre tabela com alguns cavalos a menos, a Mercedes não vive uma situação muito mais tranquila. Rosberg e Hamilton estrearam os quintos elementos na etapa russa e terão de usá-los, alternando com o que sobrou das unidades anteriores. Talvez por isso o alemão respondeu de forma irônica quando perguntado se gostaria de ver o companheiro abandonar: “eu aqui e ele em Abu Dhabi”. Espertinho, não?

Primeiro passo

Motor Racing - Formula One World Championship - Japanese Grand Prix - Practice Day - Suzuka, Japan

O cenário não era dos mais convidativos: o nome de Felipe Nasr era simplesmente ignorado quando se falava das vagas para a próxima temporada e o número de vagas disponíveis parecia ter diminuído vertiginosamente com as dificuldades financeiras dos times do fundo do pelotão. Até que, como num passe de mágica, o piloto foi anunciado como titular na Sauber.

Fora Marussia e Caterham, o time suíço é aquele com a situação mais delicada no grid no momento e, sabe-se, buscava pilotos que traziam uma boa soma em dinheiro. Isso explicava a opção por Marcus Ericsson, que não mostrou nada dentro da pista nesta sua primeira temporada. A segunda vaga, acreditava-se, ficaria com Giedo van der Garde, piloto que segue na mesma linha. E podem ter certeza, ninguém ficou mais surpreso com a notícia do que o piloto holandês, que chegou a comemorar no twitter a confirmação de Nico Hulkenberg, há algumas semanas, salientando que eles “se encontrariam no grid no próximo ano”.

Ao que parece, o Banco do Brasil conseguiu aumentar sua proposta, mas seria injusto considerar Nasr um piloto pagante: a situação atual da Fórmula 1 é mais complexa do que isso. O brasileiro demorou para engrenar na GP2 por uma série de motivos, mas teve uma grande carreira nas categorias menores e sempre evoluiu. Nos últimos anos, por vezes pecou por ser cuidadoso demais e, nesta temporada, chegou a mostrar momentos de afobação. Porém, se não é daqueles tidos no paddock como um óbvio campeão do futuro pelo que fez até agora, tem sua parcela de respeito.

O acerto com a Sauber tem dois lados. A pouca experiência da dupla de pilotos e a situação muito complicada da equipe, que ainda não pontuou neste ano, farão com que especialmente os primeiros GPs sejam bastante complicados. Por outro, a comparação com um companheiro fraco pode fazer com que Nasr apareça bem na foto, ganhando confiança para iniciar sua carreira com o pé direito.

Pode não ser o início dos sonhos para um piloto que teve todo o caminho cuidadosamente estudado pela família, mas é uma vitória considerável em um momento em que tudo indicava que a melhor opção para Nasr seria mais um ano na reserva.

GP dos EUA por brasileiros, britânicos e espanhóis: “Atenção, chegou o hammer time!”

Motor Racing - Formula One World Championship - United States Grand Prix - Race Day - Austin, USA

O horário desfavorável fez com que a Globo ‘terceirizasse’ a transmissão do GP dos Estados Unidos, disponibilizando após a prova apenas um compacto de pouco mais de 30 minutos, com narração de Luis Roberto e comentários de Reginaldo Leme. A empolgação do narrador era marcante quando Felipe Massa, mesmo largando do lado sujo da pista, superou Valtteri Bottas e assumiu o terceiro posto, atrás de Rosberg e Hamilton. “Rosberg larga bem e Massa também. Largou bem o brasileiro, algo que é característico dele. Daí em diante, se acontecer alguma coisa com os meninos da Mercedes, ótimo, mas a disputa é com o Bottas.”

Na Antena 3, espanhola, além da “largada fácil” para o pole Rosberg, o narrador Antonio Lobato foca em Fernando Alonso. “Parece que Fernando vai passar Bottas, tem de ir para fora da pista, mas o finlandês fica na frente, aproveitando a superioridade de seu carro.”

O narrador da Sky Sports britânica, Martin Brundle, chegou a admitir: estava prestes a dizer que a largada fora sem incidentes até que Sergio Perez fez um strike, primeiro em Raikkonen, depois por duas vezes em Sutil. “Temo que é 100% culpa dele”, diz o inglês, e o piloto da Force India vira motivo de piada para o repórter Ted Kravitz. “Perez ainda está no carro, imagino se é por vergonha.”

Reginaldo também não se conforma. “O GP começou agitado e com barbeiragens, coisa que não se espera de piloto de Fórmula 1. Barbeiragem total do Perez. É um piloto que anda muito rápido, mas também faz besteiras como esta.”

Os espanhóis focam mais na estratégia. Com a entrada do Safety Car, os pilotos deveriam fazer uma troca de pneus? “Em teoria, não é para entrar. Se entrar, é para tirar os macios do caminho”, explica o comentarista Pedro de la Rosa. “Quem arriscou mudar de estratégia é porque estava mais para trás. Mas será uma boa aposta?”, questiona o narrador britânico David Croft. Para Brundle, pelo menos no caso de Vettel, que largara dos boxes, “era tudo o que ele queria.”

Na relargada, Ricciardo engana Alonso e toma a quinta posição do espanhol. “Que movimento em cima do Alonso! Geralmente você não vê ele perdendo esse tipo de disputa”, se impressiona Brundle. “Eles foram lado a lado por vários metros, deu um drible no Alonso”, narrou Luis Roberto. Para Lobato, era uma questão de tempo. “É impossível lutar. Que papel difícil tem Fernando nesse GP. Acho que o objetivo dele é ficar na frente das McLaren nesta corrida.”

Antes das primeiras paradas dos ponteiros, De la Rosa já vinha avisando que o piloto que parasse primeiro e voltasse com pneus duros teria vantagem sobre quem tinha macios usados. E foi esse o pensamento da Red Bul para colocar Ricciardo à frente de Bottas, em quarto. “Foi uma boa jogada da Red Bull, que copiou a estratégia da Williams, mas daquela que está na frente, deixando Bottas exposto”, observa o espanhol quando o australiano para junto de Massa.

Mesmo que Brundle observe a vulnerabilidade tática da Williams, que “tem os dois pilotos tão juntos que não pode pará-los de uma só vez”, os espanhóis creem que o fato de Massa e Bottas voltarem com pneus macios é um erro. “Não entendo nada. Eles acreditam que o pneu vai aguentar sem graining ou vão fazer 3 paradas, o que seria absurdo estando em posição de pódio”, diz o comentarista.

Na briga pela ponta, os britânicos observam Hamilton chegando. E Kravitz pede alternâncias nas táticas. “Os engenheiros da Mercedes não podem fazer estratégias diferentes entre si, mas podem deixar Hamilton com um composto diferente. Não vemos esse tipo de coisa na Mercedes há algum tempo.”

As paradas não apresentam novidades: primeiro o líder Rosberg, depois Hamilton, mesmo composto. Mas há uma diferença, apontada pelo repórter. “Hamilton estava reclamando de saída de traseira e mudaram o acerto da asa”. Em pouco tempo, o inglês estava colado no alemão: “Atenção que Hamilton está em Hammer Time”, anuncia Lobato.

Outra boa briga ainda tira a atenção de todos do embate pela liderança: Button tenta se defender de Alonso. Para os britânicos, a disputa significa mais do que uma posição: “Você acha que pode pegar meu lugar, mas por enquanto eu consigo me segurar”, diz Croft, referindo-se à possibilidade do espanhol ir para a McLaren. “Isso é pessoal para Button, com tudo o que está ouvindo no paddock”, concorda Brundle. Para Lobato, contudo, “ver Alonso brigando com um McLaren, ainda mais com um motor que está nas últimas, é quase um milagre.” Quando o bicampeão completa a manobra, Luis Roberto vê uma ultrapassagem “de quem sabe muito e um pouco mais.”

Motor Racing - Formula One World Championship - United States Grand Prix - Race Day - Austin, USAA imagem rapidamente corta para Hamilton deixando para frear muito tarde e surpreendendo a todos: Rosberg, os editores da transmissão oficial, narradores e comentaristas. “Olha a briga valendo a liderança! Sensacional Hamilton, que manobra!”, exclama Luis Roberto. “Hamilton colocou toda a alma e conseguiu passar”, Lobato tenta explicar. “O que eu vi foi Rosberg indo muito com calma. Ele tinha de ter fechado a porta”, reclama De la Rosa.

Brundle chega a achar que houve um toque. “A gente ainda não está na metade. É uma grande corrida”, comemora o comentarista, empolgado com a corrida, enquanto Kravitz confabula. “Rosberg não pediu um pouco mais de asa dianteira, ao contrário de Hamilton. Talvez isso tenha feito a diferença.”

Na volta 29, os espanhóis destacam como o rendimento da Williams começa a cair devido à opção pelos pneus macios, criticada desde o início por De la Rosa. Esse é um dos fatores que abre a possibilidade de Ricciardo fazer novamente o undercut, desta vez em cima de Massa. Além de ter parado uma volta depois, o brasileiro ainda teve um pit stop lento.

A expectativa é grande na transmissão brasileira. “Felipe foi chamado para o box, vou ficar de olho no Ricciardo”, anuncia Luis Roberto. “Vai ter que ser tudo certinho para ser justo”, Reginaldo faz as contas. “Foram 3s7 de carro parado, a Williams teve uma parada mais lenta do que o normal e pode ter colocado em risco o pódio do Felipe.” De fato, não é suficiente e Massa perde a posição no pódio. Mas Brundle não desanima: “se ele chegar, pode passar com a velocidade de reta, mas Bottas não conseguiu isso antes.” Os espanhóis estavam no comercial, mas quando voltaram, De la Rosa não poupou críticas. “Eles focaram em Bottas, deixaram que ele parasse antes, e se esqueceram de Massa. Foi um erro de prioridades.”

Vendo que Rosberg pode ter uma possibilidade de atacar Hamilton, os ingleses começam a imaginar como a equipe vai reagir: “Sabendo que o campeonato de construtores está resolvido, eles vão deixar os dois lutarem pelo o de pilotos?”, questiona Croft. “Espero que sim”, responde Brundle. Porém, para Lobato, “a ultrapassagem foi dura demais”, para uma reação. “Agora, além de uma vantagem de pontos, tem uma vantagem moral.”

Mas Rosberg não chega a ameaçar, a exemplo de Massa, apesar da torcida brasileira. “Felipe vai ter de acelerar muito para usar a asa móvel. Talvez podendo usar duas voltas e ter uma única tentativa seria a única saída”, projeta Luis Roberto, mas a diferença nunca fica abaixo de um segundo e o piloto da Williams termina em quarto.

Já os espanhóis focam em Alonso, particularmente sua briga com Vettel. Quando o alemão faz sua última parada, não entendem: “Será que está trocando para perseguir Fernando?”, questiona Jacobo Vega, mas não é levado a sério pelos demais. No final, sofrem com a pressão do tetracampeão – e com um dado que incomoda Lobato: “A má notícia estatística, se é que podemos chamar assim, é que Hamilton igualou o número de vitórias de Alonso. Este ano não deu, mas ele voltará a vencer quando tiver um carro minimamente competitivo.”

Afinal, deu Hamilton pela quinta vez consecutiva, uma “vitória incontestável e com maturidade. Até o rádio foi maduro. Diria que ele colocou um dedo no título”, arrisca Luis Roberto. “Hamilton está feliz em correr nos Estados Unidos, ganhou 3 dos 4 GPs que disputou aqui. E a briga vai até Abu Dhabi, não importa o que aconteça. Qualquer coisa pode acontecer lá, mas é preciso ser corajoso para dizer que Hamilton não vai vencer. Ele está num grande momento”, Croft segue na mesma linha, enquanto Brundle vê Rosberg “sentindo a pressão”.

Mais um erro para a conta

Motor Racing - Formula One World Championship - United States Grand Prix - Race Day - Austin, USA

Na terra das oportunidades, Nico Rosberg perdeu mais uma chance de roubar pontos de Lewis Hamilton na luta pelo título. Sem se entender com os freios durante a classificação – o que fez com que, além de perder velocidade, prejudicasse os jogos de pneus que usaria na corrida devido às várias fritadas – o inglês havia perdido o controle de um final de semana que parecia ganho. Porém, com uma estratégia ineficiente para deixar o companheiro atrás, o alemão acabou ‘devolvendo o favor’ e se complicando ainda mais.

O reconhecido erro nas regulagens – Rosberg tentou se defender de Hamilton aumentando a potência de seu Kers por um caminho que não fazia com que o ganho fosse imediato, algo que disse ter descoberto apenas agora – é mais um para a lista do alemão nesta segunda metade do campeonato. Se foi o perfeccionismo de Nico que o manteve na luta, são os erros de julgamento que lhe estão tirando da briga: toque em Spa, freada forçada em Monza, manobra atabalhoada na Rússia e, agora, uma defesa conservadora demais em Austin. Correndo contra um piloto muito rápido e dentro de sua zona de conforto, fica difícil.

Se a atual fase é ruim para Rosberg, é excelente para a administração da Mercedes, que se saiu bem dos maus bocados que viveu em meados da temporada. Por mais que as más línguas argumentariam que o fato de Wolff reclamar tanto da pontuação dobrada indicaria que isso o incomoda pois seria a única forma de Hamilton perder, a atuação do comando do time tem sido muito correta.

Contudo, talvez pela própria pontuação dobrada, combinada com os gremlins técnicos que os carros da Mercedes sofreram ao longo do ano, ou por seu próprio histórico, Hamilton insiste que nada está decidido. “São mais ou menos 10 pontos se pensarmos na pontuação antiga. É uma boa diferença, mas muita coisa ainda pode acontecer”, diz o inglês, que já perdeu um campeonato em uma situação ainda mais confortável: com duas provas para o final em 2007, tinha o equivalente a 42 pontos de vantagem para Kimi Raikkonen.

No mais, vendo os onboards e ouvindo as reclamações do próprio Raikkonen, me impressiona como a Ferrari pode ter atualizado sua estrutura e mudado o comando técnico, mas segue com o mesmo problema: enquanto os rivais evoluem, os italianos continuam sem compreender comportamentos básicos de seu carro mesmo na segunda metade da temporada. Esse foi um fator importante para o time ter perdido os campeonatos de 2010 e 2012 – a diferença é que, neste ano, ao invés de perder terreno em relação ao campeão da vez, a briga (já perdida em condições normais) é com a Williams pelo terceiro lugar no mundial.

Confira o placar entre companheiros e as diferenças na classificação dos EUA

 

Vettel 6 a 11 Ricciardo
Hamilton 7 a 10 Rosberg
Alonso 15 a 2 Raikkonen
Grosjean 13 a 4 Maldonado
Button 8 a 9 Magnussen
Hulkenberg 11 a 6 Perez
Sutil 9 a 8 Gutierrez
Vergne 9 a 8 Kvyat
Massa 5 a 12 Bottas
Kobayashi 11 a 4 Ericsson
Bianchi 12 a 3 Chilton

 

Diferenças de hoje:

Ricciardo x Vettel: 0s807

Rosberg x Hamilton: 0s376

Alonso x Raikkonen: 0s194

Maldonado x Grosjean: 1s071

Button x Magnussen: 0s051

Perez x Hulkenberg: 0s044

Sutil x Gutierrez: 0s700

Kvyat x Vergne: 0s314

Bottas x Massa: 0s299

As diferenças são calculadas nas sessões em que o companheiro com classificação pior é eliminado e os placares contabilizam o resultado do treino, e não a posição de largada, que pode ser alterada devido a punições.

Pinta de grande

Motor Racing - Formula One World Championship - Russian Grand Prix - Race Day - Sochi, Russia

Não é qualquer um que chega aos 20 anos e com apenas uma temporada completa a uma equipe tetracampeã mundial. Mas nem a inexperiência, nem a juventude são motivos para duvidar que Daniil Kvyat é o homem certo para formar dupla com Daniel Ricciardo na Red Bull em 2015.

Em primeiro lugar, a escolha do russo para o lugar de Sebastian Vettel mantém a lógica que a empresa austríaca vem mantendo desde que firmou-se na Fórmula 1, procurando seus valores dentro de um caro programa de desenvolvimento – mas talvez não tão caro quanto o salário de um Alonso ou um Hamilton.

Foi assim com Vettel e com o próprio Ricciardo. Enquanto o programa ficou ‘travado’ por Webber e alguns bons valores foram sendo substituídos para ‘fazer a fila andar’, as críticas eram cabíveis, mas as movimentações das últimas duas temporadas deram uma fluidez importante para que a fábrica dê certo, incentivando que está vindo por aí.

A escolha de Kvyat, contudo, é mais que isso: é um voto de confiança e tanto para Ricciardo. Após apenas uma temporada na Red Bull, o australiano poderia ver sua equipe suprindo a saída de Vettel com outro campeão. Promover o russo tem um quê de “Daniel, você é nosso próximo campeão”. Bem diferente da mensagem, por exemplo, que Felipe Massa recebeu da Ferrari quando Kimi Raikkonen foi demitido.

Mas por que promover Kvyat e não seu companheiro mais experiente, Vergne, que deu trabalho a Ricciardo e responde, nesta temporada, por mais de 72% dos pontos da Toro Rosso?

Sem conhecer os bastidores do trabalho dos dois, é difícil cravar, mas dois fatores merecem menção. O estreante é daqueles que chamam a atenção nas vezes em que fui observar os pilotos na pista. Daqueles muito agressivos, que pegam o carro pelo pescoço. Isso nem sempre é produtivo, mas as boas performances de Bottas, Hamilton, Alonso frente a seus companheiros dão o indício de que isso é bom no atual regulamento.

Além disso, é inegável o interesse da Fórmula 1 em explorar o mercado russo, infinitamente mais atraente que o decadente mercado francês – e especialmente da Red Bull, pois se trata de um país em que as vendas de energy e sports drinks cresce a mais de 20%/ano.

É como unir o útil ao agradável. Bom para Ricciardo (pelo menos enquanto Kvyat não chegar chegando, da mesma forma que ele fez com Vettel), os bolsos da Red Bull e para nós, que veremos um piloto que pisa forte em um carro que tem tudo para ir bem em 2015.

O nanico e as nanicas

Motor Racing - Formula One World Championship - Italian Grand Prix - Qualifying Day - Monza, Italy

Difícil falar em crise econômica quando um esporte gera 1,8 bilhão de dólares e não consegue manter 11 equipes participando de 19 etapas por ano. A crise por que a Fórmula 1 passa hoje é política.

Uma informação já dá a noção do absurdo: a Formula One Group, administradora do campeonato, fica com mais de 430 milhões de dólares por ano, enquanto as últimas duas equipes no campeonato têm direito a 50 e 10 milhões, respectivamente.

Se é tão claro, por que as equipes não se unem para mudar isso? Houve uma época em que isso pareceu possível, em 2009, até que a Ferrari conseguiu um acordo por fora com Ecclestone e, quando a equipe italiana se alinha com um lado, é ele quem ganha na F-1. São duas marcas que não se desassociam.

Hoje, há ainda dois outros problemas: uma Federação fraca e excessivamente política e um sistema decisório por meio do F1 Strategy Group que concentra o poder de mudança nas cinco maiores equipes.

Sempre haverá diferenças de financiamento entre as equipes, assim como há em qualquer outro esporte. A questão é a diferença entre o que gastam os maiores e menores. Pensando nisso, o ex-presidente da FIA, Max Mosley, surgiu recentemente com uma ideia válida: igualar os valores distribuídos por Ecclestone para que todos comecem da mesma base. As diferenças de investimento, portanto, seriam apenas de patrocínio. Isso ainda faria com que a Ferrari, por exemplo, tivesse um orçamento muito maior que a Marussia, mas a diferença diminuiria.

O problema é que isso não interessa aos que hoje controlam o esporte. Equipes pequenas são importante plataforma de crescimento profissional para mecânicos, engenheiros e até pilotos. Há quem possa lembrar que inúmeros nanicos faliram ao longo dos anos – precisamente, 164 em 64 anos de F-1 – mas é difícil ver o atual momento de Marussia e Caterham apenas como uma questão de seleção natural: a quebra de ambas vem depois de um ano de aumento considerável dos gastos com o novo motor e da criação do Strategy Group, dois fatores que efetivamente cuspiram as nanicas para fora da categoria – e correm o risco de respingar pelo menos na Sauber, a curto prazo.

A Fórmula 1 existe sem as nanicas? Sim, contando que seja atraente às montadoras, como ocorreu em meados dos 2000. Mas chegou a hora da categoria decidir se quer ser um clubinho ainda mais exclusivo, correndo o risco de perder credibilidade no momento em que uma Mercedes da vida resolve que já investiu o bastante, ou se acerta suas contas. Mas que ninguém espere alguma solução que vise o bem comum vinda ou do Strategy Group ou de Ecclestone, cujo interesse é meramente ter o mínimo de carros para honrar seus contratos. Quem tem que aparecer é Jean Todt.

Romance

Motor Racing - Formula One World Championship - Hungarian Grand Prix - Race Day - Budapest, Hungary

Um alemão, campeão consagrado, aos 27 anos, decide assinar com uma Ferrari em crise e se tornar um ídolo do time mais icônico da Fórmula 1. Não é mera coincidência. Sebastian Vettel quer emular sua grande inspiração, Michael Schumacher. Mas as coincidências significam que o sucesso da parceria é uma questão de tempo? Nem todas as peças estão encaixadas da mesma forma e Vettel certamente sabe que, daqui em diante, terá de escrever sua própria história em Maranello.

Por um lado, a Ferrari de hoje não está tão no fundo do poço quanto naquele longínquo 96, como o ex-chefe da equipe e atual presidente da FIA, Jean Todt, fez questão de salientar em entrevista recente à Gazzetta dello Sport. Sua comparação era com o início da era Schumacher e o início da era Alonso. “Não dá para fazer paralelos. Numa escala de 1 a 10, estávamos no 2. Em 2009, eles estavam no 7.”

Diria que, do final de 2009 para cá, o time regrediu em termos de competitividade. Está nota 5. Os quatro pódios seguidos do “desmotivado” Raikkonen na segunda metade daquele ano não passam de sonho para a Scuderia hoje. E muito disso tem a ver com a unidade de potência.

Falta velocidade final, falta reaceleração, falta um comportamento mais homogêneo dos sistemas híbridos na entrega de potência, falta até confiabilidade das baterias que continuam deixando os pilotos na mão. E, além das óbvias consequências de performance que tudo isso acarreta, especialmente o terceiro item da lista torna o carro inconsistente, por vezes imprevisível. E com um comportamento que Vettel já demonstrou não gostar. Mas falemos disso adiante.

A Ferrari teve um ano para resolver as deficiências de sua unidade de potência, é verdade. Mas demitiu o chefe do setor, Luca Marmorini, no meio do caminho. O que nos leva ao segundo ponto abordado por Todt. “Qual o conselho que eu daria? Reagir calmamente e pragmaticamente.”

De maio de 2011 a setembro de 2014 todas as peças-chave foram trocadas: Aldo Costa, Domenicali, Marmorini, Alonso (que diz ter “feito a cabeça” há dois meses) e, por fim, Montezemolo. E o novo capo, Sergio Marchionne, chegou pedindo que riscos sejam assumidos. “Podemos nos dar mal, mas não temos nada a perder, certo?” Difícil enxergar algum pragmatismo aqui. Difícil, também, enxergar o “plano de três anos” propagandeado pelo chefe Marco Mattiacci.

Pragmatismo, mesmo, só se for da parte do ‘nerd’ Vettel, daqueles que, enquanto o resto do time almoça antes da classificação (que ocorre geralmente às 14h pelo horário local), já circula de macacão, focado.

Diferentemente de Schumacher, ele chega à Ferrari com algo a provar, após provavelmente uma derrota para um companheiro menos experiente em 2014 devido à má adaptação ao carro. Má adaptação que tem a mesma raiz das dificuldades Kimi Raikkonen na Ferrari: a dianteira solta demais. Vettel espera mais do que ninguém que James Allison e companhia tenham ouvido o finlandês nesta temporada. Mais um carro como o F14 T e a Ferrari joga outro ano no lixo. Mais do que isso, sem trabalhar a longo prazo, especialmente que agora têm um piloto sem o “prazo de validade” de Alonso, eles podem colocar outro ciclo potencialmente vencedor a perder.

Quente e frio

Motor Racing - Formula One World Championship - Italian Grand Prix - Preparation Day - Monza, Italy

Antes era a aerodinâmica. Agora, os motores. Não por acaso, os rivais correm para tentar aprovar mudanças no congelamento das unidades de potência a fim de conseguirem desenvolver seus sistemas durante o ano e tirar a vantagem óbvia da Mercedes, que fechou o top 5 do último GP, na Rússia.

Primeiramente, que fique claro que a suposta economia causada pelo congelamento – que é sua razão de ser – não serve como argumento. Afinal, apenas alguns elementos estão congelados: pela regra que vigora atualmente, devido à extensão das mudanças para esta temporada, apenas 8% – ou cinco itens – ficaram congelados, todos eles relacionados ao motor turbo. Para as próximas temporadas, haveria uma progressão na porcentagem de itens homologados – 23% em 2015, 35% em 2018 e 95% em 2019. Ou seja, ainda que o motor usado desde o início da temporada seja o mesmo, aquele que será utilizado em 2015 passou o ano inteiro sendo desenvolvido, pois 92% dele pode ser diferente do atual. Isso, é claro, custa dinheiro.

Os defensores do descongelamento adotam um discurso politicamente correto, de que seria “bom para a competição”. E ‘acusam’ a Mercedes de estar com medo da concorrência. Mas é uma abordagem superficial.

A Mercedes foi quem lidou melhor com a mudança nas regras e produziu um motor desejado por várias equipes. Por conta disso, para 2015, terá oito carros no grid. Se isso significa mais dinheiro entrando pela venda dos propulsores, também quer dizer que, quando houver alguma novidade, será necessário um maior investimento para entregar as novas peças a todos.

Esse é um dos pontos complicados, pois a proposta é de que todas as equipes sempre tenham todas as especificações novas ao mesmo tempo. Ou seja, a Mercedes não poderia usar uma nova peça nos motores de sua equipe de fábrica antes da Lotus, por exemplo.

É um princípio justo, claro, mas não quando uma fornecedora tem oito carros para ‘cuidar’ e outra, como a Honda, tem dois. Além disso, os clientes da Mercedes estão em condição financeira muito melhor – a Renault tem a Caterham (o acordo com a Red Bull troca exposição pelos motores, como uma equipe de fábrica) e a Ferrari tem Marussia e Sauber. É esse tipo de entrave que a medida sofre.

Teria a pressão das rivais a ver com possíveis atrasos na tentativa de chegar no nível da Mercedes? É bem possível que sim, pelos boatos que rondam o paddock e dão conta de que ao menos Honda e Renault (de novo) não estão cumprindo seus prazos. O que tem de verdade nestas especulações é difícil saber – sempre pode ser algo plantado que, de tanto ser repetido, vira ‘verdade’ no paddock, mas lembremos que todos consideravam que a Mercedes viria mais forte nessa mesma época no ano passado…

É muito provável que as mudanças nestas regras não sejam adotadas já em 2015, pois, para isso, é necessária unanimidade. Para 2016, contudo, uma vitória da maioria já garante a mudança e é bem possível que os motores fiquem descongelados. Até lá, ainda vamos ouvir muito sobre isso.

Divórcio

Motor Racing - Formula One World Championship - Chinese Grand Prix - Race Day - Shanghai, China

Fernando Alonso prepara-se para suas últimas três provas na Ferrari certamente desapontado por não ter conseguido o sucesso que almejava quando chegou na Scuderia, em 2010. O plano era repetir Michael Schumacher e se tornar ídolo na equipe mais tradicional da Fórmula 1. De lá para cá, apesar dos três vice-campeonatos, o espanhol conquistou apenas quatro pole positions e 11 vitórias.

Curiosamente, é o mesmo número de triunfos que Felipe Massa teve na equipe italiana – igualdade que deve se manter até o final do ano, dada a performance ruim do time nesta temporada.

Sim, é uma comparação desigual. O brasileiro disputou mais GPs que Alonso na Ferrari, 140 contra 93, e todas as suas poles e vitórias foram conquistadas antes do espanhol chegar à Scuderia, entre 2006 e 2008. Neste período, também, a Ferrari conquistou seus dois últimos títulos de construtores, além de um título de pilotos e dois vices (um deles, em 2008, com o próprio Massa).

Eram os anos em que a equipe ainda colhia os frutos da reconstrução vitoriosa de Schumacher, Jean Todt, Ross Brawn e companhia. Reconstrução que Alonso não conseguiu reproduzir em Maranello.

Correndo atrás das rivais desde a grande mudança de regras de 2009 – algo que só piorou com a mais nova revolução regulamentar, em 2014 – a Ferrari nunca mais teve carro para ser campeã, mas, na base do conjunto, chegou perto do título em duas oportunidades com Alonso. E quem acompanhou 2010 e 2012 sabe que o piloto espanhol foi determinante para isso, juntamente de um equipamento sólido e confiável, ainda que nunca o melhor.

Um bom exemplo disso está, inclusive, nos números. Em relação ao número de pódios, a vantagem é de Alonso, que teve a constância como marca registrada nas disputas de título que travou com Sebastian Vettel. O espanhol conquistou 44 pódios – média superior a 47% das provas disputadas, mesmo estourando o champanhe em apenas duas oportunidades em 2014 – contra 36 de Massa (média pouco acima de 25%).

Apesar das grandes performances na pista, o que Alonso não conseguiu foi atrair uma organização a seu redor que devolvesse à Ferrari sua condição de pioneira. Ao invés disso, nestes cinco anos, a equipe se limitou a copiar.

Mas serão os números relativamente modestos ou a fama de quem por inúmeras vezes fez o máximo que um piloto pode fazer dentro do cockpit que permanecerão na história? Com a sombra do que Schumacher conseguiu, o casamento Alonso e Ferrari, tido como inabalável há não muito tempo, acaba com ares até injustos de fracasso.

GP da Rússia por brasileiros, britânicos e italianos: “Mais um golpe”

Motor Racing - Formula One World Championship - Russian Grand Prix - Race Day - Sochi, Russia

O GP da Rússia começou evidenciando que qualquer análise ficaria pelo caminho logo na primeira curva, quando um afobado Nico Rosberg colocou de lado na tentativa de superar o companheiro Lewis Hamilton e jogou suas chances de vitória no lixo ao frear tarde demais. Quem gostou foi o narrador da TV Globo, Luis Roberto. “Hamilton manteve a ponta, mas Rosberg tenta colocar de lado, agora ficou bonito. Impressionante como eles arriscaram.”

Na Sky Sports, David Croft, por sua vez, não dá tanta ênfase no erro de Rosberg logo de cara. “Largada decente de Hamilton e também de Rosberg. Ele frita os pneus e vai para a ponta. O que mais temos? Acho que Ricciardo perdeu muitas posições.” Gianfranco Mazzoni e os demais italianos da Rai veem a briga na frente, mas não tiram os olhos da Ferrari. “Rosberg parte para o ataque, enquanto Alonso tenta ganhar posições mais atrás… e Rosberg corta a curva. Muita confusão nas primeiras curvas, como era previsto pelas características da pista”, narra, ajudado pelo comentarista Ivan Capelli. “Precisamos destacar a grande largada de Alonso, enquanto Raikkonen é 11º.”

Não há nem tempo de polemizar sobre a necessidade de Rosberg devolver a posição ganha fora da pista a Hamilton, pois o alemão já avisa via rádio que precisa trocar os pneus, “quadrados” na definição do comentarista inglês Martin Brundle.

O piloto coloca os pneus médios logo ao fim da primeira volta, assim como Felipe Massa, largando em 18º, troca os médios pelos macios. Isso não surpreende os brasileiros, pois a estratégia da Williams fora mencionada. “Ele pode colocar os pneus macios e ir até o fim, como o Luciano explicou antes da largada”, diz Luis Roberto, citando o comentarista Burti.

Na Globo, é vista como válida a possibilidade de ambos chegarem até o final sem fazer outro pit stop. Na Sky, isso não é possível. “A campanha de Rosberg pelo título acaba de levar outro golpe”, acredita Brundle, que emenda: “Que pena para Massa, ele tinha ganho várias posições”, demonstrando pensar que a parada não fora programada.” Quando ouve no rádio da Mercedes que a ideia é, sim, ir até o fim, a reação de Croft é um “wow”. Na avaliação de Brundle, “se ele chegar nos pontos, pode comemorar”.

Os italianos ficam no meio do caminho. “Com Rosberg trocaram o macio pelo médio, enquanto Massa fez o contrário, então dificilmente ele vai conseguir chegar ao final”, acredita o comentarista-engenheiro Giancarlo Bruno. Algumas voltas depois, a repórter Stella Bruno informa que Massa parou por estratégia e que tem “uma corrida longa com os macios”, indicando que essa era a primeira intenção da equipe.

Na nona volta, Giancarlo Bruno faz as contas e já alerta que Rosberg está se colocando em posição de chegar em segundo lugar. Impossível, na visão do repórter da Sky Ted Kravitz. “Estou vendo os números e acho que quarto é mais realista. Falaram para o Jenson que Nico vai até o final e ele respondeu que era impossível.” Pouco depois, vem o rádio da Mercedes falando que ele já chegou virtualmente em Button, terceiro. “Se a Mercedes está dizendo para o Rosberg que ele pode lutar pelo pódio, então o Felipe também”, crê Burti. De fato, até aquele momento, o brasileiro vinha abrindo caminho junto do alemão.

Motor Racing - Formula One World Championship - Russian Grand Prix - Race Day - Sochi, RussiaIsso, até a dupla chegar na Force India de Sergio Perez, “primeiro carro com motor Mercedes que eles encontram”, como destacam Croft e Capelli. Mas Rosberg se livra facilmente do mexicano e deixa a ‘encrenca’ para Massa, que passaria o resto da tarde tentando superar o rival.

Os diferentes sinais dados pelos pilotos a respeito dos pneus começam a confundir os comentaristas perto da metade da prova. Lewis Hamilton, mesmo com os pneus compostos do início da prova, elogia a performance da borracha, enquanto Rosberg, com os pneus mais duros, reclama. “Parece que o pneu macio é melhor porque o Magnussen e o Hamilton falam que o pneu está bom e o Rosberg, de médios, está reclamando. É porque ele tem mais aderência e escorrega menos”, avalia Burti.

Para Brundle, a diferença é de tocada. “Um piloto da Mercedes se diz satisfeito com os pneus e outro reclama, mesmo com pneus mais novos. Parece que Lewis entrou em uma zona nesse circuito que Rosberg não está conseguindo acompanhar.”

Avaliação semelhante é feita pelo comentarista britânico e pelo italiano Capelli quando Alonso faz uma sequência de voltas ruins e logo retoma o ritmo. Tudo pensado, para eles. “É por isso que a McLaren quer Alonso. Ele largou do lado do companheiro e já está mais de 10s e quatro posições na frente. Ron Dennis vai querer o melhor piloto possível, ele sempre foi assim. O que Button tem de fazer é pilotar o melhor que pode, mas ele também tem de aceitar que uma hora a carreira dele vai ter de acabar”, diz Brundle. “Isso só mostra a inteligência de corrida de Alonso”, vê Capelli, que aposta em uma “diferença de acerto” entre Hamilton e Rosberg, o que explicaria as relações diferentes dos dois com os pneus.

Mas logo fica claro que é graining. “O pneu voltou à vida”, comemora Rosberg. Mas nem isso é suficiente para convencer os ingleses, que mantêm a expectativa de uma segunda parada para o alemão até as voltas finais, principalmente após Massa não aguentar e trocar novamente os pneus. “Massa, como era previsto, teve de parar. Enquanto Rosberg deve manter o ritmo até o final, com os médios”, avalia Bruno. Teria sido um erro da Williams? “A escolha estratégica para Massa levou em consideração o fato dele ter vários pneus sem usar devido ao problema na classificação”, explica Giorgio Piola. Os brasileiros lamentam. “Contrariando nossa previsão, Massa para de novo e coloca em risco possibilidade de lutar pelas primeiras posições no grid”, diz Luis Roberto.

Encerrando com quaisquer dúvidas na transmissão italiana, na volta 31, Stella Bruno entrevista Paul Hembery, diretor esportivo da Pirelli, que diz que Rosberg pode, sim, terminar a corrida com os pneus médios. Mas o mesmo não acontece na Sky, que segue especulando. “Será que ele tem vantagem suficiente para aguentar mesmo com a degradação no final? Vai ser melhor apostar em ficar do que parar agora e ele ter de fazer várias ultrapassagens”, diz Croft. Até 15 voltas para o fim, Brundle ainda não se conforma. “Se eles forem parar, tem de ser agora, senão ele não terá tempo de recuperar.”

Enquanto todos começam a destacar a recuperação de Rosberg, não deixam de notar a tranquilidade da tocada de Hamilton. “Parece que está num carro de passeio”, observa Luis Roberto. “Nico mostrou muita confiança, veio muito de trás. Que recuperação isso está se tornando. Mas também só mostra o quão rápido Hamilton poderia ir se ele precisasse. Fiquei impressionado com o quão cedo ele está tirando o pé do acelerador quando vimos o onboard”, diz Brundle.

Mas a dúvida sobre a estratégia de Rosberg volta perto do final, quando ele recebe a mensagem de que estaria no “plano B”. Isso gera certo desconforto entre os italianos. “Depois de ver as voltas rápidas que Rosberg está fazendo, o plano B só pode querer dizer que…”, Capelli deixa no ar e Bruno completa “que ele vai usar os pneus agora para abrir diferença para Bottas e gerir a distância depois.” Mas o ex-piloto, na verdade, crê que “ele vai tentar abrir vantagem para parar de novo”, teoria rechaçada pelo engenheiro. “Faltam 15 voltas, essa estratégia não faz sentido.”

De fato, ficamos sem saber o que era o tal plano B. E nem quando chegaria a degradação nos pneus de Rosberg. Hamilton recebe a bandeirada com o companheiro fazendo grande recuperação em segundo, mas com o peso do erro na largada e 17 pontos de desvantagem no campeonato. “Rosberg adotou um acerto, segundo suas palavras, criativo, na sexta-feira e andou muito longe do companheiro. No sábado, voltou a um acerto mais padrão e, mesmo assim, não conseguiu chegar muito perto. Talvez isso tenha deixado-o nervoso e provocou o erro, que condicionou essa corrida”, avalia Bruno. “O erro lembra o de Spa, pois novamente ele quis resolver a disputa com seu companheiro na primeira oportunidade que teve. Mas agora não houve contato”, completa Piola. Na avaliação de Brundle, “Hamilton fez o melhor trabalho porque não errou, mas a recuperação do dia foi de Rosberg.”

Mais líder do que nunca – os 17 pontos são a maior diferença obtida por Hamilton neste ano – o inglês ainda ganhou destaque por Motor Racing - Formula One World Championship - Russian Grand Prix - Race Day - Sochi, Russiaigualar Nigel Mansell como o maior vencedor britânico na F-1. “Muito legal o Hamilton ter a consciência de que a Mercedes está fazendo história e ele também está”, diz Reginaldo Leme depois que o inglês destaca o título de construtores do time. O piloto é elogiado até por não acelerar. “Um Hamilton mudado. Poderia ter tentado a volta mais rápida e o grand chelem no final, mas preferiu pensar no campeonato”, observa Capelli.

Glória para uns, mais uma corrida difícil para Massa, 11º, atrás de Perez. “Depois do Canadá, perguntaram para o Massa se ele pensaria duas vezes antes de disputar com Perez. E ele disse que pensaria três vezes”, lembra Brundle. Para os brasileiros, contudo, uma questão de estratégia. “Era uma tentativa, ele estava largando em 18º. Eles tinham de fazer alguma coisa diferente”, defende Burti. “Vamos falar a verdade: a temporada foi muito azarada para o Felipe, quase nunca aconteceu algo de errado com o Bottas. Quem sabe no Brasil ele pode fazer uma boa prova, pois as características do traçado favorecem as características da Williams”.

Hamilton caminha para ser maior britânico, enquanto Pirelli dá uma de Bridgestone

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Nada mal para quem, antes do início desta temporada, nunca havia vencido sequer três provas em sequência. Lewis Hamilton caminha para se tornar o piloto britânico mais vitorioso da história. Com 145GPs na carreira, o líder do campeonato igualou as 31 vitórias de Nigel Mansell, que disputou 192 provas. Ele já tem os recordes de britânico com maior número de poles e pódios.

De quebra, Hamilton superou a campanha de Ayrton Senna de 1988 ao vencer pela nona vez na temporada – e o fez após 16 etapas, mesmo número de provas daquele ano.

Mas demorou justamente 31 vitórias para Hamilton ser, finalmente, campeão de construtores, uma trajetória sem paralelos na Fórmula 1. A Mercedes conquistou o título com três corridas de antecipação, assim como a Red Bul havia feito em 2011 e 2013. Porém, com a pontuação dobrada, há mais pontos em jogo em 2014.

Foi uma conquista com estilo, com direito à nona primeira fila apenas com Mercedes e nona dobradinha – recorde são 10, da McLaren em 1988, ainda que campeonato tenha tido três provas a menos que o atual.

Trata-se da 15ª equipe a ser campeã de construtores, campeonato criado em 1958. Porém, podemos considerar essa equipe de Brackley tricampeã, pois ela vem do espólio da antiga Tyrrell, dona do título de 1971, e Brawn, vencedora em 2009.

Falando em mundial de construtores, os 22 pontos de Sochi representaram o melhor resultado da McLaren desde a primeira prova do ano. Além de ter passado a Force India, o time de Woking começa a ensaiar um incômodo à Ferrari: são 45 pontos de diferença

A estreia da Rússia – 31º país a receber a Fórmula 1 – com casa lotada foi uma ótima notícia para a categoria, que fez, em Sochi, uma prova pelo 71º circuito diferente em sua história. Pena que uma escolha equivocada da Pirelli fez com que o espetáculo apresentado deixasse tanto a desejar.

Houve outras provas com apenas uma parada – a próxima etapa, nos EUA, sempre é uma forte candidata – mas nunca um piloto fora capaz de fazer toda a prova com um jogo de pneus, parando na volta 1, e não tendo sinais de degradação (Nico Rosberg fez a volta mais rápida com um giro para o final, sendo apenas destronado por Bottas). A última vez que isso aconteceu – e Fernando Alonso lembra disso como ninguém – foi no último GP da era Bridgestone, em Abu Dhabi. Longe de ser o melhor exemplo da história em termos de emoção.

Mas houve um alento. Apesar de não ter conseguido reproduzir a grande classificação na corrida, o piloto da casa Daniil Kvyat obteve a melhor posição do grid para um piloto russo, com o quinto lugar. No entanto, parece meio estranho dizer que esse era o GP caseiro do piloto da Toro Rosso, que nasceu na cidade de Ufa, a 1500km de Sochi.

Os russos também viram a primeira vez em que uma equipe participou de um final de semana de GP com apenas um carro desde o GP do Canadá de 1994 – Simtek, time de Roland Ratzenberger. Que as coincidências com aquela temporada acabem por aqui.

Finalmente, Mercedes

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Não foi em uma das corridas mais emocionantes da face da Terra, longe disso, mas o acerto de contas da Mercedes com sua própria história ao conquistar seu primeiro título de construtores foi mais uma prova do nível de eficiência que o time alemão atingiu.

Mesmo tendo de reprogramar a estratégia após o erro pouco característico de Rosberg, piloto e equipe conseguiram ler bem o desgaste de pneus, não se assustaram com o graining e conquistaram uma dobradinha que tem muito a ver, também, com todo o trabalho de acerto do carro em uma pista nova.

Sim, houve quebras demais ao longo do campeonato e esse deve ser o grande foco para o ano que vem, mas ver uma equipe funcionando bem em vários setores é impressionante. E não é algo que acontece da noite para o dia.

Deixo para vocês um texto que publiquei aqui no blog há pouco mais de um ano, em setembro de 2013, no qual aponto quais os motivos que faziam a Mercedes indicar, já naquela época, que estava no caminho certo para ser the next best thing na Fórmula 1:

A história da Fórmula 1 é cheia de ciclos: houve equipes que fizeram carros dominantes, mas não conseguiram manter-se no topo muito tempo, como a McLaren do bicampeonato de Hakkinen, algumas que apareceram do nada, como a Brawn de Button e outras que só foram “derrubadas” com mudanças de regulamento, como a Ferrari de Schumacher.

Hoje, vivemos o ciclo da Red Bull, que não dá sinais de que acabará tão cedo. Mantendo a estrutura técnica com Adrian Newey à frente e a politicagem com o cada vez mais influente Christian Horner, a equipe, que há cinco anos lutava no pelotão intermediário, hoje caminha para o tetracampeonato com sobras.

Porém, se tivesse de apostar em qual será o time do futuro, jogaria minhas fichas na Mercedes.

Voltando um pouco no tempo: a Red Bull apareceu após uma mudança no regulamento, cuja intenção era diminuir a influência da aerodinâmica nos carros. Logo de cara, a Brawn – hoje Mercedes – compensou isso com o difusor duplo, mas a falta de investimento impediu que o desenvolvimento continuasse. Newey e sua equipe, por sua vez, encontraram outras soluções, muitas delas caçadas pela FIA (como o difusor soprado e as asas flexíveis), mas ainda assim tiveram margem de manobra para se manter no topo. E é por essa constante inovação, esse desenvolvimento consistente, que fica difícil acreditar que eles apareçam com um projeto totalmente equivocado ano que vem.

Mas, se alguém dá pinta de que pode chegar nos virtuais tetracampeões mundiais é justamente o espólio da antiga Brawn. A equipe levou três anos para se reestruturar após passar aquela temporada de 2009 com muito pouco investimento e tendo de enxugar sua estrutura – lembre-se que aquele carro com que Button foi campeão foi desenvolvido com dois túneis de vento e orçamento quase infinito da Honda.

De lá para cá, o time contratou muito – e bem – adotando uma nova postura que vem ganhando adeptos na Fórmula 1, menos centralizada. Renovou a tecnologia de sua fábrica, aumentou a escala do túnel de vento, e vem colhendo os frutos. Ao contrário da Ferrari, que volta e meia se vê com peças que não funcionam; da McLaren, que alterna bons e péssimos momentos; e da tão criativa quanto endividada Lotus, mostra-se o time mais bem organizado entre os desafiantes da Red Bull.

E essa ‘afinação’ da fábrica chega em boa hora. Os engenheiros explicam que um dos grandes desafios do regulamento que entra em vigor ano que vem é a maior interdependência entre os sistemas. Ou seja, quanto mais próximos os setores que cuidam do motor e do carro em si trabalharem, melhor.

“O mais notório para mim é que a interdependência entre as peças diferentes do carro é bem maior do que hoje. Por exemplo a instalação do motor: há uma implicação aerodinâmica, uma implicação no desenho da caixa de câmbio, uma implicação no chassis – tudo é muito mais interligado”, explica o diretor técnico da Toro Rosso, James Key. Em teoria, isso favorece as equipes de fábrica.

No final dessa ‘linha de produção’, estão os pilotos, quesito em que a equipe também está bem servida. Com ambos andando bem e com contratos longos, a continuidade é outro fator a ser considerado. E, se o próprio Lewis Hamilton admitiu a essa coluna que não sente a vontade no carro “que foi desenvolvido para Nico e Michael, pois demora um tempo para adaptá-lo ao meu estilo de pilotagem”, e é terceiro em um campeonato que seria de adaptação, imagine o que está por vir.

 

Confira o placar entre companheiros e as diferenças na classificação do GP da Rússia

Vettel 6 a 10 Ricciardo
Hamilton 7 a 9 Rosberg
Alonso 14 a 2 Raikkonen
Grosjean 13 a 3 Maldonado
Button 7 a 9 Magnussen
Hulkenberg 11 a 5 Perez
Sutil 8 a 8 Gutierrez
Vergne 9 a 7 Kvyat
Massa 5 a 11 Bottas
Kobayashi 11 a 4 Ericsson
Bianchi 12 a 3 Chilton

Diferenças de hoje:

Ricciardo x Vettel: 0s386

Hamilton x Rosberg: 0s200

Alonso x Raikkonen: 0s062

Grosjean x Maldonado: 0s679

Button x Magnussen: 0s508

Hulkenberg x Perez: 0s105

Gutierrez x Sutil: 0s448

Kvyat x Vergne: 0s743

Bottas x Massa: 3s939

Ericsson x Kobayashi: 0s518

As diferenças são calculadas nas sessões em que o companheiro com classificação pior é eliminado e os placares contabilizam o resultado do treino, e não a posição de largada, que pode ser alterada devido a punições.

5 por toda a parte

O festival de números 5 já invadiu a lista de componentes usados da unidade de potência, com quatro etapas para o final, levando a crer que as punições pela utilização do sexto de qualquer um dos elementos mostrados abaixo se tornarão uma regra daqui em diante.

Os dois pilotos da Toro Rosso e Pastor Maldonado foram os primeiros a pagar punições por conta disso – não coincidentemente, pilotos que utilizam motores Renault, como vínhamos alertando desde maio. Nos treinos livres em Sochi, foi a vez de Daniel Ricciardo, na corda bamba em cinco dos seis elementos, parar com suspeita de problema no motor, mas a Red Bull já avisou que tratava-se de elementos antigos, que seriam substituídos de qualquer maneira para a corrida (ainda dentro dos 5 permitidos), o que não acarreta punição.

Esse é um fator que também pode influenciar daqui em diante: como esses cinco itens não precisam obedecer ordem (dá para recolocar no carro uma ICE usada no começo da temporada, por exemplo) as equipes vão deixar as peças mais usadas para os treinos livres de sexta-feira. E quem começar a quebrar por conta disso terá problemas na preparação para o resto do final de semana.

Pelo menos na luta do campeonato, está tudo igualado por enquanto. E fica a torcida para que não seja isso que vá decidir o campeonato com a pontuação dobrada de Abu Dhabi.

Lembrando que cada piloto pode usar, ao longo da temporada, cinco unidades de cada componente. O motor foi “desmembrado” em seis itens, que são contabilizados separadamente. A partir da sexta unidade de qualquer um destes itens, o piloto perde 10 posições no grid. Caso isso ocorra com um segundo item, serão mais cinco posições e, se toda a unidade for trocada pela sexta vez, o piloto larga do pit lane.

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ICE = Internal combustion Engine/ Motor de combustão
TC = Turbo Charger/ Turbo
MGU-K = Motor Generator Unit – Kinetic/ Gerador a partir de energia cinética
MGU-H = Motor Generator Unit – Heat / Gerador a partir de energia calorífica
ES = Energy Store / Armazenamento de energia
CE = Control Electronics / Central de controle eletrônico

GP do Japão por brasileiros, britânicos e italianos: “Não tem outro carro ali, tem?”

Motor Racing - Formula One World Championship - Japanese Grand Prix - Race Day - Suzuka, Japan

“No seco, é emocionante. Na chuva, é aterrorizante. Há rios por toda a parte e você tem de tirar muito o pé em curvas que seriam facilmente de pé embaixo”, Martin Brundle, comentarista da Sky Sports, começa sua tarde de adivinho. “Devíamos ter começado essa corrida há umas 4h.”

De fato, o prognóstico antes da largada do GP do Japão não era dos melhores. Os narradores e comentaristas informavam que eram necessárias mais de duas voltas para contar metade dos pontos e 40 para que o total fosse computado. Chuva e o entardecer logo depois das 17h (três horas depois da largada) tornavam difícil de imaginar que a prova iria até o final.

A largada é dada com Safety Car. “Os carros partem para a pista e tá um sabão”, observa o narrador da Globo, Luis Roberto. “Mesmo em baixíssima velocidade, vemos quanta água os carros levantam”, destaca o comentarista da Rai, Ivan Capelli. “É um risco enorme. Não dá para fazer uma corrida sem que os carros andem rápido, porque eles são projetados por isso”, completa o comentarista brasileiro Luciano Burti. A Caterham de Ericsson aquaplana mesmo em velocidade baixa, os pilotos não param de reclamar e não tem jeito: bandeira vermelha depois de duas voltas.

Seria o suficiente para os pontos serem dados? Para os britânicos, sim: “Se nada mais acontecer, Nico vai sair líder”, aponta Brundle. Mas há uma segunda largada, de novo sob Safety Car, e Giancarlo Bruno, comentarista técnico italiano já informa o tempo de volta que a Pirelli recomenda para a troca dos pneus de chuva para os intermediários.

Para Fernando Alonso, porém, isso pouco importa. A Ferrari simplesmente desliga após poucas curvas. “Alonso, que já esteve perto de recordes de corridas nos pontos, agora abandona a segunda corrida em três”, observa o narrador italiano Gianfranco Mazzoni. “Uma pena que perdemos um combatente. Alonso certamente teria dado show nessas condições”, lamenta Capelli, da mesma forma que Luis Roberto. “Que pena, Alonso, logo você! O piloto mais habilidoso do grid fica de fora da corrida. Apagou geral.” Já Brundle aproveita para especular. “Ele está voltando em uma moto Honda. Será que terá um motor Honda ano que vem?”

O Safety Car segue na pista e o comentarista inglês não se conforma – pede para a corrida começar desde a quarta volta e já prevê o que estar por vir. “Sabemos que as Red Bull estão acertadas para a chuva, vamos ver se eles conseguem chegar nas Williams.” Os italianos ficam em cima do muro. “Realmente as condições parecem boas, mas acredito que o spray é o único risco”, diz Capelli. Os brasileiros apoiam a direção de prova, pois, nas palavras de Reginaldo Leme, “essa é uma das pistas mais perigosas do campeonato, porque é uma das mais rápidas e tem poucas áreas de escape.”

Antes mesmo da corrida começar de verdade, os britânicos já especulam se alguém colocará os intermediários. E quem aposta é Jenson Button. “Foi assim que ele teve várias vitórias na F1: no molhado e arriscando”, lembra Mazzoni.

De fato, na volta seguinte, vários pilotos copiam o inglês, que ganha terreno. “Button já está na frente de Bottas com sua aposta”, se surpreende Capelli. Isso significa, a essa altura, a terceira posição, o que os brasileiros só veem na 16ª volta.

Enquanto Hamilton não deixa Rosberg escapar na ponta, ambos ainda com pneus de chuva extrema, as Red Bull – como previu Brundle – vão à caça das Williams. O carro mais alto, acertado para a chuva, ajuda Vettel e Ricciardo, como destacam Burti e Giorgio Piola. E não demora para a dupla chegar ao quarto e quinto postos. “Boa pilotagem de Massa e Vettel para não bater. E muito corajoso Ricciardo, mantendo o pé do acelerador mesmo com uma roda na tinta”, avalia Brundle. “Valeu a pena esperar por essa corrida.” O narrador britânico David Croft começa a acreditar que, “com esse ritmo, eles vão chegar na Mercedes no final”, até porque, como frisa Brundle, “o acerto com mais downforce está ajudando-os a manter os pneus em melhor estado.”

Na frente, Rosberg para primeiro e Hamilton aperta o ritmo. Tanto, que escapa da Spoon, perdendo a chance de superar o companheiro. “Se não fosse aquela escapada, meu amigo…” imagina Luis Roberto.

Mas o inglês não desiste e, com os problemas de equilíbrio do carro de Rosberg, se aproxima.“Vemos que Rosberg faz uma trajetória mais central para ter de virar menos e sentir menos a saída de dianteira, enquanto Hamilton faz uma trajetória mais estreita, que é, efetivamente, mais curta”, observa Capelli.

Na volta 23, Brundle começa a “imaginar quando eles vão permitir o DRS. Deve estar próximo porque o spray está bem menor”. No giro seguinte, o pedido é atendido, com Hamilton já a menos de 1s do companheiro. “Vai esquentar! Hamilton não tenta só liderar a corrida, mas também o campeonato. Pela pista estar molhada, o talento do piloto pode fazer com que use pontos de ultrapassagem que não seriam normais”, se empolga Luis Roberto.

Os italianos também acham que usar o DRS para passar não será a melhor estratégia para Hamilton, mas o inglês parece decidido a superar Rosberg na primeira curva. Na primeira vez, não dá certo e sua asa dianteira passa perto do pneu do alemão. “Quase vimos um novo Spa agora”, lembra Brundle. “O que eles vão fazer? Rosberg está com problemas no pneu e Lewis não. Enquanto isso, as Red Bull se aproximam. O que fazer para que eles não batam? Eles têm de liberar Hamilton. Os pneus dele estão melhores, mas ele não consegue usá-los”.

Motor Racing - Formula One World Championship - Japanese Grand Prix - Race Day - Suzuka, JapanA justificativa dos britânicos para pedir ordens de equipe é a aproximação das Red Bull, mas a Mercedes não precisa intervir: na volta 29, Hamilton completa a manobra para delírio de todos. “A 330km/h, em pista molhada e por fora. Foi o que restou para ele fazer. Ótima manobra. Esse é o Hamilton que a gente conhece”, vibra Reginaldo. “Grandioso. Espetacular, arriscou muito bem. E Rosberg sentiu na hora, nem conseguiu acompanhar. Perdeu 1s6 no primeiro setor”, observa Mazzoni. “Rosberg foi mais defensivo do que deveria e acabou facilitando. Isso resolveu o problema da Mercedes”, comenta Brundle.

A ultrapassagem não cessa os questionamentos dos britânicos em relação à estratégia da Mercedes. A bronca agora é pela demora em trazer Rosberg aos boxes.“Não sei o que a Mercedes está esperando para chamar o Rosberg para os pits. Parou de chover, mas não está nem perto de secar a pista”, observa o repórter Ted Kravtiz.

Para Burti, a demora talvez seja justamente porque “a equipe deve estar esperando ver se a pista vai secar”, mas os italianos pensam o contrário. “Se chover o que está previsto, ele poderia colocar os pneus de chuva e pararia uma vez a menos que os outros”, avalia Capelli.

A questão é que Vettel está se aproximando, “fazendo uma grande prova antes de ir para Maranello”, como o narrador italiano frisa. Porém, após as paradas, as posições se mantêm.

Na volta 36, Kravitz avisa : “está formando uma bela chuva aqui e está escurecendo”. A escapada de Vettel, três voltas depois, é a prova de que a água chegou de vez. “Alô, Vettel, a pista é para a esquerda!”, se diverte Luis Roberto. “Está chovendo mais, porque mudaram os níveis de aderência do asfalto”, observa Capelli, enquanto Brundle lembra que “pode ser que eles terminem a corrida antes, porque na próxima volta já tem os pontos totais. Os intermediários até que têm uma grande janela, mas chega um momento em que a água é demais. Um milímetro a mais e eles começam a aquaplanar.”

“O spray e a alta dos tempos são sinais evidentes de que as condições pioraram. Por isso proibiram o DRS. Estamos chegando no tempo limite para colocar os pneus de chuva”, observa Bruno na volta 41. Logo os pilotos começam a entrar nos boxes. A McLaren usa a informação de Magnussen e para Button. “Novamente é ele o primeiro a mudar a estratégia entre os ponteiros”, aponta Luis Roberto.

Motor Racing - Formula One World Championship - Japanese Grand Prix - Race Day - Suzuka, JapanMas o fato que mudaria a história da corrida seria a batida de Sutil na saída da Dunlop, na volta 42. “Nós podemos ter um SC. Adrian Sutil foi parar nas barreiras”, diz Croft. Isso não acontece.

Impaciente, Brundle quer ver se a área de escape já está liberada. “Onde está o carro do Sutil? Será que eles conseguem tirar rápido? Porque os outros também estarão aquaplanando no mesmo lugar. Aconteceu comigo.” Quando a imagem mostra o carro de Sutil e o trator de remoção ainda na brita e os fiscais acenando, a preocupação do comentarista, que atropelou um fiscal sob circunstâncias bastante semelhantes há 20 anos, aumenta. “Os fiscais estão andando do lado de dentro da pista, o mais sábio seria ficar do outro lado… e tem o trator também. Vimos como o Sutil escapou…”

Só então sai o Safety Car, acompanhado do carro médico, em procedimento que causa estranheza. “Muita confusão porque o SC saiu longe do líder. Parece que deve ter havido um problema com algum fiscal que estava na recuperação do carro, pois o carro médico parou por ali. Por isso eles apareceram agitando as mãos daquele jeito”, observa Capelli.

Essa, também, é a primeira suspeita dos britânicos. “O carro médico também está saindo. Não vimos Sutil depois da batida”, lembra Croft. “Ele saiu do carro, não?”, pergunta Brundle, que confabula.“Tomara que não seja algum fiscal, com o trator dando ré… alguma coisa não está bem lá.” E, depois de alguns instantes, a dúvida: “Não tem outro carro lá, tem?”.

Sim, havia outro carro. “Tem uma Marussia ali. E Jules Bianchi está fora da corrida. Será que ele escapou antes ou depois de Sutil?”, questiona Croft. “Será que ele bateu no trator? Eu estava falando dessas coisas de outro carro escapar no mesmo lugar porque aconteceu comigo em 94”, explica Brundle.

Na Globo, a primeira suspeita é que algo teria acontecido com Sutil. “Falei com a mulher de Sutil e ela disse que ele está bem, talvez seja uma checagem porque ele bateu forte”, intervém a repórter Mariana Becker. “Mas essa checagem acontece no centro médico, não na pista. Aconteceu alguma coisa”, estranha Burti. É ele, quando a corrida é interrompida e as imagens do box da Marussia não param de aparecer, quem junta os pontos. “Não dá para ver se tem outro carro… parece que o Bianchi, com a Marussia, bateu naquele trator que estava tirando o carro do Sutil. Deve ter sido muito grave para terem dado bandeira vermelha.”

Os italianos acreditam, desde o primeiro momento, que houve um problema com um fiscal. “Ao mesmo tempo, abandonou Bianchi. Tomara que não tenha acontecido nada mais grave a um fiscal. Eles são geralmente voluntários, movidos apenas pela paixão”, diz Mazzoni.

Bruno estranha as imagens da Marussia, mas a informação que tem em seu computador de que o carro médico está em uma curva e a ambulância, em outra, o confunde. “A imagem fica retornando à Marussia. Não vimos a imagem do abandono de Bianchi e sequer temos o replay…”, corrobora, antes de um longo silêncio na transmissão. “Talvez tenha acontecido em outro ponto da pista. Aqui diz que a ambulância está na curva 15, depois da 130R. O carro de Sutil está na 7.”

Com as imagens focando cada vez mais a tensão dentro da Marussia e a movimentação no centro médico, os italianos compreendem que o problema é com Bianchi, mas não imaginam que o piloto tenha batido na mesma curva de Sutil. É Piola, dos boxes, quando pilotos já estão se preparando para ir ao pódio, que informa: “Parece que Bianchi bateu no trator que retirava o carro de Sutil. Se foi isso mesmo, foi um impacto extremamente violento.” E Mazzoni completa. “Deve ter sido violento mesmo pois, se há as imagens, preferiram não mostrar.”

Os repórteres entram em cena e Mariana e Ettore Giovannelli informam que Bianchi foi levado ao hospital de ambulância e inconsciente. Na Sky, Croft tenta animar o clima, falando do aumento da vantagem de Hamilton, mas Brundle só murmura. “Isso não está na cabeça dele no momento. Eu não estou gostando disso. Não está soando bem.”