Estratégia de um GP “engessado” pela chuva (que não veio) e SC
Alguns fatores contribuíram para o GP da Bélgica ser menos movimentado do que o normal, desde a expectativa de chuva, que fez muitos times optarem por suas asas maiores, o que acabou diminuindo as chances de ultrapassagens no final da reta Kemmel – quem tinha mais velocidade de reta lá na frente, a Renault, não era veloz o suficiente para incomodar o top 3 – até o Safety Car no pior momento possível.
Digo isso porque a estratégia mais rápida era largar com os macios e parar perto da volta 18 e ir com médios até o final. O contrário – médio/macio, escolhido pelo top 3 e que dava mais flexibilidade de esperar pela chuva (que mais uma vez só veio 1h30 depois da corrida) – era bastante parecido.
Mas ninguém conseguiu seguir o melhor plano, depois que um acidente na volta 10 levou o Safety Car à pista. Economizando perto de 12s ao parar com a corrida neutralizada quase todos os pilotos foram aos boxes neste momento, e colocar os pneus duros era a melhor opção, já que havia 30 voltas, ou seja, mais da metade de uma corrida de 44, pela frente.
E isso, é claro, comprometeu seriamente o ritmo que seria adotado e neutralizou qualquer chance de disputa na ponta.
Havia, ainda, outros dois motivos principalmente para os carros mais rápidos não arriscarem atacar. Uma bandeira vermelha causada por detritos atrapalhou a simulação de corrida mais significativa, no final do segundo treino livre, e a maioria dos pilotos fez quatro voltas, parou, e fez outras quatro. E poucos tinham usado o pneu duro, uma vez que a melhor estratégia era combinar médio e macio. Além disso, várias equipes pareceram optar por tirar asa entre a sexta e a classificação/corrida, uma vez que a vantagem absurda da Renault diminuiu bastante, e isso muda o comportamento dos carros.
Por conta disso e com o pano de fundo do que aconteceu no GP da Grã-Bretanha, outro circuito que coloca muita energia lateral nos pneus – ainda que mais do que em Spa – quando os pilotos foram obrigados por um Safety Car a fazer mais voltas do que seria indicado com o mesmo jogo de pneus, a ordem após as paradas foi segurar o ritmo. Tanto que, depois de Hamilton dar uma volta no quarto colocado na Espanha, todos completaram as 44 voltas da prova. Sim, a pista é mais longa e o SC ficou na pista até a volta 15, mas ano passado Charles Leclerc deu uma volta em seis pilotos e, mesmo que os carros deste ano sejam mais rápidos (com exceção da Ferrari, claro), a corrida foi um pouco mais lenta (lembrando que em 2019 também houve um SC de quatro voltas).
Dentro de todo esse contexto, foram poucos os pilotos que fizeram algo diferente. Charles Leclerc foi o único a largar com um jogo de macios novo e se deu bem, pulando de 12º para 8º na primeira volta, mas a Ferrari poderia ter tentado qualquer estratégia no domingo que terminaria fora dos pontos, devido a sua falta de velocidade de reta. A equipe explicou que colocou Leclerc com macios e Vettel com médios no começo simplesmente para dividir as estratégias e tentar algo diferente, mas o SC neutralizou as opções e um problema no sistema de válvulas pneumáticas obrigou Leclerc a parar uma segunda vez.
Já a Red Bull teve de arriscar com Albon, que não conseguiria passar as Renault, muito mais rápidas de reta, na pista, e muito menos replicando a estratégia dos rivais. Colocou médios e isso vinha funcionando para ele superar Ocon até a última volta. Pelo menos o tailandês parece ter brigado menos, e pilotado mais o carro neste fim de semana.
Outro que tentou algo diferente depois de ter perdido terreno nas primeiras voltas foi Sergio Perez. Ele optou tentar ficar na pista com os pneus macios depois do Safety Car e foi engolido pelos rivais. Em uma pista em que não é difícil ultrapassar, não dá para entender direito a aposta.
Outro que não parou foi Pierre Gasly, único que tinha largado com os pneus duros. Sua estratégia só tinha um ponto fraco: a corrida não poderia ter Safety Car entre as voltas 8 e 20, ou seja, quando todos parariam para colocar os duros e ir até o final (antes da 8, ou os pilotos não entrariam no box, ou se comprometeriam a duas paradas e, depois da volta 20, o próprio Gasly pararia e colocaria os médios ou até os macios dependendo da volta). O fato dele ter conseguido voltar à oitava posição em que estava quando saiu o SC só evidencia o quão boa foi a corrida dele.
Será interessante ver o que os times farão em termos de configuração de asa na Itália, agora sem previsão de chuva para o final de semana. A Mercedes correu riscos com sua decisão de priorizar o downforce em Spa, e é de se duvidar que a Red Bull vai dar a mesma brecha duas vezes.
Drops do GP da Bélgica da Williams ao Brasil
Sebastian Vettel é muito provavelmente o piloto que trabalha mais duro no atual grid. Discípulo de Schumacher, ele costuma ser o primeiro a chegar e o último a sair. Mesmo assim, não passou despercebido o fato de ele ter passado praticamente toda a quinta-feira ao lado de seus mecânicos enquanto eles montavam seu carro. Parecia querer se certificar de que tudo estava sendo bem montado – sim, os carros viajam totalmente desmontados e leva hora para montá-los.
Dava para sentir na quinta-feira que tinha muito jornalista que bancou que Vettel estava assinado com a Aston Martin e que o anúncio só estava esperando a poeira baixar depois do teste positivo de Perez meio perdido. E Vettel não tem ajudado pedindo que os jornalistas simplesmente “copiem e colem” suas declarações das últimas semanas, de que não sabe o que vai fazer. E, quando perguntado quando vai divulgar sua dupla de pilotos para o ano que vem, Otmar Szafnauer simplesmente diz que eles já fizeram isso ano passado, quando anunciaram que Sergio Perez assinou por três anos, ainda que, sobre Stroll, só foi dito na época que ele continuaria em 2020 pelo que me consta.
Sobre Albon, a avaliação da Red Bull é de que ele precisa se ouvir mais. Ele é daqueles pilotos que analisam muito bem os dados, mas têm mais dificuldade de reagir às dificuldades sem ter as informações prévias. Um pouco como Nico Rosberg. E esse carro da Red Bull não é fácil de pilotar e exige muito instinto. É um carro nervoso. Então dá para entender quando ele fala que precisa parar de brigar com o carro e começar a pilotá-lo. É algo que vem muito mais naturalmente para Max do que para ele. Com Max, a equipe teve o trabalho exatamente contrário: acalmar a fera, e isso eles fizeram bem.
Um exemplo de como o mundo da Fórmula 1 é autocentrado foi a sugestão de que a empresa que comprou a Williams teria ligações com Bernie Ecclestone porque tem as iniciais BLE. Um pouco de falta de imaginação, concordam? No final das contas, foi um bom negócio para a família Williams, já que a Dorilton assumiu as dívidas e ainda vai pagar mais de 170 milhões dólares. Certamente no caso de Frank Williams e sua família, aquela máxima de que a melhor forma de virar um milionário é começar na F1 como bilionário não se aplicou. Além de milionários, eles saem (e vão sair aos poucos, já que a nova dona não tem histórico de fazer mudanças drásticas nos negócios que assume) tendo construído uma bela história de muitas vitórias.
Agora que o Pacto da Concórdia e o calendário de 2020 foram definidos, o foco é para contratos de corridas e TVs que estão vencendo no final deste ano, e é claro que o Brasil está entre as prioridades. Estamos vendo pelas saídas que eles encontraram para viabilizar esta temporada que a Liberty Media não tem medo em apostar por algo fora da caixinha (aliás, o história de usar o anel externo no Bahrein não agradou todo mundo: os pilotos acham o traçado chato e temem por uma classificação tumultuada), e essa deve ser a direção no Brasil também.
Depois que Globo, Petrobras e Banco do Brasil deixaram de colocar dinheiro em GP/pilotos em 2016, o país ficou numa posição muito vulnerável em todas as frentes. Além disso, faz tempo que a Liberty entendeu que a Globo não estava disposta a comprometer sua posição para renovar o contrato, então embora muita gente do meio estivesse lidando com esse quadro como se, talvez por osmose, tudo seria resolvido com um acordo aqui, outro ali, o cenário realmente mudou com a Liberty no comando e muita água passou por debaixo da ponte especialmente nos últimos 18 meses. Definitivamente não é como se o fato de a Globo ter dito aos anunciantes que não comprará os direitos tivesse caído como uma bomba no paddock.
GP da Bélgica e como Hamilton faz tudo parecer fácil
“Eu queria muito ver mais disputas, mas não depende de mim. Só tenho que continuar o que estou fazendo.” Quando o próprio líder do campeonato, caminhando para o sétimo título mundial e a glória de se tornar o maior vencedor da história reconhece que a temporada está previsível demais, quem pode discordar? Lewis Hamilton mais uma vez sobrou, como um super-heroi negro que “invade” um mundo dominado por brancos, vai lá, e belisca um Oscar.
A única possibilidade de Valtteri Bottas ameaçar seu companheiro de Mercedes seria na largada, mas todo campeão também precisa de sorte: a traseira de Hamilton escapou na primeira curva, mas Bottas estava logo atrás e, ao invés de atacá-lo, teve de tirar o pé. E quando os dois rasgaram a reta Kemmel ele estava longe demais para tentar o bote. Ainda assim, foi o mais próximo que estaria de Lewis por toda a corrida.
E só por esse momento Hamilton disse que a vitória da Bélgica não foi tão fácil quando “uma das mais tranquilas da carreira”, na Espanha, há duas semanas.
Muito forte em classificação e a bordo de um conjunto carro-motor pensado para comandar as corridas da frente, Hamilton vem, há anos, facilitando sua vida com performances precisas aos sábados. Ao contrário de Bottas, raramente falha em largadas (quando o faz, é algo mínimo, como neste domingo). E por isso é tão difícil batê-lo.
Junte-se a isso as temperaturas mais baixas na Bélgica em relação às últimas corridas e as possibilidades de Max Verstappen e uma Red Bull que parece lidar melhor com o superaquecimento dos pneus desapareceram. Foi o holandês, inclusive, que reclamou de falta de aderência, e que só conseguiu se aproximar depois da troca de pneus até o momento em que as Mercedes foram instruídas a aumentar o ritmo.
Sabendo que o verão europeu já está na sua reta final e a categoria ficará no continente até novembro, Hamilton até deu a ideia de impor uma segunda troca de pneus obrigatória para movimentar mais as corridas, mas qualquer mudança no regulamento teria que ser aprovada por unanimidade.
Mas há um outro elemento: quando um piloto da Renault, equipe que não vence desde 2013, quando nem era administrada pelos franceses, e que já sabe o que é vencer e fazer poles como Daniel Ricciardo, sai da corrida com um sorriso de orelha a orelha dizendo que acabara de fazer a volta mais rápida de sua vida, isso quer dizer que não é preciso ter um carro fora de série para fazer curvas antes desafiadoras de Spa com o pé embaixo ou próximo disso. Claro que a velocidade traz consigo seus desafios, mas o fato é que a F1 nunca teve tantos carros gerando tanta aderência em um mesmo grid.
A não ser que você pilote uma Ferrari, claro. Sem potência e com um carro que gera muito arrasto, os pilotos ferraristas sofreram em Spa-Francorchamps neste domingo. O pneu não dava aderência porque eles não geram pressão aerodinâmica, mas em contrapartida bem… não havia contrapartidas, porque o carro também era lento nas retas. E eles se viram brigando com seus clientes, fora do top 10 não só na corrida, mas por todo o final de semana. E não há motivos para acreditar que a situação será muito diferente em Monza.
E o pior no caso ferrarista é que não há muito o que fazer, já que muito do déficit vem do motor, que não pode ser atualizado (caso por questão de confiabilidade) nem neste ano, e nem no ano que vem.
É claro que o vexame seria menor se o carro gerasse menos arrasto, como foi o caso da Renault, momentaneamente a terceira força do grid. Ricciardo e Ocon (com ultrapassagem na última volta) maximizaram o resultado da equipe, que também deve estar bem no próximo domingo. Mas o piloto do dia foi Pierre Gasly, 12º no grid e oitavo no final mesmo com o Safety Car causado pela assustadora batida de Antonio Giovinazzi (na qual mais uma vez vimos um pneu se soltando, outro indicativo da velocidade destes carros) saindo no pior momento possível para fazer sua estratégia de largar com os pneus duros funcionar.
Como de costume nos últimos anos, houve muito movimento na prova, inclusive ultrapassagens na última volta. Mas, salvo quando há problemas com os pneus, elas não aconteceram perto o suficiente do pódio.
Confira o placar entre companheiros e as diferenças no GP da Bélgica
5 curiosidades da Bélgica que você não sabia
O país é o palco de uma das corridas mais legais e mais tradicionais do calendário da Fórmula 1. Mas será que há curiosidades da Bélgica que você não sabia?
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1 Um país dividido em dois, e a pista fica na divisa
Se fala francês e flamengo na Bélgica. Mas que raios de língua é essa, que tem nome de time de futebol? É basicamente o mesmo que holandês, mas com um sotaque mais leve (eu diria, mais afrancesado, como se fosse possível holandês ser afrancesado). É a língua oficial da parte norte da Bélgica, de onde Verstappen vem (sim, ele é nascido na Bélgica, a uma meia hora da fronteira com a Holanda). E a pista? Fica ao sul dessa região, mas logo na divisa. Mais um motivo para explicar por que os torcedores de Verstappen se sentem em casa.
2 Alerta de segurança máximo
Quando você chega a Bruxelas, seja de trem, seja de avião, sempre tem a impressão de que a cidade está com um alerta máximo de terrorismo. Afinal, não é comum na Europa ver policiamento com metralhadoras em locais de grande movimento – na verdade, em lugar algum. Por isso, Bruxelas se destaca. E é uma tensão que você também sente nas ruas, em uma intensidade maior que em outras capitais europeias.
3 Sem catchup na batata fria
São várias as coisas que os belgas acreditam fazer melhor do que ninguém. Cervejas, chocolates, waffles e, é claro, batata frita, já que foram eles quem as inventaram. Mas nada de colocar catchup na batata quando estiver com lá: a tradição é comer com maionese.
4 Os belgas têm a menor cidade do mundo
Falando em chocolate belga, é ele que move a auto-proclamada menor cidade do mundo, chamada Durbuy – e que não fica longe da pista de Spa, sendo considerada a porta de entrada para a floresta das Ardenhas. E o quão pequena seria essa cidade, que pouco mudou desde o século XVI? Dizem que dá para andar de uma ponta à outra em cinco minutos…
5 Uma conexão inesperada entre Bélgica e Itália
Existe um ponto curioso que une a Bélgica à Itália, sedes de duas corridas que, tradicionalmente, são realizadas em sequência na Fórmula 1. Há um número curiosamente grande de italianos vivendo na Bélgica. Eles ficam atrás apenas dos holandeses e dos franceses que, além de vizinhos, têm ainda a vantagem de falar alguma das línguas oficiais do país.
Mas e os italianos? Eles começaram a chegar em grande número na diáspora da pós-unificação italiana (nas últimas décadas do século XIX) e se fixaram em grande número justamente na região onde fica a pista, mais precisamente na cidade de Liège.
A última vitória de Lauda
O pódio do GP da Holanda de 1985 foi para ninguém botar defeito: Niki Lauda, Alain Prost e Ayrton Senna. Na época, só Lauda era campeão – tricampeão, mais precisamente – mas o título de Prost era uma questão de tempo e Senna já se firmava como uma estrela do futuro. Ah, e a pole position daquela prova foi de ninguém menos que Nelson Piquet… nada mal para um fim de semana qualquer de agosto de Zandvoort. Que entraria para a história como a última vitória de Lauda.
O mundo da F1 chegou à Holanda cheio de especulações para o que seria um dos GPs clássicos da pista que se despediria do calendário naquele ano e só voltaria em 2020: Lauda tinha acabado de anunciar sua segunda aposentadoria, em meio a uma temporada que vinha sendo decepcionante depois do título do ano anterior. Os rumores apontavam que seria Keke Rosberg quem assumiria a vaga de Lauda na McLaren ao lado de Prost, e Nelson Piquet, descontente com a queda da Brabham, iria para o seu lugar na Williams. E tudo acabou se confirmando.
VÍDEO: Veja os melhores momentos de Niki Lauda na F1
Voltando às pistas, o grid foi formado pela classificação da sexta-feira, já que choveu no sábado. Então Piquet sairia na pole, com Rosberg em segundo, Prost e Senna formando a segunda fila, Teo Fabi surpreendendo com o quinto lugar e Lauda só em décimo.
Como foi a prova
Piquet perdeu a liderança logo que foi dada a largada, já que sua Brabham ficou parada no grid. Rosberg assumiu a ponta e começou a abrir para Senna e Prost. E Lauda já tinha subido para sexto nos primeiros metros.
O austríaco seguiu progredindo e estava em quarto quando Senna teve um problema momentâneo no motor Renault de sua Lotus e viu Prost e o tricampeão o passarem. Poucas voltas depois, foi o motor Honda de Rosberg que deixou o finlandês na mão, causando seu abandono na volta 21.
Logo Lauda, que era pressionado por Senna, iniciou as paradas de box dos ponteiros. O pit stop serviu para o austríaco manter a posição em relação ao brasileiro depois que o piloto da Lotus também trocou seus pneus. Esperando mais algumas voltas para parar, Prost muito provavelmente sairia na frente dos dois, mas a McLaren errou na troca e ele foi ultrapassado pelos rivais.
Em ótimo ritmo, o francês conseguiria tirar 10s de diferença e passar Senna na volta 47. Quinze giros depois, já estava na cola do companheiro de McLaren. As últimas oito voltas foram tensas, com Lauda, então já com 36 anos, usando toda a sua experiência para não dar brechas a Prost, então com 30.
Última vitória de Lauda também foi marca importante
Foi assim que Niki Lauda conquistou sua 25ª vitória e última da carreira igualando Jim Clark e ficando a duas do recorde absoluto da época, de Jackie Stewart. Caberia a Prost bater esse recorde, mas isso só aconteceria cinco anos depois. O francês, inclusive, também teve o que comemorar em Zandvoort: apenas depois daquela corrida, a 11ª de 16 provas, que ele assumiu, pela primeira vez, a liderança do que seria seu primeiro campeonato.
Drops do GP da Espanha: Mercedes pressionada, Vettel desconfiado. E um GP na Turquia
Hamilton não parece estar em uma situação tão confortável quanto gostaria em relação a seu futuro. Ele sabe da importância de Wolff não apenas para tirar o máximo dos personagens centrais da Mercedes, como também reconhece o quanto a maneira como ele, Hamilton, tem vivido nos últimos anos tem muito a ver com a visão de seu chefe. E Wolff disse que ainda não decidiu o que quer fazer.
A impressão é de que a Mercedes vive pressões de todos os lados. Tem rival querendo que eles também sejam investigada pela cópia da Racing Point (ainda que não dê para acusá-la no caso dos dutos em particular, a teoria é de que seria impossível fazer uma cópia tão perfeita do resto do carro sem uma mãozinha, como um scan do carro por exemplo, ou não apenas usando o túnel de vento da Mercedes – o que eles estão fazendo, legalmente-, mas também o próprio carro de túnel de vento deles), tem a proibição do “modo festa”, que é muito mais potente no caso dos motores alemães, tem a grande possibilidade de que a Pirelli continue com os mesmos pneus por uma terceira temporada, o que significaria o aumento das pressões mínimas, algo que não é nada bom para eles.
Tudo isso já aconteceu no passado com outras equipes dominantes, mas não no meio de negociações para a assinatura de um novo contrato com a F1. Wolff disse que eles estão prontos para assinar, o que fizeram, mas é difícil imaginar que isso aconteça sem algo em troca dentro de todo esse ambiente.
Vocês tinham que ver a cara de Grosjean quando foi perguntado sobre a volta da Turquia ao calendário, no sábado. Era claramente a primeira vez que ele ouvia falar nessa possibilidade, que começou a ser levada mais a sério há alguns dias, já que os vietnamitas não se decidem e, se a F1 não for até lá, não faz sentido ir até a Malásia. No momento, são 13 corridas e, com a possibilidade de fazer duas no Bahrein e uma em Abu Dhabi no bolso, a F1 já sabe que tem seu dinheiro dos contratos de TV no bolso, com 16 etapas. Mas estas corridas do Oriente Médio estão marcadas (ainda que não tenham sido anunciadas) para dezembro e há um buraco para ser preenchido em novembro, quando já é arriscado correr na maior parte da Europa por conta do frio, ainda que, em Istambul, não é de se esperar temperaturas tão diferentes das da pré-temporada deste ano na Espanha…
Nico Rosberg deitou e rolou trabalhando para a F1 e Sky neste final de semana. Impressionante como ele consegue explicar com profundidade e clareza, e como tem um olho afiado também. Deu até para perceber certo incômodo de Brundle (que reina há anos na Inglaterra como comentarista, independentemente de quem tem os direitos) quando os dois dividiram a cabine momentaneamente nos treinos livres. E entrevistando os pilotos para a F1 antes da corrida, ele aproveitou para lembrar todo mundo que é um poliglota. Acho que só faltou russo, dinamarquês e finlandês (o que, para um Rosberg, é quase imperdoável). E “naquele” lance do terceiro treino livre, ele viu na hora que Ocon simplesmente não estava olhando para frente.
Até Vettel foi ouvir o que o compatriota tinha a dizer. Depois de ser entrevistado junto de Leclerc antes da corrida, puxou Nico de canto para uma conversa em particular. Falando em Sebastian, ele tenta soar otimista com suas palavras, mas seu corpo diz algo totalmente diferente. Chamou a atenção o fato dele não ter dito uma só palavra durante a classificação, como se tivesse decidido que corre sozinho nesta temporada. E sabemos que sozinho, na F1, simplesmente não dá.
Na coletiva após a corrida, como sempre com Binotto sentado entre os dois pilotos, ele chegou com um papel na mão, ao qual olhava com um misto de atenção e desalento. A coletiva atrasou quase 10min, algo que já disse por aqui ser muito incomum na F1, e nesse meio tempo Leclerc ficou sozinho, grudado no seu telefone (aliás, como só uma ou duas perguntas foram para ele, permaneceu assim pela maior parte do tempo). Binotto e Vettel chegaram juntos, com ele ainda analisando o papel. Era para convencê-lo que não daria para chegar mais adiante mesmo focando o tempo todo em fazer só uma parada. Ele não parecia muito convencido.
Estratégia do GP da Espanha e o que a Mercedes pode fazer (sem bolhas)
A Mercedes sabia antes do GP da Espanha que estava lidando com um cenário diferente da semana anterior. A temperatura da pista era marginalmente mais alta, e esse era o único cenário perigoso para seus pneus. A pressão mínima prescrita pela Pirelli era 1psi mais alta do que no ano passado para a corrida de Barcelona, o que seria um fator potencial de risco, mas como nenhuma bolha apareceu nos pneus na sexta-feira de treinos livres, o temor já era bem menor.
Mas por que as bolhas não apareceram? A equipe fala no fato de os compostos serem mais duros em relação à segunda corrida de Silverstone, mas eles acabaram fazendo a prova nos mesmos C2 e C3 (a diferença era que, desta vez, eles eram o médio e o macio, e na Inglaterra, eram o duro e o médio disponíveis), então essa não é uma explicação plausível. A explicação só pode estar nas diferenças de traçado: sem as trocas de direção rápidas e curvas que geram muita energia no pneu, ele não “cozinhou” por dentro nas Mercedes como em Silverstone.
Mas o fato de as bolhas terem desaparecido não resolvia, por si, a vida das Mercedes na Espanha. O Circuito da Catalunha tem os dois primeiros setores com curvas mais de alta, e com raio longo, seguidas por um trecho mais travado no final, e uma reta que não é suficiente para que o pneu perca muita temperatura. Isso costuma gerar superaquecimento na superfície do pneu, o que resulta em degradação térmica. E o único jeito de evitar degradação térmica é diminuir o ritmo, o que explica em boa parte a dificuldade atual em se ultrapassar em Barcelona.
A chave para não sofrer com isso seria ter posição de pista, pois a tendência é o carro que está no ar turbulento do outro sofrer mais, um dos fatores que explicam o fato de, em 22 das 29 corridas anteriores na Espanha, o pole position ter ganhado.
Mesmo com tudo isso, lá estava Toto Wolff dizendo que “Verstappen é o favorito para a corrida porque sua simulação de corrida foi melhor na sexta-feira”. De fato foi, o que gerou o temor de que Max pudesse usar primeiro o undercut, e depois o overcut (primeiro antecipar a parada, e depois parar mais tarde) para bater as Mercedes.
Mas ele só poderia fazer isso se passasse um carro na largada, o que acabou acontecendo. Até a volta 11, o cenário que a Mercedes temia estava desenhado: Hamilton primeiro, Verstappen a menos de 2s atrás. As primeiras paradas estavam previstas para começar na volta 15.
Era a hora de Hamilton apertar o passo e ver se o rival teria ritmo para responder. Na volta 11, a diferença era 2s. Na 12, 2s5. Na 13, 3s2. Na 15, 4s. Foi ali que Verstappen percebeu que tinha perdido a corrida: não tinha ritmo para acompanhá-lo. Na volta 17, a Red Bull chamou Albon para colocar os pneus duros, que não tinham funcionado para ninguém na sexta, e a única explicação seria usar o tailandês como laboratório para entender se era possível mudar os planos de Verstappen. Mas não era, e um pneu lento e que não durou o suficiente para Albon fazer só uma parada acabou com seu GP.
Na frente, Max poderia perder a posição para Bottas, que também tinha acelerado e estava em posição de fazer um undercut. Max pedia para que a equipe o chamasse para o box porque seus pneus estavam acabados, mas ele voltaria no meio das Racing Point. Eles tinham que esperar que a distância de pelo menos 23s se abrisse. Isso aconteceu só na volta 21, quando ele foi chamado. A Mercedes não ajudou o finlandês ao chamá-lo, na volta seguinte, junto de Hamilton. Não havia necessidade de proteger o inglês do undercut de Verstappen, 8s atrás antes da parada. E, como a parada dupla significou que o pit stop de Bottas foi mais lento, acabou com as chances de passar Verstappen. Mais tarde, na volta 40, Bottas estava de novo em posição de conseguir um undercut: ele estava a 1s5 de Max, mas a Red Bull novamente antecipou a parada do holandês para cobrir qualquer ataque. A Mercedes, então, tentou deixá-lo na pista por mais tempo para tentar um overcut, mas essa é uma jogada sempre muito mais difícil de ser feita com os Pirelli.
Mais atrás, foi interessante ver como a Racing Point deixou os pilotos fazerem estratégias diferentes, com Perez tentando usar sua boa proteção dos pneus para superar Stroll, o que ele só não conseguiu pela punição por não ter deixado Hamilton passar.
Assim como Perez, cada um tentou usar suas melhores armas. Leclerc estava fazendo a tática de uma parada funcionar até seu motor desligar por ele ter atacado mais fortemente uma zebra. Vettel não tinha gostado do rendimento do pneu médio e tinha parado antes que o previsto, abandonando o plano de fazer um pit, até que se sentiu muito melhor com o macio, teve lá seus arranca-rabos com o engenheiro, e conseguiu fazer com que sua vontade prevalecesse. E as McLaren adiaram ao máximo as paradas finais para tentar ganhar posições na pista, já que seu carro “ganha vida” com menos combustível. Não funcionou para Norris, que ficou preso atrás de Gasly. Mas ao menos Sainz teve a chance de passar o carro em que vai estar no ano que vem.
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Não é à toa que o Circuito da Catalunha é tão usado para testes na Fórmula 1. É claro que o inverno mais ameno na região tem seu papel, mas a pista é cruel com as equipes no sentido de mostrar as forças e fraquezas dos carros, e com os espectadores, de certa forma, já que a dificuldade de seguir um rival de perto sem superaquecer seus pneus faz com que as corridas em Montmeló sejam mais táticas do que brigadas na pista.
Mas hoje não houve tática que pudesse derrubar Lewis Hamilton e a Mercedes, e isso Max Verstappen disse ter percebido a partir da volta 13, quando o inglês começou a aumentar o ritmo e ele viu que não tinha como responder. Com menos mudanças bruscas de direção em curvas de alta velocidade e com compostos mais duros em relação à semana passada, as bolhas não apareceram nos carros da Mercedes, e Hamilton, a partir daí, já sabia que não havia nada que Verstappen pudesse fazer em termos de estratégia. Nem sob um sol mais escaldante do que o da semana passada.
Outra prova de como o Circuito da Catalunha é cruel foi a corrida de Valtteri Bottas, cujo destino foi selado na largada. O finlandês, como tem sido comum, teve uma reação 0s2 mais lenta que Hamilton, o que foi o suficiente para que ele caísse de segundo para quarto, após uma manobra arriscada de Lance Stroll por dentro na primeira curva. Tendo de forçar seus pneus para superar o canadense na primeira parte da corrida, ele perdeu terreno na briga com Verstappen e não conseguiu mais recuperar. A Mercedes tem um carro projetado para liderar o pelotão, e nem poderia ser diferente, depois de seis títulos, então o finlandês tem de trabalhar melhor os sábados e as largadas se quiser ter qualquer chance contra Hamilton.
Pilotos-estrategistas
O inglês teve até tempo de questionar a estratégia e convencer o time a colocá-lo com o composto médio nas voltas finais, em um diálogo bem menos agressivo do que o que acontecia um pouco mais atrás entre Sebastian Vettel e a Ferrari. Em mais um dia em que ficou claro que o time, além de ter um carro lento, anda confuso, demorou para o engenheiro e Vettel pararem de bater cabeça a respeito da estratégia e focar na tática de uma parada que deu o sétimo lugar para o alemão. E, pior: um nervoso Leclerc teve que lembrar o time de que estava sem o cinto de segurança, depois que teve de tirá-lo para tentar reiniciar seu motor, com um problema elétrico após um ataque mais forte nas zebras.
A Ferrari é quinta no mundial depois de seis etapas e, na pista, está brigando ora com a McLaren (que finalmente acertou nos pit stops e viu Carlos Sainz ser sexto em uma pista em que eles esperavam sofrer), ora com a AlphaTauri (sim, a ex-Minardi), que vem contando com uma excelente temporada de Pierre Gasly.
As Racing Point finalmente conseguiram demonstrar seu ritmo e terminaram nas posições em que largaram pela primeira vez no ano. Eles estão numa “terra de ninguém”, entre os três primeiros e o grupo de McLaren, Ferrari em diante. E a volta que levaram de Hamilton, cruelmente, no estilo GP da Espanha, deixou isso claro.
Confira o placar entre companheiros e as diferenças no GP da Espanha
Schumacher e Vettel: sem paralelos
E pensar que há 25 anos Michael Schumacher estava fazendo sua aposta pela Ferrari, ao mesmo tempo em que caminhava a passos largos para o segundo título mundial pela Benetton. Era um contrato de dois anos, de 60 milhões de dólares no total. Uma quantia e tanto para a época. E uma aposta e tanto também. A Ferrari vinha desde 1979 sem títulos de pilotos, desde 83 entre as equipes. Tinha tido um lampejo com o câmbio semi-automático e Alain Prost em 1990 mas, dali até Schumacher chegar, o time só venceria duas corridas. Em cinco temporadas.
A reestruturação já tinha começado em 1993, com a contratação de Jean Todt, na época um relativamente jovem ex-piloto de rali e dirigente na modalidade. Ele foi a aposta de Luca di Montezemolo que, depois de ter tido sucesso na Ferrari nos anos 1970 e ter passado os 80 em posições de poder na FIAT, se tornara presidente ferrarista em 1991.
Schumacher teve carta branca para trazer consigo Rory Byrne (o que fez com que os projetos do carro fossem divididos entre sua empresa na Inglaterra e o pessoal de Maranello) e Ross Brawn. Ele foi contratado dizendo que não se importava em ser tri logo de cara. Seu plano era ganhar o título em 1997. “Tudo o que quero é uma situação em que possa desenvolver uma equipe até um determinado padrão. É uma boa oportunidade de trabalhar com a Ferrari e em nossa primeira temporada vamos vencer corridas e, no segundo ano, vamos vencer o campeonato.”
Foi por pouco. Se Jacques Villeneuve não tivesse forçado por dentro aproveitando as voltas logo depois de sua parada para atacar Schumacher em Jerez, ele provavelmente teria sido tri em 97. Depois surgiriam as flechas de prata da McLaren, a perna quebrada, e o título acabaria vindo só em 2000. Mas ele sempre esteve lá. Mesmo nos anos em que a Ferrari estava construindo seu domínio, a sensação era de que o que estava por vir era apenas uma questão de tempo.
De lá para cá, isso não se repetiu. E não me refiro só à sequência de títulos. A Ferrari atraiu pilotos com esse mesmo ideal de reconstruir o time, mas também ingênuos o suficiente para acreditar que o time tomaria conta do restante. E a estrutura ao seu redor já não tinha sido bem reestruturada na transição entre a era dos testes ilimitados dos quais Schumacher tanto se aproveitou com, muitas vezes, três pistas à disposição da Ferrari, perto de sua fábrica, em um só dia. Junte-se a isso o fato de a Scuderia ter subestimado o desafio do V6 turbo híbrido no início, e as duas vezes em que Fernando Alonso chegou perto do título podem ser mais explicadas por falhas da Red Bull e pela otimização dos resultados por parte do espanhol do que qualquer coisa que poderia ser sustentável e crescer para que a Ferrari se tornasse o time a ser batido.
Que sirva como lição para Sebastian agora em seu próximo passo. A inocência de que acreditar que pode tornar um time vencedor por conta de seu próprio trabalho já virou decepção, que se torna maior ainda quando o fracasso em, como ele disse, tentar impedir que Hamilton chegasse nos números de seu ídolo, vem junto do descaso. As histórias dele e do piloto que era confirmado no time há 25 anos não só terminaram diferentes, como nunca tiveram os paralelos que Seb buscou.
GP dos 70 Anos da F1: Foi estratégia de Max que ganhou a corrida?
Uma das perguntas que recebi no Instagram (sempre faço um vídeo às segundas-feiras respondendo perguntas de vocês) foi se a Mercedes pode ser batida em condições normais ou só na estratégia. E é um erro julgar o que Max Verstappen fez no GP dos 70 Anos da F1 como uma vitória que não tenha sido na pista. As Mercedes perderam porque derreteram seus pneus.Mas por que isso aconteceu? Algo que dificulta a compreensão do que exatamente deu errado é o fato de três variáveis terem mudado de um final de semana para o outro: estava mais quente no último domingo, os estouros da semana passada obrigaram a Pirelli a aumentar a prescrição das pressões e, a pedido da F1, eles arriscaram na seleção dos pneus, com os C2, C3 e C4 sendo usados no segundo final de semana. Ainda que a Mercedes (e a grande maioria das equipes) tenha evitado o C4 na corrida, de qualquer maneira eles fizeram quase toda a prova com o composto com o qual largaram na semana anterior.
Explico: no GP da Grã-Bretanha, as Mercedes e Verstappen largaram com o C2 e colocaram o C1 na volta 12 para ir até o final. Sofreram com desgaste, ou seja, gastaram toda a borracha do C1, e os pneus das Mercedes estouraram e o de Max, quase, de acordo com o time.
No GP dos 70 Anos, Verstappen decidiu largar com o C2, algo que sequer foi discutido na Mercedes e os pilotos não sabiam explicar muito bem por quê. Ele fez um stint curto no meio da prova com o C3 e depois voltou ao C2. Já as Mercedes foram de C3-C2-C2.
Mas o que eles sofreriam com o C2 não teria qualquer paralelo com o que aconteceu na primeira corrida. Eram bolhas que se formavam após poucas voltas, indicando superaquecimento. Ter uma pressão mínima maior ajuda nisso, assim como a temperatura externa, e é claro que ter um carro que também força mais os pneus por ser mais rápido colabora. De certa forma, a Mercedes sofreu duplamente (com os estouros na primeira prova e com o consequente aumento da pressão mínima recomendada na segunda) por ser rápida demais.
E não há sinais de que a história teria sido diferente caso a estratégia tivesse sido exatamente a mesma da Red Bull – largar com os duros, colocar os médios no meio da corrida e terminar com os duros – porque o ritmo dele foi forte com ambos os compostos e, mais importante, Verstappen pôde forçar o tempo todo. Inclusive quando o engenheiro dele pedia para maneirar.
Em relação à tática em si, chamou a atenção do fato da Mercedes ter chamado Bottas na volta 32 e Hamilton apenas na 41. Sabendo que os pneus duros estavam funcionando muito bem e durando bastante, a Red Bull buscava cobrir qualquer chance de undercut de Bottas, chamando Max aos boxes quando a diferença era de 2s4 e as bolhas já eram, de novo, visíveis no carro do finlandês.
Em retrospecto, a equipe deveria ter pedido a Bottas que fizesse o inverso de Verstappen e não entrasse junto com ele, já que a chance de derrotar a melhor equipe de pit stops da F1 por mais de 2s seria mínima. Bottas não teria ritmo para ser mais rápido logo de cara, mas poderia permanecer na pista pois mais tempo, o que Hamilton fez basicamente porque era sua única chance.
O time explicou que o pneu de Bottas tinha vibrações e que por isso a parada dele foi antecipada. Mas no final das contas eles observaram que ainda havia muita borracha no pneu deles e, com essa informação em mãos estenderam o stint de Hamilton. Quem acompanha sempre o post de estratégias já sabe que a Mercedes costuma pecar pelo excesso de zelo, e a Red Bull é exatamente o oposto.
Para a Espanha, voltam C1, C2 e C3, então a mesma escolha da primeira corrida de Silverstone, em um circuito que em que os pneus são menos forçados nas curvas, mas em que o asfalto é um pouco mais abrasivo. As pressões, mais uma vez, continuam altas, tendo subido em 1psi em relação ao ano passado. Não é a toa que os engenheiros da Mercedes saíram de Silverstone dizendo que precisavam entender o que tinha acontecido para não “dar uma de palhaços” de novo na Espanha.
A corrida das Ferrari e a parada “misteriosa” de Hulk
O quarto colocado Charles Leclerc explicou que partiu dele a pressão, antes e durante a corrida, para fazer uma parada mesmo largando com médios. A teoria era de que, com todo mundo parando cedo, ele correria fora do trânsito. Era isso também que Vettel queria (não exatamente parar só uma vez, mas largar com pneu duro e continuar na pista por mais tempo no primeiro stint). Acontece que, com a rodada do alemão na largada, ele estava na posição “errada” para a Ferrari na pista logo após a parada de Leclerc (que inclusive foi bem cedo para quem faria um pitstop apenas, na 18!): ele foi parar logo atrás de Vettel, andando 0s5 por volta mais rápido, mas sem poder forçar muito porque tinha que levar o pneu até o final.
Em um ambiente normal, Vettel receberia a ordem de abrir, mas a equipe demonstrou, ao chamá-lo para o box, entender que ele tentaria complicar a vida de Leclerc. Que o alemão tem seus motivos e que a administração da Ferrari tem sua parcela nisso tudo é inegável. Mas o fato é que, dentro de todo esse contexto, também é inegável que a Ferrari aumentou suas chances de marcar bons pontos tirando Vettel do caminho de Leclerc, e chamando-o para os boxes na volta 22.
Ele só voltou à pista encaixotado e sem conseguir a pista livre que queria para preservar seus pneus porque a McLaren, que parou junto com ele, errou na parada de Sainz, algo que estava totalmente fora do controle da Ferrari.
Falando em Sainz, outros dois pilotos que têm sua saída confirmada de suas atuais equipes, ele e Ricciardo, também tiveram resultados péssimos. O espanhol vinha na mesma estratégia de Seb, largando com os duros de fora do top 10, mas sem a rodada: era quarto (estava cinco posições na frente de Vettel, portanto) quando parou na volta 22. A McLaren (para variar) fez uma parada lenta e ele voltou no tráfego, destruiu seus pneus, parou de novo uma volta depois de Vettel e os dois ficaram correndo juntos, fora da zona dos pontos.
Chegou a haver um questionamento se a Renault também não tinha estragado a corrida de Ricciardo, chamando-o rapidamente para a segunda parada, mas ele revelou que o segundo jogo de pneus médios não funcionou como esperado e o pedido partiu dele, o que nos leva ao caso de Hulkenberg.
Ele parou na volta 15, relativamente cedo. E depois parou de novo na 30, tendo 22 voltas pela frente com o composto médio, o mesmo do primeiro stint, mas com o carro mais vazio. Basicamente o mesmo que Norris, Albon e Stroll fizeram. Mas o rendimento deste jogo não foi o esperado e ele mesmo disse que não teve escolha: “Estava sentindo muitas vibrações, tinha bolhas enormes e não acho que teria chegado ao final sem que o pneu estourasse”. Há quem possa perguntar se é mesmo possível que um jogo de pneus seja completamente diferente do outro e isso não é incomum na era Pirelli, ainda que ele também possa ter forçado demais o ritmo no começo do stint, aumentando demais a temperatura do pneu, o que também não é incomum.
Drops do GP dos 70 Anos da bronca de Vettel à pressão da Racing Point
A assessora de imprensa da Ferrari mal perguntou se alguém tinha mais alguma pergunta na coletiva via Webex (eles não usam Zoom) e Sebastian Vettel já tinha levantado e ido embora. Concordo com Prost quando ele diz que Seb está sofrendo muito com tudo o que está acontecendo porque é muito humano. Agora é um momento muito delicado porque foram duas corridas em uma pista na qual a Scuderia teve de tirar todo o downforce do carro para que os carros não fossem engolidos nas retas. Na Hungria, a situação tinha sido diferente para ele.
Bottas foi confirmado por mais um ano na Mercedes e nem ele tinha muito o que dizer sobre isso. O contrato já estava assinado há algum tempo e tudo já estava bem claro a partir do momento em que Claire não liberou (e por que deveria?) George de seu contrato de três anos. Na verdade, a pergunta é por que George assinou por três anos sabendo que também tem um contrato paralelo com a Mercedes. Curiosamente, ele já começou a preparar o terreno para ser companheiro de Hamilton em 2021, dizendo que seria irreal pensar que teria um desempenho tão bom quanto o do compatriota logo de cara, já que demorou pelo menos seis meses para sequer estar confortável no carro da Williams em sua primeira temporada.
Os apresentadores da Sky Sports britânica estavam usando roupas dos anos 50 para comemorar os 70 Anos da F1. Button perguntou para Daniil se ele gostou e ele… “não”, bem ao seu estilo mesmo. Da última vez que alguém tinha feito algo do tipo, sabemos o que aconteceu. Mas, pelo menos na frente das câmeras, o programa correu bem!
Repare que os alemães recuaram um pouco nas manchetes de “Vettel está assinado, é só anunciar”. As últimas que surgiram vieram de Luigi Perna, da Gazzetta, na Itália. Isso porque a conversa mais forte durante a semana foi de que a viagem de Perez ao México resultou, sim, em maior apoio de seus patrocinadores, jogando ainda mais pimenta (mexicana) na situação.
Aliás, falando de Racing Point (falou-se de qualquer outra coisa até a largada?), causou estranheza o tanto que a equipe forçou para ter Perez de volta neste final de semana. Eles dizem que os especialistas que consultaram explicaram que ele poderia estar totalmente curado. Mas causou um certo desgaste com a F1 e com a FIA essa pressa, exatamente quando a imagem que eles querem vender é de um paddock à prova de covid.
E não é um bom momento para se ter ainda mais problemas com a FIA. A visão geral do paddock é de que eles escaparam com uma punição muito branda pelo caso dos dutos de freio. E a cada novo detalhe que emerge, pior a situação vai ficando até mesmo para a Mercedes. Sabe-se, por exemplo, que eles forneceram dutos de freio em janeiro, para serem usados como reserva caso os que a Racing Point “desenhou” não ficassem prontos a tempo para a pré-temporada. Eles acabaram não usando o equipamento, mas dia 1º de janeiro os dutos já tinham entrado na lista de peças que têm de ser desenhadas por cada construtor.
Eles se defendem dizendo que o carro não precisa estar 100% legal antes do primeiro treino livre da primeira corrida. Mas é algo que mostra a extensão da parceria com a Mercedes. Segundo Otmar Szafnauer, “quanto mais fuçarem, melhor para nós”. Mas não tem sido bem assim.
E tudo isso está acontecendo no que parecem ser as negociações finais do Pacto da Concórdia (ou seja lá como vão chamar os novos contratos da F1 com as equipes). A Ferrari está mais do que feliz, mantendo seus privilégios (talvez como moeda de troca pelo motor), enquanto Wolff diz que a Mercedes não está pronta para assinar. Há meses eles dizem que só faltam “detalhes” a serem fechados, que a parte da grana em si está acertada. Alguém parece estar mentindo.
Sei que muitos de vocês se mobilizaram na internet para conseguir colocar o shoey da Aninha na Fan Cam, enquanto eu tentava alguns atalhos nos bastidores. Não faltou vontade da F1 em si, mas trata-se de algo que não é controlado por eles. Mas o time de digital fez questão de homenageá-la no programa pós-corrida, e postando novamente o vídeo que fizemos em São Paulo, e foi bem legal ver pilotos e equipes se manifestando no post. Vez ou outra, quando eles não estão brigando por alguma tecnicalidade, a F1 mostra seu lado de comunidade de verdade.
Mais feeling, menos computadores
Será que as Mercedes pagaram por serem rápidas demais em Silverstone? No GP da Grã-Bretanha, com compostos de pneu mais duros e temperatura mais amena, os dois carros tiveram estouros por desgaste, ou seja consumiram toda a borracha do pneu, nas voltas finais, e Lewis Hamilton só não perdeu a corrida porque isso aconteceu com ele com poucas curvas para o final. E, neste domingo, o calor e os compostos mais macios mudaram a cara do “inimigo”: o superaquecimento gerou bolhas, que impediram que Hamilton e Bottas forçassem tanto o ritmo quanto poderiam em teoria. Melhor para Max Verstappen, o único piloto que tem conseguido colocar um mínimo de pressão na Mercedes neste ano.
Nas duas provas, ninguém sofreu mais com os pneus do que as Mercedes. E também ninguém teve um equipamento tão forte para tanto.
No final das contas, o prejuízo não foi dos melhores: mesmo sofrendo desde o início da prova, Hamilton foi segundo e Bottas, terceiro, tamanha a vantagem do time que, salvo uma tragédia, já pode ir programando a festa do hepta. Isso porque, como destacou Verstappen, houve uma combinação de fatores nesta tarde em Silverstone que dificilmente vai se repetir, com um circuito que gera muita energia nos pneus de qualquer maneira, calor e principalmente pneus mais macios do que normalmente a Pirelli levaria para a pista inglesa, e que só foram escolhidos justamente para criar variáveis na segunda corrida em um mesmo circuito.
Mas quem sabe não vale a pressão para que a fornecedora de pneus repita a dose ao longo da temporada. Até porque a Red Bull, um carro difícil de pilotar, parece ganhar vida com os pneus mais duros e Verstappen vem demonstrando o amadurecimento de quem consegue ler muito bem quando as oportunidades surgem, como quando decidiu contrariar o engenheiro e seguir as Mercedes de perto no início da prova, e na manobra decisiva em cima de Bottas, que selou sua vitória.
Isso tem a ver com o feeling do piloto, algo para o qual a F1 moderna não costuma dar tanta importância. Mas deveria. Além de Verstappen, outro jovem, Charles Leclerc, também foi contra as determinações da Ferrari. Ele sentia que conseguiria fazer a estratégia de uma parada funcionar, em um carro que gera muito menos pressão aerodinâmica que os Mercedes, e disse que insistiu por toda a prova para manter seu plano. “Eles ficam muito focados no que os computadores dizem, mas meu feeling no carro era de que os pneus aguentariam”. Ele estava certo e levou um quarto lugar para a casa.
Ajuda, é claro, o fato de Leclerc estar mais à vontade com o carro que seu companheiro Sebastian Vettel, que rodou mais uma vez por um erro próprio, mas também passou grande parte da prova no meio do trânsito, o que não é bom para o rendimento do carro, e também para os pneus. É por isso que ele se queixou durante a prova, e é por dias como hoje que há quem comece a duvidar que ele ainda estará correndo pela Ferrari na última corrida do ano em Abu Dhabi.
Confira o placar entre companheiros e as diferenças no GP dos 70 Anos
A análise sobre o que esperar da corrida vou postar lá na minha coluna no UOL.
Na Racing Point, Nico Hulkenberg mostrou que pegou o jeito rápido nessa volta apressada ao grid e colocou 0s346 em Stroll.
A Mercedes rosa virou abóbora?
Os treinos livres desta sexta-feira são muito importantes para uma equipe em particular: a Racing Point está pagando o preço por ter mudado totalmente a filosofia de seu carro de um ano para o outro. Mesmo tendo se inspirado fortemente, digamos assim, no melhor carro do grid.
E isso não tem nada a ver com o resultado do protesto da Renault, que rendeu uma multa de mais de 2.5 milhões de reais e a perda de 15 pontos.
Enquanto é cada vez maior o grupo de engenheiros no paddock que acredita que é impossível fazer um carro tão parecido com outro somente pela observação de fotos, algo que vai além dos protestos da Renault, a equipe também enfrenta outros desafios dentro dos próprios boxes. “O carro tem picos de performance que nos mostram o que ele pode fazer. O problema é mantê-lo com esse tipo de desempenho o tempo todo”, explicou o CEO Otmar Szafnauer depois de um final de semana muito pior do que o esperado em Silverstone na semana passada. Afinal, na pista que, em teoria, deveria ser a melhor para a Racing Point neste início de campeonato, eles saíram com dois pontos apenas.
Esse era um risco sobre o qual o diretor técnico Andy Green vinha salientando desde a pré-temporada. Nos últimos anos, a Racing Point vinha tentando encaixar a caixa de câmbio que comprava da Mercedes na filosofia da Red Bull. Até que o dinheiro de Lawrence Stroll chegou e Green decidiu arriscar mudar isso completamente, ainda que para usar por apenas um ano (ou pelo menos ele acreditava que seria assim, em um mundo pré-pandemia): o carro de 2020 usaria todo o conhecimento que eles, parceiros técnicos de longa data e aliados políticos da Mercedes, tinham sobre a filosofia do carro alemão.
Acontece que não é por acaso que ninguém segue o rake baixo, distância entre-eixos longa, e o bico mais largo da Mercedes. E até eles mesmos vinham tendo dificuldade em fazer sua filosofia funcionar desde que as dimensões dos carros mudaram em 2017, Ok, com eles vencendo ano após ano não dava a impressão de que eles estavam sofrendo tanto assim, mas é clara a evolução do comportamento do carro de lá para cá.
E qual era o problema da Mercedes? Era um carro cuja janela de funcionamento otimizado era pequena. Em algumas classificações, até mesmo uma uma nuvem do céu já mudava seu comportamento. Foi uma “jornada”, como costuma definir o diretor-técnico da Mercedes, James Allison, até eles “domarem” o carro e chegarem no modelo que parece andar sobre trilhos de 2020.
E olha que foram eles que desenharam completamente o carro.
O que quero dizer com isso é que eles entenderam o porquê de todas as soluções às quais chegaram, e como uma peça do carro dialoga com a outra. E mesmo assim sofreram. Imagine se você fez o que tem sido chamado no paddock de “engenharia reversa”, ou seja, ter acesso às informações de algo já feito e projetar a sua “versão” (segundo a Racing Point, estas informações seriam fotos, e para muita gente no paddock, um scan ou algo do tipo). Seja como for, demora para os engenheiros entenderem como responder quando o carro não rende como esperado.
Era este o “grande risco” ao qual Green se referia lá em Barcelona. E é a materialização dele que a equipe viveu semana passada, em que pese estar com um carro só basicamente para chegar ao melhor acerto (com o outro mais focado em deixar Hulkenberg à vontade) em um final de semana difícil tecnicamente pela disparidade entre as condições climáticas de sexta em relação à classificação e à corrida. “Acabamos otimizando o carro para usar justamente o pneu que não foi utilizado na corrida, explicou Szafnauer, referindo-se ao melhor tempo da sexta-feira, com o pneu macio, frente ao desempenho do restante do final de semana. Poderia ter adicionado: o carro estava otimizado para o pneu macio e pista perto dos 50 graus, e isso foi irrelevante na classificação e na corrida.
Isso leva a crer que eles sempre vão estar mais expostos do que os demais a mudanças climáticas ou a outro tipo de alteração de condição de pista. Quanto mais estabilidade em meio a uma mudança tão grande, melhor para eles, comprovando que, na F1, até uma cópia tão boa que até parece mentira, não é tão simples quanto parece.
Drops do GP da Inglaterra de Vettel/Perez à reunião misteriosa
Nao sei se é impressão minha, mas a maneira como Otmar defendeu Perez deu a entender que ele está do lado da equipe que quer a permanência do mexicano. O que talvez o coloque em rota de colisão com Lawrence Stroll. Otmar deixou claro que a equipe sabia que os pilotos voltariam para seus países de origem e não gostaria de discriminar ninguém, ou seja, não queria dizer “você não vai ver sua família porque está no México.” O apoio foi tão claro que até deixou a impressão de que ele foi liberado para ir para um dos países com maior nível de transmissão no momento para buscar mais dinheiro com seus patrocinadores para o ano que vem…
Mas que foi um susto para quem achava que a vida dos jatinhos particulares era à prova de balas, isso foi. Pelas regras da FIA, não havia problema em voltar para casa com duas semanas entre as corridas. Agora com três em sequência, a recomendação (não regra) é ficar por lá, mas é muito difícil convencer todo mundo especialmente agora que, quem mora na Inglaterra, vai voltar para casa de qualquer jeito (até porque muitos moram nos arredores do circuito e nem ficam em hoteis durante o GP).
Voltando a Vettel, chama a atenção sua atitude mesmo com tudo o que anda acontecendo. A irritação dele, especialmente na segunda sessão de treinos livres, era clara. Ainda mais depois que ele reportou um problema nos pedais, parou nos boxes, e não viu ninguém ir lá verificar. Ele mesmo foi, chamou um mecânico, e permaneceu com o capacete em cima da cabeça, como quem diz “estou pronto quando vocês estiverem prontos.” Mas ele, como aconteceu em outros momentos de sua carreira na Scuderia em que foi deixado na mão, não partiu para as críticas abertas, ou pelo menos por enquanto.
E parece que tudo está errado mesmo com o time italiano. Até as máscaras. Chega a irritar ver os pilotos da Ferrari falando nas entrevistas porque nem elas parecem bem projetadas. Não ficam no lugar!
Hulk “realizou o sonho de pilotar uma Mercedes”, foi a cutucada dupla do Andreas Seidl, velho conhecido do compatriota. Hulk parecia estar com uns quilinhos a mais em relação à última corrida, e certamente terá uma semana mais tranquila depois de perder a corrida. Ou pelo menos seu pescoço deve estar agradecendo pelo tal parafuso quebrado que impediu que o time ligasse seu motor!
A temporada de Albon está começando de maneira semelhante à de Gasly ano passado, e os dois reportam o mesmo tipo de coisa: não se sentem confortáveis no carro principalmente em termos de acerto. Russell mesmo estava falando sobre sua segunda temporada na Williams, citando como “demorou uns seis meses” para ele se sentir cômodo. Isso, sem toda a pressão da Red Bull e sem um Max Verstappen conseguindo domar um carro que não aparenta ser dos mais fáceis. Mas Alex tem uma diferença marcante em comparação com Pierre: ele é muito mais duro consigo mesmo e está realmente sentido com o que está acontecendo na temporada. Pelo menos o time não pode questionar seu comprometimento, como fizeram com Gasly.
Já Kimi dá impressão que está de saco cheio. No rádio, nas entrevistas, ele soa mais Kimi que o normal. Antes da temporada começar, ele disse que ficaria na F1 por mais tempo se fosse divertido. Bom, ele não deve estar se divertindo muito no momento e a expectativa é de que uma melhora só viria em 2022. No momento ele não parece estar muito afim de esperar.
Chamou a atenção o fato de Toto e Guenther terem se atrasado para suas coletivas via zoom no sábado. No caso do austríaco, foi por quase 1h, o que é muito incomum na F1. “Ele está preso em uma reunião”, dizia o assessor da equipe. E realmente há muita coisa nos bastidores: chegamos a agosto e ainda as equipes ainda não assinaram contratos para permanecerem na categoria além de 2020. A Ferrari está prontíssima para assinar, já que parece ter “sacrificado” seu motor para seguir ganhando muito mais que as outras, independentemente do resultado na pista. E o desfecho da história da Mercedes rosa também é importante para que outras equipes saibam com que F1 elas estão assinando.
Estratégia do GP da Inglaterra e os estouros sem aviso
O primeiro a reclamar de vibrações foi Kimi Raikkonen. Depois, Valtteri Bottas. E logo depois, Carlos Sainz. E ainda faltavam 18 voltas para o fim do GP da Inglaterra.
Para as equipes, mesmo com todos os seus sensores, desgaste é mais difícil de ver. Degradação geralmente é termal e vai fazendo o desempenho do pneu acabar lentamente, e fica claro com a piora dos tempos de volta. Desgaste é basicamente quando a borracha é usada até o fim. Quanto menos borracha o pneu tem, mais exposto ele fica. E, em uma pista em que as forças são tão intensas, combinadas com os detritos que vão se acumulando na pista ao longo da corrida, a chance de uma falha como aconteceu no final do GP (assim como há três anos, e há sete também) aumenta exponencialmente.
Mesmo com todos esses elementos, as equipes e a própria Pirelli previam antes da corrida que seria possível fazer até 40 voltas com o pneu duro. No final das contas, como a grande maioria parou após o SC causado por Daniil Kvyat (que, inclusive, foi a primeira falha de pneu, ainda que seja o traseiro esquerdo e talvez não tenha relação com as demais), eles fizeram 37 voltas com o pneu duro, sendo 33 acelerando. Então os problemas são um sinal de que os carros melhoraram mais do que esperado em um ano (a pole de Hamilton foi 0s7 mais rápida que a de 2019!) e, como o pneu continuou o mesmo (lembre-se que as próprias equipes descartaram o protótipo da Pirelli para 2020), as previsões têm de ser revistas.
Mas como se sabe que não foi só uma questão de detritos? O sinal amarelo já tinha sido acendido pela Pirelli quando Romain Grosjean trocou seu pneu médio na volta 37. “A degradação era de 100%”, disse Mario Isola. Isso significa que toda a borracha tinha sido usada mesmo em um carro que gera menos pressão aerodinâmica, como o da Haas. Não é surpresa que as duas Mercedes e Sainz, em quinto e tendo de forçar o ritmo porque Norris vinha logo atrás também preocupado com o seu dianteiro esquerdo, foram os carros que tiveram problemas.
Estratégia sem complicações até então
O GP da Inglaterra teria apenas uma parada de qualquer maneira, muito em função da enorme perda de tempo no pit stop, de 28s (geralmente, ela fica entre 21 s 23s ao longo do calendário). E até por isso cinco carros no top 10 e todos os outros fora dele largaram com os pneus médios, que permitiriam uma permutação médio-duro, a maneira mais veloz de terminar a corrida. Sem conseguir passar para o Q3 com os médios, as McLaren, Renault e Vettel teriam que sofrer com os macios no início.
Mas mesmo essa estratégia de macio-duro previa a parada ao redor da volta 14. Ou seja, não dá para dizer que as equipes exageraram ao acreditarem que poderiam chegar ao final com o composto duro parando na 12, ainda mais lembrando que o SC demorou a sair da pista. Na prática, eles começaram o stint com o composto duro na volta 19. E fariam isso normalmente mesmo sem o SC.
A única equipe que tentou algo diferente, mais uma vez, foi a Haas, que deixou Grosjean na pista com os médios. Primeiro a encontrar o francês na pista, quando os pneus dele ainda estavam rendendo bem, Sainz foi quem sofreu mais para ultrapassá-lo, o que também pode ter contribuído para o que aconteceu com o espanhol mais tarde.
Tendo economizado pneus, as duas Renault conseguiram aproveitar o caos do final para ganhar terreno, com Ricciardo passando Norris e lucrando com a falha nos pneus de Sainz e Bottas para terminar em quarto, e Ocon mais atrás passando Stroll, com um carro erroneamente acertado para otimizar o rendimento com o pneu macio, também no final para ser sexto. E Alex Albon, em outra corrida complicada por uma classificação ruim e um toque, veio voando no final com pneus mais novos e conseguiu chegar nos pontos. Outra vez, também, ele teve um ritmo de corrida bom, indicando que só precisa de um final de semana sem grandes acontecimentos para conseguir um resultado “normal”.
A Red Bull e a Mercedes erraram no final?
Verstappen explicou que, nas últimas 10 voltas, estava alertando a equipe a respeito da condição de seu dianteiro esquerdo, ao mesmo tempo em que abria os 29s que lhe dariam a segurança de parar para colocar pneus macios e ir buscar a volta mais rápida sem ser ameaçado por Leclerc (cujos pneus foram aparentemente salvos pela pouca carga aerodinâmica usada pela Ferrari na corrida para compensar sua falta de potência). E a reação normal da equipe foi chamá-lo aos boxes assim que Bottas teve o problema com seu pneu.
Mas eles não poderiam ter apostado que Hamilton teria o mesmo destino? Nem a Mercedes apostou nisso, nem o próprio Hamilton esperava. O piloto disse que chegou a dar uma olhada em seu dianteiro esquerdo depois de ser avisado da falha de Bottas, e achou que estava tudo bem. E a equipe julgou que, por ter corrido o tempo todo na liderança, Hamilton teria naturalmente cuidado melhor de seus pneus, provavelmente o mesmo pensamento da Red Bull.
No final das contas, o time ficou com a impressão de que Verstappen também poderia ter ficado pelo caminho, já que seu pneu “tinha uns 50 cortes”, como revelou Horner. Então Red Bull (ao chamar Verstappen) e Mercedes (ao não chamar Hamilton) agiram de acordo com a lógica. Mas em um dia em que um parafuso deixou Hulkenberg na mão antes mesmo da largada, a lógica passou longe de Silverstone.
O que tudo isso significa para a corrida da semana que vem, quando é esperado mais calor em Silverstone, e quando serão usados o C2, C3 e C4 (os que estouraram foram os C1, os mais resistentes)? Talvez uma saída para a Pirelli seria aumentar a pressão pelo menos dos dianteiros para diminuir o movimento dos pneus durante as curvas de alta. E, pelo que Mario Isola indicou em sua entrevista após a corrida, limitar o número de voltas com cada composto. Pelo menos isso diminuiria o risco de novas falhas ao mesmo tempo em que abriria mais as estratégias da corrida.
GP da Inglaterra e a vitória sobre 3 rodas de Hamilton
Lewis Hamilton já venceu muitas vezes na carreira – 87 só na F1 – mas pela primeira vez venceu correndo só em três rodas. Com a sorte que costuma aparecer para os mais talentosos, ele viu seu pneu dianteiro esquerdo estourar na última volta, depois que o mesmo já tinha acontecido com seu companheiro e único rival na corrida, Valtteri Bottas. E depois, também, que a Red Bull tinha chamado Max Verstappen para o box para colocar pneus macios e buscar a volta mais rápida da corrida.
Seja como for, uma coisa é certa após o GP da Inglaterra: vamos ouvir falar muito sobre pneus nesta semana, antes que a F1 corra novamente no circuito de Silverstone e (pelo menos esse é o plano) com compostos mais macios do que os usados neste domingo, em que três pilotos sofreram com delaminações praticamente sem aviso prévio.
Carlos Sainz e Valtteri Bottas tinham reclamado de vibrações, e todos sabiam que estavam levando o pneu duro ao extremo em termos de desgaste, até porque fariam pelo cerca de 10 voltas a mais do que o inicialmente planejado porque tinham parado cedo devido ao SC causado pelo que já tinha sido uma batida estranha de Daniil Kvyat. Mas uns foram mais cautelosos em termos de ritmo do que outros, e também foram “protegidos” pelo fato de seus carros gerarem menos pressão aerodinâmica.
É preciso explicar algo aqui: desgaste não é o mesmo que degradação, que é o que acontece normalmente nas corridas da F1. Degradação é mais fácil de detectar porque o tempo de volta vai caindo. Desgaste, ou seja, ir usando a borracha até ela acabar, causa falhas que vêm de uma hora para a outra. E foi isso o que aconteceu neste domingo.
Após a prova, o diretor esportivo da Pirelli, Mario Isola, indicou que o mais provável é que as delaminações – que já aconteceram em Silverstone em 2013 e 2017 – tenham sido resultado da combinação entre o desgaste e detritos na pista. “Pode ser desgaste porque foram muitas voltas no pneu, pode ter sido pelos detritos de outros carros. O nível de desgaste é muito alto, isso é um fato. Vimos isso no pneu de Grosjean, usado por 37 voltas, e em outros também: o desgaste chegou perto de 100%. E é claro que, se o pneu está mais desgastado, é mais fácil ter uma falha se o piloto passar por cima de um detrito porque você não tem tanta borracha para proteger o pneu”, explicou o italiano.
O que fazer, então, para a segunda corrida em Silverstone, já no próximo domingo, para a qual a Pirelli vai levar pneus mais macios, na tentativa de dar uma chacoalhada (bem-vinda, aliás, pois a corrida era morna até as falhas) na prova? Como não há um composto mais duro ainda, parece que o jeito vai ser a Pirelli limitar o número de voltas com cada composto, missão difícil uma vez que os limites são diferentes dependendo da maneira como cada carro usa os pneus.
Antes que os pneus estourassem…
Sobrou pouco para se destacar da corrida em si, a não ser um time que deu um passo adiante, mesmo que tímido, e outro que andou para trás. O terceiro lugar da Ferrari no final foi, é claro, devido às delaminações, mas o time teve um ritmo melhor do que era esperado para Silverstone. Isso, pelo menos com Leclerc, que teve um final de semana sem problemas, ao contrário de Vettel (que pouco treinou e ainda sentiu o carro muito diferente, como ocorrera na primeira prova, entre o sábado e o domingo). A saída do time para compensar a falta de potência em um circuito de alta velocidade foi andar com pouca carga aerodinâmica, e o déficit que era de 1s na pista curta da Áustria diminuiu mesmo nos quase 6km de Silverstone. É mais um tapa-buraco do que uma solução em si, mas pelo menos dá mais confiança ao time no próximo final de semana.
Por outro lado, o resultado ruim da Racing Point, com Lance Stroll em nono, andando mais lento que as McLaren e Renault, mostra o risco que eles assumiram ao copiar o carro da Mercedes, abandonando uma filosofia aerodinâmica, mais próxima à Red Bull, que eles vinham adotando há anos: eles não conseguiram direcionar o carro para a condição de pista que mudou de sexta para domingo, e nem para funcionar melhor com os pneus mais duros, que seriam usados pela maior parte da corrida. São esses detalhes operacionais que estão distanciando o que o carro promete em termos de ritmo e a realidade dos resultados.
Mas é claro que há a chance de entender o que aconteceu e tentar de novo no próximo final de semana em Silverstone, para o qual é esperado calor. E muito provavelmente dois pit stops e, com eles, grandes chances de uma prova mais aberta.
Confira o placar entre companheiros e as diferenças no GP da Grã-Bretanha
A análise sobre o que esperar da corrida está lá na minha coluna no UOL.
E sim, eu sei que na Racing Point é o Perez que está no gráfico, e este placar não foi atualizado hoje. Deixo aqui que Stroll foi 65 milésimos mais rápido, com pneus médios, enquanto Hulkenberg não conseguiu melhorar significativamente seu tempo mesmo com os macios no final do Q2.
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Continue readingPor dentro da F1 e dos dutos de freio
Já expliquei aqui as implicações políticas do protesto da Renault que, tudo indica, deve ser negado – até por estas mesmas questões políticas. Também existe o fato de o carro da Racing Point ser o único que segue a filosofia da Mercedes, algo que eles vinham querendo fazer há muito tempo, mas que dizem que só foi possível agora, com o dinheiro de Lawrence Stroll.
Os rivais não acreditam nesta história de que eles viram fotos e copiaram detalhes do carro que eles mesmos vêm tentando entender há anos. Acreditam que a união política entre Stroll e Toto Wolff levou, também, a uma parceria técnica que vai além do que é permitido pelas regras. Mas é algo difícil de provar e vai contra o que a chefia da F1 parece ver como o futuro da categoria. Todas as decisões da turma de Ross Brawn até aqui priorizou a competitividade em detrimento da inovação tecnológica e da engenharia, e isso tem uma explicação clara: essa correria da categoria para voltar a correr (e fazer o máximo de provas possível) em plena pandemia só mostra sua fragilidade financeira. E quanto mais tecnológica e focada em engenharia, mais cara e mais distante do grande público a F1 será.
Mas, voltando ao protesto, o texto do UOL também explica por que a Renault focou nos dutos de freio. Basicamente, eles são difíceis de copiar por observação ou fotos e estavam na lista de peças que poderiam ser vendidas até o ano passado. E se você comparar os dutos da Haas e da Ferrari, ou da Red Bull e AlphaTauri, verá que há pelo menos uma grande inspiração nas peças, lembrando que, até o ano passado, elas também poderiam simplesmente ser compradas, então estes clientes (que a Renault não tem) poderiam ter tido acesso aos projetos da maneira mais óbvia possível. Ainda que a Racing Point diga que nunca comprou os dutos da Mercedes.
O que nos leva a outra pergunta: por que esses tais dutos de freio são tão importantes? Eles têm duas funções: refrigerar os freios e ter efeito aerodinâmico.
O resfriamento os freios é fundamental para sua eficácia, e a tecnologia da fluidodinâmica na F1 tem ajudado os engenheiros a compreender de maneira muito mais específica quais são as áreas específicas que precisam de mais atenção. Quando falo em específico, realmente quero dizer específico: os discos de freio têm até 1000 orifícios de ventilação para otimizar a ventilação, obviamente de diâmetro muito reduzido. Eles servem para expor a superfície da fibra de carbono ao ar e dissipar o calor.
Os dutos vão alimentar justamente estes orifícios, por meio de “túneis” cuja complexidade é maior na parte de dentro da peça, ou seja, onde as fotos não chegam. A quantidade de ar que chega ao sistema de freio é controlada de maneira diferente dependendo do caminho percorrido nestes “túneis”, e eles mesmos são diferentes dependendo da pista, sendo Montreal, no Canadá, aquela em que os dutos são maiores que em outras devido às fortes zonas de frenagem o tempo todo.
Pensando no mesmo carro e no mesmo modelo de duto, só de aumentá-los por conta da característica da pista pode custar 1,5% em eficiência aerodinâmica, segundo dados da fornecedora de freios Brembo, o que significa 1km/h.
Isso leva ao outro grande efeito dos dutos, na parte aerodinâmica do carro, ajudando a compor, junto com as asas dianteiras (no caso do duto dianteiro) todo o conjunto que vai direcionar o ar com zonas de maior ou menor pressão aerodinâmica para o restante do carro. Por isso, quando você vê carros conceitualmente parecidos do ponto de vista aerodinâmico, também verá dutos semelhantes.
É claro que estamos falando em termos de F1, mas os dutos de freio são, sim, um diferencial de performance importante. E não é por acaso que são o centro desta briga.
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Continue readingGP da Hungria: Estratégia e seus atalhos
Talvez tenha sido a batida (ok, não a batida em si) o ponto fundamental para Verstappen na tarde de domingo. Max vinha balançando para todo lado até perder o carro, tentando encontrar onde estava a aderência. Coisa de especialista em pista molhada. Entre a façanha e o mico estavam os mecânicos da Red Bull. Christian Horner pode ter valorizado um pouco, mas disse que o trabalho de trocar o pushrod, normalmente, duraria 90 minutos. Eles fizeram em 20, e entregaram o carro com 35s de “folga” para o tempo limite. Isso só valida meu ponto do post anterior sobre a importância de não esgotar os mecânicos e engenheiros nessa temporada maluca: muita gente queria ter o emprego deles, mas quantos são tão bons quanto?
Passado o drama inicial de Max, não havia spray e o sol aparecia timidamente no circuito. A temperatura do asfalto perto de 30ºC indicava que a pista secaria rápido. A Haas viu, ali, uma oportunidade de chamar os pilotos para o box, o que depois foi julgado como uma instrução, assim como tinha acontecido ano passado com a Alfa Romeo, e renderia o acréscimo de 10s ao tempo de ambos pilotos. Uma pena que o regulamento iniba basicamente a única chance de uma equipe do final do pelotão fazer algo diferente.
Mas o rendimento de Magnussen e Grosjean largando, dos boxes, com pneus de pista seca foi um bom indicativo para as equipes, e o primeiro a reagir foi Kvyat na segunda volta, e Leclerc e Bottas na segunda. Acabou sendo um bom negócio para eles parar antes não pelo rendimento da pista em si, mas pela confusão que o pitlane virou na volta seguinte, com nove pilotos parando juntos, um atrapalhando o outro.
Quer dizer, não todos: Hamilton abriu três segundos na primeira volta, com a pista complicada. A corrida já tinha sido ganha no sábado e na largada. E virou um passeio graças à tranquilidade conquistada naquela volta.
Para outros, a corrida, especialmente em um circuito no qual a posição de pista é tão importante, ficou prejudicada logo ali. Várias paradas foram muito ruins porque os pilotos demoraram a serem liberados, de tão movimentado que estava o pitlane. Vettel perdeu mais tempo, 28s em uma parada que outras equipes fizeram em 21s, mas Sainz calcula que perdeu mais posições, três ou quatro.
Verstappen pulou de sétimo a terceiro na primeira volta, ajudado pelas largadas ruins de Bottas e Perez logo atrás dele. O finlandês foi parar em sexto após o primeiro giro e o mexicano, em sétimo. Stroll era segundo, Vettel era quarto e Leclerc era quinto. E Albon tinha subido de 13º para 11º. Stroll foi daqueles que não teve uma parada limpa, e sua volta de retorno aos boxes (ou seja, a primeira com pneus de pista seca com a pista ainda úmida) foi 8s mais lenta que a volta de Verstappen. Max, inclusive, foi mais veloz que Hamilton nessa primeira volta com slicks.
A maioria optou pelos pneus médios, acreditando que, se a chuva voltasse, não seria logo, e já pensando em fazer apenas mais uma parada na corrida. Nas temperaturas mais baixas que o normal para Budapeste que tivemos neste final de semana, principalmente o composto macio estava sofrendo com graining, e a única explicação para a Ferrari ter colocado Leclerc com o C4 (e só não ter repetido o mesmo erro com Vettel porque o alemão bateu o pé) seria o temor pelo aquecimento logo depois da parada e no caso de chuva. Leclerc já falou algumas vezes que precisa aprender a questionar mais o que lhe é dito pela equipe, enxergar melhor a corrida, e esta foi mais uma prova disso. ‘Ah, mas ele é inexperiente?’, óbvio, mas a meta sempre tem de ser evoluir e não encontrar desculpas.
Após as paradas, Hamilton liderava Verstappen, Magnussen, Grosjean, Stroll, Leclerc, Bottas, Vettel, Albon e Perez. Só Leclerc tinha os pneus macios e logo começou a pagar por isso, sendo ultrapassado pelos rivais, assim como Magnussen e Grosjean, pela falta de ritmo da Haas. Isso fez com que algumas coisas voltassem ao normal, com Bottas e Albon escalando o pelotão, enquanto a Ferrari segurava Leclerc na pista esperando uma chuva que não veio.
Com o tempo, até os pneus médios foram se desgastando e já não valia mais a pena esperar. A 1s de Stroll, Bottas parou na volta 33 e a Racing Point ainda demorou dois giros para responder, e obviamente perdeu a posição. O finlandês, agora, iria à caça de Verstappen, com 7s e metade da corrida pela frente.
De certa forma, a velocidade da Mercedes custou o segundo posto para Bottas. E explico: eram tantos os retardatários (chegaram a ser 15!) que Verstappen conseguia usar o DRS para escapar. E, com o pneu certo, conseguiu neutralizar a vantagem de equipamento dos alemães. Isso porque a Red Bull escolheu o duro para o terceiro stint de Max, já que era o único disponível, e acabou dando certo, já que o médio foi bom o suficiente para Bottas chegar, mas já não havia rendimento suficiente para ele passar.
A aposta foi parar de novo, como tinham feito com Hamilton ano passado, e colocá-lo no duro nas últimas 19 voltas, tendo de tirar 21s. Talvez se tivessem feito isso antes (ele ficou 6 voltas colado sem conseguir tentar uma manobra), Bottas teria mais chances, mas ele está certo em culpar seu erro na largada, quando reagiu a luzes que se apagaram no seu volante, relacionadas à rotação do motor. Prova de que dá para ter uma corrida toda complicada mesmo com um carro tão bom quanto esse Mercedes.
Drops do GP da Hungria e o lado humano da F1
Já contei aqui para vocês que, quando alguém mencionava as três corridas seguidas que fizemos em 2018, França-Áustria-Inglaterra, a gente se entreolhava e não precisava dizer mais nada: só a Copa do Mundo deu uma animada, porque, na pista, estava todo mundo exausto. Afinal, os dias no circuito são bastante longos e é esperado de todo mundo lá um nível máximo de excelência, até porque eles foram escolhidos e tantos que adorariam estar no paddock justamente por isso. Então são longas horas sob intensa pressão, e sem muito descanso, já que um fim de semana de GP para os mecânicos, por exemplo, começa muitas vezes na terça-feira.
Junte-se a isso o fato de trabalhar com todas as restrições devido ao coronavírus e essa terceira corrida seguida, mesmo que todo mundo tenha começado empolgado por finalmente voltar a competir depois de tanto tempo, foi marcada pela estafa. Principalmente para os membros de equipe que viram a chefia e os pilotos voltarem para casa entre as corridas. Por isso que, quando me questionaram sobre Bottas, lembrei que o problema de decidir ir de jatinho particular para Mônaco, que não tem casos em aberto, não era sanitário. Mas, sim, humano. Com certeza não o tornou mais popular entre os mecânicos e engenheiros que trabalham com ele.
E é pelo mesmo motivo que essa imagem aí do post significa muita coisa.
Ah, mas por que as equipes não trocam os mecânicos e engenheiros para dividir a carga? Os carros são tão específicos que até mesmo quem trabalha direto neles tem dificuldade em se adaptar e trabalha mais lentamente de um ano para o outro. Mesmo com as regras permanecendo estáveis, o carro muda por dentro. Então é um trabalho super especializado e simplesmente não há tantas pessoas assim qualificadas para fazer essa rotação. E o show que os mecânicos da Red Bull deram no grid ilustra bem isso.
Sobre o futuro de Vettel, não parece ser algo que vá ser decidido nos próximos dias. É uma daquelas decisões que dividem qualquer equipe: Checo é muito querido lá dentro pelos resultados e, é claro, por ter sido decisivo para a sobrevivência do time nos meses anteriores à chegada de Lawrence Stroll e sua grana. E será que Vettel sem andar na ponta vai conseguir entregar muito mais que ele? As opiniões no paddock se dividem quanto a isso. Só não se dividem, é claro, quando ao valor comercial que Vettel agregaria ao já forte projeto da Aston Martin em 2021.
E a vaga seria a de Perez mesmo, porque Lawrence não investiu tanto na carreira do filho para relegá-lo a piloto reserva ou colocá-lo em um time pior. Fora da Racing Point/Aston Martin, há mercado para Perez porque ele entrega um pacote performance/patrocínio forte, e a primeira a entrar em contato foi a Alfa Romeo, indicando que a carreira de Kimi Raikkonen pode mesmo estar chegando ao fim. Ele disse que continua se estiver divertindo-se, e ao que tudo indica será bem difícil se divertir no carro que a equipe tem neste ano. Para quem está se perguntando “por que Raikkonen e não GIovinazzi?”, é bom lembrar que esta vaga é de indicação da Ferrari, que tem o melhor plantel entre as academias de pilotos no momento. Falei mais sobre isso no vídeo do instagram dessa semana.
Sobre a F1 e o Brasil (aliás, quem não viu o especial que fiz sobre a estreia do Emerson, aqui vai o link), teve gente batendo na porta da Band (de novo), e não foi da Liberty, tentando vender a F1. O valor diminuiu bastante desde a primeira tentativa, mas não o suficiente para a realidade da emissora. E, com um valor mais baixo, a Globo também não descarta repensar sua situação. Sobre o GP, Doria tem tomado para si as negociações com a Liberty, tentando eliminar as rusgas políticas entre Interlagos e a Liberty. Mas sem aumentar a proposta, a situação é complicada. Ele também não desistiu ainda da corrida deste ano (e não esperem, inclusive, a divulgação do restante do calendário tão cedo, calendário, inclusive, que pode ter a volta da Malásia no lugar da China, que terá a etapa cancelada e a renovação até 2025 anunciada nos próximos dias), mas deixa eu contar uma história para vocês entenderem a diferença de pensamento entre o pessoal da F1 e aí do Brasil: a região de Bedfordshire, que fica a uns 50km de Silverstone, teve 16 novos casos em um dia na semana passada e o governo já estava estudando impor lockdown novamente por lá. Na F1, teve gente que já começou a pedir que cancelassem o GP da Grã-Bretanha por acharem arriscado demais! Claro que isso não foi para frente, mas é exemplo que ilustra bem o abismo de realidades.
GP da Hungria e suas engrenagens
Nem mesmo quando fatores externos podem complicar uma corrida, a engrenagem perfeita de Lewis Hamilton, seu engenheiro Peter Bonnington, mais conhecido como Bono, e o W11 da Mercedes, deixa de funcionar à perfeição. No GP da Hungria, ele conquistou sua oitava vitória no Hungaroring dando volta em 14 pilotos, incluindo as duas Ferrari, mesmo tendo feito uma parada a mais que a grande maioria deles, e escreveu mais um capítulo da história que tem tudo para ser a mais dominadora de que se tem notícia.
Isso porque o carro parece andar em trilhos, e não em uma pista, o que é mais uma prova de quão bem a engrenagem funciona. Quando a F1 passou por uma mudança extensa de regras para deixar os carros mais rápidos, em 2017, a Mercedes, mesmo vencendo, sofria porque a janela em que o carro funcionava bem era pequena. E lá foram anos de feedback dos pilotos sendo traduzidos pelos engenheiros até chegar aos novos desenhos e resultar em corridas como a deste domingo.
Com um carro bem menos na mão, ainda que rendendo muito mais do que na classificação, Max Verstappen quase jogou tudo fora ao bater antes de alinhar no grid, em um momento em que vários pilotos tinham dificuldade e a pista parecia estar um sabão. Mas seus mecânicos, aqueles mesmos que costumam fazer pit stops abaixo dos 2s, trabalharam com calma e basicamente reconstruíram a frente do carro, terminando 35s antes do limite para se mexer no carro no grid. E Max agradeceu ignorando qualquer temor tanto pela condição da pista, quanto do carro, indo para cima na largada e depois conseguindo fazer bons tempos com o asfalto pouco molhado com pneus intermediários. Foi um dos últimos a trocar para os pneus de pista seca e, ainda assim, voltou em segundo.
Outro acerto da equipe foi colocá-lo com pneus duros para a segunda parte da prova. Como tinha sido observado graining na sexta-feira, algo relacionado à baixa temperatura e que aflige mais os compostos macios, então os pneus de faixa branca eram a melhor opção, embora houvesse a preocupação com o aquecimento nas primeiras voltas.
Talvez por isso, a Mercedes tenha optado pelos médios, mas sua vantagem é tão grande que os dois pilotos chegaram ao pódio mesmo com um pit stop a mais. E a dobradinha só não saiu porque Bottas se confundiu com uma luz no seu painel e só não queimou a largada porque o movimento que seu carro fez antes de as luzes se apagarem ficou dentro da tolerância do transponder que cada carro carrega.
Falando em estratégia, a intenção da Haas chamando os dois pilotos para os boxes ainda na volta de apresentação foi excelente, não fosse algo fora das regras. Isso é algo a que o racing manager tem de ficar muito atento, pois é ele que, pelo menos em teoria, conhece as regras como ninguém. Ainda mais quando um time foi punido recentemente (Alemanha 2019) por algo tão semelhante. Essa regra de não poder dar instruções aos pilotos na volta de apresentação é focada na largada, mas a decisão foi por barrar qualquer instrução para evitar que os times usem códigos. Então eles poderiam ter combinado previamente com os pilotos que eles entrariam caso sentissem que a pista estava seca. Mas, mesmo com as punições, provavelmente Magnussen não pontuaria não fosse a tática.
Foi uma corrida com mais um protesto contra a Racing Point, algo que vai continuar acontecendo até que a FIA feche o caso. E foi mais uma corrida em que Sergio Perez errou, assim como fez passando do limite de velocidade no pit na Áustria e tocando em Albon (que hoje fez boa corrida, por sinal) no GP da Estíria. Agora foi a largada ruim, talvez atrapalhada por Bottas, já que ele estava logo atrás. De qualquer maneira, o quarto lugar de Stroll mostrou que o time é mesmo a terceira força na corrida, e talvez a segunda na classificação.
O GP da Hungria mostrou, também, a realidade do grupo que vem logo atrás. Vettel foi sexto mesmo perdendo bastante tempo na primeira parada, pois a Ferrari teve que esperar vários pilotos passarem para liberá-lo, a exemplo do que aconteceu na McLaren com Sainz. O time teve um ritmo melhor do que Renault e McLaren, seus rivais diretos, pelo menos com o alemão, já que Charles Leclerc disse que nem reconhecia seu carro, completamente diferente em comparação com a classificação. Seja como for, o fato é que a Scuderia já está a quase 100 pontos da Mercedes depois de apenas três corridas!
Confira o placar entre companheiros e as diferenças no GP da Hungria
10 curiosidades da Hungria que você não sabia
Para ajudar a entrar no clima de GP, um fim de semana de corrida tem que começar com o Turistando! Lembrando que esta é a quarta temporada desta série: já dei uma geral nos GPs, dei dicas para quem quiser curtir essas corridas ao vivo e fiz um passeio culinário pelos destinos da temporada. Aqui, você vai ficar por dentro de 10 curiosidades da Hungria.
Por que o GP da Hungria está na minha lista dos melhores para ir como fã
Onde ficar, como ir para o GP da Hungria
Culinária fica entre o joelho de porco e o bolo de chaminé
1 Boa sorte em aprender algo de húngaro
O húngaro é uma língua completamente diferente das vizinhas, guardando semelhanças apenas com o finlandês e o estoniano. Mas não são muitas: são menos de 10 palavras similares. Não é o suficiente para explicar, portanto, porque, desde o primeiro GP da Hungria, em 1986, são os finlandeses que invadem a cidade na época da corrida. Mais fácil justificar com a proximidade e a possibilidade de encher a cara sem gastar muito no verão húngaro.
2 O povo húngaro na verdade é originalmente asiático
Na Hungria a palavra Magyar ou similares está por todos os lados, acredito que você já tenha notado isso na transmissão do GP da Hungria. Ela se refere ao povo que deu origem ao húngaro, mas que na verdade não é de lá: eles fugiram das montanhas Ural, que ficam na região em que hoje está o sudoeste da Rússia e o Cazaquistão. Também é por isso que a língua é tão diferente das vizinhas.
3 Húngaros têm uma fixação pelo número 96
Esse povo Magyar inclusive fundou um dos estados mais antigos da Europa, em 896. Dizem que, por conta disso, até hoje nenhum prédio por lá pode ter mais do que 96 pés, que é o equivalente a uns 10 andares. A coisa foi ficando tão séria que o hino tem de ser cantado em 96 segundos. Pelo menos o GP da Hungria escapou de ter 96 voltas!
4 Uma boa receita para se recuperar das baladas de Budapeste
A Hungria é famosa pelas águas termais e o país tem nada menos que 1500 spas. E o mais legal é que o entorno destes lugares pode ter tanto um ar mais romano, quanto mais turco, e com isso conta um pouco da história também da região. As termas mais antigas de Budapeste ainda em uso, inclusive, a Kiraly Bath e a Rudas Bath, foram construídas pelos turcos no século XVI!
5 A Hungria tem sua praia
Falando em águas termais, dá para ir para a praia na Hungria? Os locais diriam que sim. O lago Balaton é o maior da Europa central e atrai milhares de pessoas no quente verão húngaro. Pode faltar ondas ou mesmo areia, mas pelo menos o lago é conhecido por ter minerais na água que ajudariam a curar doenças.
6 Budapeste tem uma beleza única
Beleza tem muito a ver com gosto, claro, mas considero Budapeste a capital mais bonita da Europa. E parte desta beleza está no ar meio decadente de alguns dos prédios, claramente há décadas sem serem restaurados. E a cidade parece estar bem à vontade com eles, com estabelecimentos integrando-se a esta arquitetura que lembra dias de mais glória da cidade.
7 Páprika está por todos os cantos (dos pratos)
Basicamente tudo tem páprika na comida. Então tudo tem aquela cor meio laranja, meio avermelhada. E não é só isso: a páprica vem de pimentas, que podem ser mais ou menos azedas dependendo de onde são cultivadas. E a páprica tomou conta da culinária húngara justamente porque as pimentas lá são mais adocicadas. Tem quem goste, claro.
8 Terra de arte e de um cubo famoso
A Hungria é famosa pelos compositores clássicos – inclusive, a Ópera de Budapeste segue sendo uma referência – mas também é um país de inventores. Sabe o Cubo Mágico? Foi criado por um húngaro, Erno Rubik.
9 Cuidado ao brindar na Hungria
Todo cuidado é pouco na hora de brindar na Hungria. Reza a lenda que, quando a revolução húngara de 1848 foi derrotada, 13 generais do país foram executados e, após cada uma das mortes, os austríacos brindavam com seus copos de cerveja. A partir daí se tornou sinal de mau agouro brindar por lá. Mas o costume de um olhar no olho do outro para afastar o azar, que também existe na Áustria, está mantido!
10 Polo aquático é o esporte nacional
Enquanto nas olimpíadas os brasileiros ficam ligados em esportes como vôlei e ginástica artística, os húngaros são bons em esportes aquáticos. O esporte nacional é o polo, e é o que deixa todo mundo grudado na telinha na época dos Jogos. Essa relação especial do polo com a Hungria levou a um capítulo clássico da história das olimpíadas: a vitória de 4 a 0 dos húngaros contra a União Soviética e Melbourne, 1956. Com a Hungria sob a Cortina de Ferro, as tensões entre os dois países eram fortes, e foram parar na piscina: o jogo ficou conhecido como a partida da piscina de sangue.
Estratégia do GP da Estíria e a virada de Norris
O GP da Estíria foi relativamente simples do ponto de vista estratégico na luta pelo pódio: não havia muito para onde correr em termos de tática de boxes, a Mercedes tinha a vantagem de ritmo e de correr com dois carros contra um, uma vez que a Red Bull e Alex Albon ainda não se acertaram em relação a como fazer o tailandês render bem com muito combustível.
A situação só piorou para os donos da casa quando Valtteri Bottas chegou a 2s de Max Verstappen já na volta 22, com o engenheiro pedindo para o finlandês forçar o ritmo. A Red Bull entendeu isso como a tentativa de um undercut, antecipando a parada para usar a aderência superior do pneu novo e voltar na frente do Max depois que ele parasse, e antecipou, ela, a parada do holandês. É sempre dura a posição de quem tem de se defender com um carro pior, e tendo a posição de pista (ou seja, quando o rival já sabe se você optou por parar ou não), e à Mercedes coube apenas deixar Bottas o maior tempo possível na pista para que ele tivesse pneus bem mais frescos na parte final da prova e conseguisse a ultrapassagem.
Com Hamilton, a equipe já sabe que poderia antecipar sua parada tranquilamente sem o temor de que ele perdesse rendimento no final, já que estava controlando o ritmo da ponta. Em uma tarde de temperaturas bem mais baixas que no domingo anterior, não havia muito mesmo com que se preocupar até mesmo em relação aos Safety Cars que marcaram a corrida anterior: com os carros mais longe do limite, as quebras também desapareceram.
Emoção no segundo pelotão
Mas isso não quis dizer que faltou emoção no finalzinho da corrida. Como o rendimento de Racing Point, Renault e McLaren (e Ferrari também em teoria, ainda que os carros vermelhos não tenham comparecido ao GP da Estíria) é parecido, qualquer detalhe leva um piloto do céu à terra, ou do quinto ao nono, como no caso da McLaren!
Carlos Sainz, largando em terceiro, passou a primeira parte da prova em quinto, depois de ser ultrapassado pelos dois carros mais rápidos que a McLaren, a Red Bull de Albon e a Mercedes de Bottas. Então era ele o líder do segundo pelotão, que tinha 4 pilotos divididos por pouco mais de 4s quando a McLaren decidiu antecipar sua parada, na volta 32, com o mesmo pensamento da Red Bull com Max: para evitar um undercut.
Não poderia ter dado mais errado: ele perdeu 5s a mais em uma parada desastrosa da McLaren e voltou no meio de uma briga com carros lá do final do pelotão, perdendo mais tempo ainda. Após todos pararem, voltou justamente atrás deste pelotão que liderava, em oitavo, e com pneus mais velhos e desgastados principalmente na comparação com seu companheiro. Depois que a tentativa desastrada de defender um possível undercut no caso de Sainz, a McLaren adotou a tática inversa, um offset, para Norris, ou seja, ele ficou o máximo de tempo possível na pista para ter pneus mais frescos no final.
Norris parou na volta 39 e voltou em nono. Como tinha um ritmo muito melhor que Sainz pela diferença de pneus, o companheiro abriu e ele era oitavo com 10 voltas para o final, mas andando 0s5 mais rápido do que Daniel Ricciardo e Lance Stroll, que vinham em uma briga particular. Chegou nos dois com quatro giros para o fim, passou a Renault na penúltima volta, a Racing Point na última e ainda chegou em Sergio Perez, que mais uma vez cometeu um erro no finalzinho da prova, achou que tinha espaço para corrigir uma saída de frente do seu carro enquanto ultrapassava Albon, não tinha, quebrou a asa e teve sorte de perder só uma posição na volta final.
A boa notícia é que devemos ver isso por mais algumas vezes na temporada: o rendimento desse segundo pelotão é muito parelho, e os estrategistas, engenheiros e pilotos é que vão fazer a diferença.
Drops do GP da Estíria entre surpresas e pegadinhas
Especialmente os britânicos da F1 ficaram em choque na sexta-feira ao receberem a lista de restrições que terão de respeitar na Hungria. Depois de respirar aliviado ao não ter nenhum caso positivo de coronavírus em duas semanas na Áustria, a categoria acreditava ter feito o suficiente para passar confiança às autoridades. Essas restrições não estavam acordadas anteriormente e, se tivessem sido explicitadas pelo governo local antes, talvez até dificultassem a realização da prova. Para quem não viu do que se trata, quem tiver passaporte de fora da União Europeia não pode sair do roteiro hotel-circuito para absolutamente nada.
E para quem ouviu a história de que a corrida correu risco de ser cancelada, consegui encontrar a fonte da história toda: Imprimiram um “comunicado” falso com o Ross falando que a corrida podia ser cancelada para fazer uma pegadinha com um câmera que estava reclamando de ficar tanto tempo na Áustria. O cara acreditou e passou para frente. Isso chegou no ouvido do Wurz, que falou ao vivo na TV austríaca e pronto, a pegadinha chegou a alguns sites como verdade! Mas bem cedinho no domingo já chegou um email da Liberty dizendo que era tudo fake.
Os mais atingidos são os jornalistas, totalmente descobertos pela FIA, que é responsável por eles. Eles não vão ficar nos hoteis pelo menos 4 estrelas em que as equipes ficam, dirigem os próprios carros alugados (não será permitido usar o transporte público ou táxis), não têm escolta da polícia e têm mais dificuldade em comprovar o que estão fazendo lá no caso de serem parados. Imagine passar por tudo isso para fazer uma cobertura em que sequer podem entrar no paddock. Obviamente, quem lutou tanto para estar lá, embora ainda considere a experiência válida do ponto de vista jornalístico por conta do ineditismo da situação, já começa a ficar de saco cheio.
Dá para sentir nas mídias sociais a expectativa dos portugueses para a confirmação da volta de seu GP ao calendário, e muita gente achou estranho ver o anúncio de Mugello e da Rússia, e não ouvir nada sobre Portimão. Parece ser só uma questão de tempo, com os portugueses “pagando” por sua posição geográfica. Explico: a prioridade da Liberty é conseguir correr na China e no Vietnã, recebendo por estas provas. Houve quem questionou se não haveria restrições a eventos internacionais na China, mas o documento do governo abre brechas e isso não é um problema para a F1. A questão são as restrições de viagem que ainda estão em vigor.
Mas o que isso tem a ver com Portugal? Caso não seja possível ir para China e Vietnã, o plano reserva é colocar Imola e Hockenheim no calendário, e isso jogaria a prova portuguesa mais para o final de outubro por conta do clima mais ameno em relação aos outros dois circuitos.
Muita gente perguntou sobre o Drive to Survive 3: o pessoal da Netflix está gravando os bastidores dos GPs sim, mesmo com todas as restrições. Eles têm de respeitar as mesmas regras das TVs, ficando a 2m de todo mundo porque são de uma bolha diferente. Mas eles já gravavam a uma certa distância de qualquer jeito, e podem também simplesmente deixar câmera e microfone em uma sala para gravar, já que estão lá somente para documentar. E de um certo time vermelho, às vezes é melhor manter a distância mesmo!
Podcast No Paddock da F1 com a Ju: Entrevista Reginaldo Leme
Julianne Cerasoli entrevista Reginaldo Leme, que relembra histórias dos primórdios da sua carreira na Fórmula 1 nos anos 1970
Continue readingDuas da Mercedes e uma de Hamilton. No Red Bull Ring
Uma vitória de Lewis Hamilton no Red Bull Ring, assim como duas vitórias da Mercedes no Red Bull Ring, são fatos que dizem muito sobre o nível atingido pela equipe e pelo piloto. Eles venceram onde foram batidos nos últimos dois anos, e onde Lewis é o primeiro a reconhecer que nunca se deu muito bem. Dizem que é mais difícil se manter do que chegar no topo e não é por acaso. Como toda a inspiração do carro da Racing Point atesta, o que era uma vantagem que tinha muito a ver com o motor no início da era híbrida foi se transformando em um carro fora de série e, como a soberana pole position prova, a simbiose entre Hamilton, seu talento, e seu engenheiro, cuja atuação é fundamental em uma classificação sob chuva, explicam por que nenhum outro conjunto teve qualquer chance no GP da Estíria.
Seria difícil imaginar outro desfecho, já que Hamilton se especializou em dar esse tipo de volta por cima depois de finais de semana como o passado, em que reconheceu que foi “mentalmente desafiador” perder a pole, ser chamado para se explicar para os comissários pouco antes da corrida, e depois levar outra punição durante a prova. Para completar, veio a chuva no sábado e, sob condições realmente complicadas, o conjunto Mercedes-Hamilton-Bono sobra, como já tinha acontecido em Monza há três anos. E por que insisto na questão do engenheiro? Os pilotos explicaram sábado que mal conseguiam ver os pontos de frenagem. Além disso, como todo mundo ficou o tempo todo na pista para ter certeza de que não iriam perder o momento em que ela estivesse mais rápida, estar bem posicionado é fundamental, e ter um engenheiro falando no seu ouvido na hora certa, também. Some-se a isso uma noção incrível de onde a aderência está no molhado e temos uma volta como a do sábado, que se transformou em um passeio no domingo.
Isso porque Verstappen não teve ritmo para atacar em momento algum. Já na primeira volta após a relargada após o erro de Charles Leclerc, que desrespeitou a regra de ouro do automobilismo de não bater na primeira volta, principalmente em um carro da mesma cor que o seu, Hamilton já tinha aberto 1s3, tinha escapado do DRS e pôde gerenciar o ritmo, livrando-se dos temores de que os tais “ruídos elétricos”, como a Mercedes batizou os problemas que eles tiveram semana passada, voltassem a incomodar.
Ele nem precisou fazer a simulação de corrida na sexta-feira para ter um domingo tão dominante. Nos treinos livres, ele estava sentindo um comportamento estranho no carro, a Mercedes encontrou o problema (sobre o qual eles não quiseram dar detalhes) e o resto é história. E história está sendo feita bem na nossa frente, com direito a punho cerrado e braço erguido no pódio.
Na Red Bull, a impressão foi de uma melhora, mas o fato de Bottas ter conseguido passar Verstappen, que endureceu a disputa só porque é Verstappen mesmo, pois sabia que tinha um ritmo inferior, mostra que a distância é, sim, grande. Até porque é sempre bom lembrar que tudo o que rolou nos dois últimos domingos foi no Red Bull Ring.
No mais, grande corrida de Perez, que em 14 voltas saiu de 17º para sétimo, e que só foi parar quando encostou na Red Bull de Alex Albon. Aliás, quando chegaram em carros com ritmo mais parecido ao seu, as duas Racing Point parece que perderam o encanto, algo que nos acostumamos a ver na Mercedes nos últimos anos.
A McLaren voltou a mudar da água para o vinho com pouco combustível, tanto na classificação, quanto nas últimas voltas da corrida. E novamente foi Norris quem aproveitou para fazer ultrapassagens. Bem mais contente com o equilíbrio do carro do que semana passada, Carlos Sainz teve um combo atrapalhando sua tarde no GP da Estíria: parou mais cedo que os rivais para evitar um undercut, teve um pit stop muito ruim, saiu no tráfego e acabou com seus pneus. E a Renault comprovou que tinha, mesmo, mais ritmo do que mostrou no primeiro GP, com direito a Daniel Ricciardo tendo um gostinho de como será seu ano de despedida: mesmo com mais ritmo e pedindo passagem, o time não ordenou a inversão de posições com Ocon, e ele teve que passar na pista mesmo.
No mais, várias ultrapassagens por fora da curva 4, algo possível quando se respeita o espaço e também quando se usa todo o espaço da pista. Neste domingo, tentar passar por dentro é que foi mais complicado. Mais uma prova de que muita coisa pode mudar na F1 mesmo de uma semana para a outra, dando voltas nos mesmos círculos.
Confira o placar entre companheiros e as diferenças no GP da Estíria
Quer saber o que esperar do GP da Estíria? Ouvi chefes e equipes e pilotos (direto do Zoom, já que o que dá por enquanto) e trago as informações aqui no preview da corrida na minha coluna no UOL.
GP da Estíria e as lições de casa
No papel, não há motivos para acreditar que o segundo GP na Áustria (oops, GP da Estíria) vai ser muito diferente do primeiro. Afinal, a pista não terá alterações e os compostos de pneus serão os mesmos. Só a previsão do tempo mesmo que parece ser um pouco diferente, desta vez com mais calor nas simulações na sexta-feira do que na corrida, e com grande possibilidade de chuva para o sábado, o dia todo. Isso seria uma boa, mesmo se a água não cair na classificação: só por limpar a borracha já abriria algumas possibilidades. Além disso, a temperatura no domingo deve estar bem mais baixa do que na simulação de corrida, o que costuma complicar a vida dos engenheiros.
O foco neste momento não deve ficar tanto em atualizações, mas sim em tirar tudo do carro. Principalmente no super competitivo meio do pelotão, tudo o que foi compreendido sobre o carro de uma semana para a outra vai contar como vantagem.
Mesmo sendo a segunda corrida, no entanto, as quebras que vimos na primeira etapa não devem ficar restritas à estreia. Pelo menos se a teoria de Andrew Shovlin, da Mercedes, estiverem certas:
“A pista da Áustria é horrível para os carros. Normalmente, você começa a temporada em Melbourne, uma pista em que é difícil de ultrapassar, e então pode cuidar do seu carro e, mesmo assim, não será ultrapassado. Aqui é um circuito em que é bem fácil ultrapassar e, se você não usar as zebras e não forçar o ritmo, corre riscos.”
E novas quebras devem trazer mais SC à pista. O diretor de provas, Michael Masi, não soube explicar por que deu preferência a colocar o SC na pista à adotar o VSC. Disse que não havia nenhum outro motivo, foi simplesmente uma questão de circunstância. Circunstância essa que se repetiu na F2. Ficou um pouco estranha a explicação, então veremos quais serão as tais circunstâncias neste final de semana.
Para a Mercedes, é preciso encontrar uma solução para diminuir o “ruído elétrico” que fez com que o ataque às zebras resultasse em mensagens de falha iminente do câmbio. Eles se mostraram confiantes quanto a isso, mas foi interessante que Wolff falou em “dar um jeito” para a segunda corrida. Outro ponto importante é que, desta vez, é Valtteri Bottas que tem a prioridade do vácuo na classificação. Além disso, vejamos como Hamilton se comporta agora que está a cinco pontos de levar uma suspensão, ainda mais sabendo que carregará pelo menos seis até novembro. E devemos ter várias corridas até novembro…
Na Ferrari, perder 1s na classificação foi tão humilhante que o time acelerou as atualizações, ainda que nem tudo seja esperado para este final de semana, e talvez não esteja em ambos os carros. Sabe-se que há um assoalho que será testado por Vettel e uma asa dianteira, por enquanto. E, como Binotto deixou claro, não vai resolver tudo de uma hora para a outra. Para Vettel, é importante entender o que aconteceu com o carro entre sexta e o fim de semana, e ele indicou que os freios podem ter sido o problema. Pelo menos a Scuderia sabe que o carro é confiável, assim como a Alfa Romeo.
Depois de se preocupar bastante com a Mercedes na estreia, a Red Bull tem vários problemas internos para resolver, depois de dois abandonos por questões elétricas diferentes relacionadas ao motor, mas que não estragaram as unidades de potência. A Honda parece tranquila após investigar o que deu errado no domingo. Mas não para por aí: apenas de ter claramente o segundo melhor carro do grid, o modelo é nervoso, e trocar a asa dianteira (só Max usou a nova, mas ambos reclamaram de saídas de traseira) não resolveu.
A McLaren provavelmente teve o piloto do primeiro final de semana, ainda mais depois daquela última volta, e demonstrou uma característica interessante: o carro anda melhor com pouco combustível, na classificação e no final da corrida, algo que o time ainda não entendeu muito bem. E resta, também, isso se estender para Carlos Sainz, que não conseguiu encontrar o acerto ideal e agora tem sua segunda chance neste final de semana.
Falando em segundas chances, a Renault terá a oportunidade de ver onde está sem interferências na classificação (Ocon não teve vácuo e Ricciardo foi “vítima” da bandeira amarela de Bottas). Como os carros de Ferrari, Racing Point, McLaren e do time francês estão muito próximos, qualquer centésimo está fazendo a diferença.
A bandeira amarela no Q3 também foi uma pedra no sapato da Racing Point, que tentou uma jogada diferente na corrida ao colocar Perez no pneu médio, mas depois ficou sem compostos novos para reagir no segundo Safety Car. É a única explicação para priorizar a posição de pista em um circuito em que não é tão difícil ultrapassar (se você conseguir chegar perto o suficiente nas retas, é claro). A boa notícia é que, com uma classificação limpa, Perez deve conseguir largar na frente dos carros laranjas.
Chamou a atenção também no primeiro fim de semana em Red Bull Ring as falhas relacionadas aos motores Mercedes, na Racing Point e na Williams, o que não foi comum nos últimos anos, especialmente nos clientes. E é claro que a fumaça branca que saía dos carros da Racing Point, que a equipe disse serem por excesso de óleo, não passaram despercebido…
Finalizando, a missão da AlphaTauri de escapar do Q1 foi bastante facilitada pela perda de rendimento dos carros equipados com motor Ferrari. Mas ainda falta um pouco de rendimento para lutar com o próximo grupo. Para o segundo final de semana no mesmo circuito, vale ainda um reforço no freio (mesmo caso da Haas, cujos problemas foram gerados pela falta de arrefecimento) e outro na suspensão, já que a estreia foi a prova de que chegar até o fim pode gerar bons dividendos.
Fernando Alonso está de volta
Do lado da Fórmula 1, não poderia fazer mais sentido: tudo bem que nomes como Max Verstappen e Charles Leclerc têm gerado muito interesse no esporte, mas não o suficiente para a Liberty correr o risco de ter só um campeão no grid, caso Kimi Raikkonen e Sebastian Vettel se forem ao final (ou, quem sabe, um deles nem chega ao final) desta temporada, ainda que a Racing Point comece a chamar de “interessante” a possibilidade de contar com o tetracampeão.
Do lado da Renault, não há muito para onde correr. O programa de jovens não tem exatamente um Leclerc ou um Russell para promover – tanto, que Abiteboul teve que bater na porta de Toto Wolff para emprestar Ocon para esta temporada. O programa tem Zhou e todo o mercado chinês por trás, o que poderia ser uma opção interessante, mas neste momento não se sabe nem se ele conseguirá a superlicença neste ano.
Não parece que Vettel esteve nos planos (ou se a Renault esteve nos planos de Vettel) e os franceses precisavam de um nome forte depois de perderem Ricciardo. A empresa tem despejado milhões de dólares na equipe de F1 e tem uma chance importante de crescer com o conjunto de mudanças dos próximos anos.
Primeiro, o teto de gastos, que vai ficar bem próximo do que a Renault gasta em sua operação atual (lembrando que salários de pilotos e os outros 3 maiores, além dos gastos com marketing, ficam de fora da conta dos 145 milhões de dólares para 2021). Segundo, a oportunidade de projetar um carro novo dentro deste limite. E terceiro, de usar mais o túnel de vento que as equipes que têm, no momento, um equipamento superior. Olhando mais a médio prazo, espera-se um novo regulamento de motores em 2026.
O que é mais difícil de ver é como Fernando Alonso pode se beneficiar de tudo isso. Ele vai voltar aos 39 anos. Tirando os primórdios da F1, quando os pilotos eram geralmente mais velhos, só Nigel Mansell, no GP da Austrália de 1994, conseguiu ganhar uma corrida aos 40. E basicamente não coube no cockpit da McLaren no ano seguinte.
Não que o físico de Alonso esteja em questão. Ele inclusive está bem mais magro do que quando deixou a F1 no final de 2018. E, nesse meio tempo, a única mancha é ter ficado de fora das 500 Milhas ano passado (e, vamos combinar, o conjunto não ajudava). O que não deixa de ser curioso: ele andou em tudo o que era possível em alto nível (ok, não tudo, faltou a MotoGP), conseguiu manter seus salários milionários, bem acima de 30 milhões de dólares anuais, e não perdeu a vontade de pilotar um F1.
Mas qual Fernando volta pela segunda vez à Renault? Aquele que, por duas vezes, defendeu a equipe enquanto estava de olho em uma vaga melhor? Aquele que deixou para trás um climão em 2006 por lá, depois colocou fogo no parquinho na McLaren, e saiu também chamuscado da Ferrari para pagar pelos pecados na McLaren novamente? Aquele que é responsável por todas as glórias e não faz o que pode quando as coisas dão errado (por culpa do time, claro). Ou aquele piloto extremamente respeitado pelos engenheiros, com uma visão de corrida absolutamente espetacular, um ritmo avassalador? A carreira de Alonso mostra que não é possível separar um do outro.
A estratégia do GP da Áustria e como o pódio ficou colorido
A temporada 2020 da Fórmula 1 começou com uma corrida que tinha tudo para ser estrategicamente simples, ainda mais depois que o único piloto que decidiu tentar algo diferente no top 10, Max Verstappen, logo saiu de combate por um problema eletrônico. Até que a série de Safety Cars abriu todas as disputas, inclusive pela vitória.
Era um cenário difícil de imaginar depois dos treinos livres, todos dominados por Hamilton. Na hora da verdade e por uma margem de 12 milésimos, deu Bottas, em tempo marcado na primeira tentativa no Q3. Na segunda, forçou demais e saiu da pista justamente na frente do companheiro. Curiosamente, Lewis pode ter perdido a chance de sair na frente no campeonato justamente porque teve a preferência do vácuo no último final de semana. No próximo sábado, a situação se inverte e se, desta vez, se o vácuo de fato ajudar, isso dá boas chances de Bottas repetir a pole, até porque o circuito de Red Bull Ring não é dos melhores para Hamilton, e ele não sabe explicar o porquê.
Ainda assim, na estreia, Hamilton liderou todos os treinos livres, e demonstrou, pela quantidade de voltas que ficou a menos de 1s de Bottas, que tinha um ritmo de corrida melhor. E saiu com um quarto lugar.
A punição por não respeitar bandeiras amarelas (e toda a confusão de alguns painéis verdes serem mostrados erroneamente já deveria ter servido de alerta para todos perceberem o quanto estavam “enferrujados” depois de oito meses sem corridas) impediu que Hamilton atacasse Bottas na largada, e o inglês precisou, ainda que viesse tirando a diferença pouco a pouco no primeiro stint (de 7s8 a 3s2 em 15 voltas), de um SC para colar de vez.
Um pouco mais atrás, Alex Albon fazia uma corrida solitária, com Lando Norris segurando o pelotão intermediário, em um final de semana em que a McLaren teve, sim, um ritmo bom, mas em que, na corrida, foi ajudada também pela boa velocidade de reta. Porém, até o primeiro SC, houve pouca ação na pista e abandonos mexiam na classificação.
Voltando à disputa da frente, Hamilton revelou após a prova que seu plano era parar bem depois de Bottas e colocar os pneus médios e então atacar o finlandês, que colocaria os duros. Já Valtteri disse que teve tudo sob controle o tempo todo, mesmo quando Lewis estava em sua zona de DRS, pois sabia o quão difícil seria aproximar-se nas curvas de alta velocidade.
De qualquer jeito, Hamilton já tinha se afastado depois das insistentes mensagens para os pilotos não usarem as zebras. Um sensor indicava que as caixas de câmbio estavam a ponto de falhar devido a vibrações. Mesmo sem atacar, eles ainda eram mais rápidos que a concorrência.
Houve quem questionou por que a Mercedes não parou no segundo Safety Car, na volta 51, mas os carros tinham acabado de passar pela última curva, e perderiam posições se parassem depois. Foi então que a Red Bull chamou Albon e colocou pneus macios no carro do tailandês. Com 20 voltas para o fim, era a jogada certa para tentar vencer a corrida.
Com pneu macio novo, Albon teria a chance de descontar a desvantagem de equipamento de por volta de 0s5, e atacar as Mercedes principalmente nas primeiras voltas, antes que seus pneus se aquecessem. Isso porque o pneu duro na Áustria não perde muito rendimento (como Norris provou em sua última volta). Então não faria sentido Albon esperar para atacar: naquele momento, contavam a seu favor a aderência maior do pneu macio e o fato de ele ter uma janela de temperatura mais baixa. O que aconteceu, contudo, já é história: o toque com Hamilton, a quebra do motor, e Albon ficou pelo caminho, deixando Lewis com uma punição de 5s.
Afastada a ameaça do tailandês, a Mercedes ainda cogitou inverter as posições de Hamilton e Bottas para que o inglês pudesse abrir os 5s de que precisava, mas desistiu. Vai que Hamilton abre mais que 5s, vai que Bottas perde posição para mais alguém ao tirar o pé… No fundo, a tranquilidade de que Lewis tem carro para recuperar os pontos perdidos.
A corrida foi mais franca atrás dos carros pretos. Sem confiança na Ferrari depois de uma mudança de comportamento da sexta para o sábado, Vettel se jogou para cima de Sainz, rodou e saiu da briga. Duas voltas depois, Perez parecia estar na tática certa, tendo preferido o composto médio ao duro, e passava Norris para ocupar o quarto lugar. A decisão de não parar junto dos demais no SC da volta 51, contudo, acabaria com suas chances quando a equipe decidiu preservar a posição de pista e não o chamou para os boxes. Isso significou que ele tinha de se defender de pilotos com pneus bem mais novos e ritmo muito parecido. Para completar, Perez fez o que não costuma fazer nesse tipo de corrida de oportunidades, acelerou demais no pitlane, e levou 5s de punição.
A briga, então ficou com Leclerc, Norris e Sainz. Com 11 voltas para o fim, o monegasco ainda era o sexto, posição que ocupava desde que Verstappen abandonou. Ele passou Norris e Perez, e herdou as posições de Albon e do punido Hamilton, e conseguiu um improvável segundo lugar. Lando chegou a ter uma disputa com Sainz, mas seguiu na frente, e também passou Perez, com quatro voltas para o final.
Quando cruzou o penúltimo giro, Norris estava a 5s5 de Hamilton. Teria de tirar meio segundo em uma volta para seu primeiro pódio. E o fez. No final, um pódio muito mais colorido do que as dobradinhas de todos os treinos sugeria. Veremos o que acontece, na mesma pista pela primeira vez na história, já neste domingo. Os carros ficaram por lá e quase todos os profissionais, incluindo pilotos, também. Há muita lição de casa a ser feita depois da corrida com o menor número de pilotos cruzando a linha de chegada desde o GP da Áustrália de 2015.
Drops do GP da Áustria e o “crash” da F1
“Você tem muito mais informação aí. É até triste andar no paddock de tão vazio que está”, me dizia um jornalista no domingo de manhã. E olha que se tratava de alguém que trabalha com TV, ou seja, que teve acesso ao paddock, ao contrário dos profissionais de mídia escrita e internet. Além do número reduzido de pessoas com acesso, não havia também o movimento normal, a circulação que tanto ajuda o trabalho dos jornalistas.
Mas informações circulam, mesmo em tempos de corona. Dentro das próprias equipes, começa a haver um questionamento sobre a real necessidade de tanto protocolo. Deve ter sido estranho mesmo trabalhar de máscara, manter-se em bolhas e passar por dolorosos testes continuamente vendo a vida seguir normalmente ao redor. Explico: a região da Estíria não tem casos abertos de coronavírus e a Áustria foi um dos primeiros países europeus a sair da quarentena, e isso já faz várias semanas.
Algo que era esperado para este final de semana, mas desde quinta já estava claro que não sairia é o restante do calendário. Mugello assinou e há grandes chances de Imola entrar também. Sim, poderemos ter três GPs na Itália bem em um ano em que a Ferrari está do jeito que está. Portimão também entraria, Alemanha tem grandes chances… enfim, cada vez mais o calendário se desenha para ser um misto de Europa + Ásia/Oriente Médio. A única surpresa foi ouvir que existe uma luz no fim do túnel para o primeiro GP do Vietnã. Canadá ainda tenta uma vaga, mas aparentemente querem pagar muito pouco. EUA, México e Brasil, com pouquíssimas chances pela contínua escalada dos números da pandemia.
Corona à parte, a Williams está tentando reaver os 25 milhões de dólares que a RoKit não pagou no começo deste ano. A quantia é muito maior do que se acreditava e, somada a 20 a 25 milhões, que são a conta do que foi perdido com o coronavírus, ajuda a explicar por que o time foi colocado à venda e precisou de um empréstimo salvador de Latifi. Mas o canadense não parece ter interesse em comprar a equipe, então é bom mesmo o processo contra a ex-patrocinadora dar resultado! O problema é que a Williams vai ter que entrar na fila, porque o Manchester United também ainda não viu a cor do dinheiro. E nem a Mercedes, que chegou a acertar com eles, mas não colocou a marca no carro justamente pelo mesmo motivo. Aliás, o mais bizarro dessa história é que o dono na RoKit chegou a mandar para a Williams a captura de tela do celular com a transferência. Parece que ele só esqueceu de dar “confirma”.
Mas quem sou eu para falar mal da RoKit? Foi o celular deles (tão ruim que não serve nem de brinde de quermesse, é sério) que me salvou a vida na transmissão em um final de semana cheio de problemas técnicos. Fiz o ao vivo com um delay gigantesco na imagem e sem tabelas de tempo (tudo aquilo que mostrei no instagram, feliz quando tudo ainda funcionava, nos treinos livres, travou na hora da corrida). E sem ouvir os rádios também. Além dos carros quebrando na pista, havia muitas outras coisas que não estavam funcionando na F1, muito em função de uma grande quantidade de dados estar sendo processada “in house”. Isso apagou a comunicação entre o HQ da F1 na Inglaterra e a pista, e fez com que a F1TV caísse, junto com parte dos dados. O que vocês veem na TV no Brasil só não caiu porque estava sendo mixado na pista, e não na Inglaterra. Imagina se a primeira corrida do ano é sem público e sem transmissão?
GP da Áustria. Ou dos sobreviventes
Se tem uma coisa que o GP da Áustria mostrou, é que esse negócio de fazer corrida de Fórmula 1 é complicado. Com 2000 pessoas fazendo o trabalho que seria feito normalmente por mais que o dobro, misturando-se com a falta de prática de quem não enfrentava um final de semana de corrida há oito meses, houve problemas por toda a parte, de quebras na pista a panes na transmissão (mas essa segunda parte explico no post de amanhã. Vamos à corrida em si).
Foi uma prova de sobreviventes, de administrar erros e falhas. Na Mercedes, desde o começo da prova o carro de Valtteri Bottas começou a apresentar problemas ligados à vibrações na caixa de câmbio. E depois, Lewis Hamilton passou a ter o mesmo tipo de problema. Os dois ouviram mensagens contínuas para evitarem as zebras, e mesmo assim eram uns 0s3 por volta mais rápidos que a concorrência.
Ainda assim, é um problema que eles terão poucos dias para resolver, mas Toto Wolff já disse que ele se sente confiante porque eles já têm um indicativo do que possa ter acontecido.
A Red Bull está um passo atrás – em termos de ritmo e de entender o que aconteceu neste domingo: o que se sabe é que Verstappen teve um problema elétrico e Albon, no motor. Outra lição de casa para a equipe é entender qual a melhor asa dianteira, uma vez que o holandês usou uma versão mais nova que a do companheiro.
https://twitter.com/F1/status/1279860348028256256
Albon tinha, sim, chances de vencer o GP da Áustria. Obviamente, agora sabemos que o motor dele quebraria, mas a decisão de colocar pneus macios no SC vinha pagando dividendos: ele jamais colocaria de lado numa disputa com Hamilton não fosse isso. No final das contas, o toque foi inevitável porque Hamilton costuma deixar nas mãos dos rivais a decisão de arriscar o toque ou não, e Alex disse que já estava até de olho em Valtteri. A regra diz que é preciso deixar um carro de distância para a linha branca se um carro estiver do seu lado, Albon estava no limite na pista, e esse espaço se fechou. Houve quem questionou se ele não deveria ter esperado mais, mas era necessário atacar as Mercedes antes que os pneus – duros e usados – deles se aquecessem. Era preciso arriscar.
Tudo isso jogou o segundo lugar no colo de Leclerc, que era sexto até 10 voltas para o fim. Passou Norris, passou Perez e herdou as posições de Albon e Hamilton. Norris, aliás, que parecia estar perdendo rendimento após o último SC, perdendo contato com Perez, sendo passado por Leclerc e brigando com Sainz mas, no final, se livrou do companheiro, que teve problemas com o equilíbrio da McLaren por todo o final de semana, viu o mexicano perder rendimento com pneus desgastados e “só” precisava tirar mais de meio segundo na última volta para ir ao pódio, beneficiando-se dos 5s de punição dados a Hamilton. Fez uma volta sensacional e conseguiu, por 198 milésimos.
Quando se tem uma corrida com sete equipes nos pontos, fica claro que não foi uma tarde processual. Freios acabaram com a corrida da Haas e quase fizeram o mesmo com Gasly, que acabou conseguindo levar o carro até o sétimo lugar. Dando sinais de que estava sem “ritmo de jogo” depois de mais de 18 meses parado, Ocon acabou com a corrida de Kvyat. Ricciardo teve problemas de arrefecimento, Raikkonen viu sua roda mal afixada sair pulando na pista (o que custou míseros 5 mil euros para o time).
Seria uma boa oportunidade para a Williams beliscar um pontinho, e Russell vinha segurando Vettel até ter um problema de pressão de combustível. Sim, Vettel. Sem confiança nas freadas e depois de um mergulho otimista para cima de seu substituto na Ferrari, ele teve um tarde pra lá de apagada. A Ferrari não apenas deixou de ter os superpoderes de seu motor, como também tem um carro com muito arrasto. Mas o GP da Áustria mostrou que pelo menos o carro chega até o final da corrida. Será interessante ver, com tantas corridas em sequência e muita gente das equipes ficando na Áustria e indo direto para a Hungria, por quanto tempo isso será um diferencial.
Confira o placar entre companheiros e as diferenças no GP da Áustria
10 curiosidades da Áustria que você não sabia
Um dos cenários mais bonitos da temporada para quem gosta de verde, a pista de Spielberg está cravada em uma das regiões mais particulares do campeonato. Duvida? Então aqui vai a lista de 10 curiosidades da Áustria.
Lembrando que esta é a quarta temporada do turistando: já dei uma geral nos GPs, dei dicas para quem quiser curtir essas corridas ao vivo e fiz um passeio culinário pelos destinos da temporada:
1 A Estíria não é exatamente movimentada durante o ano
As pacatas cidadezinhas ao redor do circuito da F1 na região da Estíria geralmente são a morada de pessoas mais velhas que decidiram viver no campo, e muitos cultivam parte do que comem e criam alguns animais. Para se ter uma ideia, a cidade de Spielberg tem menos de 6 mil habitantes.
2 As casas geralmente têm mais cabeças do que habitantes
Dentro desse clima, algumas casas tentam manter as tradições. Por exemplo, não é incomum ter cabeças de animais empanadas na decoração da sala e chuveiro com aquecimento a lenha. Mais roots, impossível.
3 A Estíria é destino turístico no verão e no inverno
A região é um destino turístico na Áustria o ano inteiro: no inverno para esquiar, e no verão para fazer caminhadas nas montanhas. Inclusive há casinhas no topo das montanhas para as pessoas passarem a noite durante as caminhadas mais longas.
4 Brindando olho no olho por um motivo nobre
É uma tradição austríaca mas não faz mal nenhum copiar: quando se brinda por lá, tem que olhar olho no olho, caso contrário a pessoa terá sete anos de sexo ruim.
5 Palco do GP da Áustria já teve vários nomes
Para muita gente é difícil usar o nome Red Bull Ring para o palco do GP da Áustria. E, de fato, é uma pista que já teve alguns nomes na história. Nomes mesmo só existiram outros dois, Österreichring, que era bem mais longo, e A1-Ring, a partir de 1996, quando a pista foi encurtada e ficou muito semelhante ao que é hoje, mesmo depois de ter sido comprada, logo depois, pela Red Bull. Mas a pista também ficou conhecida pelas cidades das redondezas, Zeltweg (por onde a pista antiga passava) e Spielberg (onde o que sobrou da pista de hoje está).
6 Há basicamente dois tipos de austríacos
Existe uma certa rivalidade entre os austríacos de Viena e do restante do país, já que as personalidades e valores seriam diferentes. Pelo menos é isso que eu sempre ouvi dizer, e o grande exemplo que foi me dado é observar como o vienense Toto Wolff se posiciona, e como Franz Tost, da pequena Trins, perto de Innsbruck, se comportam e se posicionam de maneiras completamente diferentes.
7 Não é só a Estíria que é coberta de verde
Não é por acaso que já senti vergonha de dizer o que fazia da vida conversando com austríacos, principalmente com todas as horas de voos decorrentes do trabalho na F1: é um dos países mais ‘verdes’ da Europa, com 63% do lixo reciclado e a maior parte da eletricidade vinda de fontes limpas, principalmente eólica.
8 Roupa tradicional ainda faz parte da vida das pessoas do interior
Quem viu o GP da Áustria já percebeu que algumas pessoas usam roupas típicas, e é uma tradição que a Red Bull costuma manter do jeito que pode. Engana-se quem pensa que é algo que só é usado nesta região do mundo no Oktoberfest ou algo do tipo. Aquela roupa com ar camponês se chama Tracht e algo de boa qualidade custa algumas centenas de euros. E é muito valorizada na região, como forma de manter as tradições. Muitas vezes as pessoas usam para festas e para ir à igreja no domingo, por exemplo.
9 A Áustria já teve dias de império…
A Áustria já foi oito vezes maior do que é hoje, primeiro com um império próprio e depois na época do império Austro-Húngaro, no século XIX e início do XX. Aliás, um dos lugares mais marcantes por que já passei foi Sarajevo, que era um dos limites deste império. Até hoje, uma linha divide o centro da cidade. De um lado, a arquitetura lembra muito Viena. No outro, Istambul, uma vez que o império “do outro lado da rua” era o Otomano.
10 E o fim desse império gerou a Primeira Guerra Mundial
Foi justamente lá em Sarajevo que o assassinato do arquiduque do Império Austro-Húngaro, Franz Ferdinand, acabou sendo o estopim para o início da Primeira Guerra Mundial. Foi essa guerra que acabou com o império Austro-Húngaro e, é claro, Ferdinand não é o único austríaco que ficou associado a uma grande guerra…
Como funciona o sistema de tokens de desenvolvimento na F1 2020
Falar em sistema de tokens não é novidade na F1: nos remete à introdução das unidades de potência V6 turbo híbridas, que primeiro previa que várias peças seriam rapidamente homologadas e depois ficou mais aberta quando as tais fichas de desenvolvimento foram introduzidas. E, num terceiro momento, essas limitações caíram para permitir basicamente que as demais fornecedoras pudessem chegar perto da Mercedes. Afinal, quando todo o sistema foi pensado, ninguém imaginou que uma fornecedora conseguisse uma vantagem tão grande (mesmo que ela mesma tenha sido basicamente a autora do projeto aprovado pela FIA, mas essa é uma outra conversa).
A questão é que o sistema de tokens está de volta, agora para os carros e como uma medida de contingência para evitar, em última análise, que equipes quebrem em 2020 e 2021, antes que o teto orçamentário e a nova divisão de lucros entrem em vigor. E, sim, há a possibilidade de que uma equipe – de novo, a Mercedes – se perpetue na frente justamente porque impor limites ao desenvolvimento significa cortar custos, é verdade, mas também premia quem já tem vantagem.
Se é algo que vem para o bem ou para o mal, o fato é que era necessário. Apesar manter o regulamento estável já não tinha evitados que equipes, como a McLaren e Racing Point, investissem pesado para mudar completamente seus carros de 2019 para cá, e nada impediria que o mesmo acontecesse ao longo deste ano e no próximo.
Bom, agora algo impede: cada equipe terá dois tokens de desenvolvimento para serem gastos nas primeiras oito provas e mais dois nas restantes. E aí começa uma série de especificações que tornam uma ideia que parece simples a princípio em algo complexo e compossíveis escapatórias.
Está tudo lá no artigo 22 do regulamento técnico para quem quiser consultar qual tipo de componente está em qual lista e exatamente o que não está em lista nenhuma. Aqui deixo alguns pontos importantes:
- Superfícies aerodinâmicas não entram nesta lista e podem ser melhoradas.
- Há exceções basicamente por questões de segurança, para assegurar o conforto e do piloto (e aí entram também mudanças nos botões do volante, por exemplo), para assegurar melhor confiabilidade ou para gerar economia. Se uma equipe mudar de fornecedor, claro, também poderá fazer as alterações cabíveis, assim como se a FIA determinar alguma alteração. Mudanças de configuração que não apresentem “custo significativo ou mudança de funcionalidade” também são permitidas.
- A lista de componentes homologados é dividida em dois: uma com o que pode ser alterado para as primeiras oito corridas gastando-se os tokens, outra com o que pode ser modificado só a partir da nona etapa, também gastando as tais fichas.
- Nem toda modificação significa gastar um token: mudar a suspensão traseira, por exemplo, já gasta os dois aos quais cada time tem direito em cada um dos períodos (da primeira à oitava corrida e da nona em diante).
- Dizer que algo pode ser modificado da primeira à oitava não quer dizer que a peça possa mudar durante este período: o que foi alterado para essa parte já foi homologado pela FIA e já estará no carro a partir da primeira prova. E o que o time planejar mudar para a segunda parte também já foi comunicado (dia 22 de julho) à FIA. Então são coisas que não vão ser desenvolvidas ao longo da temporada.
- As regras também especificam como isso vai funcionar para as equipes clientes. Vamos supor que a Haas compre um componente atualizado pela Ferrari, pelo qual a Scuderia “pagou” um token. Neste caso, a Haas também vai ter que gastar um de seus tokens para usar a atualização. As equipes clientes só escapam disso caso estejam usam uma peça do ano anterior. Ou seja, se a Haas começa a temporada com algo cuja especificação era usada pela Ferrari em 2019, pode mudar para a versão 2020 sem gastar seus tokens.
- E se uma peça for atualizada e não funcionar como a equipe esperava? Ela pode voltar a usar o desenho anterior, mas os tokens gastos não podem ser recuperados.
Ou seja, como de costume quando lemos as regras, há bastante adjetivação, principalmente nas exceções, e muito mais do que era de se esperar em algo que deveria ser mais preto no branco. Misture as duas cores e surgem as tais áreas cinzentas.
A lista de componentes homologados aumenta para 2021, quando o assoalho dos carros será alterado para ajudar a Pirelli a manter os mesmos compostos por uma terceira temporada. Mas esta, também, é uma outra história.
10 motivos para não perder a temporada 2020 da F1
Muita coisa mudou em pouco menos de quatro meses, quando a F1 imaginou que podia driblar o coronavírus e começar sua temporada. O campeonato de 2020 será intenso, com pouco tempo para se recuperar e poucas oportunidades também, já que o desenvolvimento dos carros terá limitações. E quem se adaptar melhor leva.
Campeonato express
Sim, vamos conhecer o campeão em menos de 6 meses – e isso não quer dizer que alguém dominou absurdamente como quando Schumacher foi penta em julho. Será um ano mais de tirar o máximo do carro que tem nas mãos do que de buscar desenvolvimento, o que vai testar as equipes de uma maneira diferente. Para os pilotos, pela sequência maluca de corridas, saber equilibrar a agressividade com o cuidado para não acabar com o equipamento será fundamental.
Líderes aos 22 anos
Para Max, liderar equipe grande não é uma novidade. Para Leclerc, sim. Será que a linha de aprendizagem seguirá tão íngreme mesmo assim? Seja como for, é fato que o início do choque geracional que vimos ano passado nos times grandes vai se intensificar, com Albon também mais adaptado à Red Bull. Os pilotos abaixo dos 25 já são a metade dos pilotos do grandes, algo impensável até pouco tempo atrás.
Hamilton o mais vencedor da história?
Vai ficar um pouco mais difícil com a temporada mais curta, mas o inglês pode sim passar as 91 vitórias de Schumacher ainda em 2020. E alcançar seus sete títulos. Será que as conquistas do inglês vão ser, como de costume, relativizadas por motivos, como de costume também, pouco objetivos?
Nervos de aço
A temporada deve começar com 3 x 3, ou seja, por três vezes haverá três corridas em finais de semana seguidos, algo que só aconteceu (uma vez) em 2018. Para os pilotos, a carga emocional é grande, mas nada se compara aos engenheiros e, principalmente, mecânicos, cuja carga horária não só no domingo de GP, mas de quarta a domingo, é de pelo menos 10h. Sob muita pressão.
Relação Vettel-Ferrari
É forte o burburinho que vem da Itália de que, além de não oferecer algo aceitável para Vettel continuar na Ferrari, a Scuderia ainda tentou diminuir seu salário neste ano. Não que o alemão aparente ser daqueles apegados à grana, mas é lógico que há toda uma simbologia atrelada a isso. Imagine se rolar um “Charles is faster than you” com esse pano de fundo…
Novas pistas
No meio da crise, aparecem oportunidades, não é verdade? E no caso da F1 as mais imediatas foram de pistas que tinham interesse em estar no campeonato, mas não estavam em condições de oferecer um bom pacote. Junte-se a isso a sorte de estar na Europa, com menos complicações para os deslocamentos e, no meio de todos os desafios, os pilotos e equipes ainda terão algumas pistas novas para aprenderem. Pelo menos não estamos na época de testes ilimitados. Caso contrário, Mugello seria a corrida mais previsível do ano!
Vamos ouvir menos ‘poupe o motor’
As fornecedoras se prepararam para fazer 22 corridas com a alocação de motores, e vão fazer, no máximo 18. E isso gera, obviamente, menos necessidade de poupar equipamento, e pode trazer surpresas, uma vez que as unidades de potência não são tão diferentes assim em termos de rendimento em si, mas sim em quanto tempo conseguem operar em configurações mais ricas. Junte-se a isso o fato da Honda acreditar ter conseguido um salto importante com a atualização que Red Bull e AlphaTauri vão usar logo desde a primeira etapa…
Despedidas tensas
Certamente a relação Vettel-Ferrari vai chamar mais atenção, mas não é a única que pode esquentar ao longo de um ano em que se sabe que várias parcerias estão com os dias contados. Especialmente quando duas destas situações envolvem a Renault e Cyril Abiteboul, o que é promessa de pressão para cima da McLaren e de Ricciardo.
As vantagens do regulamento estável
Manter as mesmas regras costuma gerar mais competitividade na F1. Pelos sinais da curta pré-temporada, a impressão foi de que a Ferrari perdeu a chance de encostar, talvez às voltas com as mudanças que teve de fazer em relação ao ano passado, e a Red Bull possivelmente está um pouco longe demais para lutar por título. Mas uma coisa é certa: ninguém duvida que o meio do pelotão está mais embaralhado do que nunca.
A despedida de Raikkonen?
Por último, mas não menos importante: tem que ter coragem para apostar qualquer coisa sobre a carreira de Kimi Raikkonen. Ele “foi saído” da Ferrari por duas vezes, e em ambas houve quem acreditou que sua carreira tinha chegado ao fim. Mas parece que ele gosta mesmo desse negócio de corrida de carro. E, no ano em que faz 41, pode arrumar mais uma extensãozinha de contrato. Por que não?
Mexendo na grana
Bernie Ecclestone sempre foi muito rápido ao apontar o dedo para o motor V6 turbo híbrido, adotado em 2014, como o grande culpado pelo abismo de performance entre as equipes. Sempre “esqueceu-se” dos contratos bilaterais que fechou com as equipes em 2012 (o que também foi o início da queda de importância da FIA, já que, pela primeira vez desde 1981, não foi firmado um Pacto da Concórdia, ou seja, um acordo entre todas as equipes, FIA e detentor dos direitos comerciais). Tais contratos, que acabam ao final de 2020, deram a Mercedes, Ferrari e Red Bull quase 60% de todo o dinheiro distribuído às equipes. E as outras sete dividem o restante.
Quando a FIA definiu que o regulamento esportivo seguisse o mesmo para 2021, isso também significou uma espécie de extensão forçada para os contratos com as equipes, ainda que haja a possibilidade de mudar isso. A partir daí, a F1 atacou áreas que julgou serem prioritárias, jogando as novas regras para 2022 e puxando o teto orçamentário para 2021 (e diminuindo-o). Mas a verdade é que falta esta última peça no quebra-cabeça do futuro da F1: distribuir o dinheiro dos direitos comerciais de forma mais justa.
O que existe hoje em dia como resultado dos tais acordos bilaterais é uma divisão complicada com um valor básico para todas as equipes (35 milhões de dólares), uma parte que depende do resultado no campeonato de construtores e (aí a coisa começa a ficar desigual) uma série de bônus que só cinco equipes ganham, e que variam enormemente entre si. A Williams fica com mais 10 milhões (levando em consideração os números de 2019, já que é sempre uma porcentagem que varia do valor total do que foi arrecadado no ano anterior), a McLaren com mais 33, a Red Bull tem mais 71, a Mercedes 76 e a Ferrari com mais 114. É por isso que um vice-campeonato ferrarista rende mais dinheiro que um título para a Mercedes, por exemplo.
A decisão da FIA de jogar as regras para 2021 significa que esses contratos também ficam valendo por mais um ano, a não ser que a Liberty consiga chegar a outro acordo com as equipes.
Na longa entrevista que deu logo depois que as oito primeiras datas do calendário foram divulgadas, Chase Carey deixou claro que a Liberty vai tentar fazer justamente isso, agora que questões mais latentes (regras, teto orçamentário) saíram do caminho. “Nada precisa ser estendido. Podemos essencialmente implementar algo e dizer ‘se vocês quiserem competir, estes são os termos’.” E as negociações não envolverão a FIA novamente, como Jean Todt já confirmou, embora Ross Brawn tenha afirmado que há partes em que o “órgão de governança”, ou seja, a FIA, estará implicado e seria justamente nessa questão que o contrato estaria emperrado, e não na distribuição do dinheiro em si. A ver.
Mas isso quer dizer que a F1 pode entrar em 2021 sem um novo acordo comercial e com a possibilidade de equipes deixarem o esporte? Isso já aconteceu em um passado recente, no final dos anos 2000, quando o acordo vigente acabou sendo estendido e houve, sim, um movimento de rebeldia dos grandes para criar uma liga paralela, o que, no final das contas, acaba explicando os contratos pouco igualitários em vigor até hoje. Mas é justamente por conta do rombo de performance que estes contratos criaram que existe um consenso maior sobre o caminho que se deve tomar. Então, se a missão é não só curar-se dos efeitos diretos do coronavírus, e sim colocar a F1 em um lugar melhor e mais competitivo no futuro, ela passa por finalizar estes contratos.
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Enquanto a Fórmula 1 caminha para conseguir fechar um calendário com 18 corridas, permanecendo na Europa até outubro e adicionando pistas que estavam de fora, a Fórmula E anunciou nesta quarta-feira que fará as etapas necessárias para que o campeonato seja válido de maneira mais radical: com seis corridas em nove dias em três traçados distintos em Berlim. Este é um bom ponto de partida para entender as diferenças entre as duas categorias, mas quem será que sairá melhor da pandemia?
Esportivamente: ponto para a F1
É interessante ver como a F1 está buscando uma flexibilidade e igualdade que a FE tem, no sentido de testar novos formatos e agir de maneira afirmativa para aumentar a competitividade, haja vista as mudanças já implementadas (como do escalonamento do desenvolvimento aerodinâmico com base no resultado do campeonato, que estão sendo finalizadas (no novo pacto da Concórdia ou sabe-se lá como vai chamar, com uma distribuição mais justa entre as equipes) e a tentativa de adotar o grid invertido, que segue em pauta para os próximos anos, embora não tenha passado em 2020.
Usando este período de crise para efetuar mudanças necessárias e experimentar soluções até mais radicais, a F1 tem tudo para emergir melhor da pandemia, embora as mudanças já acertadas só devam começar a surtir efeito em 2022, quando estreiam os novos carros desenvolvidos com o teto de gastos e o escalonamento aerodinâmico.
Enquanto isso, a Fórmula E pode viver um enorme desafio: todo seu modelo é baseado em eventos em grandes cidades, o que pode ser complicado pelo menos até que haja imunidade. E os carros atualmente podem chegar a até 280km/h, é verdade, mas não durariam muitas voltas nesse ritmo. O motor elétrico tem potencial, especialmente ficando mais leve, mas ainda não é o momento, por exemplo, de colocar uma corrida de FE em uma pista usada pela F1.
Tecnologicamente: um empate
Faz sentido pensar que a pandemia vai acelerar a corrida pela mobilidade usando energias renováveis. O pacote de recuperação da Alemanha, inclusive, já dobrou os incentivos para os carros elétricos, em parte para apoiar a indústria automobilística em si. A diminuição da poluição observada quase instantaneamente nas grandes cidades durante o lockdown também aponta para a mesma direção, e o temor de que o coronavírus se perpetue por mais tempo, com ondas indo e vindo antes que seja possível vacinar ou gerar imunidade (que ainda não seja sabe quanto tempo duraria) na maior parte da população pode ser um ponto negativo para os meios públicos de transporte.
Mas então a Formula E não sairia vencedora com isso? Talvez em termos de marketing, e chegaremos lá, mas é questionável do ponto de vista tecnológico, uma vez que a unidade de potência usada na categoria elétrica não difere muito de um dos elementos da unidade de potência da F1, o MGU-K. O sistema da F1 é bastante complexo e não tem transferência direta para a indústria (ou seja, o V6 híbrido turbo usado não vai estar no seu carro da maneira como ele existe na F1), mas em termos de eficiência, essa parte elétrica e o biocombustível, sim. Carros elétricos não são a única resposta possível, e há questionamentos, inclusive, se seriam a melhor resposta.
Financeiramente: ponto para a FE
Dentro deste contexto de aposta nos carros elétricos especialmente no médio prazo, já que as leis principalmente na Europa apontam para isso, é de se esperar que o investimento crescente na Fórmula E não sofra tanto. É uma corrida de carros e a indústria automobilística foi fortemente atingida pela pandemia, sim, mas é uma categoria que está do lado certo em termos de marketing para o caminho de retomada desta indústria. Além disso, as contas da Fórmula E são muito mais baseadas em patrocínio do que as da F1. E a categoria acabou de comemorar, ano passado, sua primeira temporada ‘no verde’, com 1 milhão de euros de lucro. Nas cinco primeiras temporadas, eles perderam mais do que ganharam, investindo pesado justamente em marketing. Note que todo o modelo de negócio é completamente diferente da F1, e as cifras também: as equipes se bancam totalmente, mas os orçamentos são de 20, 25 milhões de dólares. Na F1, mais de 900 milhões de dólares vindos dos lucros que são divididos entre as equipes e os orçamentos podem superar os 400 milhões. Isso significa, por exemplo, que uma montadora como a Renault coloca mais dinheiro no time de F1, mesmo recebendo sua premiação, do que correndo “de graça” na FE.
Mas voltando ao modelo de negócio, são as taxas cobradas junto aos promotores que representam a maior fatia de ganhos da F1, e não os patrocínios, e isso será diretamente atingido com a pandemia. Mesmo que seja possível fazer 18 corridas, a Liberty não poderá cobrar de etapas que não tiverem público e terá de, inclusive, pagar o aluguel em alguns casos. Fica fácil entender como a F1 deve sofrer um impacto mais forte em sua receita, mesmo conseguindo remarcar mais provas.
Campeonato “europeu” de F1?
A cada notícia que se vê por aí, fica mais claro que a Fórmula 1 não sai da Europa se não puder contar com público. Na verdade, mais com VIPs do que com público, mas chego lá em algumas linhas. Ainda que a reabertura na Europa e em partes da Ásia esteja sendo até acelerada, e com poucos focos de uma segunda onda de infecções por coronavírus que vem tímida até o momento, ainda é arriscado pensar em aglomerações. Quer dizer, elas até têm acontecido em vários lugares do mundo pela falta de discernimento das pessoas, então vou refazer a frase: ninguém quer correr o risco de promover um evento que possa se tornar o novo Atalanta x Valência.
Não é por acaso que a F1 tentou garantir, primeiro, as 8 provas necessárias para validar o campeonato, e “cumprir a tabela europeia”. Mantendo os GPs no continente, é possível equilibrar gastos e receitas desse tal “novo normal”. O complicado sempre seria o próximo passo, como já estava prevendo em abril. Na época, Silverstone estava pedindo 19 milhões de dólares, o mesmo que paga para receber a corrida anualmente, para realizar duas etapas. Mas não levou. Provavelmente eles terão algum lucro, mas muito menor.
Isso se repete com todos os circuitos que estão no calendário das 8 corridas: recentemente, saiu a notícia de que a F1 estendeu contratos de Bélgica e Hungria por mais um ano. Isso quer dizer que o valor do contrato segue o mesmo, mas a corrida deste ano sairá de graça para os promotores, justamente por que as provas serão realizadas sem público.
Até aí, tudo bem: A F1 cobre os gastos dos promotores, já que eles não podem vender ingressos, pode deixá-los ficar com o dinheiro das placas de publicidade (dependendo do contrato, essa quantia já é deles mesmo e, em outros, o lucro é dividido, mas a questão é que essa seria outra fonte de renda que pode ser explorada) e ganha de volta com o campeonato acontecendo e tudo que o isso representa em termos de dinheiro vindo da TV e patrocinadores, duas das suas três grandes fontes de renda.
O problema começa quando os custos de operação das corridas aumentam. Em outras palavras, o problema é sair da Europa sem poder cobrar as taxas dos promotores.
Por isso, achei curiosa a escolha da manchete do que chamamos de network (Motorsport.com e Autosport): “Dois GPs são oferecidos à China”. Como se não fosse a F1 que estivesse precisando mais do que nunca da China (com todas as ironias que a situação possa suscitar). Eles, na verdade, “ofereceram” que a China pagasse por dois GPs, o mesmo que fizeram com a Rússia.
Mas a conta tem de fechar dos dois lados. A Liberty não pode se dar ao luxo de deixar de cobrar pelas provas fora da Europa porque elas são muito mais caras. É a F1 quem transporta, por exemplo, a maior parte (até 70 toneladas) do equipamento das equipes nestes casos, enquanto, na Europa, são elas mesmas, por via terrestre. E os preços de envio de carga estão nas alturas devido à pandemia.
Mas é realista pensar em corridas com público nem que seja em outubro? O Vietnã e a Rússia já estão retomando futebol com número limitado de torcedores. Mas é uma comparação perigosa. O que vale a pena mesmo na F1 é o Paddock Club, aquele ingresso (mais corporativo que qualquer coisa) vendido a 5 ou 6 mil dólares a cabeça. Note que não é difícil para os promotores recuperarem uma boa parte do race fee apenas com estes ingressos, inclusive. Mas ter Paddock Club quer dizer ter pessoas contratadas para cozinhar, servir, montar os espaços VIP, quer dizer passeios pelo paddock e pelo pit lane, quer dizer encontrar pilotos. Não é um ingresso que pode ser comercializado com a premissa de distanciamento social.
Que a F1 vai sair da Europa em algum momento, isso é dado como certo. Bahrein e Abu Dhabi vão encerrar o campeonato. São lugares com números relativamente altos de casos, mas pelo melhor motivo possível: os governos foram enérgicos nas restrições e investiram em testes em massa. Os dois (Bahrein e Emirados Árabes Unidos) estão entre os 5 países com mais testes por milhão, sendo que os demais são territórios com menos de 70.000 pessoas. Para ter com base, o Bahrein tem mais de 1.6 milhão de pessoas e o EAU, quase 10). Ou seja, eles podem prover ambientes mais seguros para seus torce… para seus VIPs. Aí a conta fecha.
A (dura) volta da F1
Quando os atletas olímpicos dão entrevista sobre a mudança da data dos Jogos para o ano que vem, uma palavra que se repete é frustração. Não é por acaso: o atleta se prepara por quatro anos para ter dois picos de performance (geralmente, um menor que o outro no caso dos favoritos): nas classificatórias, para garantir sua vaga e, é claro, durante os Jogos. Ou seja, todos eles vinham nessa linha ascendente quando começaram a ter seu treinamento atrapalhado pela covid e, depois, a confirmação do adiamento.
Esse adiamento teoricamente indica que o nível dos próximos Jogos não será tão alto, já que o ciclo foi interrompido e estendido. Ou pelo menos é o que diz a lógica (caso isso não acontecer, toda a teoria do treinamento de performance terá de ser revista!).
Em menor escala, o mesmo acontece com o treinamento dos pilotos. Eles buscam basicamente dois picos durante a temporada, no início e em Singapura, fisicamente a prova mais difícil do ano pela mistura entre calor, umidade, e geralmente a prova mais longa do campeonato.
Assim como com os atletas olímpicos, eles também tiveram seu trabalho pesado especialmente de janeiro e fevereiro jogado no lixo. Talvez à exceção de Lewis Hamilton (não se sabe onde ele passou esse período desde março e suas postagens correndo na rua sugerem algum lugar em que o lockdown não foi tão restrito), todos os pilotos passaram a maior parte dos últimos quatro meses com restrições para treinar.
E vão encarar uma sequência inédita: oito corridas em dez finais de semana. Se, por um lado, as diferenças de fuso horário e as longas horas de voo, que são a grande fonte de desgaste do início “normal” de temporada, ficaram de lado, o desgaste físico e mental (e sabemos que eles estão totalmente conectados), de estar sob pressão praticamente sem descanso, e ainda seguindo o protocolo de isolamento restrito da F1/FIA, será duríssimo.
O exemplo aqui é dos pilotos, mas não para por aí. Todos estarão trabalhando no limite: do engenheiro que tem de tomar decisões rápidas sobre estratégia ao mecânico que não pode vacilar na troca de pneus.
Nós temos a experiência das três corridas em sequência de 2018, duramente rechaçada pelas equipes justamente pelo esgotamento de seus funcionários. Até hoje, quando se fala no que se chama em inglês triple-header (que já é uma imagem perturbadora por si só, imaginem, um ser com três cabeças…), a teoria é de que só sobrevivemos porque tínhamos a Copa do Mundo de futebol para descansar a mente!
Não será assim desta vez.
Uma coisa é trabalhar por 10, 12h por dia de quarta a domingo, como as equipes fazem normalmente, sabendo que terá dois dias de folga e voltará a fazer isso por mais quatro dias e voltará à fábrica. Isso, está todo mundo treinado para fazer. Outra coisa é repetir, por duas vezes, esse procedimento por três semanas seguidas e, ao invés de uma folga, ter de se manter confinado no hotel. E ainda, é claro, ter de render 100% até o domingo do segundo GP na Inglaterra, quando termina essa maratona inicial.
Junte-se a isso o fato dos carros estarem praticamente congelados, como uma das formas de frear os gastos na era da covid, e teremos um campeonato em que outras máquinas, as humanas, serão testadas mais do que nunca.
A F1 precisa da FIA?
GP de Abu Dhabi de 2019. Eu sei, parece que tudo aconteceu décadas atrás: há um problema no sistema do DRS, que fica por algumas voltas desativado até que os servidores voltem a funcionar corretamente. Na coletiva que sempre dá após as corridas, o diretor de prova, Michael Masi, tenta explicar o que aconteceu aos jornalistas. Sentada ao lado dele, percebo que ele escolhe muito bem as palavras e, constantemente, olha além da rodinha de colegas que o cerca. Também na sala, ouvindo atentamente, estão vários homens de camisa branca e o logo da F1 no peito.
Todos eles são contratados pela Liberty Media. Masi é da FIA. Usa a camisa também branca, mas com o logo da federação, e calças azuis.
Uma das grandes dúvidas dos jornalistas era de quem é o tal sistema? Liberty ou FIA? E é justamente ao responder que o erro foi “coletivo” que ele olha sem parar para os homens do uniforme branco e calça preta.
A cena evidencia como a Liberty Media tem colocado o papel da FIA na F1 em xeque.
No início do milênio, Bernie Ecclestone comprou da FIA o direito de explorar a F1 comercialmente, por 300 milhões de dólares. Tal contrato vale até 2113 (isso mesmo!) e muito possivelmente foi o melhor negócio já feito por um homem cujo combustível sempre foi levar vantagens em negócios. Para vocês terem uma ideia, só o valor atual do contrato da Sky Sports britânica é muito superior a essa soma.
Então foi isso que a Liberty Media comprou: o controle comercial da Fórmula 1. E o que a FIA tem? A chancela do campeonato. Seu papel é dar legitimidade ao chamar a competição de FIA Formula One Championship, ligando-o a uma federação esportiva. E é isso.
Sob o comando de Ecclestone, havia uma divisão de responsabilidades. Ao seu pessoal, da FOM, cabia cuidar das TVs, patrocinadores e calendário. À FIA, cabia gerenciar as regras e a segurança. Dentro deste cenário, à medida que o nível tecnológico foi aumentando a ponto de a FIA sempre estar um passo atrás, os times foram tomando conta do processo decisório das regras. O grupo de estratégia, por exemplo, formado nos anos 2000, era composto por engenheiros das equipes e suas simulações eram feitas pelos próprios times, ou seja, ficava difícil ter alguma mudança que, efetivamente, resolvesse problemas de competitividade. Vide 2009.
No início de 2017, a Liberty assumiu o controle.
O choque cultural era inevitável. A FIA é estruturalmente francesa, burocrática, complicada, exageradamente política. Tudo o que passa pela federação é demorado e pouco transparente. E, com o passar dos anos, após o péssimo negócio feito com Ecclestone, passou a ser um elo fraco na governança da F1 também financeiramente, com a saída de profissionais importantes da área mais técnica, como Laurent Mekies (que foi para a Ferrari) e Marcin Budkowski (agora na Renault). E o último grande buraco na organização foi deixado por Charlie Whiting após sua morte repentina, em março de 2019.
Enquanto isso, a Liberty foi ocupando os poucos espaços que cabiam à FIA. Primeiro, vamos corrigir algo importante: eles não gostam de ser chamados de Liberty, muito menos de FOM. Eles (e é, inclusive, o que está escrito no tal uniforme) são a F1. E ponto.
Uma das primeiras ações dos norte-americanos foi criar uma divisão técnica, chefiada por Ross Brawn. Essa divisão tem outros nomes, como Pat Symonds, Rob Smedley, entre tantos outros, e cuida dos aspectos técnicos e esportivos. Com o dinheiro que a FIA não tem, a F1 (vamos atualizando o nome!) desenvolveu seus próprios simuladores para ajudar no desenho de novas pistas, novos carros, testar ideias de novas regras esportivas. Isso tirou o poder (especialmente dos times grandes) de ditar o tom das regras, ainda que todas as equipes sigam fazendo parte do processo decisório. E a FIA? Eles também sentam à mesa, mas com muito menos instrumentos para colaborar no processo.
Reparem como foi interessante o anúncio das novas regras, com Todt completamente deslocado (e claramente morrendo de sono):
[youtube https://www.youtube.com/watch?v=3JddVHuPmCM]
Ao longo dos últimos anos, e não por acaso, a FIA vem tentando se promover no campo da segurança e, de fato, tem um departamento forte nesse sentido, de prevenção e estudo de acidentes de todas as modalidades de esporte a motor. Mas, na F1, até nisso eles ganharam uma companhia, com a empresa privada Formula Medicine, sob as garras da Liberty, ampliando seu papel. São eles, inclusive, que vão prover os testes de coronavírus que serão feitos pelo menos nas primeiras etapas com todos os envolvidos.
Voltando ao caso lá de Abu Dhabi, o nervosismo de Masi para não falar algo comprometedor tinha uma explicação: a FIA (ainda) comanda o sistema de DRS, mas depende dos dados enviados pelas câmeras onboard (e quando eu falo dados, não quero dizer apenas as imagens, pois o sistema envolve tudo, de cronometragem ao que vemos na transmissão, por exemplo, velocidade, marcha, degradação de pneus). E este sistema é controlado pela F1, ou seja, é mais um item em que a FIA depende da Liberty.
Então, se toda a parte técnica e esportiva, e cada vez mais a parte médica também, estão nas mãos da Liberty/F1, o que sobra para a FIA? Na prática, só o nome do campeonato mesmo. E não surpreenderia ninguém se as três letrinhas iniciais sumissem a médio prazo. É só a Liberty apertar o gatilho.
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A ideia era fazer uma sequência de textos mostrando como a F1 mudou depois da última crise mundial, em 2008 (que parece pequenininha em comparação com essa quando pensamos na nossa vida cotidiana e em todas as vidas que se foram, mas que atingiu em cheio o mercado financeiro e teve desdobramentos sérios nas montadoras), “apresentar” um personagem importante para a F1 e sua “mudança de lado” e amarrar tudo no final.
Um tal de Sebastian Vettel e a Ferrari foram a ignição de uma série de eventos que deixou a série adormecida por duas semanas, mas cá voltamos. A grande diferença entre a F1 que viveu até a ameaça de uma liga paralela pós-crise de 2008 e agora é que Ross Brawn está do lado de quem comanda o esporte. E é só dar uma olhada rápida em seu histórico para apostar que, finalmente, tudo leva a crer que será o esporte, e não uma ou outra equipe, que sairá vencedor após todas as decisões que já vinham sendo tomadas, mas que “ligaram o turbo” devido ao coronavírus.
Para saber mais sobre o que foi decidido até aqui, fiz uma lista no UOL nesta semana.
O mais interessante é o fato da questão da competitividade sido a pauta central. São ideias que foram discutidas para entrarem em vigor junto com o regulamento de 2021 (aquele que, agora, ficou para 2022) e foram deixadas de lado por pressão dos times grandes. Com a pandemia, vendo que o próprio modelo de negócio corre risco, os poderosos foram obrigados a ceder.
Não que tudo tenha passado: há uma ideia muito interessante da Racing Point de criar uma plataforma open source para peças que custam caro para serem desenvolvidas, mas não são um diferencial de performance importante; e o retorno das equipes-clientes (ou seja, da possibilidade de comprar carros prontos). São dois pontos que estão em pauta e ainda podem ser adotados. Ainda assim, é só o começo dos desafios da F1 pós-pandemia.
Do lado das finanças, o teto orçamentário já prevê uma retração importante. E os primeiros contratos firmados entre as equipes e a Liberty, que substituirão o pacto da Concórdia que vence no final de 2020, devem diminuir as discrepâncias de receita entre os times.
Mas o quanto o modelo de negócio da F1 como um todo será atingido?
Mesmo se os cientistas chegarem a uma vacina e mesmo se uma quantidade significativa da população estiver imunizada, a pandemia da covid-19 escancarou algo para o qual especialistas alertavam há tempos: a maneira como vivemos nos coloca em perigo se há um vírus novo por aí.
A Liberty Media deixou claro que vê dois caminhos para a F1 aumentar sua receita: realizando mais corridas e focando em produtos digitais. Note que os contratos de TV até foram deixados um pouco de lado: em busca de conquistar mercados importantes, como EUA e China, os direitos foram negociados por quantias irrisórias. A aposta é que o digital ocupe o espaço da TV então, diferentemente de Ecclestone que, em busca do máximo possível de lucro antes da venda, praticamente acabou com a F1 em TV aberta, a Liberty tende a flexibilizar mais seus acordos a fim de fazer o esporte voltar, onde foi possível, a ser mais visto.
Esta estratégia, portanto, não deve mudar: aumentar a audiência mesmo que isso signifique ficar sem os milhões da TV a cabo enquanto a F1 se lança nas plataformas digitais. Algo que a covid não nos deixou ver, por exemplo, foram as transmissões do pré e pós prova que seriam feitos via Facebook. E serão, assim que a temporada voltar, ainda que com uma atmosfera toda diferente.
Mas e o calendário? Será que as fronteiras seguirão tão escancaradas? Será que os aviões simplesmente voltarão a transportar centenas de pessoas confinadas num mesmo (e pequeno) espaço por tantas horas como se nada tivesse acontecido? Algo que já se discute é se o sonho de uma Europa sem fronteiras já não teria morrido. Caso isso se confirme, os desafios logísticos de se fazer ainda mais corridas só se multiplicariam. É só ver o tamanho da encrenca para sequer começar a temporada deste ano:
[youtube https://www.youtube.com/watch?v=zpA_Ggp95WA]
Outro ponto que ficou claro com as corridas virtuais usando o jogo oficial da F1 é como a categoria também ficou para trás nesse aspecto. Se a ideia é conquistar fãs mais jovens e vender que a F1 é o topo, então, para a geração que vem chegando, é o jogo que tem que ser o melhor. E o sem-número de falhas do F1 2019 durante as “peladas” virtuais só deixou claro que esse não é o caso.
Ross Brawn – de novo, ele – não parece estar apenas fazendo propaganda quando diz que a F1 estará em um lugar muito melhor no pós-pandemia. Afinal, passos muito importantes foram dados no sentido de promover uma maior competitividade a longo prazo, algo ímpar nos 70 anos do esporte. Desta vez, não é só uma mudança de regras em que se corre o risco de alguém disparar na ponta. Mas, desta vez, também, os desafios estão mais do lado de fora das pistas.
O melhor da F1. Agora do outro lado
Para ficar nos últimos 20 anos: ele foi peça central na transformação da Ferrari em uma máquina de vitórias, fazendo grandes carros, recuperando-se no meio da temporada quando não começava muito bem, reinando nas estratégias. Com 11 campeonatos em seis anos, tornou-se o time mais vencedor da história da F1.
Foi pescar, tirou um sabático. Voltou como diretor-técnico da Honda e liderou o time que descobriu a brecha no regulamento de 2009. Chegou a questionar sobre isso em uma reunião, ninguém deu muita bola. Nem a Honda, aparentemente. Os japoneses não quiseram esperar e perderam a chance de serem campeões, já que a brecha era o difusor duplo, que praticamente recuperava os 60% de downforce que deveriam ser perdidos em 2009 para aumentar o número de ultrapassagens.
Além de campeão, ele ficou ainda mais milionário: pouca gente lembra que, além de assumir a equipe de Brackley pelo valor simbólico de um dólar, entrou em acordo para fazer a Honda arcar com os custos operacionais em 2009. E usou motor Mercedes de graça; Ao final do ano, vendeu o time campeão do mundo para os alemães. E ficou na chefia!
Fazendo um parênteses na história, é forçar um pouco, eu sei, mas dá para jogar na conta dele o DRS, para quem não gosta. Ele se fez necessário em 2011 porque tudo o que tinha sido feito para 2009 em termos de diminuição da turbulência dos carros fora jogado no lixo, em decorrência do difusor duplo. Sei que a Brawn não foi a única equipe que o explorou, e no final das contas cabia à FIA ter agido de forma menos política e mais técnica. De qualquer maneira, a ideia aqui não é culpar ninguém, só observar uma linha de acontecimentos interessante, então seguimos adiante.
Na Mercedes, ele foi peça central na transformação da Mercedes em uma máquina de vitórias, fazendo grandes carros, recuperando-se no meio da temporada quando não começava muito bem, reinando nas estratégias. Com 12 campeonatos em seis anos, tornou-se o time mais vencedor da história da F1. Mais ainda que aquela Ferrari.
Esse cara, obviamente, é Ross Brawn.
Percebam que ele é o nome que se repete por trás das grandes reclamações que volta e meia aparecem por aí sobre o fato da F1 ter passado de uma dinastia para a outra nos últimos 20 anos. Em duas delas, na Ferrari e na Mercedes, ele teve participação direta. Nos quatro títulos da Red Bull, foi a avenida aberta por ele na exploração do difusor que permitiu que uma equipe do meio do pelotão conquistasse quatro títulos seguidos. Ou seja, foi Brawn que tomou as melhores decisões, que viu as melhores oportunidades.
E talvez essa seja a melhor notícia dessa F1 tão cheia de negatividade (assim como o mundo, obviamente) em tempos de pandemia. Muitas mudanças estão acontecendo para que a categoria e suas equipes sigam existindo na era pós-covid. E agora Brawn está do outro lado. Sua equipe, agora, é o próprio esporte.
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Continuando a resgatar a história do blog, que faz 10 anos em 2020, e aproveitando que a F1 vai mostrar no seu canal de Youtube o GP da Europa de 2012, deixo com vocês o post das transmissões que fiz daquela corrida que, para mim, foi a melhor apresentação de Alonso na carreira.
Aqui também tem o post de estratégia daquela corrida, em que explico como Alonso conseguiu sair de 11º para vencer em um circuito tão travado como era a pista de rua de Valência.
Ninguém parece muito animado antes do GP da Europa começar. Afinal, como lembra o comentarista Reginaldo Leme, na Globo, “dos quatro anos, só em um o carro da pole não venceu, e foi com Rubens Barrichello.” O narrador da BBC, Ben Edwards, segue na mesma linha. “Ninguém nunca venceu um GP da Europa pela terceira vez e Vettel está na posição perfeita de fazê-lo. Ou talvez um dos pilotos da Lotus possa continuar com o conto de fadas de vencedores diferentes.”
Quem espera muito da dupla da Ferrari fica inquieto antes da largada. Afinal, os vermelhos largam em 11º e 13º após “uma meio que trapalhada”, como define Galvão Bueno. “Eles sabem que, se tivessem feito duas tentativas com macios no Q2, estavam entre os dez. Mas, agora que têm pneus novos, duas paradas é o ideal.”
Na espanhola Antena 3, a preocupação é com os pilotos que largam perto de Alonso e estão com pneus médios. “Estamos falando em duas ou três paradas ou será que alguém pode cometer a loucura de ir a uma?”, pergunta o narrador Antonio Lobato a Marc Gené. “Sim, é possível, mas serão muitas voltas com os macios. Creio que a estratégia de Fernando é mais lógica.” Mas nem mesmo os conterrâneos de Alonso confiam em um bom resultado: antes da largada, já secam a concorrência. “Confiamos que o ritmo de corrida da Ferrari seja bom, como mostrou na sexta, e o da Lotus também, para trazer problemas a Hamilton e Vettel”, espera Lobato.
Com seu piloto fora do top 10, Lobato se encarrega de narrar o que acontece na largada dos ponteiros, enquanto Vega e Gené ficam de olho em Alonso. “Madre mia, que arriscado”, sofre o piloto de testes da Ferrari. “Maldonado adora achar alguém na largada. Foi quase”, exclama Galvão. Também sobra para Grosjean, que fez manobra arriscada. “Ele tem curto-circuito quando larga!” A briga do venezuelano com ambas as Lotus confundiu Edwards, que acredita estar vendo Raikkonen em terceiro. Afinal, era o finlandês que largara por dentro. “Não, é Grosjean! E as Ferrari ganham terreno.”
O comentarista David Coulthard chama a atenção para “Massa e Button, um em cima do outro, na curva 4”. Para Galvão, isso fez com que o brasileiro ganhasse uma posição a menos que o companheiro na largada. “Espalharam para cima do Felipe!”
Os brasileiros se empolgam com o início agressivo do compatriota. “Foi o repeteco do Felipe no Canadá. Passou Rosberg por fora lá também e o alemão não gostou. Agora provou que não tem medo”, diz Luciano Burti.
Na frente, Vettel passeia e Hamilton segura o pelotão. “O engenheiro diz que Lewis está fazendo um bom trabalho. Pode ser que estejam tentando fazer uma parada a menos”, supõe Burti. Coulthard segue na mesma linha. “Nesse início, a McLaren não está conseguindo colocar energia no pneu ou será que Hamilton recebeu a instrução de fazer o contrário do Canadá e parar apenas uma vez. Porque a diferença para Vettel é muito grande”. A discussão na BBC é se Vettel vai fazer uma parada a mais que os outros. O analista técnico Gary Anderson não se arrisca.
Já os espanhóis estão pra lá de preocupados. Apesar do ritmo ruim de Hamilton, que “beneficia Vettel, claro, mas também Fernando, porque todos estão muito junto”, como observa Gené, estão assustados com “um domínio que ainda não tinha sido visto em 2012” do líder da prova. “Olha a distância do Vettel. Parece 2011”, define Lobato. “Nesse ritmo, Vettel vai dar uma volta em todos”. A crença espanhola é de que Grosjean poderia acompanhar o alemão, mas está bloqueado por Hamilton. Quando o francês se livra, no entanto, estão no comercial. Os britânicos, por outro lado, viram bem. “Ao contrário de Massa, ele se certificou de que Lewis não tivesse escolha a não ser desistir. Ultrapassagem muito madura de Grosjean. Foi muito profissional da parte de Lewis”, define Coulthard. “Hamilton foi muito correto”, concorda Burti, que logo observa que “a McLaren não está tentando fazer nada diferente. É falta de ritmo mesmo.”
Voltas depois, é a vez de Raikkonen superar Maldonado. Para Galvão, porque o venezuelano “deu mole, deixou o lado de fora aberto”. Seus colegas não concordam. “Ele teve dificuldade para segurar o carro porque teve de ir rápido demais para quem está do lado de fora”, justifica Reginaldo. “Que bonita a ultrapassagem de Kimi”, exclama Lobato. “Arriscou bastante. Quem disse que em Valência não dava para ultrapassar?”
Os ponteiros param e voltam no tráfego. E que tráfego. “Parece trânsito das 18h”, define Galvão. “Parece uma corrida de turismo. Por fora, por dentro, dá na mesma”, Lobato dá sua versão. E logo fica apertado demais para Bruno Senna e Kamui Kobayashi. “Kimi passou, Kobayashi tentou fazer o mesmo, mas foi fechado contra o muro. Para mim, parece um incidente de corrida. Tenho certeza de que Senna não vai concordar. Ele tomou sua trajetória e não devia saber que Kobayashi estava lá”, define Coulthard, que se surpreende com a punição ao brasileiro. “Não leria dessa maneira. Claro que eles têm mais informações, mais câmeras, GPS. E não falo isso só para ficar em cima do muro. É verdade.”
Galvão não se conforma com a manobra do japonês. “Tocaram Bruno Senna por trás. Ele podia bater no muro ou no Bruno. Tocou nos dois. Tentou passar onde não podia.” A primeira reação de Burti é de que “quem vai à frente tem o direito de proteger a linha”, mas logo depois Reginaldo lembra que a regra fala em deixar espaço de um carro. A punição sai e Galvão a classifica de “rígida porque acho que não havia um carro antes dele começar a manobra”.
O narrador, então, surge com uma “maldade”. “Mika Salo, comissário aqui, é finlandês e tem um finlandês na Williams que estão loucos para colocar no lugar do Bruno.”
Os espanhóis passam praticamente batido pelo incidente. Estão impressionados pela maneira como Alonso avança no pelotão. “Fernando não se rende nunca. Metade da Espanha deve estar de pé nesse momento. Que corridaça que estamos vendo aqui. Nem precisava de assentos na arquibancada, porque ninguém senta”, diz Lobato. “Além disso, faz tudo com muita cabeça”, completa Gené, que não se contém. “Magistral o que fizeram Ferrari e Fernando agora. É uma de suas melhores corridas do ano. Uma pena que esteja tão fácil para Vettel.”
E realmente estava. Até um dos aspirantes à vaga do alemão no futuro, Jean-Eric Vergne, cometer uma barbeiragem para cima de Kovalainen. “Esse sim merece uma passagem pelo box”, desconta Burti. “O que Vergne fez?”, Gené não entende.
O Safety Car entra na pista e os britânicos vão à loucura com a demora na parada de Hamilton, que o faz perder posições para Alonso e Raikkonen. “Demora uma eternidade, eternidade, para Lewis sair do pit!”, exclama Edwards. “Parece que o macaco falhou. Será que é de praxe eles terem um reserva ou eles esperavam ter problemas?”, questiona Coulthard. “E eles eram a única equipe treinando pit stop hoje de manhã. Ficaram obcecados com isso. Vão começar a fazer estratégias minimizando o número de pits”, Gené tira sarro.
Todos quase esquecem o líder. “Imagina a cara de Vettel com esse Safety”, diz Galvão. “Mas, Antonio, com o ritmo que ele tem…”, Jacobo Vega acredita que a vitória do piloto da Red Bull continua certa. “Sim, mas agora tem Grosjean atrás, vamos ver o verdadeiro ritmo. Cuidado que a corrida começou de novo, agora com Alonso em terceiro, graças a seu talento, aos riscos que correu e ao golpe de sorte com o erro da McLaren.” Coulthard, por outro lado, duvida que o francês faça frente ao alemão. “Se estivéssemos no Canadá, eu diria que Grosjean lutaria pela vitória. Mas a vantagem que Vettel conseguiu no começo foi muito grande. Agora eles estão com pneus médios, vamos ver o que acontece.”
A discussão fica em segundo plano quando, logo após a relargada, Alonso passa Grosjean por fora na curva 2, repetindo manobra anterior com Webber. “Talvez o engenheiro de Grosjean gostaria de ter avisado seu piloto que Alonso esteve praticando esse mesmo truque com Webber antes. Fantástico”, se empolga Coulthard. “Gigantesco Fernando Alonso! Em uma circunstância como essa, ele vai lutar pela vitória”, acredita Galvão. “O Alonso, para mim, e um piloto melhor que o Schumacher.”
Lobato quase perde o fôlego. “Ele passou!!IN-CRE-Í-BLE Fernando! Arquibancadas não acreditam. Valeu a pena gastar o que não tinha para vir para cá”. Gené diz que “há anos não via uma atuação dessas. É antológico.”
Mas a situação iria melhorar para o espanhol quando o líder Vettel encostou sua Red Bull. “Alonso lidera. O que aconteceu com ele? Será um furo? Drama no GP da Europa”, diz Edwards. “Enlouquece o torcedor!” diz Galvão. “Que longas são as corridas de F-1! Não é um sonho. É um presente dos céus, meu Deus!”, completa Lobato.
Mas a sensação geral é de que o piloto da Ferrari não terá vida fácil. Os espanhóis não se importam. “Mesmo se o Grosjean o ultrapassar, o segundo lugar é um resultado muito bom”, Gené pensa no campeonato, enquanto Coulthard questiona não ter SC com carro de Vettel na pista.
A discussão logo perde sentido, pois o francês também abandona. Os espanhóis, mais uma vez, estavam no comercial. “O que está acontecendo com esses carros confiáveis da F-1? Ano passado, todos completaram aqui, e agora perdemos o líder e aquele que estava em segundo lugar”, questiona Edwards, enquanto Coulthard destaca que Grosjean se preocupou em achar lugar para estacionar. “Esse é um cara que se sente à vontade com sua posição na F-1.”
Todos concordam que o único que pode atacar Alonso é Raikkonen, que está preso por Hamilton. “Os pneus de Alonso estão acabando, mas os de Hamilton também. Quem poderia lutar pela vitória é Raikkonen, mas ele tem de passar logo porque ficar atrás de Lewis só vai prejudicar seus pneus”, observa Anderson.
Quando vai ficando claro que o finlandês não tem velocidade para superar o inglês, começam as homenagens ao feito de Alonso. “Ele é inacreditável. Sei que a sorte jogou a seu lado hoje, mas ele tem um ritmo implacável e é um exemplo de líder, trazendo a Ferrari desde as dificuldades da pré-temporada. Todos achavam que seria uma vergonha. Não tem nada vergonhoso em ser o primeiro a vencer duas corridas na temporada”, afirma Coulthard. “É um GP em que um espanhol está fazendo mágica, lidera e merece como ninguém. Fernando tem o Kers das arquibancadas”, vê Lobato. “Alonso vai para vitória histórica, largando em 11º em pista de difícil ultrapassagem. Foi extremamente agressivo”, destaca Galvão.
Mas a corrida ainda guardava algumas brigas e, justamente o desgaste excessivo de pneus, que virara fantasma para os espanhóis e evitava uma comemoração antecipada, ‘atacara’ Hamilton. Raikkonen foi o primeiro passar, bem no momento em que Coulthard o criticava. “Sou apenas eu que estou vendo ou Kimi parece hesitante? Ele faz a manobra só para me calar!” Depois, é a vez de Maldonado. “Esses dois têm histórico!”, lembra o escocês. “Vai com calma que você vai passar, Pastor”, torce Lobato.
Mas o tal histórico entre os dois ganha mais um capítulo. “Que burros os dois”, define Vega. “Acho que é mais erro de Hamilton, porque Maldonado já tinha passado. Se os comissários considerarem Maldonado culpado, é porque ele estava com as quatro rodas fora da pista quando tentou ultrapassar.” Coulthard não concorda. “Maldonado estava do lado de fora e bateu na lateral de Hamilton. Se tiver de culpar alguém…”, ri o escocês. “Às vezes um quarto lugar é melhor que nada”, lembra Galvão ao ver Hamilton no muro. “Batida bastante discutível.”
“Alonso viu seus principais rivais fora e venceu em casa. Que dia para ele”, diz Edwards. Mas o choro do espanhol ainda no rádio quando, mesmo com Domenicali pedindo “nos diga algo, Fer”, nada saía, mostrava que era mais do que isso. “É a vitória mais emocionante da sua carreira. Ele fez coisas memoráveis, mas não lembro de uma vitória como essa. Vitória apoteótica. Vou me calar e deixá-los ouvir a arquibancada”, atesta Lobato. “Vou puxar a orelha de Fernando porque ele disse que o pódio era impossível. Ele sabia que era. Ele sabe que, em qualquer situação, é possível para ele. Ele é um cara duro, mas não vai aguentar algo como isso. Tremendamente emocionado depois do que obteve em um GP que desejava com toda sua alma.” Para Gené, “não há nenhum piloto na história que consiga tirar proveito das corridas dessa maneira, que sempre consegue o máximo de seu carro, de sua corrida, de sua estratégia.”
Os brasileiros vão além e a emoção de Alonso parece contagiar até Galvão. “A Espanha vive momento difícil, povo está sofrido e ele mesmo reconhece que o esporte pode dar alegria. Assim como aconteceu com Ayrton Senna no Brasil. É muito bonito ver um campeão chorar de emoção em um esporte em que o dinheiro fala tão alto.” E Reginaldo emenda. “É daqueles momentos de que a F-1 não esquece.”
Por que a Ferrari escolheu Sainz? Os ganhadores e perdedores da dança das cadeiras
Ele foi votado pelos próprios pilotos como o quarto melhor do ano passado, atrás apenas de Hamilton, Verstappen e Leclerc, e ainda tem muita gente questionando o que diabos a Ferrari viu em Carlos Sainz. Trata-se de um piloto que deu um salto muito grande na McLaren e que tem algumas características dentro e fora das pistas que o tornaram um candidato interessante para a Scuderia. Um misto do que veio de berço, e de seu grande ídolo.
Como Alonso, Sainz não tem a classificação como seu ponto forte, embora tenha batido Verstappen no quesito quanto foram companheiros. Como Alonso, é encontrando a trilha para avançar nas corridas que ele se destacou ano passado, especialmente na segunda metade. Como o pai, lida bem com a parte política internamente (haja vista o cuidadoso vídeo de despedida que fez para a McLaren), agrada patrocinadores, tem retorno técnico reconhecido e é de uma regularidade impressionante em termos de ritmo. Não por acaso, seu engenheiro o apelidou de “smooth operator”.
[youtube=http://youtu.be/GvJEmnHnG1U]
E, do ponto de vista da Ferrari, as ambições imediatas de Sainz são bem menores que as de Charles Leclerc.
Neste cenário, dá para entender por que Daniel Ricciardo foi preterido. Não chegaria na Ferrari para ter sua primeira chance em um time grande, mas para lutar pelo título. E isso implicaria, inicialmente, em lutar por espaço com Leclerc. Justamente o mesmo motivo pelo qual saiu da Red Bull, após Verstappen construir um cenário muito semelhante ao do monegasco.
Além disso, como houve a conversa de que o australiano teria pedido muito dinheiro nas negociações de 2018, ele pode ter ganhado fama de ambicioso demais. E não ajuda o fato de ter saído da Red Bull para ganhar um caminhão de dinheiro na Renault e pular do barco na primeira oportunidade. Iria cobrar menos para a Ferrari agora? Provavelmente. Mas não é o tipo de atitude que ajuda quando você já não tem tudo a seu favor.
Diz ele que não teve nada disso: ele era o piloto Ferrari para 2019 até o GP de Mônaco, quando Marchionne bateu o martelo a favor de Charles. O presidente morreu no final de julho daquele ano e sua palavra foi mantida não apenas por respeito, mas porque os que assumiram o comando da Ferrari eram seus aliados. E a Leclerc foi dada a chance de lutar de igual para igual com Vettel desde o início da temporada (convenhamos que só viu o “menino Leclerc contra o mundo” quem quis).
Piloto da Academia, indicação de Marchionne (nome central na recuperação da empresa mesmo não tendo ficado por tanto tempo assim no controle), e um trunfo importante também com os Todt (leia-se, FIA). Não é a toa que ele traz consigo tanto poder. E, na pista, os resultados.
Depois da experiência positiva de ter um piloto já bicampeão (Schumacher) chegando com peças-chave para a reconstrução da equipe, e de duas tentativas frustradas em que só foram contratados os pilotos em si com a missão de salvar a lavoura (Alonso e Vettel), a Ferrari parece tentar algo diferente, com suas crias. De Leclerc ao topo do corpo técnico, é assim que o time está estruturado para enfrentar os próximos anos.
McLaren se deu bem
Demorou dois anos, mas a jogada que Zak Brown tentou em 2018 finalmente deu certo: Ricciardo esteve próximo de acertar com a McLaren e acabou decidindo ir para a Renault. Em teoria, estar em uma equipe de fábrica é melhor do ponto de vista da competitividade do motor, mas desde que o motor fale alto. Ele decidiu duvidar de todos os sinais de que a Honda estava se encontrando e apostou no motor errado. Curiosamente, um desses sinais era a negociação da McLaren para retomar a parceria com a Mercedes.
Lucrando puramente com o fato de Ricciardo não ser o nome correto para o momento que a Ferrari atravessa, a McLaren acabou com uma bela dupla. Ricciardo tem experiência, vem com fome de mostrar que sua carreira não foi jogada no lixo, é excelente no meio do pelotão, sabe vencer. Pode parecer bobagem, mas vira e mexe na F1 a gente ouve de equipes que já foram grandes o quão difícil é fazer os próprios engenheiros e mecânicos acreditarem que estão em um time vencedor. Ele pode trazer essa mentalidade de volta à McLaren.
E a Renault?
Nem é preciso dizer que a Renault saiu por baixo de tudo isso. Mais um vez, diga-se de passagem, após perder a Red Bull e, depois, a McLaren. Não por acaso, o tom do comunicado de Abiteboul foi de reiterar o compromisso da equipe na F1.
Quando ele foi bater na porta da montadora pedindo mais dinheiro, em 2018, tinha debaixo do braço um projeto de cinco anos. Foi com este projeto que ele convenceu Daniel Ricciardo, mas o australiano demonstrou não confiar totalmente no que via ao assinar por dois anos e deixar em aberto um plano de fuga quando tantos contratos estariam no fim. Pulou do barco.
Agora, Abiteboul precisa de um nome forte, e os indicativos são de que Vettel não estaria interessado no projeto francês – e até, convenhamos, pelo que ele mostrou andando no bolo na Ferrari, talvez não fosse uma ótima opção. É neste contexto que o nome de Fernando Alonso volta à tona, no que poderia ser uma posição interessante também para Valtteri Bottas caso ele se veja sem lugar na Mercedes. Correndo por fora, Nico Hulkenberg não está exatamente ocupado no momento….
Nesta dúvida para saber qual o melhor projeto para o futuro, se a McLaren com motor Mercedes ou a Renault focada totalmente no time de fábrica e com orçamento mais garantido, quem aparece como a grande aposta para o futuro é a Racing Point/Aston Martin. Em teoria, eles não têm vagas abertas para 2021, mas seriam uma saída e tanto para quem perdeu esse primeiro bonde.
E agora, Ferrari? E agora, Vettel?
É preciso voltar a julho de 2018 para entender o que aconteceu com a trajetória de Sebastian Vettel na Ferrari. Jogar a vitória no GP da Alemanha no lixo e ainda provocar o Safety Car que daria ao rival Lewis Hamilton a chance de vencer uma corrida que vinha desenhada para que ele perdesse muitos pontos após uma rara falha na Mercedes na classificação quebrou a confiança da equipe e, em que pese todas as oportunidades nas quais especialmente Mattia Binotto tentou resgatá-la – especialmente em Singapura e com todo o esforço para deixá-lo mais confortável no carro do ano passado – a realidade nua e crua era que um estreante muito bem posicionado politicamente na Scuderia tinha o superado.
Quando se fala que Vettel não aceitou a redução salarial e isso travou as negociações, não é uma questão de números. Quando ele renovou com a Scuderia em 2017, fechou um acordo de 120 milhões de dólares por três anos, tendo como companheiro um Kimi Raikkonen que sempre foi descomplicado como tal em termos políticos, e que tinha de tornado fácil também de ser batido na pista.
Mas o mesmo Marchionne que lhe deu o contrato generoso acreditava que Vettel precisava ser desafiado, e defendia que o jovem Leclerc seria o melhor nome para isso. Talvez só não esperasse que a passagem de bastão acontecesse de forma tão rápida: Leclerc fez mais poles, ganhou mais, pontuou melhor. E não fez com que Vettel subisse de nível: ele continuou errando, e sozinho, como no Bahrein ou na Itália ano passado.
Não coincidentemente, a proposta que teve na mesa para renovar o contrato desta vez não foi tão vantajosa. E aí entra a questão de dinheiro: receber menos dentro deste contexto, com Leclerc na equipe, e ter um contrato mais curto que o do companheiro só poderia significar que o espaço foi perdido.
Então quando se fala que Vettel não aceitou ganhar menos, não é preciso conhecê-lo muito bem para saber que não é a conta bancária que lhe incomodou, mas o significado desse “rebaixamento”.
Confesso que desde que ouvi Vettel falar sobre as novas regras, no dia em que elas foram divulgadas, na quinta-feira do GP dos EUA, não o vejo no grid para pilotar esses carros. Apreciador da F1 da época de Schumacher e estudioso da história da categoria, ele odeia esse motor híbrido, odeia o calendário longo e não acha que o esporte está indo na direção correta. Ele não perdeu a paixão por pilotar, mas a quantidade de elementos que ele não gosta na F1 está começando a pesar.
E para a Ferrari?
É inevitável que eles percam do ponto de vista da experiência. Não tem nenhum tetracampeão no mercado com tantos GPs e vitórias nas costas – acreditando no que o Hamilton tem dito há algum tempo sobre não se interessar pela vaga na Ferrari. Leclerc ainda comete muitos erros, embora tenha se mostrado um aluno aplicado, então a Ferrari precisaria de alguém que lhe desse tranquilidade e lhe forçasse ao mesmo tempo. É um equilíbrio difícil de se encontrar, vide a Mercedes.
O nome que encabeça a lista a Carlos Sainz. Tecnicamente, uma ótima escolha: apesar de jovem, já tem cinco temporadas, nas quais ganhou consistência. A regularidade deve vir de berço e o racecraft lembra seu ídolo Alonso. Mas, assim como o compatriota, ele já mostrou no passado que joga politicamente dentro da equipe.
Outra opção seria Ricciardo, há anos na lista ferrarista. Ele já indicou algumas vezes acreditar que seu ex-companheiro Vettel era quem lhe vetava na Scuderia, então o caminho estaria aberto agora. Mas ele aceitaria ir para Maranello a qualquer custo? Certamente ganharia muito menos do que hoje e, aos 31 anos, entraria numa equipe que já tem dono.
Giovinazzi corre por fora e, se for o escolhido, seria visto como a prova cabal de que Leclerc tomou um lugar que foi de Schumacher, Alonso e Vettel. Nunca foi da Academia da Ferrari em si, mas o time o conhece bem da época em que foi piloto de simulador. Na verdade, eles sabem muito mais sobre ele que seus resultados podem nos contar.
Correndo por fora, ouvi ainda em julho do ano passado que um certo Valtteri Bottas estava de olho no movimento de Vettel na Ferrari, e talvez fosse mesmo uma boa para ele, e para a Scuderia, já que com Bottas viria a experiência de quem está no time a ser batido.
Quem eu escolheria? Nenhum deles. Mas sim um amigo de Leclerc, também rapidíssimo e com um poder impressionante de adaptação, que forçaria o monegasco sem desgastar a tal “harmonia perfeita” que Vettel não via mais dentro da equipe. E o contrato dele com a Red Bull acaba no final deste ano…
A lição que os últimos anos da Ferrari nos deixa é que não existe só uma receita para falhar em Maranello. Se Fernando Alonso foi praticamente perfeito dentro das pistas e saiu pelo desgaste fora delas, a história de Vettel foi justamente o contrário disso. Que fique a lição para quem chegar.
Os melhores GPs da F1 para ver ao vivo
Enquanto as viagens ficam restritas aos nossos pensamentos e planos, muita gente tem me perguntado sobre os melhores GPs para conferir ao vivo. Fiz uma lista baseada em diferentes gostos e prioridades em 2017, e uso as postagens em comemoração aos 10 anos de blog para este repost que na verdade teve algumas revisões importantes!
F1 Roots: Silverstone (no meio original era Spa, mas explico)
Por que não Monza? (Se for ferrarista, é imprescindível) Por que não Spa? (Era minha opção no post original, com seus motivos, que continuam valendo, mas diria que é imperdível se você é fã do Verstappen e curte festa como os holandeses). Por que não Suzuka? (Ok, Suzuka é concorrente forte para Spa, mas é tão particular por conta do show de paixão e respeito que os japoneses dão que tem que ser um evento colocado à parte). O GP da Grã-Bretanha é o evento em que você vai sentir que encontrou sua turma. Claro que tem quem goste mais do piloto X ou da equipe Y, e obviamente muita gente vai torcer para o Lewis, mas a grande maioria é fã de F1 e ponto final.
Também tem a chance de você topar com alguém que trabalha ou já trabalhou na categoria, pois a maioria das equipes ficam ao redor de Silverstone. Se há uma região voltada ao automobilismo na Europa, é lá.
Para chegar lá, as melhores opções são hospedar-se em Milton Keynes ou Oxford (mil vezes melhor) e pegar o ônibus grátis até o circuito. Se o clima for roots mesmo, o camping é a melhor opção, mas lembrando que pode acontecer absolutamente de tudo em termos de clima em Silverstone. Já peguei uns 11 graus com chuva com a sensação que era muito menos, e quase 30 no sol escaldante. Você pode imaginar que, na Inglaterra, o escoamento é bom em caso de chuva no camping, mas não é. Como os ingleses “sobrevivem”? Com litros de cerveja à temperatura ambiente e fazendo churrasco de linguiça.
Como a pista é de alta velocidade, as arquibancadas são um pouco longe, mas dá para ter a sensação do quão rápidos os carros são nas curvas. E as corridas têm sido boas. Mesmo se não forem, o clima de festival de verão no entorno compensa.
Experiência: Cingapura
É impossível não fazer uma menção a Mônaco. Afinal, para qualquer fã de Fórmula 1, ver os prédios e curvas que aprendemos a decorar de outros ângulos é uma experiência e tanto. Mas o GP de Cingapura é meu preferido em toda a temporada. A região de Marina Bay é espetacular – e muda a cada ano que a F-1 desembarca. A corrida noturna dá um ar completamente diferente e os organizadores se certificam que os espectadores fiquem entretidos com shows em pelo menos dois palcos. Como qualquer corrida de rua, é possível ver os carros muito de perto mas, à noite, eles ficam ainda mais bonitos e impressionantes. E dependendo do ângulo da arquibancada, dá até para ver o olhar do piloto.
O ponto negativo é o preço da estadia, que está entre os mais caros da temporada. A passagem saindo do Brasil, é claro, também é salgada, mas seria um gran finale para uma viagem ao sudoeste asiático (altamente recomendável!). Os ingressos não estão entre os mais baratos,mas os organizadores oferecem algumas opções interessantes, como pacotes para grupos e alguns que combinam três lugares diferentes para os três dias, incluindo visita aos pits.
Visão da pista: EUA
Foram alguns os circuitos em que Hermann Tilke teve praticamente uma página em branco para desenhar e não fez grande coisa, mas em Austin ele inegavelmente acertou. Além do traçado em si ser bastante seletivo e uma espécie de ‘best of’ de outras pistas, a elevação do terreno faz com que determinados pontos tenham uma visão privilegiada. E você não precisa pagar mais por isso: mesmo com o ingresso de general admission, é possível ficar no final da reta, diante de uma das melhores curvas do circuito e ainda vendo boa parte do restante da pista.
Os organizadores fazem uma promoção incrível incluindo F-1, MotoGP e WEC em apenas um ingresso vendido antecipadamente por 200 dólares. Para quem pensa em visitar a região apenas em outubro, há outros mimos como ingressos com open bar, visita aos pits e festa exclusiva.
O problema em Austin é o preço salgado da hospedagem. Em 2017, mesmo após muita pesquisa, paguei mais que em Mônaco! A capacidade hoteleira da cidade não comporta o evento e não raro a F-1 divide a atenção com outro grande evento na cidade.
Barganha: México
Quando fiz o texto original, era a Malásia, sem sombra de dúvida. Para a sorte dos brasileiros, a barganha ficou mais perto de casa, ou seja, ainda mais atrativa. Não sei se é porque não vivo no Brasil que me empolgo tanto ao chegar na Cidade do México, a irmã gêmea de São Paulo nesse mundão. Lá, principalmente para quem já está acostumado a uma cidade gigante, desigual e violenta (e, com isso, consegue aproveitar os pontos positivos) vai curtir o GP. O local da pista é bem parecido com Interlagos, mas com policiamento infinitamente maior. E, lá dentro, o clima também lembra muito a irmã paulistana, mas com mais conforto. Um ingresso para os três dias no estádio fica em 270 dólares.
Dá para ir de metrô até, literalmente, o portão da pista, e a viagem de uma área tipo a Paulista (assim como em SP, eu evitaria o centro em si) até a pista de metrô dura uns 40 minutos no máximo. O GP ganhou como melhor evento do ano em todas as oportunidades desde que voltou ao calendário e isso não é coincidência.
Custo-benefício
Na Europa: Budapeste
Uns dizem que é porque eu não conheço Paris. Outros garantem que é porque estava encantada demais com Berlim quando cheguei a Praga. Mas considero Budapeste a mais bela capital europeia. É gloriosa e clássica ao mesmo tempo em que é jovem e pulsante. E, com a Hungria fora da zona do Euro, está entre as mais baratas. Dá para pagar pouco mais de 100 reais por dia para ficar muito bem localizado, o sistema de transporte coletivo funciona bem com metrô, bonde e ônibus e a alimentação é bem em conta.
Considero o GP da Hungria como o melhor da Europa em termos de custo-benefício porque é possível ao mesmo tempo visitar essa cidade incrível e ir em um GP com um clima todo especial, já em pleno verão europeu – e em que raramente se vê chuva. A pista fica perto da cidade – a uma meia hora do centro – e, se ficar quente demais, tem um parque aquático logo do lado! Os ingressos? Dá para sentar na arquibancada por 270 reais.
Fora da Europa: Montreal
Mas se alguém me perguntasse qual GP indicaria para ter um pouquinho de tudo o que citei nos exemplos acima, escolheria o Canadá. É lógico que os GPs roots têm seu charme para os fãs, mas nada como casar a visita a um GP e uma cidade incrível como Montreal. Lá, é possível chegar tranquilamente de metrô ao Circuito Gilles Villeneuve, que costuma ser o palco de corridas emocionantes.
A cidade em si se transforma devido à prova, com donos de carros antigos, esportivos e/ou envenenados desfilando nas ruas, e as pessoas são contagiadas por um clima de festa, com barraquinhas servindo comida e bebida no centro e várias atividades culturais paralelas. Apesar do país não ter tanta tradição em termos de pilotos, a prova atrai um público fanático com conhecimento bem acima da média.
O preço da hospedagem depende diretamente do quão perto da festa você quer ficar. Se o foco for só a corrida, qualquer lugar próximo ao metrô já serve. O ingresso para a prova também é convidativo: o mais barato sai por 320. Quer ficar no famoso hairpin e ter uma visão como esta da foto? Vai pagar cerca de 480 reais. Só precisa correr, porque com um canadense no grid depois de tanto tempo, Montreal promete ter uma das provas mais concorridas da temporada.
F1 e a crise do coronavírus: como a categoria sobreviveu a 2008?
Fazendo a matéria para o UOL sobre as origens das equipes que estão hoje no grid, foram vários os vestígios das transformações pelas quais a Fórmula 1 passou como consequência da crise financeira de 2008. Acabou sendo o fim de uma era e o que alguns viam como sinais de que a categoria caminhava para o fim acabaram sendo os embriões do que ela se tornou. A F1 nunca mais foi a mesma depois que as montadoras foram saindo, uma a uma, entre o fim de 2008 e 2010. E é impressionante como a história se repete.
O que foi a crise de 2008?
Vira e mexe ouvimos falar dessa tal crise que acabou não sendo tão sentida no bolso do brasileiro médio devido a uma série de medidas do governo para manter a economia aquecida, como a redução de impostos em determinados produtos (carros, por exemplo). O país vinha crescendo em um ritmo acelerado, parou em 2009 (houve recessão de 0.6%) e para explodiu de novo em 2010 (crescimento de 7.5%). Então no Brasil foi possível, digamos, passar 2009 na banguela e depois voltar a acelerar.
Internacionalmente, a crise de 2008 foi considerada a pior desde a quebra da bolsa de NY de 1929. Foram crises parecidas, com o aumento de preços (no caso de 2008, do mercado imobiliário norte-americano) incompatível com a realidade, criando bolhas financeiras. Quando as pessoas não conseguiram pagar suas dívidas, a bolha estourou. Isso fez ações despencarem em todo o mundo e grandes empresas do mundo automobilístico viram suas vendas voltarem aos níveis da década de 1980. As montadoras reviram seus gastos e a F1 foi atingida em cheio.
Como era a F1 em 2008
É importante salientar que a tal ‘bolha’ estourou em setembro, então os efeitos foram sentidos após a temporada que teve uma das decisões de título mais emblemáticas da história, entre Massa e Hamilton no GP do Brasil, e durante o ano de 2009.
A Fórmula 1 tinha sobrevivido sem grandes percalços ao fim da propaganda de cigarros em 2001 justamente porque já estava cheia de montadoras. E assim permaneceu na primeira década dos anos 2000. Em 2008, o grid tinha Ferrari, BMW, Renault, Toyota, Honda e a presença da Mercedes como fornecedora da McLaren. Os orçamentos de Ferrari e McLaren ficaram entre 420 e 430 milhões de dólares naquele ano, mas a questão não era tanto o gasto de quem lutava pelo título: no meio do pelotão, a Toyota gastava mais de 440 milhões e a Renault, quase 400; no fundo do grid, a Honda investia o mesmo dos franceses.
Para efeito de comparação, hoje, mesmo com a inflação dos últimos 12 anos somada, os orçamentos dos três grandes fica entre 450 e 480, mas despenca no meio do pelotão, ficando na casa dos 270-260 de Renault e McLaren para baixo. Então, no total, mesmo tanto tempo depois, as equipes têm menos dinheiro para investir, e isso tem muito a ver com o que aconteceu nos meses que se sucederam à crise de 2008.
Na pista, cinco equipes venceram mais porque o rendimento em si não era tão diferente e não porque era mais fácil ultrapassar. As corridas não eram sensacionais, e essa maior competitividade tinha a ver com a equalização dos motores e manutenção das regras.
A crise chegou quando as equipes se preparavam para gastar
É impressionante como há semelhanças entre o momento da F1 hoje e em 2008: havia o consenso de que era preciso diminuir o efeito da aerodinâmica para fomentar as ultrapassagens, e uma grande mudança de regras, deixando os carros bem mais lentos, aconteceria em 2009. Além disso, havia a opção de colocar o Kers, já que a F1 já começava a sentir que seu motor V8 era obsoleto. Ou seja, a crise chegou quando as montadoras estavam gastando os tubos por conta das novas regras, sem garantia de que teriam ou não sucesso.
A Honda foi a primeira a abandonar o barco. No final de 2009, foi a Toyota que a seguiu. Peter Sauber retomou o controle de sua equipe com a saída da BMW e, no final de 2010, a Renault vendeu seu time para a Genii (e depois o compraria de volta em 2015).
Então, no final das contas, a F1 chegou a 2011 só com Ferrari e Mercedes (e Renault e Cosworth como fornecedoras de motores) e sem que as mudanças que custaram muito caro para a categoria surtissem efeito. O difusor duplo da Brawn (equipe que emergiu do espólio da Honda) tinha jogado tudo para o lixo em termos de perda de pressão aerodinâmica, gerando o DRS, adotado em 2011.
Teve até ameaça de categoria paralela
A situação ficou tão delicada durante 2009 que houve uma ameaça séria da formação de uma categoria paralela com todas as equipes, fora a Williams. Isso aconteceu porque Max Mosley aproveitou o momento de crise para determinar um teto orçamentário de 100 milhões de euros para os times grandes e 45 milhões para quem quisesse entrar, para abrir a porta a novos times. Por sorte da F1, a posição de Mosley já estava enfraquecida politicamente e ele teve de ceder, desistindo de concorrer pela reeleição na FIA no final de 2009. E a ideia do teto orçamentário ficou adormecida por alguns anos.
Renault e Honda voltaram, e só
Com a promessa do teto orçamentário de Mosley, HRT (depois Hispania), Lotus (que virou Caterham) e Virgin (a Marussia) entraram, amarguraram o fundo do grid e desapareceram rapidamente. Entre as montadoras, de 2011 para cá, a Renault retomou o controle de sua equipe quatro anos depois, já que tinha investido pesado no motor de 2014. A adoção do turbo híbrido motivou a Honda a retornar, mas recomeçando do zero, os japoneses sofreram tanto que mostraram o tamanho do desafio. E, a não ser que o motor seja simplificado, ninguém mais vai se aventurar.
Quem lucrou com a crise? Ross Brawn
Se teve alguém que saiu ainda mais milionário da crise de 2008 foi Ross Brawn. Ele era diretor-técnico da Honda quando o time investia pesado em encontrar soluções para o carro de 2009. Eles encontraram o difusor duplo e, sabendo disso, quando a Honda decidiu sair, ele pagou um dólar pelo espólio do time, garantiu que a Honda pagaria os custos de 2009, ganhou os dois títulos, vendeu suas ações para a Mercedes por 200 milhões de dólares e ainda permaneceu como chefe da equipe até 2013. Neste período, ajudou a construir a equipe que se tornaria a mais dominante da história – e cuja sequência de vitórias é, no fundo, a grande motivação para a F1 estar mudando tudo de novo (e, novamente, tendo o azar de fazer isso durante uma crise mundial).
Isso nos leva ao futuro: a indicação de Brawn, (ele de novo!) hoje diretor-técnico da F1, de que o teto orçamentário vai começar com 145 milhões de dólares e vai cair (a discussão é quanto) nos anos seguintes é um alento tardio, mas necessário. Mas talvez o mais interessante seja a flexibilização das equipes clientes. É uma briga antiga que, circula nos bastidores, está prestes a ter final feliz para Haas e companhia. Mas as previsões para o futuro da F1 pós-pandemia eu deixo para a semana que vem.
A F1 era melhor antigamente?
Foram três fatores que me motivaram a adicionar no blog os textos relembrando corridas antigas da F1: é uma forma de eu mesma descobrir histórias que precedem minhas memórias, reconstruir minhas memórias com uma visão mais ampla dos fatos e, principalmente, desconstruir alguns mitos.
Hoje, até arrisco dizer que nostalgia tem cura.
Para escrever os textos, costumo recorrer a matérias escritas na época e a vídeos, como aqueles que começaram a ser feitos nos anos 1980 como resumo da temporada. Com o tempo convivendo no circo, aprendi que deve-se descontar uma boa parte da negatividade quando os relatos vêm da Inglaterra – e é a mídia inglesa que constrói muito da história da F1 – uma vez que o jornalismo por aqui é sinônimo de focar sempre no que não está certo.
Nesse sentido, cada um tem sua tradição: é esperado do jornalista esportivo espanhol que ele torça. É esperado do italiano que veja tudo sob o prisma da Ferrari – e que cobre mais da Scuderia do que de qualquer outro. E por aí vai.
Mesmo com esses “juros e correção monetária” (já que estamos falando de coisas das antigas) tem sido um exercício muito interessante nos últimos anos. Especialmente depois do início da década de 1980, é muito comum encontrar exatamente o mesmo tipo de reclamação que vemos hoje. E quem estiver com “dor de cotovelo” da grande geração que temos atualmente daqui a 20 anos, vai pegar estes textos e pensar ‘nossa, como eles reclamavam de mão cheia!’. Não vou entrar na psicologia de como costumamos romantizar nossas lembranças, e nem preciso: aí estão as reprises dos tempos de quarentena para nos tirar qualquer dúvida.
Novidades na F1 sempre foram recebidas com críticas
Nestes anos pesquisando para os textos históricos, lembro de ver reclamações sobre as pistas novas que Bernie Ecclestone passou a incluir no calendário – e não estou falando de Coréia do Sul ou Índia, mas sim de Detroit, Phoenix, porque era “um absurdo a F1 ir para um lugar em que ninguém parece se importar com a categoria”, além da “ganância” de buscar etapas que lhe davam mais dinheiro ao invés de ficar “com a tradição de Watkins Glen”.
Quando a perspectiva que o tempo nos dá mostra que, embora não tenha acertado sempre, o que chamaria de visão de Ecclestone fez da F1 o que ela é hoje.
Até aumento de segurança foi criticado
Também li que era a hora da F1 adotar padrões de segurança mais rígidos do que em Jarama ou em Zolder por exemplo. Li que a brita era ultrapassada. E inúmeras, muito mais do que hoje, teorias sobre trapaças.
Mas uma crítica volta e meia aparecia: a falta de competitividade, especialmente a partir do final dos anos 1980, quando o dinheiro (trazido por Ecclestone) dos direitos de TV começou a aumentar exponencialmente e o desenvolvimento de tecnologias digitais foi alterando o processamento de dados e invadindo os carros.
Domínios fazem parte da história da F1
Não que não tenham havido carros imbatíveis antes (que o diga a Lotus) e que qualquer um podia vender uma corrida. Isso não ocorreu em nenhum momento em um campeonato que sempre teve em seu DNA as diferenças entre os carros. Mas, a partir do MP4/4, uma “dinastia” foi entregando o domínio para outra, com alguns “refrescos” no caminho. E isso foi criticado duramente, desde a época de Senna.
Bons eram os velhos tempos, em que começávamos uma corrida sem a certeza de que Ayrton ou Alain ganhariam, diziam os relatos da época. E depois veio a Williams de outro mundo, a Benetton da qual todos desconfiavam, as flechas de prata da McLaren, a Ferrari de Schumacher.
Uma coisa é romantizar que Senna saiu de 16º para vencer e ser campeão pela primeira vez, como muita gente assistiu no último domingo. É uma história e tanto, é verdade. Mas também é verdade que aquele carro era muito superior, e quando Hamilton por exemplo cai para o fim do pelotão, se recupera com uma Mercedes e muita gente desdenha devido à vantagem do carro, fica a lembrança de equalizar pesos e medidas.
Sempre há o que melhorar, seja no esporte, seja na vida. Quem sabe vamos assistir tanta reprise que vai começar a dar saudade das corridas de hoje em dia.
5 curiosidades da Espanha que você não sabia
Uma das curiosidades da Espanha relacionadas ao GP de Fórmula 1 que a etapa é a única em que se toca dois hinos, da Espanha e da Catalunha.
Continue readingRepost: Muito tempo. Nem tanto conteúdo
Tudo partiu de uma conversa com o repórter da Globo Guilherme Pereira durante a sempre longa espera no cercadinho, a zona de entrevistas de TVs e rádios, no domingo na Espanha: vindo do futebol, o colega, que fazia sua segunda prova, estava impressionado com o tempo o qual os pilotos ficam à disposição da mídia durante um final de semana de GP.
Fora eventos de patrocinadores, os pilotos basicamente têm 8 dias de trabalho com a mídia por mês, contando a média de dois GPs por mês. E, de fato, o acesso da imprensa é infinitamente maior que o de jogadores badalados na Europa e mesmo no Brasil, onde eles são mais blindados. Após conversas com colegas e de juntar com meus dados aproximados e os exatos da Williams, cheguei à conclusão de que um piloto fala, em média, por seis vezes mais tempo com a imprensa por mês que um jogador de futebol. Os detalhes estão na matéria publicada no último sábado no UOL Esporte.
E nem vou entrar no mérito da chance incrível que temos de falar com os pilotos no grid.
Claro que há alguns adendos a se fazer. A quantidade de mídia presente no paddock se assemelha mais a uma Copa do Mundo ou uma Olimpíada do que a uma partida do Campeonato Brasileiro. E, a exemplo destes eventos, são vários idiomas a serem contemplados. É claro que eu na Rádio Bandeirantes ou a Globo não vamos usar Felipe Massa falando em inglês – e esses pilotos cuja língua-mãe não é o inglês costumam ficar um pouco mais sobrecarregados. Outro fator é o número gigante de emissoras de TV, todas elas com contratos caríssimos para ter direito ao uso da imagem. E todas querendo exclusividade no cercadinho.
Não é por acaso que todas as mudanças feitas pela equipes e pela própria F-1 ultimamente visam agradar às TVs: cada vez mais os times resumem ou extinguem sessões para a mídia impressa, enquanto a coletiva de imprensa oficial de quinta-feira – que é transmitida pela TV, tornando seu conteúdo praticamente inútil para a mídia impressa, para a qual ela seria direcionada – está sendo dividida em duas e, enquanto metade dos pilotos escalados fala na oficial, adivinhem com que o restante está falando de forma mais exclusiva?
Isso, porém, não tem ajudado em nada o conteúdo. Imagine que você é Fernando Alonso e acabou de fazer um teste na Indy. Na coletiva, vão lhe perguntar sobre isso. No cercadinho, você vai parar em 10 a 15 TVs e cada uma delas vai querer saber disso. E, no caso da McLaren, há ainda uma outra coletiva para a mídia impressa. E um vai querer uma resposta mais interessante para a mesma coisa. Não vão ter.
Outro problema decorrente dessa necessidade de agradar as TVs durante quatro dias seguidos de atividades – e ter muitas delas para agradar – é que uma grande parcela das opiniões que ficam rodando a mídia por dias foram colhidas assim que os pilotos saíram do carro, no calor do momento, sem qualquer análise posterior. Isso é diferente na maioria das sessões de mídia impressa – não no caso da Ferrari, que leva os pilotos do cercadinho direto para estas entrevistas, então as aspas costumam ser bastante cruas – mas a tal política de agradar as TVs vem fazendo com que os assessores de imprensa cortem o tempo de trabalho de mídia de seus pilotos justamente por estas sessões. Os pilotos da Red Bull e da Williams, por exemplo, não falam com os jornalistas de impresso, que não podem entrar no cercadinho, após a corrida.
Não é por acaso que, mesmo com este acesso que parece gigantesco, há muita reclamação. Dos pilotos, cansados de ouvir as mesmas perguntas, e dos jornalistas, cansados de ouvir as mesmas respostas. Mais um problema criado pela Era Bernie e seu apetite feroz por contratos de TV.
(Atualizando, depois de três anos trabalhando com a Liberty, a mentalidade não mudou muito. O que mudou é que agora temos também a equipe de mídia digital da própria F1, fazendo “propaganda”, como eles mesmos dizem, e não exatamente jornalismo, na linha de frente da produção de conteúdo)